O Brasil vive um momento absolutamente fantástico, de grandes decisões, intensas paixões, velhos personagens na cadeia, novos homens públicos dando exemplo de coragem, um debate acirrado sobre formas, limites e eficácia do combate à corrupção dentro do Estado Democrático de Direito. Mas isso deixa a plateia irracional e os atores principais em situação delicada. Coloquem-se no lugar dos ministros do TSE e de procuradores, juízes, delegados, ministros do Supremo, deputados, senadores, governadores e primeiro escalão do governo Temer. A pressão é enorme, tanto sobre quem caça quanto sobre quem é caçado. O peso da responsabilidade, ainda maior. O TSE, que começa em dois dias o julgamento da chapa Dilma-Temer, está entre as mil páginas do relator Herman Benjamin e as circunstâncias de um País que acaba de sair do impeachment, vive uma crise econômica sem precedentes, embola 13,5 milhões de desempregados e só consegue enxergar interrogações no horizonte. Para quem está fora, estarrecido com a corrupção, é fácil resumir tudo à “letra fria da lei”, à defesa de que juiz não olha ao redor, só para capítulos, artigos e parágrafos. Mas, para quem está dentro, há que contar os graus muito diferentes e a imensa responsabilidade histórica e com o País de hoje. A interpretação das leis não é cartesiana. O risco de Dilma, já cassada, é ficar inelegível (aliás, como era previsto no impeachment) e sofrer mais um arranhão profundo na biografia. Com Temer, o que está em jogo é o seu pescoço e, com ele, o que resta de previsibilidade política e econômica. Se eles fizeram mesmo “o Diabo” e foram às profundezas do inferno, que se danem. Mas, e se há dúvidas, gradações, senões, como fica o custo-benefício? Daí a previsão de um pedido de vistas. Temer já me disse que, quanto antes o julgamento, melhor. Na verdade, a avaliação palaciana é que, quanto mais o tempo passa, mais claros ficarão os sinais de recuperação da economia, com reforma da Previdência, melhora dos indicadores, reversão de expectativas – e do humor nacional. Ou seja, o sonho é que esteja mais fortalecido na fase final do julgamento. Até lá, assume posições duras: romper com Renan, sancionar a terceirização sem vetos... Enquanto isso, o STF e o ministro Edson Fachin, soterrados pelas milhares de páginas, gravações e revelações da Lava Jato, buscam bússolas para um País melhor. Aliás, é injusto criticar Cármen Lúcia por não incluir na pauta de abril o fim do foro privilegiado. O que aconteceria se o foro fosse derrubado agora? Um estouro da boiada para instâncias inferiores. E o que vocês fariam se fossem deputados ou senadores? A legítima defesa é um direito fundamental. Se eles são indistintamente alvos da fúria popular, estão com a Lava Jato no cangote e na bica de perder o foro privilegiado, deveriam esperar a guilhotina bovinamente? Ou debater uma lei contra abusos de autoridade? Louve-se o gesto do procurador geral Rodrigo Janot, que ao entregar uma proposta alternativa legitimou a necessidade de uma lei do abuso, combinando legalidade e combate à corrupção. A questão é, mais uma vez, de limites. A proposta de Janot, já apresentada pelo juiz Sergio Moro, prevê salvaguarda para juízes e procuradores que, sem má-fé, tenham interpretação divergente para leis e provas. Aí a coisa empaca, porque o Congresso considera salvo conduto para eles trucidarem os alvos da Lava Jato. Tudo isso caracteriza um vibrante momento da democracia, com interesses, direitos e deveres em jogo e com profundos efeitos em 2017, 2018, 2020, 2040... E, goste-se ou não do ministro Gilmar Mendes, esse momento é no Brasil real e nós não estamos “em Marte”. PS: Mais uma semaninha das férias de 2016. Até dia 11!