O Judiciário enfrenta com firmeza a ameaça de golpe, mas quem vai enfrentar os desmandos e escândalos do próprio Judiciário? Não é minimamente admissível que uma desembargadora do TJ-MT receba R$ 130 mil por mês, três vezes mais que o teto salarial do funcionalismo, e ainda por cima autorize um “vale peru” de R$ 10 mil de presente para ela e os colegas.
Ela não agiu sozinha, tanto que o tribunal descumpriu a ordem do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e liberou o mimo para ele próprio — ou seja, para os pobrezinhos dos desembargadores de Mato Grosso, que certamente precisavam muito dessa verba para ter uma ceia decente no Natal, num País onde milhões não têm o que comer nem no seu dia a dia.
É escandaloso, vergonhoso, e todo mundo finge que não vê, apesar das sucessivas reportagens do nosso Estadão. “Decisão judicial não se discute, cumpre-se”, mas quem toma as decisões judiciais não se sente obrigado a cumpri-las, como no caso do teto constitucional, e nem mesmo de acartar as ordens do CNJ, como a de suspender o “Vale peru”.
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A desembargadora e o tribunal de Mato Grosso não são os únicos a se auto concederem privilégios indecentes, imorais, driblando a própria lei que são pagos pelo povo brasileiro para aplicar. Toda hora surgem relatos, investigações e comprovantes de “penduricalhos” para descumprir não uma lei, mas a lei maior do País, e aumentar ilegalmente salários de juízes e magistrados.
Isso ocorre em vários estados, ou seria em quase todos? Mas o pior são notícias avassaladoras sobre vendas de sentenças, envolvendo, ora funcionários, ora os próprios desembargadores, e isso respinga até no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Como confiar nos agentes da Justiça e na própria Justiça? E na polícia, nos legislativos, nos executivos?
Alexandre de Moraes é implacável contra golpistas de vários naipes e estrelas e Flávio Dino, contra emendas do Congresso que, não raro, evaporam no destino de forma tão espantosa como se multiplicam ano a ano. Palmas para eles, mas quem será o Xandão e o Dino contra abusos e desvios do próprio Judiciário?
Ouve-se por toda parte, inclusive no Supremo, que as Forças Armadas e os militares devem, ou deveriam ser os primeiros a se indignar e a cobrar punições dos seus que mataram um músico e um catador ao dispararem 257 tiros ou articularam um golpe e até o assassinato de um presidente eleito, seu vice e do presidente do TSE.
O Judiciário e o Supremo não deveriam também ser os primeiros a se indignar e exigir respeito de juízes e desembargadores que usem, abusem e desviem dinheiro público?