O governo brasileiro apoia reformas na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) que são acusadas de restringir a atuação do órgão na defesa das liberdades civis, entre elas a de imprensa. As propostas de reformas, elaboradas por um grupo de estudo formado por membros da própria CIDH, com a participação ativa do Brasil, poderão ser aprovadas na Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), que começa hoje em Cochabamba, na Bolívia.O Estado teve acesso ao relatório do grupo de trabalho. A principal recomendação é a de definir critérios claros para abrir processos de investigação e para impor medidas cautelares contra países acusados de violar direitos humanos. "Se a OEA aprovar (as reformas na CIDH), a independência da comissão ficará reduzida, pois será outorgado à Assembleia Geral o poder de redefinir o que ela e as suas relatorias podem ou não fazer", adverte José Miguel Vivanco, diretor da Human Rights Watch para as Américas. Para ele, as reformas atingem "o estatuto da comissão em áreas-chave, como suas intervenções urgentes, a tramitação de casos e - algo que incomoda àqueles que mais violam os direitos humanos - os relatórios de países".O ativista de direitos humanos cita a proposta de que "os próprios Estados monitorados pela comissão definam os termos dessa supervisão com a possibilidade, além disso, de adiar por até um ano a publicação dos relatórios, ou seja, condená-los à irrelevância".A Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) concorda com as críticas. "Se os países aprovarem essas recomendações e propostas para reformar o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, a CIDH e a Relatoria Especial sobre Liberdade de Expressão, aliadas naturais das causas que defendemos, como a de uma imprensa livre, perderão toda a sua eficácia e relevância na defesa dos direitos humanos", afirmam Milton Coleman e Gustavo Mohme, dirigentes da SIP, em uma nota enviada à imprensa.Apoio. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Tovar da Silva Nunes, confirmou ao Estado o apoio do Brasil às reformas e negou que elas pudessem restringir a atuação da comissão. "Essa é uma informação muito perigosa e tendenciosa, porque não é verídica", afirmou o porta-voz. Tovar disse que as propostas são resultado de consenso entre países como Brasil, Colômbia, México e Uruguai. "É uma reforma de dentro da organização do sistema para que ele funcione melhor.""Todo país ou grupo de países e até organizações que têm interesse efetivamente no Sistema Interamericano de Direitos Humanos deveriam participar", continuou Tovar, numa referência ao fato de que os Estados Unidos, onde está baseada a Human Rights Watch, não integram a comissão. "Quem participa hoje está querendo salvar esse sistema que, segundo muitos, caiu em descrédito e perdeu força", justificou o porta-voz. Segundo ele, o intuito das reformas é deixar mais claros os critérios e "dar previsibilidade às etapas" de atuação da comissão, de maneira a conter os "impulsos de politização" aos quais está sujeita, "para que ela não seja usada de maneira seletiva e politizada contra países e grupos de países, e que efetivamente promova o respeito aos direitos humanos"."Quanto maior o grau de politização, menor a inclinação dos países em seguir o que foi acordado", analisou Tovar, acrescentando que é preferível ter uma comissão "isenta e não vulnerável a pressões, atirando para todos os lados".O porta-voz disse que o Sistema Interamericano de Direitos Humanos foi construído em grande parte pela atuação do Brasil. "Não é o Brasil que vai querer vê-lo morrer dessa maneira", afirmou. Tovar explicou que "há uma concentração excessiva em direitos políticos" e que, com as reformas, a comissão deverá reconhecer mais os "avanços em direitos econômicos e sociais". No centro desse debate está Cuba, sujeita há cinco décadas a um embargo econômico pelos Estados Unidos, por causa de seu regime político, enquanto alguns governos, principalmente os de esquerda, veem na ilha avanços na área social. "Um país que é só objeto de crítica e nele não se vê nenhum avanço, é natural que se sinta desencorajado, porque isso não cria uma dinâmica tendente a melhorar os direitos humanos em geral", concluiu Tovar.