Fachin: ‘A Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers’


Futuro presidente do TSE alerta para cibercrimes, cita Rússia e diz que ‘instituições terão seu maior teste’

Por Breno Pires e Weslley Galzo

A uma semana de tomar posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Edson Fachin disse ao Estadão que a Justiça Eleitoral “já pode estar sob ataque de hackers” e citou a Rússia como a origem da maior parte dessa ofensiva.

“A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses, e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não têm legislação adequada de controle”, afirmou Fachin ontem, em entrevista exclusiva.

Sem resposta do Telegram a reiterados contatos do TSE, o ministro avisou que é hora de endurecer para evitar que a plataforma seja usada na campanha eleitoral para difundir informações falsas. Mas destacou que ainda vai aguardar uma posição do Congresso para restringir a atuação de redes sociais que não têm representantes no País. “O mundo não virou planeta sem lei.”

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Fachin fala em tornar as eleições do País 'uma espécie de case mundial sobre a democracia' Foto: Gabriela Biló/Estadão

O ministro descartou a possibilidade de as Forças Armadas se atrelarem a “interesses conjunturais”, caso o presidente Jair Bolsonaro seja derrotado nas urnas em outubro. “Nós teremos o maior teste das instituições democráticas”, observou ele. Ao dizer que o slogan de sua gestão no TSE será “paz e segurança nas eleições”, Fachin afirmou que o “populismo autoritário” não tem mais espaço no Brasil. “Ditadura nunca mais”, declarou o magistrado. A seguir, os principais trechos da entrevista:

O presidente Jair Bolsonaro já ameaçou não reconhecer o resultado das urnas neste ano eleitoral. O que o TSE pode fazer se isso acontecer? E o que pode fazer também caso surja um movimento semelhante ao da invasão ao Capitólio, nos Estados Unidos?

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Eu não creio que irá acontecer. Tenho esperança de que não aconteça e vou trabalhar para que não aconteça. Mas, numa circunstância como essa, nós teremos, certamente, o maior teste das instituições democráticas do Brasil. Um grande teste para o Parlamento, que, na democracia representativa, representa a sociedade. Um grande teste para as Forças Armadas, que são forças permanentes, institucionais, do Estado, e que estou seguro que permanecerão fiéis à sua missão constitucional e não se atrelarão a interesses conjunturais. Também será um teste para a Justiça Eleitoral, que é uma instituição permanente do Estado. A nós caberá organizar, realizar as eleições, declarar os eleitos, diplomar e, em seguida, haverá posse para que cada um governe. É para efetivamente isso que vamos trabalhar.

De onde vem a confiança nesse quadro?

O que contribui para isso? Em primeiro lugar, contribui para isso que nós tivemos 25 anos de uma ditadura civil-militar cujo resultado foi um resultado que trouxe consequências nefastas para o Brasil. Ditadura nunca mais. Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia. (A Constituição) desenhou um arcabouço que, no meu modo de ver, pode sofrer turbulências, mas será mais firme do que qualquer populismo autoritário que tente gerar a ruína, a diluição do regime democrático do Brasil. Eu espero que minha geração não veja isso de novo e que meus netos cresçam numa democracia.

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‘Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia’

O senhor citou que criminosos e agentes estatais hospedados em diversos países, como a Rússia, declararam guerra à Justiça Eleitoral. Pode dar exemplos disso e explicar como exatamente será reforçada a segurança cibernética nas eleições de 2022?

A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não tem legislação adequada de controle. Porque, para garantir a liberdade, é preciso controlar quem atenta contra a liberdade. Para garantir a liberdade de expressão, é fundamental que se garanta a expressão da liberdade. Porque, senão, o discurso da liberdade é um discurso oco, é um discurso próprio do populismo autoritário. E esse é o nosso terceiro universo de preocupações, ou seja, universo que diz respeito a ter paz e segurança nas eleições.

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Foram detectadas ameaças na prática ou ainda estão no campo de riscos?

Nós temos riscos detectados em alguns países, como, por exemplo, na Macedônia do Norte, que são riscos detectados, entraram no nosso radar diagramado do desenho desses riscos... Em relação aos hackers que advêm da Rússia, os dados que nós temos dizem respeito a um conjunto de informações que estão disponíveis em vários relatórios internacionais e muitos deles publicados na imprensa. Há relatórios públicos e relatórios de empresas privadas, que a Microsoft fez publicar perto do fim do ano passado, que (mostram que) 58% dos ciberataques têm origem na Rússia.

O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, disse, recentemente, que qualquer plataforma de comunicação que não respeite as leis brasileiras deve simplesmente ser suspensa. O senhor entende ser adequado suspender o Telegram?

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Eu entendo pouco de música, mas gosto muito de música. Gosto desde o Pena Branca e Xavantinho até as óperas de Wagner. E nós sabemos que o crescendo da música começa no pianíssimo, que é quase inaudível, no piano, no forte, no muito forte e no fortíssimo. Essa escala bem revela qual é o caminho que nós vamos seguir em relação ao Telegram. Nós já passamos do pianíssimo, chegou a hora de entrar no movimento crescendo forte. Nós estamos observando, em primeiro lugar, qual é a resposta que o Parlamento brasileiro vai dar. Será uma grande oportunidade de o Parlamento brasileiro pacificar esta questão adotando uma premissa fundamental: quem entra no Brasil tem a liberdade plena que a Constituição lhe garante e, ao mesmo tempo, a responsabilidade integral que também deriva da Constituição, que é, em primeiro lugar, cumprir as leis brasileiras.

Já existe no Marco Civil da Internet uma previsão que permitiria, na visão de alguns especialistas, a atuação do TSE em relação à suspensão de contas justamente porque não há representação.

Acaso isso não ocorra, o que nós estamos fazendo simultaneamente é um mapeamento das experiências de outros países. A mais recente experiência é esta da Alemanha, cujas notícias nos últimos dias foram bastante interessantes sobre as providências tomadas em relação ao Telegram, que foram excluídos diversos canais que propagavam a incitação ao ódio. Estamos também examinando outros países que estão se defrontando com problemas parecidos, como o México. Portanto, o TSE está a observar, a colaborar com o Parlamento e está a aguardar o pronunciamento do Parlamento, mas poderá ocorrer que, em um determinado momento, em uma determinada ação ou uma determinada promoção que seja feita pelo Ministério Público, o Tribunal Superior Eleitoral, ou quem sabe até mesmo o Supremo Tribunal Federal, venha a se pronunciar sobre esta matéria. Este é o crescendo desta partitura, nós nos encontramos atualmente nesta fase e eu, pessoalmente, comungo de todas as ideias expressadas pelo ministro Barroso até agora sobre esta matéria.

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O senhor vai tentar novamente entrar em contato com os representantes do Telegram?

Sim, até porque a nossa compreensão é de que uma plataforma, uma rede que tem milhões de usuários num determinado país, não pode se esconder por trás da transterritorialidade. O mundo não virou um planeta sem lei. O mundo se tornou um lugar regulamentado e, especialmente pela autonomia, pela autorregulamentação, pela liberdade, pelos espaços de negócios, pelos espaços de ofícios públicos. Podemos citar os Estados Unidos, onde há uma sociedade de mercado e, portanto, uma sociedade aberta. É uma sociedade imensamente regulada, também regulada para garantir autonomia. Esse é possivelmente o caminho que nós sigamos.

Em 2018, a eleição foi marcada por desinformação desenfreada. Para evitar que isso se repita, que medidas o senhor deve adotar nesses próximos cinco meses para garantir o sucesso do processo? 

Em primeiro lugar, houve um conjunto de iniciativas importantes na gestão do ministro Barroso que nós vamos dar continuidade juntos, já com o ministro Alexandre de Moraes. Nós estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação, inclusive com a renovação dos acordos do TSE com as plataformas digitais conhecidas. Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar. Para isso, o juiz não age, como regra, por iniciativa própria. É o Ministério Público que investiga, oferece denúncia. Portanto, este é um ano também muito importante para a atuação do Ministério Público Eleitoral em favor da lisura e da normalidade das eleições.

‘Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar.’

Que outras ações o Tribunal Superior Eleitoral está fazendo para combater a disseminação de informações falsas?

Estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação. Estamos dando total apoio à rede que nós temos de trabalho na nossa Secretaria de Comunicação, que tem feito um trabalho extraordinário de prestar informações, criar modos amigáveis de comunicação com pessoas interessadas, formulários de denúncia. Ao mesmo tempo nós temos uma comissão de transparência eleitoral que está nos auxiliando. Que é essa comissão composta de 12 membros e tem realizado um trabalho extraordinário de sugestões. Alguns questionamentos importantes, porque os questionamentos nos ajudaram a testar, mais uma vez, a solidez dos nossos sistemas. As respostas que nós estamos dando a todos os questionamentos que vieram das mais diferentes origens contribuíram para que realizássemos mais um teste de solidez das nossas urnas.

As emendas do orçamento secreto são apontadas por juristas e especialistas como uma espécie de “bolsa reeleição” que anula a possibilidade de renovação do Congresso. No Supremo Tribunal Federal, o senhor teve um voto contra essas emendas. De que maneira a Justiça Eleitoral deveria atuar para impedir abuso do poder econômico com recursos públicos? 

Eu fiquei vencido (no julgamento sobre o bloqueio do uso dos recursos do orçamento secreto). As premissas que estão na sua pergunta comungam e conversam com as premissas, embora no âmbito jurídico, que eu tomei no voto em que fiquei vencido. A maioria do Supremo alterou a sua percepção inicial. Isso terá consequências eleitorais. Se houver e estiver na alçada do Tribunal Superior Eleitoral, as decisões aqui, obviamente, serão tomadas. Mas a decisão mais relevante foi lá tomada e eu, infelizmente, fiquei vencido.

Qual o significado do pleito de 2022 no País após ataques à democracia nos últimos anos e diante da invasão do Capitólio nos Estados Unidos?

As eleições no Brasil são importantíssimas não apenas para o País, mas para a região da América do Sul, da América Latina, da América Central, da própria América do Norte e da Europa. Haja vista o que se passa nos dias correntes em alguns países da Europa, uma Polônia, Hungria, Turquia, para citar alguns exemplos, e o que se passa aqui perto do Brasil como em El Salvador, recentemente na Nicarágua, a Venezuela. Portanto, maus exemplos de derrocada no funcionamento da democracia. E o Brasil precisa ser um bom exemplo. Nós queremos nessa articulação internacional tornar as eleições do Brasil é uma espécie de case mundial sobre a democracia. 

Para lembrar: Histórico de ataques russos em eleições

A campanha presidencial americana de 2016 foi marcada por acusações de que hackers russos atacaram o Partido Democrata com a intenção de interferir na eleição em favor de Donald Trump. Em 2020, esse mesmo grupo esteve por trás de tentativas de espionagem nas eleições americanas. Segundo a Microsoft, o grupo foi responsável por ataques a mais de 200 pessoas e organizações nos EUA e no Reino Unido. Entre os alvos americanos havia consultores das campanhas democrata e republicana. Em 2017, hackers russos também atacaram o En Marche!, movimento político de Emmanuel Macron, então candidato mais votado no 1.º turno das eleições presidenciais na França. O ataque consistiu em tentativas de “phishing”, técnica para roubar dados com o envio de e-mails fraudulentos.

A uma semana de tomar posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Edson Fachin disse ao Estadão que a Justiça Eleitoral “já pode estar sob ataque de hackers” e citou a Rússia como a origem da maior parte dessa ofensiva.

“A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses, e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não têm legislação adequada de controle”, afirmou Fachin ontem, em entrevista exclusiva.

Sem resposta do Telegram a reiterados contatos do TSE, o ministro avisou que é hora de endurecer para evitar que a plataforma seja usada na campanha eleitoral para difundir informações falsas. Mas destacou que ainda vai aguardar uma posição do Congresso para restringir a atuação de redes sociais que não têm representantes no País. “O mundo não virou planeta sem lei.”

Fachin fala em tornar as eleições do País 'uma espécie de case mundial sobre a democracia' Foto: Gabriela Biló/Estadão

O ministro descartou a possibilidade de as Forças Armadas se atrelarem a “interesses conjunturais”, caso o presidente Jair Bolsonaro seja derrotado nas urnas em outubro. “Nós teremos o maior teste das instituições democráticas”, observou ele. Ao dizer que o slogan de sua gestão no TSE será “paz e segurança nas eleições”, Fachin afirmou que o “populismo autoritário” não tem mais espaço no Brasil. “Ditadura nunca mais”, declarou o magistrado. A seguir, os principais trechos da entrevista:

O presidente Jair Bolsonaro já ameaçou não reconhecer o resultado das urnas neste ano eleitoral. O que o TSE pode fazer se isso acontecer? E o que pode fazer também caso surja um movimento semelhante ao da invasão ao Capitólio, nos Estados Unidos?

Eu não creio que irá acontecer. Tenho esperança de que não aconteça e vou trabalhar para que não aconteça. Mas, numa circunstância como essa, nós teremos, certamente, o maior teste das instituições democráticas do Brasil. Um grande teste para o Parlamento, que, na democracia representativa, representa a sociedade. Um grande teste para as Forças Armadas, que são forças permanentes, institucionais, do Estado, e que estou seguro que permanecerão fiéis à sua missão constitucional e não se atrelarão a interesses conjunturais. Também será um teste para a Justiça Eleitoral, que é uma instituição permanente do Estado. A nós caberá organizar, realizar as eleições, declarar os eleitos, diplomar e, em seguida, haverá posse para que cada um governe. É para efetivamente isso que vamos trabalhar.

De onde vem a confiança nesse quadro?

O que contribui para isso? Em primeiro lugar, contribui para isso que nós tivemos 25 anos de uma ditadura civil-militar cujo resultado foi um resultado que trouxe consequências nefastas para o Brasil. Ditadura nunca mais. Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia. (A Constituição) desenhou um arcabouço que, no meu modo de ver, pode sofrer turbulências, mas será mais firme do que qualquer populismo autoritário que tente gerar a ruína, a diluição do regime democrático do Brasil. Eu espero que minha geração não veja isso de novo e que meus netos cresçam numa democracia.

‘Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia’

O senhor citou que criminosos e agentes estatais hospedados em diversos países, como a Rússia, declararam guerra à Justiça Eleitoral. Pode dar exemplos disso e explicar como exatamente será reforçada a segurança cibernética nas eleições de 2022?

A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não tem legislação adequada de controle. Porque, para garantir a liberdade, é preciso controlar quem atenta contra a liberdade. Para garantir a liberdade de expressão, é fundamental que se garanta a expressão da liberdade. Porque, senão, o discurso da liberdade é um discurso oco, é um discurso próprio do populismo autoritário. E esse é o nosso terceiro universo de preocupações, ou seja, universo que diz respeito a ter paz e segurança nas eleições.

Foram detectadas ameaças na prática ou ainda estão no campo de riscos?

Nós temos riscos detectados em alguns países, como, por exemplo, na Macedônia do Norte, que são riscos detectados, entraram no nosso radar diagramado do desenho desses riscos... Em relação aos hackers que advêm da Rússia, os dados que nós temos dizem respeito a um conjunto de informações que estão disponíveis em vários relatórios internacionais e muitos deles publicados na imprensa. Há relatórios públicos e relatórios de empresas privadas, que a Microsoft fez publicar perto do fim do ano passado, que (mostram que) 58% dos ciberataques têm origem na Rússia.

O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, disse, recentemente, que qualquer plataforma de comunicação que não respeite as leis brasileiras deve simplesmente ser suspensa. O senhor entende ser adequado suspender o Telegram?

Eu entendo pouco de música, mas gosto muito de música. Gosto desde o Pena Branca e Xavantinho até as óperas de Wagner. E nós sabemos que o crescendo da música começa no pianíssimo, que é quase inaudível, no piano, no forte, no muito forte e no fortíssimo. Essa escala bem revela qual é o caminho que nós vamos seguir em relação ao Telegram. Nós já passamos do pianíssimo, chegou a hora de entrar no movimento crescendo forte. Nós estamos observando, em primeiro lugar, qual é a resposta que o Parlamento brasileiro vai dar. Será uma grande oportunidade de o Parlamento brasileiro pacificar esta questão adotando uma premissa fundamental: quem entra no Brasil tem a liberdade plena que a Constituição lhe garante e, ao mesmo tempo, a responsabilidade integral que também deriva da Constituição, que é, em primeiro lugar, cumprir as leis brasileiras.

Já existe no Marco Civil da Internet uma previsão que permitiria, na visão de alguns especialistas, a atuação do TSE em relação à suspensão de contas justamente porque não há representação.

Acaso isso não ocorra, o que nós estamos fazendo simultaneamente é um mapeamento das experiências de outros países. A mais recente experiência é esta da Alemanha, cujas notícias nos últimos dias foram bastante interessantes sobre as providências tomadas em relação ao Telegram, que foram excluídos diversos canais que propagavam a incitação ao ódio. Estamos também examinando outros países que estão se defrontando com problemas parecidos, como o México. Portanto, o TSE está a observar, a colaborar com o Parlamento e está a aguardar o pronunciamento do Parlamento, mas poderá ocorrer que, em um determinado momento, em uma determinada ação ou uma determinada promoção que seja feita pelo Ministério Público, o Tribunal Superior Eleitoral, ou quem sabe até mesmo o Supremo Tribunal Federal, venha a se pronunciar sobre esta matéria. Este é o crescendo desta partitura, nós nos encontramos atualmente nesta fase e eu, pessoalmente, comungo de todas as ideias expressadas pelo ministro Barroso até agora sobre esta matéria.

O senhor vai tentar novamente entrar em contato com os representantes do Telegram?

Sim, até porque a nossa compreensão é de que uma plataforma, uma rede que tem milhões de usuários num determinado país, não pode se esconder por trás da transterritorialidade. O mundo não virou um planeta sem lei. O mundo se tornou um lugar regulamentado e, especialmente pela autonomia, pela autorregulamentação, pela liberdade, pelos espaços de negócios, pelos espaços de ofícios públicos. Podemos citar os Estados Unidos, onde há uma sociedade de mercado e, portanto, uma sociedade aberta. É uma sociedade imensamente regulada, também regulada para garantir autonomia. Esse é possivelmente o caminho que nós sigamos.

Em 2018, a eleição foi marcada por desinformação desenfreada. Para evitar que isso se repita, que medidas o senhor deve adotar nesses próximos cinco meses para garantir o sucesso do processo? 

Em primeiro lugar, houve um conjunto de iniciativas importantes na gestão do ministro Barroso que nós vamos dar continuidade juntos, já com o ministro Alexandre de Moraes. Nós estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação, inclusive com a renovação dos acordos do TSE com as plataformas digitais conhecidas. Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar. Para isso, o juiz não age, como regra, por iniciativa própria. É o Ministério Público que investiga, oferece denúncia. Portanto, este é um ano também muito importante para a atuação do Ministério Público Eleitoral em favor da lisura e da normalidade das eleições.

‘Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar.’

Que outras ações o Tribunal Superior Eleitoral está fazendo para combater a disseminação de informações falsas?

Estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação. Estamos dando total apoio à rede que nós temos de trabalho na nossa Secretaria de Comunicação, que tem feito um trabalho extraordinário de prestar informações, criar modos amigáveis de comunicação com pessoas interessadas, formulários de denúncia. Ao mesmo tempo nós temos uma comissão de transparência eleitoral que está nos auxiliando. Que é essa comissão composta de 12 membros e tem realizado um trabalho extraordinário de sugestões. Alguns questionamentos importantes, porque os questionamentos nos ajudaram a testar, mais uma vez, a solidez dos nossos sistemas. As respostas que nós estamos dando a todos os questionamentos que vieram das mais diferentes origens contribuíram para que realizássemos mais um teste de solidez das nossas urnas.

As emendas do orçamento secreto são apontadas por juristas e especialistas como uma espécie de “bolsa reeleição” que anula a possibilidade de renovação do Congresso. No Supremo Tribunal Federal, o senhor teve um voto contra essas emendas. De que maneira a Justiça Eleitoral deveria atuar para impedir abuso do poder econômico com recursos públicos? 

Eu fiquei vencido (no julgamento sobre o bloqueio do uso dos recursos do orçamento secreto). As premissas que estão na sua pergunta comungam e conversam com as premissas, embora no âmbito jurídico, que eu tomei no voto em que fiquei vencido. A maioria do Supremo alterou a sua percepção inicial. Isso terá consequências eleitorais. Se houver e estiver na alçada do Tribunal Superior Eleitoral, as decisões aqui, obviamente, serão tomadas. Mas a decisão mais relevante foi lá tomada e eu, infelizmente, fiquei vencido.

Qual o significado do pleito de 2022 no País após ataques à democracia nos últimos anos e diante da invasão do Capitólio nos Estados Unidos?

As eleições no Brasil são importantíssimas não apenas para o País, mas para a região da América do Sul, da América Latina, da América Central, da própria América do Norte e da Europa. Haja vista o que se passa nos dias correntes em alguns países da Europa, uma Polônia, Hungria, Turquia, para citar alguns exemplos, e o que se passa aqui perto do Brasil como em El Salvador, recentemente na Nicarágua, a Venezuela. Portanto, maus exemplos de derrocada no funcionamento da democracia. E o Brasil precisa ser um bom exemplo. Nós queremos nessa articulação internacional tornar as eleições do Brasil é uma espécie de case mundial sobre a democracia. 

Para lembrar: Histórico de ataques russos em eleições

A campanha presidencial americana de 2016 foi marcada por acusações de que hackers russos atacaram o Partido Democrata com a intenção de interferir na eleição em favor de Donald Trump. Em 2020, esse mesmo grupo esteve por trás de tentativas de espionagem nas eleições americanas. Segundo a Microsoft, o grupo foi responsável por ataques a mais de 200 pessoas e organizações nos EUA e no Reino Unido. Entre os alvos americanos havia consultores das campanhas democrata e republicana. Em 2017, hackers russos também atacaram o En Marche!, movimento político de Emmanuel Macron, então candidato mais votado no 1.º turno das eleições presidenciais na França. O ataque consistiu em tentativas de “phishing”, técnica para roubar dados com o envio de e-mails fraudulentos.

A uma semana de tomar posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Edson Fachin disse ao Estadão que a Justiça Eleitoral “já pode estar sob ataque de hackers” e citou a Rússia como a origem da maior parte dessa ofensiva.

“A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses, e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não têm legislação adequada de controle”, afirmou Fachin ontem, em entrevista exclusiva.

Sem resposta do Telegram a reiterados contatos do TSE, o ministro avisou que é hora de endurecer para evitar que a plataforma seja usada na campanha eleitoral para difundir informações falsas. Mas destacou que ainda vai aguardar uma posição do Congresso para restringir a atuação de redes sociais que não têm representantes no País. “O mundo não virou planeta sem lei.”

Fachin fala em tornar as eleições do País 'uma espécie de case mundial sobre a democracia' Foto: Gabriela Biló/Estadão

O ministro descartou a possibilidade de as Forças Armadas se atrelarem a “interesses conjunturais”, caso o presidente Jair Bolsonaro seja derrotado nas urnas em outubro. “Nós teremos o maior teste das instituições democráticas”, observou ele. Ao dizer que o slogan de sua gestão no TSE será “paz e segurança nas eleições”, Fachin afirmou que o “populismo autoritário” não tem mais espaço no Brasil. “Ditadura nunca mais”, declarou o magistrado. A seguir, os principais trechos da entrevista:

O presidente Jair Bolsonaro já ameaçou não reconhecer o resultado das urnas neste ano eleitoral. O que o TSE pode fazer se isso acontecer? E o que pode fazer também caso surja um movimento semelhante ao da invasão ao Capitólio, nos Estados Unidos?

Eu não creio que irá acontecer. Tenho esperança de que não aconteça e vou trabalhar para que não aconteça. Mas, numa circunstância como essa, nós teremos, certamente, o maior teste das instituições democráticas do Brasil. Um grande teste para o Parlamento, que, na democracia representativa, representa a sociedade. Um grande teste para as Forças Armadas, que são forças permanentes, institucionais, do Estado, e que estou seguro que permanecerão fiéis à sua missão constitucional e não se atrelarão a interesses conjunturais. Também será um teste para a Justiça Eleitoral, que é uma instituição permanente do Estado. A nós caberá organizar, realizar as eleições, declarar os eleitos, diplomar e, em seguida, haverá posse para que cada um governe. É para efetivamente isso que vamos trabalhar.

De onde vem a confiança nesse quadro?

O que contribui para isso? Em primeiro lugar, contribui para isso que nós tivemos 25 anos de uma ditadura civil-militar cujo resultado foi um resultado que trouxe consequências nefastas para o Brasil. Ditadura nunca mais. Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia. (A Constituição) desenhou um arcabouço que, no meu modo de ver, pode sofrer turbulências, mas será mais firme do que qualquer populismo autoritário que tente gerar a ruína, a diluição do regime democrático do Brasil. Eu espero que minha geração não veja isso de novo e que meus netos cresçam numa democracia.

‘Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia’

O senhor citou que criminosos e agentes estatais hospedados em diversos países, como a Rússia, declararam guerra à Justiça Eleitoral. Pode dar exemplos disso e explicar como exatamente será reforçada a segurança cibernética nas eleições de 2022?

A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não tem legislação adequada de controle. Porque, para garantir a liberdade, é preciso controlar quem atenta contra a liberdade. Para garantir a liberdade de expressão, é fundamental que se garanta a expressão da liberdade. Porque, senão, o discurso da liberdade é um discurso oco, é um discurso próprio do populismo autoritário. E esse é o nosso terceiro universo de preocupações, ou seja, universo que diz respeito a ter paz e segurança nas eleições.

Foram detectadas ameaças na prática ou ainda estão no campo de riscos?

Nós temos riscos detectados em alguns países, como, por exemplo, na Macedônia do Norte, que são riscos detectados, entraram no nosso radar diagramado do desenho desses riscos... Em relação aos hackers que advêm da Rússia, os dados que nós temos dizem respeito a um conjunto de informações que estão disponíveis em vários relatórios internacionais e muitos deles publicados na imprensa. Há relatórios públicos e relatórios de empresas privadas, que a Microsoft fez publicar perto do fim do ano passado, que (mostram que) 58% dos ciberataques têm origem na Rússia.

O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, disse, recentemente, que qualquer plataforma de comunicação que não respeite as leis brasileiras deve simplesmente ser suspensa. O senhor entende ser adequado suspender o Telegram?

Eu entendo pouco de música, mas gosto muito de música. Gosto desde o Pena Branca e Xavantinho até as óperas de Wagner. E nós sabemos que o crescendo da música começa no pianíssimo, que é quase inaudível, no piano, no forte, no muito forte e no fortíssimo. Essa escala bem revela qual é o caminho que nós vamos seguir em relação ao Telegram. Nós já passamos do pianíssimo, chegou a hora de entrar no movimento crescendo forte. Nós estamos observando, em primeiro lugar, qual é a resposta que o Parlamento brasileiro vai dar. Será uma grande oportunidade de o Parlamento brasileiro pacificar esta questão adotando uma premissa fundamental: quem entra no Brasil tem a liberdade plena que a Constituição lhe garante e, ao mesmo tempo, a responsabilidade integral que também deriva da Constituição, que é, em primeiro lugar, cumprir as leis brasileiras.

Já existe no Marco Civil da Internet uma previsão que permitiria, na visão de alguns especialistas, a atuação do TSE em relação à suspensão de contas justamente porque não há representação.

Acaso isso não ocorra, o que nós estamos fazendo simultaneamente é um mapeamento das experiências de outros países. A mais recente experiência é esta da Alemanha, cujas notícias nos últimos dias foram bastante interessantes sobre as providências tomadas em relação ao Telegram, que foram excluídos diversos canais que propagavam a incitação ao ódio. Estamos também examinando outros países que estão se defrontando com problemas parecidos, como o México. Portanto, o TSE está a observar, a colaborar com o Parlamento e está a aguardar o pronunciamento do Parlamento, mas poderá ocorrer que, em um determinado momento, em uma determinada ação ou uma determinada promoção que seja feita pelo Ministério Público, o Tribunal Superior Eleitoral, ou quem sabe até mesmo o Supremo Tribunal Federal, venha a se pronunciar sobre esta matéria. Este é o crescendo desta partitura, nós nos encontramos atualmente nesta fase e eu, pessoalmente, comungo de todas as ideias expressadas pelo ministro Barroso até agora sobre esta matéria.

O senhor vai tentar novamente entrar em contato com os representantes do Telegram?

Sim, até porque a nossa compreensão é de que uma plataforma, uma rede que tem milhões de usuários num determinado país, não pode se esconder por trás da transterritorialidade. O mundo não virou um planeta sem lei. O mundo se tornou um lugar regulamentado e, especialmente pela autonomia, pela autorregulamentação, pela liberdade, pelos espaços de negócios, pelos espaços de ofícios públicos. Podemos citar os Estados Unidos, onde há uma sociedade de mercado e, portanto, uma sociedade aberta. É uma sociedade imensamente regulada, também regulada para garantir autonomia. Esse é possivelmente o caminho que nós sigamos.

Em 2018, a eleição foi marcada por desinformação desenfreada. Para evitar que isso se repita, que medidas o senhor deve adotar nesses próximos cinco meses para garantir o sucesso do processo? 

Em primeiro lugar, houve um conjunto de iniciativas importantes na gestão do ministro Barroso que nós vamos dar continuidade juntos, já com o ministro Alexandre de Moraes. Nós estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação, inclusive com a renovação dos acordos do TSE com as plataformas digitais conhecidas. Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar. Para isso, o juiz não age, como regra, por iniciativa própria. É o Ministério Público que investiga, oferece denúncia. Portanto, este é um ano também muito importante para a atuação do Ministério Público Eleitoral em favor da lisura e da normalidade das eleições.

‘Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar.’

Que outras ações o Tribunal Superior Eleitoral está fazendo para combater a disseminação de informações falsas?

Estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação. Estamos dando total apoio à rede que nós temos de trabalho na nossa Secretaria de Comunicação, que tem feito um trabalho extraordinário de prestar informações, criar modos amigáveis de comunicação com pessoas interessadas, formulários de denúncia. Ao mesmo tempo nós temos uma comissão de transparência eleitoral que está nos auxiliando. Que é essa comissão composta de 12 membros e tem realizado um trabalho extraordinário de sugestões. Alguns questionamentos importantes, porque os questionamentos nos ajudaram a testar, mais uma vez, a solidez dos nossos sistemas. As respostas que nós estamos dando a todos os questionamentos que vieram das mais diferentes origens contribuíram para que realizássemos mais um teste de solidez das nossas urnas.

As emendas do orçamento secreto são apontadas por juristas e especialistas como uma espécie de “bolsa reeleição” que anula a possibilidade de renovação do Congresso. No Supremo Tribunal Federal, o senhor teve um voto contra essas emendas. De que maneira a Justiça Eleitoral deveria atuar para impedir abuso do poder econômico com recursos públicos? 

Eu fiquei vencido (no julgamento sobre o bloqueio do uso dos recursos do orçamento secreto). As premissas que estão na sua pergunta comungam e conversam com as premissas, embora no âmbito jurídico, que eu tomei no voto em que fiquei vencido. A maioria do Supremo alterou a sua percepção inicial. Isso terá consequências eleitorais. Se houver e estiver na alçada do Tribunal Superior Eleitoral, as decisões aqui, obviamente, serão tomadas. Mas a decisão mais relevante foi lá tomada e eu, infelizmente, fiquei vencido.

Qual o significado do pleito de 2022 no País após ataques à democracia nos últimos anos e diante da invasão do Capitólio nos Estados Unidos?

As eleições no Brasil são importantíssimas não apenas para o País, mas para a região da América do Sul, da América Latina, da América Central, da própria América do Norte e da Europa. Haja vista o que se passa nos dias correntes em alguns países da Europa, uma Polônia, Hungria, Turquia, para citar alguns exemplos, e o que se passa aqui perto do Brasil como em El Salvador, recentemente na Nicarágua, a Venezuela. Portanto, maus exemplos de derrocada no funcionamento da democracia. E o Brasil precisa ser um bom exemplo. Nós queremos nessa articulação internacional tornar as eleições do Brasil é uma espécie de case mundial sobre a democracia. 

Para lembrar: Histórico de ataques russos em eleições

A campanha presidencial americana de 2016 foi marcada por acusações de que hackers russos atacaram o Partido Democrata com a intenção de interferir na eleição em favor de Donald Trump. Em 2020, esse mesmo grupo esteve por trás de tentativas de espionagem nas eleições americanas. Segundo a Microsoft, o grupo foi responsável por ataques a mais de 200 pessoas e organizações nos EUA e no Reino Unido. Entre os alvos americanos havia consultores das campanhas democrata e republicana. Em 2017, hackers russos também atacaram o En Marche!, movimento político de Emmanuel Macron, então candidato mais votado no 1.º turno das eleições presidenciais na França. O ataque consistiu em tentativas de “phishing”, técnica para roubar dados com o envio de e-mails fraudulentos.

A uma semana de tomar posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Edson Fachin disse ao Estadão que a Justiça Eleitoral “já pode estar sob ataque de hackers” e citou a Rússia como a origem da maior parte dessa ofensiva.

“A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses, e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não têm legislação adequada de controle”, afirmou Fachin ontem, em entrevista exclusiva.

Sem resposta do Telegram a reiterados contatos do TSE, o ministro avisou que é hora de endurecer para evitar que a plataforma seja usada na campanha eleitoral para difundir informações falsas. Mas destacou que ainda vai aguardar uma posição do Congresso para restringir a atuação de redes sociais que não têm representantes no País. “O mundo não virou planeta sem lei.”

Fachin fala em tornar as eleições do País 'uma espécie de case mundial sobre a democracia' Foto: Gabriela Biló/Estadão

O ministro descartou a possibilidade de as Forças Armadas se atrelarem a “interesses conjunturais”, caso o presidente Jair Bolsonaro seja derrotado nas urnas em outubro. “Nós teremos o maior teste das instituições democráticas”, observou ele. Ao dizer que o slogan de sua gestão no TSE será “paz e segurança nas eleições”, Fachin afirmou que o “populismo autoritário” não tem mais espaço no Brasil. “Ditadura nunca mais”, declarou o magistrado. A seguir, os principais trechos da entrevista:

O presidente Jair Bolsonaro já ameaçou não reconhecer o resultado das urnas neste ano eleitoral. O que o TSE pode fazer se isso acontecer? E o que pode fazer também caso surja um movimento semelhante ao da invasão ao Capitólio, nos Estados Unidos?

Eu não creio que irá acontecer. Tenho esperança de que não aconteça e vou trabalhar para que não aconteça. Mas, numa circunstância como essa, nós teremos, certamente, o maior teste das instituições democráticas do Brasil. Um grande teste para o Parlamento, que, na democracia representativa, representa a sociedade. Um grande teste para as Forças Armadas, que são forças permanentes, institucionais, do Estado, e que estou seguro que permanecerão fiéis à sua missão constitucional e não se atrelarão a interesses conjunturais. Também será um teste para a Justiça Eleitoral, que é uma instituição permanente do Estado. A nós caberá organizar, realizar as eleições, declarar os eleitos, diplomar e, em seguida, haverá posse para que cada um governe. É para efetivamente isso que vamos trabalhar.

De onde vem a confiança nesse quadro?

O que contribui para isso? Em primeiro lugar, contribui para isso que nós tivemos 25 anos de uma ditadura civil-militar cujo resultado foi um resultado que trouxe consequências nefastas para o Brasil. Ditadura nunca mais. Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia. (A Constituição) desenhou um arcabouço que, no meu modo de ver, pode sofrer turbulências, mas será mais firme do que qualquer populismo autoritário que tente gerar a ruína, a diluição do regime democrático do Brasil. Eu espero que minha geração não veja isso de novo e que meus netos cresçam numa democracia.

‘Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia’

O senhor citou que criminosos e agentes estatais hospedados em diversos países, como a Rússia, declararam guerra à Justiça Eleitoral. Pode dar exemplos disso e explicar como exatamente será reforçada a segurança cibernética nas eleições de 2022?

A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não tem legislação adequada de controle. Porque, para garantir a liberdade, é preciso controlar quem atenta contra a liberdade. Para garantir a liberdade de expressão, é fundamental que se garanta a expressão da liberdade. Porque, senão, o discurso da liberdade é um discurso oco, é um discurso próprio do populismo autoritário. E esse é o nosso terceiro universo de preocupações, ou seja, universo que diz respeito a ter paz e segurança nas eleições.

Foram detectadas ameaças na prática ou ainda estão no campo de riscos?

Nós temos riscos detectados em alguns países, como, por exemplo, na Macedônia do Norte, que são riscos detectados, entraram no nosso radar diagramado do desenho desses riscos... Em relação aos hackers que advêm da Rússia, os dados que nós temos dizem respeito a um conjunto de informações que estão disponíveis em vários relatórios internacionais e muitos deles publicados na imprensa. Há relatórios públicos e relatórios de empresas privadas, que a Microsoft fez publicar perto do fim do ano passado, que (mostram que) 58% dos ciberataques têm origem na Rússia.

O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, disse, recentemente, que qualquer plataforma de comunicação que não respeite as leis brasileiras deve simplesmente ser suspensa. O senhor entende ser adequado suspender o Telegram?

Eu entendo pouco de música, mas gosto muito de música. Gosto desde o Pena Branca e Xavantinho até as óperas de Wagner. E nós sabemos que o crescendo da música começa no pianíssimo, que é quase inaudível, no piano, no forte, no muito forte e no fortíssimo. Essa escala bem revela qual é o caminho que nós vamos seguir em relação ao Telegram. Nós já passamos do pianíssimo, chegou a hora de entrar no movimento crescendo forte. Nós estamos observando, em primeiro lugar, qual é a resposta que o Parlamento brasileiro vai dar. Será uma grande oportunidade de o Parlamento brasileiro pacificar esta questão adotando uma premissa fundamental: quem entra no Brasil tem a liberdade plena que a Constituição lhe garante e, ao mesmo tempo, a responsabilidade integral que também deriva da Constituição, que é, em primeiro lugar, cumprir as leis brasileiras.

Já existe no Marco Civil da Internet uma previsão que permitiria, na visão de alguns especialistas, a atuação do TSE em relação à suspensão de contas justamente porque não há representação.

Acaso isso não ocorra, o que nós estamos fazendo simultaneamente é um mapeamento das experiências de outros países. A mais recente experiência é esta da Alemanha, cujas notícias nos últimos dias foram bastante interessantes sobre as providências tomadas em relação ao Telegram, que foram excluídos diversos canais que propagavam a incitação ao ódio. Estamos também examinando outros países que estão se defrontando com problemas parecidos, como o México. Portanto, o TSE está a observar, a colaborar com o Parlamento e está a aguardar o pronunciamento do Parlamento, mas poderá ocorrer que, em um determinado momento, em uma determinada ação ou uma determinada promoção que seja feita pelo Ministério Público, o Tribunal Superior Eleitoral, ou quem sabe até mesmo o Supremo Tribunal Federal, venha a se pronunciar sobre esta matéria. Este é o crescendo desta partitura, nós nos encontramos atualmente nesta fase e eu, pessoalmente, comungo de todas as ideias expressadas pelo ministro Barroso até agora sobre esta matéria.

O senhor vai tentar novamente entrar em contato com os representantes do Telegram?

Sim, até porque a nossa compreensão é de que uma plataforma, uma rede que tem milhões de usuários num determinado país, não pode se esconder por trás da transterritorialidade. O mundo não virou um planeta sem lei. O mundo se tornou um lugar regulamentado e, especialmente pela autonomia, pela autorregulamentação, pela liberdade, pelos espaços de negócios, pelos espaços de ofícios públicos. Podemos citar os Estados Unidos, onde há uma sociedade de mercado e, portanto, uma sociedade aberta. É uma sociedade imensamente regulada, também regulada para garantir autonomia. Esse é possivelmente o caminho que nós sigamos.

Em 2018, a eleição foi marcada por desinformação desenfreada. Para evitar que isso se repita, que medidas o senhor deve adotar nesses próximos cinco meses para garantir o sucesso do processo? 

Em primeiro lugar, houve um conjunto de iniciativas importantes na gestão do ministro Barroso que nós vamos dar continuidade juntos, já com o ministro Alexandre de Moraes. Nós estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação, inclusive com a renovação dos acordos do TSE com as plataformas digitais conhecidas. Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar. Para isso, o juiz não age, como regra, por iniciativa própria. É o Ministério Público que investiga, oferece denúncia. Portanto, este é um ano também muito importante para a atuação do Ministério Público Eleitoral em favor da lisura e da normalidade das eleições.

‘Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar.’

Que outras ações o Tribunal Superior Eleitoral está fazendo para combater a disseminação de informações falsas?

Estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação. Estamos dando total apoio à rede que nós temos de trabalho na nossa Secretaria de Comunicação, que tem feito um trabalho extraordinário de prestar informações, criar modos amigáveis de comunicação com pessoas interessadas, formulários de denúncia. Ao mesmo tempo nós temos uma comissão de transparência eleitoral que está nos auxiliando. Que é essa comissão composta de 12 membros e tem realizado um trabalho extraordinário de sugestões. Alguns questionamentos importantes, porque os questionamentos nos ajudaram a testar, mais uma vez, a solidez dos nossos sistemas. As respostas que nós estamos dando a todos os questionamentos que vieram das mais diferentes origens contribuíram para que realizássemos mais um teste de solidez das nossas urnas.

As emendas do orçamento secreto são apontadas por juristas e especialistas como uma espécie de “bolsa reeleição” que anula a possibilidade de renovação do Congresso. No Supremo Tribunal Federal, o senhor teve um voto contra essas emendas. De que maneira a Justiça Eleitoral deveria atuar para impedir abuso do poder econômico com recursos públicos? 

Eu fiquei vencido (no julgamento sobre o bloqueio do uso dos recursos do orçamento secreto). As premissas que estão na sua pergunta comungam e conversam com as premissas, embora no âmbito jurídico, que eu tomei no voto em que fiquei vencido. A maioria do Supremo alterou a sua percepção inicial. Isso terá consequências eleitorais. Se houver e estiver na alçada do Tribunal Superior Eleitoral, as decisões aqui, obviamente, serão tomadas. Mas a decisão mais relevante foi lá tomada e eu, infelizmente, fiquei vencido.

Qual o significado do pleito de 2022 no País após ataques à democracia nos últimos anos e diante da invasão do Capitólio nos Estados Unidos?

As eleições no Brasil são importantíssimas não apenas para o País, mas para a região da América do Sul, da América Latina, da América Central, da própria América do Norte e da Europa. Haja vista o que se passa nos dias correntes em alguns países da Europa, uma Polônia, Hungria, Turquia, para citar alguns exemplos, e o que se passa aqui perto do Brasil como em El Salvador, recentemente na Nicarágua, a Venezuela. Portanto, maus exemplos de derrocada no funcionamento da democracia. E o Brasil precisa ser um bom exemplo. Nós queremos nessa articulação internacional tornar as eleições do Brasil é uma espécie de case mundial sobre a democracia. 

Para lembrar: Histórico de ataques russos em eleições

A campanha presidencial americana de 2016 foi marcada por acusações de que hackers russos atacaram o Partido Democrata com a intenção de interferir na eleição em favor de Donald Trump. Em 2020, esse mesmo grupo esteve por trás de tentativas de espionagem nas eleições americanas. Segundo a Microsoft, o grupo foi responsável por ataques a mais de 200 pessoas e organizações nos EUA e no Reino Unido. Entre os alvos americanos havia consultores das campanhas democrata e republicana. Em 2017, hackers russos também atacaram o En Marche!, movimento político de Emmanuel Macron, então candidato mais votado no 1.º turno das eleições presidenciais na França. O ataque consistiu em tentativas de “phishing”, técnica para roubar dados com o envio de e-mails fraudulentos.

A uma semana de tomar posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Edson Fachin disse ao Estadão que a Justiça Eleitoral “já pode estar sob ataque de hackers” e citou a Rússia como a origem da maior parte dessa ofensiva.

“A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses, e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não têm legislação adequada de controle”, afirmou Fachin ontem, em entrevista exclusiva.

Sem resposta do Telegram a reiterados contatos do TSE, o ministro avisou que é hora de endurecer para evitar que a plataforma seja usada na campanha eleitoral para difundir informações falsas. Mas destacou que ainda vai aguardar uma posição do Congresso para restringir a atuação de redes sociais que não têm representantes no País. “O mundo não virou planeta sem lei.”

Fachin fala em tornar as eleições do País 'uma espécie de case mundial sobre a democracia' Foto: Gabriela Biló/Estadão

O ministro descartou a possibilidade de as Forças Armadas se atrelarem a “interesses conjunturais”, caso o presidente Jair Bolsonaro seja derrotado nas urnas em outubro. “Nós teremos o maior teste das instituições democráticas”, observou ele. Ao dizer que o slogan de sua gestão no TSE será “paz e segurança nas eleições”, Fachin afirmou que o “populismo autoritário” não tem mais espaço no Brasil. “Ditadura nunca mais”, declarou o magistrado. A seguir, os principais trechos da entrevista:

O presidente Jair Bolsonaro já ameaçou não reconhecer o resultado das urnas neste ano eleitoral. O que o TSE pode fazer se isso acontecer? E o que pode fazer também caso surja um movimento semelhante ao da invasão ao Capitólio, nos Estados Unidos?

Eu não creio que irá acontecer. Tenho esperança de que não aconteça e vou trabalhar para que não aconteça. Mas, numa circunstância como essa, nós teremos, certamente, o maior teste das instituições democráticas do Brasil. Um grande teste para o Parlamento, que, na democracia representativa, representa a sociedade. Um grande teste para as Forças Armadas, que são forças permanentes, institucionais, do Estado, e que estou seguro que permanecerão fiéis à sua missão constitucional e não se atrelarão a interesses conjunturais. Também será um teste para a Justiça Eleitoral, que é uma instituição permanente do Estado. A nós caberá organizar, realizar as eleições, declarar os eleitos, diplomar e, em seguida, haverá posse para que cada um governe. É para efetivamente isso que vamos trabalhar.

De onde vem a confiança nesse quadro?

O que contribui para isso? Em primeiro lugar, contribui para isso que nós tivemos 25 anos de uma ditadura civil-militar cujo resultado foi um resultado que trouxe consequências nefastas para o Brasil. Ditadura nunca mais. Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia. (A Constituição) desenhou um arcabouço que, no meu modo de ver, pode sofrer turbulências, mas será mais firme do que qualquer populismo autoritário que tente gerar a ruína, a diluição do regime democrático do Brasil. Eu espero que minha geração não veja isso de novo e que meus netos cresçam numa democracia.

‘Os males da democracia devem ser resolvidos dentro da democracia’

O senhor citou que criminosos e agentes estatais hospedados em diversos países, como a Rússia, declararam guerra à Justiça Eleitoral. Pode dar exemplos disso e explicar como exatamente será reforçada a segurança cibernética nas eleições de 2022?

A preocupação com o ciberespaço se avolumou imensamente nos últimos meses e eu posso dizer a vocês que a Justiça Eleitoral já pode estar sob ataque de hackers, não apenas de atividades de criminosos, mas também de países, tal como a Rússia, que não tem legislação adequada de controle. Porque, para garantir a liberdade, é preciso controlar quem atenta contra a liberdade. Para garantir a liberdade de expressão, é fundamental que se garanta a expressão da liberdade. Porque, senão, o discurso da liberdade é um discurso oco, é um discurso próprio do populismo autoritário. E esse é o nosso terceiro universo de preocupações, ou seja, universo que diz respeito a ter paz e segurança nas eleições.

Foram detectadas ameaças na prática ou ainda estão no campo de riscos?

Nós temos riscos detectados em alguns países, como, por exemplo, na Macedônia do Norte, que são riscos detectados, entraram no nosso radar diagramado do desenho desses riscos... Em relação aos hackers que advêm da Rússia, os dados que nós temos dizem respeito a um conjunto de informações que estão disponíveis em vários relatórios internacionais e muitos deles publicados na imprensa. Há relatórios públicos e relatórios de empresas privadas, que a Microsoft fez publicar perto do fim do ano passado, que (mostram que) 58% dos ciberataques têm origem na Rússia.

O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, disse, recentemente, que qualquer plataforma de comunicação que não respeite as leis brasileiras deve simplesmente ser suspensa. O senhor entende ser adequado suspender o Telegram?

Eu entendo pouco de música, mas gosto muito de música. Gosto desde o Pena Branca e Xavantinho até as óperas de Wagner. E nós sabemos que o crescendo da música começa no pianíssimo, que é quase inaudível, no piano, no forte, no muito forte e no fortíssimo. Essa escala bem revela qual é o caminho que nós vamos seguir em relação ao Telegram. Nós já passamos do pianíssimo, chegou a hora de entrar no movimento crescendo forte. Nós estamos observando, em primeiro lugar, qual é a resposta que o Parlamento brasileiro vai dar. Será uma grande oportunidade de o Parlamento brasileiro pacificar esta questão adotando uma premissa fundamental: quem entra no Brasil tem a liberdade plena que a Constituição lhe garante e, ao mesmo tempo, a responsabilidade integral que também deriva da Constituição, que é, em primeiro lugar, cumprir as leis brasileiras.

Já existe no Marco Civil da Internet uma previsão que permitiria, na visão de alguns especialistas, a atuação do TSE em relação à suspensão de contas justamente porque não há representação.

Acaso isso não ocorra, o que nós estamos fazendo simultaneamente é um mapeamento das experiências de outros países. A mais recente experiência é esta da Alemanha, cujas notícias nos últimos dias foram bastante interessantes sobre as providências tomadas em relação ao Telegram, que foram excluídos diversos canais que propagavam a incitação ao ódio. Estamos também examinando outros países que estão se defrontando com problemas parecidos, como o México. Portanto, o TSE está a observar, a colaborar com o Parlamento e está a aguardar o pronunciamento do Parlamento, mas poderá ocorrer que, em um determinado momento, em uma determinada ação ou uma determinada promoção que seja feita pelo Ministério Público, o Tribunal Superior Eleitoral, ou quem sabe até mesmo o Supremo Tribunal Federal, venha a se pronunciar sobre esta matéria. Este é o crescendo desta partitura, nós nos encontramos atualmente nesta fase e eu, pessoalmente, comungo de todas as ideias expressadas pelo ministro Barroso até agora sobre esta matéria.

O senhor vai tentar novamente entrar em contato com os representantes do Telegram?

Sim, até porque a nossa compreensão é de que uma plataforma, uma rede que tem milhões de usuários num determinado país, não pode se esconder por trás da transterritorialidade. O mundo não virou um planeta sem lei. O mundo se tornou um lugar regulamentado e, especialmente pela autonomia, pela autorregulamentação, pela liberdade, pelos espaços de negócios, pelos espaços de ofícios públicos. Podemos citar os Estados Unidos, onde há uma sociedade de mercado e, portanto, uma sociedade aberta. É uma sociedade imensamente regulada, também regulada para garantir autonomia. Esse é possivelmente o caminho que nós sigamos.

Em 2018, a eleição foi marcada por desinformação desenfreada. Para evitar que isso se repita, que medidas o senhor deve adotar nesses próximos cinco meses para garantir o sucesso do processo? 

Em primeiro lugar, houve um conjunto de iniciativas importantes na gestão do ministro Barroso que nós vamos dar continuidade juntos, já com o ministro Alexandre de Moraes. Nós estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação, inclusive com a renovação dos acordos do TSE com as plataformas digitais conhecidas. Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar. Para isso, o juiz não age, como regra, por iniciativa própria. É o Ministério Público que investiga, oferece denúncia. Portanto, este é um ano também muito importante para a atuação do Ministério Público Eleitoral em favor da lisura e da normalidade das eleições.

‘Disseminar informação sabidamente falsa é crime eleitoral, de forma que, se for necessário algum tipo de providência mais severa, nós não vamos ter dúvida em também tomar.’

Que outras ações o Tribunal Superior Eleitoral está fazendo para combater a disseminação de informações falsas?

Estamos reforçando e ampliando o conjunto de recursos humanos e profissionais da assessoria de combate à desinformação. Estamos dando total apoio à rede que nós temos de trabalho na nossa Secretaria de Comunicação, que tem feito um trabalho extraordinário de prestar informações, criar modos amigáveis de comunicação com pessoas interessadas, formulários de denúncia. Ao mesmo tempo nós temos uma comissão de transparência eleitoral que está nos auxiliando. Que é essa comissão composta de 12 membros e tem realizado um trabalho extraordinário de sugestões. Alguns questionamentos importantes, porque os questionamentos nos ajudaram a testar, mais uma vez, a solidez dos nossos sistemas. As respostas que nós estamos dando a todos os questionamentos que vieram das mais diferentes origens contribuíram para que realizássemos mais um teste de solidez das nossas urnas.

As emendas do orçamento secreto são apontadas por juristas e especialistas como uma espécie de “bolsa reeleição” que anula a possibilidade de renovação do Congresso. No Supremo Tribunal Federal, o senhor teve um voto contra essas emendas. De que maneira a Justiça Eleitoral deveria atuar para impedir abuso do poder econômico com recursos públicos? 

Eu fiquei vencido (no julgamento sobre o bloqueio do uso dos recursos do orçamento secreto). As premissas que estão na sua pergunta comungam e conversam com as premissas, embora no âmbito jurídico, que eu tomei no voto em que fiquei vencido. A maioria do Supremo alterou a sua percepção inicial. Isso terá consequências eleitorais. Se houver e estiver na alçada do Tribunal Superior Eleitoral, as decisões aqui, obviamente, serão tomadas. Mas a decisão mais relevante foi lá tomada e eu, infelizmente, fiquei vencido.

Qual o significado do pleito de 2022 no País após ataques à democracia nos últimos anos e diante da invasão do Capitólio nos Estados Unidos?

As eleições no Brasil são importantíssimas não apenas para o País, mas para a região da América do Sul, da América Latina, da América Central, da própria América do Norte e da Europa. Haja vista o que se passa nos dias correntes em alguns países da Europa, uma Polônia, Hungria, Turquia, para citar alguns exemplos, e o que se passa aqui perto do Brasil como em El Salvador, recentemente na Nicarágua, a Venezuela. Portanto, maus exemplos de derrocada no funcionamento da democracia. E o Brasil precisa ser um bom exemplo. Nós queremos nessa articulação internacional tornar as eleições do Brasil é uma espécie de case mundial sobre a democracia. 

Para lembrar: Histórico de ataques russos em eleições

A campanha presidencial americana de 2016 foi marcada por acusações de que hackers russos atacaram o Partido Democrata com a intenção de interferir na eleição em favor de Donald Trump. Em 2020, esse mesmo grupo esteve por trás de tentativas de espionagem nas eleições americanas. Segundo a Microsoft, o grupo foi responsável por ataques a mais de 200 pessoas e organizações nos EUA e no Reino Unido. Entre os alvos americanos havia consultores das campanhas democrata e republicana. Em 2017, hackers russos também atacaram o En Marche!, movimento político de Emmanuel Macron, então candidato mais votado no 1.º turno das eleições presidenciais na França. O ataque consistiu em tentativas de “phishing”, técnica para roubar dados com o envio de e-mails fraudulentos.

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