Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) protestaram, nos bastidores, contra o voto do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), a favor da PEC que limita os poderes da Corte, aprovada nesta quarta-feira, 22, por 52 votos a 18. Sob a condição de anonimato, magistrados da Corte consideraram que o endosso de Wagner à proposta é uma “traição rasteira” depois da resistência feita pelo Supremo ao que definiram como “golpe bolsonarista”.
A postura do senador levou a um ultimato do Supremo: “ou o Jaques Wagner sai, ou não tem mais papo do STF com o Planalto e o governo”. Wagner foi o único senador petista a ir contra o próprio partido, que orientou pelo voto “não”. A PEC teve três votos a mais do que os 49 que são necessários para sua aprovação.
“Acabou a ‘lua de mel’ com o governo. Traição rasteira. União com os Bolsonaristas contra o STF depois de tudo que aconteceu. Jaques Wagner precisa renunciar à liderança, senão acabou a interlocução com o STF”, afirmou um ministro nos bastidores.
Segundo os magistrados, Wagner teria apelado para um “truque barato” para conseguir a votação necessária sem precisar comprometer a bancada do PT que votou em peso contra a PEC. Em vez de contar com os senadores petistas, Wagner — que é da Bahia e já chegou a governar o Estado — teria dado os votos dos senadores da bancada baiana: Otto Alencar e Ângelo Coronel, que são do PSD, partido de base do governo. “Acham que somos bobos com esse truque barato do PT votar de uma lado e os aliados da Bahia de outro”, disse um ministro.
Os ministros ainda questionaram a participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na manobra. “Jaques iria fazer sem o Lula saber?”, apontou um integrante da Corte.
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‘Não é uma questão do governo’
Na terça-feira, 22, Wagner liberou a bancada do PT para votar como quisesse na proposta que fez com que a votação ficasse para esta quarta. Como mostrado pelo Estadão, caso a PEC tivesse sido votado na terça, a oposição teria dificuldades para garantir sua aprovação. Na ocasião, toda a bancada do PT votou contra o adiamento, com exceção do líder do governo, que se absteve.
Ainda antes da votação desta quarta, o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, afirmou que o tema “não é assunto do governo”. De acordo com o ministro, discussões como essa, que envolvem disputas entre os Poderes, não “são temas em que o governo tem posição”.
“Não é uma questão do governo, por isso o líder do governo em questões como essa acaba liberando a bancada. Eu fui líder da bancada do partido durante muito tempo. Você tem que reunir a bancada e tirar uma posição. O governo não pode ter uma opinião ou orientação sobre um voto num tema em que ele não tratou e não tratará”, disse Pimenta.
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Mudanças de última hora na PEC
A votação que aprovou a PEC que limita os poderes da Corte ocorreu depois de uma alteração de última hora feita pelo relator Esperidião Amin (PP-SC), num acordo que envolveu conversas com ministro do STF e até mesmo parlamentares da base do governo. A mudança surgiu a partir de uma emenda apresentada pelo senador Omar Aziz (PSD-AM) para que os ministros ainda possam derrubar por meio de decisão individual atos normativos do governo federal.
A versão inicial da proposta previa que as medidas administrativas do governo, assim com as leis aprovadas pelo Congresso, só poderiam ser derrubadas pela maioria do STF. “Atos normativos que são via de regra do Executivo podem tramitar sem essa regulação que a nossa emenda constitucional aplica”, disse o relator.
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Amin ainda acatou uma proposta do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para que as Casas Legislativas de onde saírem as medidas eventualmente questionadas no STF sejam procuradas para se manifestar antes de os ministros tomarem a decisão de suspendê-las ou não. Atualmente as manifestações da Câmara e do Senado não são obrigatórias.
Amin retirou do relatório o estabelecimento de um prazo de validade de 180 dias para os pedidos de vista (suspensão de julgamento). A mudança também foi fruto de conversa de Pacheco com o ministro Alexandre de Moraes, do STF, na última terça-feira. De acordo com o presidente do Senado, o magistrado “compreende” que a intenção é “melhorar a relação entre os poderes”.
Quem votou contra e a favor da PEC que limita poderes do STF
Jaques Wagner foi o único petista a votar a favor da PEC 08/2021. Os outros sete senadores seguiram a orientação do PT e manifestaram-se contra a proposta. O mesmo não se pode dizer de outros partidos da base do governo.
No PSB do vice-presidente Geraldo Alckmin, os senadores Flávio Arns e Chico Rodrigues foram favoráveis à proposta, Jorge Kajuru foi contra. Já no MDB, que também é da base do governo, foram favoráveis os senadores Alessandro Vieira, Fernando Dueire, Giordano e Ivete da Silveira. Foram contra Confúcio Moura, Marcelo Castro e Fernando Farias.
PSD e PDT, que têm ministérios, também apresentaram votações divididas. No PSD — que também é o partido de Rodrigo Pacheco, presidente do Senado — foram sete senadores favoráveis e quatro contrários, enquanto o PDT ficou com um senador de cada lado.
Nos casos do União Brasil e do PP, que também estão representados na Esplanada como parte do acordo do presidente Lula com o Congresso, todos os senadores foram favoráveis.
Já no PL, partido do ex-presidente Bolsonaro, 11 senadores votaram pela proposta, enquanto um deles — o senador Romário — foi contra.