BRASÍLIA – As capitais do Sul do Brasil chegam às eleições municipais deste domingo, 6, em disputas alheias à polarização da política nacional protagonizada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e por Jair Bolsonaro. Os representantes dos dois polos estão mais bem representados nos candidatos a vice, que por vezes, são escanteados nas campanhas, em uma espécie de apoio velado.
A avaliação de especialistas ouvidos pelo Estadão é a de que a vinculação com as lideranças de esquerda e da direita é, ao mesmo tempo, uma alavanca nas intenções de voto e um chamariz para a rejeição. Por isso, políticos de situação ou que já são conhecidos nas cidades por sua atuação no Executivo e no Legislativo buscam manter próximas as bases de apoio de seus cabos eleitorais sem afugentar potenciais votos de outros segmentos.
O resultado são debates voltados à defesa das gestões por parte dos atuais prefeitos e de propostas para áreas essenciais, como transporte, educação e saúde. A tendência vai na contramão de São Paulo, por exemplo, onde ataques pessoais e discussão de temas da agenda de costumes ganham espaço.
Para o cientista político da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Rodrigo Stumpf, candidatos das maiores cidades do País, a exemplo de São Paulo, tendem a debater mais temas nacionais porque já ambicionam voos maiores na política. “É normal que eleições municipais sejam mais centradas em questões locais e cotidianas. Porém, grandes cidades tendem a nacionalizar o debate, porque são candidatos naturais a cargos de maior importância no futuro.”
Porto Alegre tem prefeito que evita alardear apoio do PL e deputada do PT como favoritos
Em Porto Alegre, o atual prefeito, Sebastião Melo, tem como vice a militar Betina Worm, do PL, fidora do bolsonarismo na chapa, mas se equilibra em corda bamba para não desagradar parcela do eleitorado avessa à administração do ex-presidente. A estratégia segue a receita utilizada por ele, em 2020, quando se elegeu pela primeira vez ao cargo.
Na época, já contava com apoio de Bolsonaro, mas usou a justificativa de que contava com ampla coligação partidária para modular o discurso ideológico. Esse cenário se repete esse ano, em que lidera frente com oito legendas. Seus discursos não citam cabos eleitorais e focam em defender marcas do primeiro mandato. “A polarização passou ao largo aqui. O vice de Melo é um segredo escondido à luz do dia e o prefeito evitou os temas sensíveis da política de costumes. Os temas que mais mobilizaram foram a enchente ocorrida na cidade e questões como vagas em creche”, diz Stumpf.
Porto Alegre foi uma das cidades do Rio Grande do Sul atingidas pelas onda de fortes chuvas em abril. O tema ganhou relevância nos debates para a prefeitura, em que opositores de melo tentaram responsabilizá-lo pelos efeitos das enchentes na cidade. As críticas, segundo o analista, não surtiram efeito pois foram trazidas apenas no período eleitoral.
Já Maria do Rosário, segunda colocada nas pesquisas, não foge da vinculação com Lula, já que está em seu sexto mandato na Câmara pelo PT e foi ministra dos Direitos Humanos no governo de Dilma Rousseff. Contudo, tem feito gestos ao centro na tentativa de atenuar a rejeição de eleitores avessos ao lulopetismo. Ela promete se manter fiel à responsabilidade fiscal e admitiu ter votado a favor do projeto que acabou com as “saidinhas” de detentos para evitar críticas de opositores.
O presidente não fez nenhuma agenda com a candidata no Estado e apareceu apenas em vídeos gravados para peças de campanha. Na avaliação de Stumpf, a estratégia abriu espaço para que os votos da esquerda se dividissem entre a petista e a candidata do PDT, Juliana Brizola, neta do ex-governador do Estado Leonel Brizola. Ela se apresentou como uma candidata mais próxima do centro e recebeu apoio do atual governador, Eduardo Leite (PSDB).
“A decisão da Maria do Rosário de fazer uma candidatura de centro deixou menos clara a diferença entre ela e a Juliana Brizola, que tem o apoio do PSDB. Isso talvez tenha contribuído para uma divisão dos votos da esquerda.”
Candidatos à prefeitura de Curitiba têm apoio declarado de Lula e Bolsonaro, mas evitam levar polarização para campanha
A eleição municipal na capital do Paraná tem na dianteira das pesquisas o atual vice-prefeito, Eduardo Pimentel (PSD), formalmente apoiado por Jair Bolsonaro, seguido de Luciano Ducci (PSB), candidato de Lula que foi prefeito entre 2010 e 2012, após o então mandatário, Beto Richa deixar o cargo para disputar o governo do Estado.
Em que pese o aval das duas lideranças que personificam a polarização do País, ambos tratam timidamente seus vínculos com a política nacional e focam em temas da cidade, como o transporte público e vagas em creches.
A atual administração é alvo de críticas devido ao valor da tarifa, de R$ 6. Esse tema mobilizou as duas principais campanhas. Ducci prometeu gratuidade no transporte público local aos domingos e Pimentel, cortar pela metade o valor nos mesmos dias. “É mais difícil trazer os critérios das eleições nacionais para as cidades. Em Curitiba, tanto o lavajatismo quanto o bolsonarismo não apresentaram cabeças de chapa. Entraram como vice. Isso tornou difícil essa vinculação com a política nacional”, avalia Emerson Urizzi Cervi, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Pimentel tem apoio do atual prefeito, Rafael Greca, e do governador do Ratinho Jr. (PSD). Seu vice é Paulo Martins, ex-deputado federal bolsonarista que disputou cadeira no Senado em 2022, mas não conseguiu se eleger. A presença dele nos atos de campanha é reduzida e se intensificou apenas na reta final de campanha devido após avaliação de que votos bolsonarismo poderiam migrar para Cristina Reis Graeml (PMB), mais identificada com as ideias do ex-presidente.
“Muitos bolsonaristas não gostaram da aliança com o PSD, porque é o partido do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que não pauta o impeachment do (ministro do STF, Alexandre de) Moraes”, destaca Cervi.
Florianópolis pode já ter prefeito no primeiro turno
Florianópolis é a única das três capitais do Sul em que as pesquisas indicam possibilidade de vitória já no primeiro turno do prefeito Topázio Neto (PSD), candidato à reeleição. Seu principal adversário é Marquito (PSOL). Nenhum deles se apoia em vínculos com Lula ou Bolsonaro.
O atual mandatário tem como principal cabo eleitoral o governador do Estado, Jorginho Mello (PL), com quem costuma aparecer em atos de campanha. No entanto, a parceria entre eles é tratada mais do ponto de vista administrativo do que ideológico, destaca o cientista político da Universidade Federal de Santa Catarina Julian Borba.
“Bolsonaro foi um personagem ausente na campanha. Jorginho Mello apareceu para mostrar a afinidade entre as duas gestões, não no sentido ideológico, mas do ponto de vista da administração”.
O candidato do PT, Vanderlei Lela, foi o único que fez apelos à polarização nacional reforçando seu vínculo com Lula e está em quarto lugar nas pesquisas. À frente dele, há o ex-prefeito da cidade Dario Berger (PSDB).
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