Apesar da quase unanimidade interna contra o governo na crise da Venezuela, a reação externa é positiva. O presidente Joe Biden liga para o presidente Lula discutindo caminhos, os opositores Maria Corina e Edmundo González reconhecem o esforço brasileiro, Colômbia e México assumem uma nota tríplice com o Brasil e, agora, até Javier Milei, da Argentina, agradece publicamente o socorro do Itamaraty.
Assim como os EUA estão no olho do furacão no conflito do Oriente Médio, o Brasil está no caos venezuelano, tentando manter pontes com todos os lados em busca de saídas. A bandeira verde e amarela flamulando na embaixada argentina em Caracas é um bom símbolo.
A fala de Lula considerando normal e sem gravidade a crise e as evidências de fraudes nas eleições da Venezuela é deslocada e inadmissível, assim como é juvenil e irresponsável o seu partido reconhecer a vitória do ditador Nicolás Maduro já no primeiro momento, contra todas as evidências. Ambos merecem a montanha de críticas, mas isso não anula o fato de que a diplomacia brasileira tem rumo, estratégia, objetivo.
Há duas dimensões. A portas fechadas, como na noite de quarta-feira, com o chanceler Mauro Vieira e o assessor internacional Celso Amorim, a avaliação é clara, até óbvia: Maduro se nega a divulgar as atas de votação porque foi derrotado e ameaça a Venezuela, não só com a absurda prisão de Corina e González, mas com um autogolpe e um “banho de sangue” - como ele mesmo disse antes do pleito.
Mas a portas abertas, ou seja, nas manifestações diplomáticas, é preciso manter a frieza e aguentar firme a pancadaria interna para buscar soluções. A Argentina e seis outros países chutaram o pau da barraca, e daí, o que conseguiram com isso? Atiçaram a fúria de Maduro, que expulsou as representações em Caracas e obrigou a Argentina a pedir socorro ao Brasil para cuidar de seus interesses e de refugiados oposicionistas que estão na sua embaixada.
Não é simples entender a diplomacia, que exige paciência, negociação e recuos contra conflitos. A crítica feita ao governo é que, com a (real e condenável) condescendência com o regime de Maduro, já chamado de “democracia” por Lula, o Brasil perde a condição de líder regional. É verdade. Mas há que se reconhecer que, ao manter o diálogo com oposição e governo - como fez Celso Amorim em Caracas - e se articular com os EUA e países vizinhos, o Brasil consolida sua liderança.
Maduro está isolado e feras acuadas são capazes de qualquer coisa, inclusive um golpe militar e um “banho de sangue”. É isso que Brasil, México e Colômbia, três países importantes, considerados progressistas e com as maiores populações da América Latina, tentam impedir. Se não conseguirem, ninguém conseguirá. Aí, a história será outra.