Juntando tudo, resta zero dúvida sobre a tentativa de golpe que poderia ter jogado o Brasil numa ditadura e as Forças Armadas na lama e que pode ser definida com três palavras: foi grave, mas amadora e, em vários momentos, patética. Cada um desses adjetivos está ilustrado por imagens fortes, abundantes, de veracidade comprovada e amplo conhecimento público.
Foi obviamente GRAVE porque o golpe era liderado pelo próprio presidente da República, o capitão insubordinado Jair Bolsonaro, que cooptou oficiais generais, coronéis, capitães e tenentes das três Forças Armadas, chegou a articular um projeto no Congresso para assumir o controle sobre as polícias militares e escancarou o porte e a posse de armas para civis.
Bolsonaro tratou de manipular as massas em torno dessas ideias grotescas, em atos de cunho inequivocamente golpista – propondo fechamento do Congresso e do Supremo, com volta do regime militar e até do AI-5, o mais tenebroso instrumento legal da ditadura. E não descuidou de tirar a autonomia e intervir, a seu bel prazer, nos órgãos de inteligência, fiscalização e controle do Estado brasileiro, como Abin, Polícia Federal, Receita, Coaf...
As imagens não deixam dúvida: reuniões em palácio em que Bolsonaro, ministros e generais capricharam nas provas contra si, o governo e o próprio presidente; atos golpistas diante da rampa do Planalto ou com o QG do Exército ao fundo; discurso absurdo contra o Brasil e o sistema eleitoral para dezenas de embaixadores; minutas com o ex-ministro da Justiça e o ex-ajudante de ordens do presidente para intervenção no TSE e a criação de comissões recheadas de militares; rascunho de um pronunciamento anunciando Estado de Sítio. Sem falar nas indecentes trocas de mensagens pela internet e, claro, do próprio 8 de janeiro de 2023.
A tentativa de golpe também foi AMADORA. Onde já se viu combinar golpe, falando as maiores barbaridades, com um monte de gente sentada em torno de uma mesa, na sede do Poder Executivo, e ainda por cima registrar tudo em vídeo? E misturar oficiais cheios de estrelas e cursos com capitães expulsos do Exército, hackers condenados, políticos fajutos, advogados aproveitadores, empresários de quinta, especialistas em rachadinhas? Um circo dos horrores.
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Imagens? Mais uma vez, ora, ora, os vídeos das reuniões golpistas no Planalto, em que Bolsonaro e seu ministro da Defesa, general Braga Neto, garantem aos militares, ministros e diplomatas presentes que eles não estavam sendo gravados. Estavam. Ou Bolsonaro enganou os presentes e estava gravando tudo para prevenir “traições”, ou ele era gravado pelos próprios generais, ou pela própria equipe. O mais provável é que a ordem tenha sido dele, sempre desconfiado, com mania de perseguição, mas de qualquer jeito é uma lambança primária, inacreditável.
E tudo foi PATÉTICO, afinal, porque, como tantas coisas na vida, na carreira militar, na carreira política e no governo de Bolsonaro, a tentativa de golpe é como um pastelão que se passa em Miami – para onde, aliás, ele correu antes da posse de Lula e do 8 de janeiro. Misturem-se as intenções, o palavreado e os personagens com as histórias de avião da FAB indo buscar joias das Arábias, militares e advogados metidos em vendas de relógios ilegais nos EUA, atestados falsos de vacina, general da ativa em carro de som de campanha, embaixadores estrangeiros chocados ao ouvir o presidente esculhambar o Brasil...
Há uma profusão de imagens patéticas desde o início do governo, como a de Bolsonaro recebendo importante autoridade americana em mesinha de fórmica e copo de geleia, mas isso é só folclore. Fiquemos numa única imagem, imbatível, para a história: a dos tanques velhos, barulhentos, fumacentos, ridículos, desfilando na frente do Planalto no dia em que o Congresso daria – e deu – um sonoro não à tentativa bolsonarista/militar de instituir cédula impressa com o intuito de achincalhar as urnas eletrônicas e preparar terreno para o golpe em caso de derrota de Bolsonaro. Aqueles tanques e seu fumacê dizem tudo sobre o golpe e os aventureiros golpistas.