RIO – O vereador carioca e candidato à reeleição Zico Bacana (Podemos), baleado no início da noite desta segunda-feira, 2, no bairro de Marechal Hermes, na zona norte do Rio, afirmou ter sido vítima de tentativa de homicídio. Atingido de raspão na cabeça, Zico, que tenta a reeleição, prestou depoimento à Polícia Civil por cerca de três horas. Duas pessoas morreram durante a ação.
“O que aconteceu foi realmente tentativa de homicídio. Eu não posso dizer pra você da onde veio, da forma que aconteceu. Foi muito rápido. Vários disparos que foram efetuados”, disse o vereador, em entrevista à TV Globo. O caso está sendo investigado pela Delegacia de Homicídios da Capital, e os agentes fazem diligências nesta manhã para tentar identificar os autores do ataque.
Poucas horas após o tiroteio, a assessoria de imprensa do vereador já havia afirmado parecer se tratar de “um atentado, em circunstâncias estranhas”. O parlamentar foi levado ao Hospital Carlos Chagas, no mesmo bairro onde aconteceu o crime, foi atendido e liberado.
O carro do vereador foi alvejado por cerca de 15 disparos de fuzil. Além dele, outras quatro pessoas foram baleadas, e duas acabaram morrendo – nenhuma delas havia sido identificada. Antes do crime, ele postou no Facebook uma foto nesta segunda-feira, participando de um campeonato de futebol em Ricardo de Albuquerque, na zona norte.
Defensor do prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) no Legislativo, Zico Votou contra os diversos pedidos de impeachment apresentados contra o mandatário ao longo do mandato.
CPI da Milícias
Zico Bacana era apenas um cabo da Polícia Militar quando foi citado na CPI das Milícias, em 2008. Jair Barbosa Tavares (seu nome de batismo) tentara se eleger para a Câmara Municipal carioca naquele ano, mas não havia conseguido. Acusado de comandar um grupo miliciano nos bairros de Anchieta, Guadalupe e Ricardo de Albuquerque, na zona norte, ele chegaria à Câmara do Rio em 2016. Neste mês, tentará a reeleição.
Em 2018, o vereador apareceu no noticiário policial por outro motivo: o assassinato da colega Marielle Franco (PSOL), morta a tiros em março daquele ano. Foi convocado para depor por causa de algumas coincidências. Marielle tinha o deputado Marcelo Freixo, presidente da CPI das Milícias, como padrinho político. Além disso, policiais do batalhão da PM de Irajá, na zona norte, haviam sido homenageados por Zico na Câmara. Mariella tinha denunciado supostas irregularidades dos mesmos agentes pouco antes de ser executada.
O parlamentar também foi convocado a depor porque tinha gabinete no 7º andar do Palácio Pedro Ernesto, que naquela época atraía a atenção dos investigadores por causa de imagens das câmeras de segurança. Ao depor, Bacana lamentou a morte de Marielle e negou qualquer envolvimento com o crime. O Estadão tentou contato com Zico nesta terça-feira, mas não teve retorno.
Outros políticos citados na CPI das Milícias
O caso de Zico não é o único de políticos citados na CPI das Milícias, que foi instalada na Assembleia Legislativa do Rio, que ainda estão na vida pública, mesmo após prisões e cassações.
É simbólico o caso da família Jerominho, indiciada em dose tripla nas investigações – Zico não foi indiciado, apenas citado. Os irmãos Natalino José Guimarães (DEM), ex-deputado estadual, e Jerônimo Guimarães, o Jerominho (MDB), ex-vereador, foram acusados de chefiar a Liga da Justiça, milícia que atuava na zona oeste do Rio e cujo poder se expandiu. Os dois irmãos cumpriram pena em regime fechado, mas hoje estão soltos. O Bonde do Ecko, grupo paramilitar de maior capilaridade hoje no Rio, é considerado um desdobramento da gangue que tem seu símbolo no morcego do Batman. Ecko é o apelido de Wellington da Silva Braga, o miliciano mais procurado da cidade.
Também indiciada, a ex-vereadora Carminha Jerominho, filha do ex-vereador, foi considerada pela Polícia uma “liderança intermediária” da Liga da Justiça. Ela foi eleita em 2008, mesmo após ser presa durante a eleição por crime eleitoral. Junto com o grupo de milicianos, coagiria eleitores para ganhar votos. Assumiu o mandato e, após um vaivém de decisões judiciais, tentou se reeleger em 2012, mas não conseguiu. Neste mês, ela tentará novamente voltar à Câmara do Rio.
Como o pai é inelegível pela Lei da Ficha Limpa, já que foi condenado por órgão colegiado, a esperança da família de retornar à política está depositada em Carminha, que concorre pelo PMB. Nas redes sociais, ela mostra imagens da família percorrendo bairros da zona oeste. Jerominho atua como cabo eleitoral, com direito a discursos ao microfone.
Outro amplamente mencionado na CPI que volta a tentar ter poder político é o ex-vereador Luiz André Ferreira da Silva, o Deco, que ocupou o cargo pelo PL. Depois de sair da cadeia para cumprir a pena em liberdade condicional, o ex-parlamentar lançou o filho, Daniel Carvalho, à disputa deste ano. Ele concorre pelo PTC e tem o pai como principal cabo eleitoral.
O reduto da família é a Praça Seca, também na zona oeste, hoje uma área de conflitos constantes entre milícia e tráfico. Deco e seus aliados teriam até planejado, segundo a polícia apontou em 2011, a morte de Freixo e da hoje candidata à Prefeitura do Rio Martha Rocha (PDT). Ela presidiu uma delegacia em área de atuação do ex-vereador.
Na Baixada Fluminense, outro caso: o vereador Chiquinho Grandão (Progressistas) está até hoje com mandato no Legislativo local, após ter sido indiciado e preso. É acusado pelo MP de formação de quadrilha no município. O grupo do parlamentar seria responsável por impor “taxas de segurança” a comerciantes. Também exploraria serviços de transporte alternativo, agiotagem e outros tipos de crime comuns a esse tipo de milícia.
Para a próxima legislatura, contudo, ele segue o caminho de Jerominho e de Deco: aposta no filho. Vitinho Grandão é filiado ao Solidariedade e tem o pai como principal cabo eleitoral. “Agora é a juventude com experiência”, diz o slogan de uma das imagens em que aparecem juntos.
O Estadão não conseguiu ouvir os políticos acusados de envolvimento com milícias. Em geral, eles negam as acusações de supostos crimes, atribuindo-as a adversários políticos.