Estudo inédito faz raio-X do Centrão e define perfil dos deputados que compõem o bloco


Pesquisa com 379 cientistas políticos chegou a nove siglas enquadradas na categoria, com diferentes graus de fisiologismo: PP, Republicanos, PL, PTB, MDB, União Brasil, Patriota, Podemos e PSD

Por Guilherme Caetano

BRASÍLIA – A reforma política de 2017, que buscou punir partidos com comportamento fisiológico, reduziu o número de siglas menores e concentrou recursos e poder nas mãos dos partidos médios do chamado “Centrão 2.0″, grupo reunido em torno de demandas clientelistas, em detrimento de uma agenda ideológica.

A conclusão é do estudo “Do fisiologismo ao poder: as reformas eleitorais e o centrão 2.0″, dos cientistas políticos Graziella Testa (FGV), Lara Mesquita (FGV) e Bruno Bolognesi (UFPR), que buscou apresentar pela primeira vez uma definição acadêmica do que compõe o Centrão – termo recorrente no jargão jornalístico – e descobrir se houve mudança no perfil dos deputados federais a partir das reformas de 2007 e 2017.

Votação no plenário da Câmara dos Deputados. Foto: Wilton Junior/Estadão
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A terminação “2.0″ se refere à história da expressão “Centrão”, usada pela primeira vez no processo constituinte de 1987-1988 no Brasil, quando nasceu um bloco parlamentar de reação ao protagonismo da esquerda durante o debate sobre a Constituição Federal. Já o Centrão atual reaparece quando o “baixo clero” é alçado ao poder na Câmara dos Deputados, na transição dos mandatos de Dilma Rousseff, entre 2014 e 2015, em especial na figura do ex-deputado federal Eduardo Cunha, que chefiou a Casa durante o processo de impeachment da então presidente.

O conservadorismo permanece então como uma característica distintiva do Centrão, diz o estudo, baseado em dados da literatura acadêmica que os colocam no campo da direita. Apesar disso, outras legendas desse campo ideológico, como PSDB e Novo, não se enquadram na categoria, por serem “minimamente programáticos”.

Os pesquisadores partiram de três conjuntos de dados para chegar à definição de “Centrão 2.0″: questionário respondido por 379 cientistas políticos, análise da carreira dos deputados federais e informações sobre o comportamento das bancadas partidárias na Câmara. A pesquisa com a comunidade brasileira de cientistas políticos, que deu pontapé na investigação, chegou a nove siglas do Centrão, de acordo com os acadêmicos: PP, Republicanos, PL, PTB, MDB, União Brasil, Patriota, Podemos e PSD.

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Nem todas essas siglas, no entanto, demonstram o mesmo caráter ideológico (qualidade oposta a ideológico ou programático), segundo a pesquisa. Quando se observa os comportamentos dessas legendas tanto na disputa eleitoral quanto na atuação legislativa, quatro partidos se encaixam de forma unânime na categoria: PSD, Podemos, PP e o Republicanos. Bolognesi os chamam de “núcleo duro” do Centrão.

No debruçar sobre a carreira dos congressistas, os pesquisadores identificaram que deputados federais do Centrão demonstram menos fidelidade partidária, a partir de dados segundo os quais esses parlamentares se filiam em média a mais siglas do que os demais antes de se elegerem (2,05 contra 1,67). Também são menores a proporção dos deputados do Centrão que ocupam cargos na direção de seus partidos (29,6% contra 36,9%) e a proporção dos que atuam na liderança de suas bancadas (9% contra 18,8%), se comparados a parlamentares de partidos mais ideológicos.

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Parlamentares do Centrão têm menos vínculo com a sociedade civil (47,7% contra 57,6%) – como igrejas, sindicatos, clubes, grupos empresariais –, e mais frequentemente pertencem a clãs políticos (28,3% contra 20,1%). Também participam menos de projetos coletivos: lideram menos vezes frentes parlamentares durante o mandato (0,23 vez por mandato contra 0,33).

Os dados apontam que se tratam de parlamentares “com lealdade menor às legendas das quais faziam parte, ainda que se possa afirmar que lealdade partidária não seja um traço forte do sistema político brasileiro”, na avaliação dos pesquisadores.

O ano de 2007 é um marco divisório na apreciação dos dados levantados. A Justiça Eleitoral mudou o entendimento até então vigente e passou a reconhecer que o mandato de candidatos eleitos pela regra proporcional pertence ao partido e, assim, em caso de desfiliação ou filiação a outra legenda, o mandato volta para o partido político.

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A decisão inaugurou uma nova forma de comportamento parlamentar: as legendas passaram com mais frequência a liberar a bancada para votar conforme quiser, isto é, quando o partido não fecha questão sobre determinada votação, permitindo a autonomia individual sobre aquela questão.

A liberação de bancada denotaria, na visão dos pesquisadores, uma “estratégia fisiológica e pragmática” por parte das lideranças que, diante de um tema que gera divisões internas, optam por não fechar questão e desagradar membros da legenda. Não havendo conflito acerca do tema em questão, a liderança partidária prefere o comportamento estratégico ao convicto: permite que sua bancada se divida sem que isso repercuta em punições para os parlamentares. “Em outros termos, partidos que liberam mais a bancada podem ser considerados mais fisiológicos no comportamento parlamentar que partidos que raramente o fazem”, diz o estudo.

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“É curioso ver o quanto o pragmatismo rende. A gente observa que liberar a bancada tende a preservar a bancada no futuro. Quem deixa seus deputados livres tende a não perder suas cadeiras. Essa estratégia vale muito a pena para os dirigentes”, diz Bolognesi.

A cláusula de barreira criada na reforma política de 2017, que impôs um desempenho mínimo para que partidos tivessem acesso a recursos públicos para sua manutenção, é peça-chave no estudo de Testa, Mesquita e Bolognesi. Não sobreviveram ao dispositivo 14 siglas ao todo – todas consideradas integrantes do Centrão, de acordo com o estudo.

“Seria possível dizer, então, que o Centrão perdeu com a reforma de 2017? Não”, diz o artigo. “O que se pode dizer é que os pequenos partidos do Centrão perderam com a reforma de 2017. Já os partidos médios parecem ter herdado o legado dos pequenos que deixaram de receber recursos.”

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Maiores partidos do Centrão se fortaleceram com cláusula de barreira

Os maiores partidos do Centrão não só sobreviveram à cláusula como se fortaleceram, e hoje dominam o acesso ao Orçamento. Sete dos oito partidos com maior verba do fundo eleitoral em 2024 (recurso destinado ao financiamento de candidaturas, mas distribuído conforme o tamanho das bancadas) eram do Centrão (PL, União, PSD, MDB, PP, Republicanos e Podemos), de acordo com a definição encontrada a partir do questionário com cientistas políticos. A exceção é o PT, dono de R$ 604,2 milhões, perdendo apenas para o PL, que recebeu R$ 863 milhões.

Para Testa, Mesquita e Bolognesi, “o Centrão é populado por partidos fisiológicos, mas que abrem espaço justamente para a manifestação individual de ideologia, de modo que os partidos do Centrão sirvam como casa para uma rama de políticos conservadores. A diferença, então, reside justamente na distinção entre o partido a serviço do indivíduo, no caso do Centrão, e o indivíduo a serviço do partido, no caso dos demais partidos ideológicos”.

Em relação a definições anteriormente propostas, o estudo do trio coloca ênfase no fisiologismo e no clientelismo eleitoral como traços definidores do Centrão. “Isso não quer dizer que os outros partidos não sejam clientelistas, mas é a somatória do clientelismo como prática eleitoral com o fisiologismo como prática legislativa que coloca o parlamentar do Centrão como um ente autônomo ao partido, seja ao angariar votos, seja ao representar”, dizem os pesquisadores.

“A questão é entender como o Centrão vai lidar com a consolidação da reforma política de 2017, que foi feita para dar mais poder nas mãos dos líderes partidários. A cláusula de barreira ficando mais alta (até 2030), os fundos ficando maiores. Existe um equilíbiro em que a gente ainda não chegou”, diz Mesquita.

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BRASÍLIA – A reforma política de 2017, que buscou punir partidos com comportamento fisiológico, reduziu o número de siglas menores e concentrou recursos e poder nas mãos dos partidos médios do chamado “Centrão 2.0″, grupo reunido em torno de demandas clientelistas, em detrimento de uma agenda ideológica.

A conclusão é do estudo “Do fisiologismo ao poder: as reformas eleitorais e o centrão 2.0″, dos cientistas políticos Graziella Testa (FGV), Lara Mesquita (FGV) e Bruno Bolognesi (UFPR), que buscou apresentar pela primeira vez uma definição acadêmica do que compõe o Centrão – termo recorrente no jargão jornalístico – e descobrir se houve mudança no perfil dos deputados federais a partir das reformas de 2007 e 2017.

Votação no plenário da Câmara dos Deputados. Foto: Wilton Junior/Estadão

A terminação “2.0″ se refere à história da expressão “Centrão”, usada pela primeira vez no processo constituinte de 1987-1988 no Brasil, quando nasceu um bloco parlamentar de reação ao protagonismo da esquerda durante o debate sobre a Constituição Federal. Já o Centrão atual reaparece quando o “baixo clero” é alçado ao poder na Câmara dos Deputados, na transição dos mandatos de Dilma Rousseff, entre 2014 e 2015, em especial na figura do ex-deputado federal Eduardo Cunha, que chefiou a Casa durante o processo de impeachment da então presidente.

O conservadorismo permanece então como uma característica distintiva do Centrão, diz o estudo, baseado em dados da literatura acadêmica que os colocam no campo da direita. Apesar disso, outras legendas desse campo ideológico, como PSDB e Novo, não se enquadram na categoria, por serem “minimamente programáticos”.

Os pesquisadores partiram de três conjuntos de dados para chegar à definição de “Centrão 2.0″: questionário respondido por 379 cientistas políticos, análise da carreira dos deputados federais e informações sobre o comportamento das bancadas partidárias na Câmara. A pesquisa com a comunidade brasileira de cientistas políticos, que deu pontapé na investigação, chegou a nove siglas do Centrão, de acordo com os acadêmicos: PP, Republicanos, PL, PTB, MDB, União Brasil, Patriota, Podemos e PSD.

Nem todas essas siglas, no entanto, demonstram o mesmo caráter ideológico (qualidade oposta a ideológico ou programático), segundo a pesquisa. Quando se observa os comportamentos dessas legendas tanto na disputa eleitoral quanto na atuação legislativa, quatro partidos se encaixam de forma unânime na categoria: PSD, Podemos, PP e o Republicanos. Bolognesi os chamam de “núcleo duro” do Centrão.

No debruçar sobre a carreira dos congressistas, os pesquisadores identificaram que deputados federais do Centrão demonstram menos fidelidade partidária, a partir de dados segundo os quais esses parlamentares se filiam em média a mais siglas do que os demais antes de se elegerem (2,05 contra 1,67). Também são menores a proporção dos deputados do Centrão que ocupam cargos na direção de seus partidos (29,6% contra 36,9%) e a proporção dos que atuam na liderança de suas bancadas (9% contra 18,8%), se comparados a parlamentares de partidos mais ideológicos.

Parlamentares do Centrão têm menos vínculo com a sociedade civil (47,7% contra 57,6%) – como igrejas, sindicatos, clubes, grupos empresariais –, e mais frequentemente pertencem a clãs políticos (28,3% contra 20,1%). Também participam menos de projetos coletivos: lideram menos vezes frentes parlamentares durante o mandato (0,23 vez por mandato contra 0,33).

Os dados apontam que se tratam de parlamentares “com lealdade menor às legendas das quais faziam parte, ainda que se possa afirmar que lealdade partidária não seja um traço forte do sistema político brasileiro”, na avaliação dos pesquisadores.

O ano de 2007 é um marco divisório na apreciação dos dados levantados. A Justiça Eleitoral mudou o entendimento até então vigente e passou a reconhecer que o mandato de candidatos eleitos pela regra proporcional pertence ao partido e, assim, em caso de desfiliação ou filiação a outra legenda, o mandato volta para o partido político.

A decisão inaugurou uma nova forma de comportamento parlamentar: as legendas passaram com mais frequência a liberar a bancada para votar conforme quiser, isto é, quando o partido não fecha questão sobre determinada votação, permitindo a autonomia individual sobre aquela questão.

A liberação de bancada denotaria, na visão dos pesquisadores, uma “estratégia fisiológica e pragmática” por parte das lideranças que, diante de um tema que gera divisões internas, optam por não fechar questão e desagradar membros da legenda. Não havendo conflito acerca do tema em questão, a liderança partidária prefere o comportamento estratégico ao convicto: permite que sua bancada se divida sem que isso repercuta em punições para os parlamentares. “Em outros termos, partidos que liberam mais a bancada podem ser considerados mais fisiológicos no comportamento parlamentar que partidos que raramente o fazem”, diz o estudo.

“É curioso ver o quanto o pragmatismo rende. A gente observa que liberar a bancada tende a preservar a bancada no futuro. Quem deixa seus deputados livres tende a não perder suas cadeiras. Essa estratégia vale muito a pena para os dirigentes”, diz Bolognesi.

A cláusula de barreira criada na reforma política de 2017, que impôs um desempenho mínimo para que partidos tivessem acesso a recursos públicos para sua manutenção, é peça-chave no estudo de Testa, Mesquita e Bolognesi. Não sobreviveram ao dispositivo 14 siglas ao todo – todas consideradas integrantes do Centrão, de acordo com o estudo.

“Seria possível dizer, então, que o Centrão perdeu com a reforma de 2017? Não”, diz o artigo. “O que se pode dizer é que os pequenos partidos do Centrão perderam com a reforma de 2017. Já os partidos médios parecem ter herdado o legado dos pequenos que deixaram de receber recursos.”

Maiores partidos do Centrão se fortaleceram com cláusula de barreira

Os maiores partidos do Centrão não só sobreviveram à cláusula como se fortaleceram, e hoje dominam o acesso ao Orçamento. Sete dos oito partidos com maior verba do fundo eleitoral em 2024 (recurso destinado ao financiamento de candidaturas, mas distribuído conforme o tamanho das bancadas) eram do Centrão (PL, União, PSD, MDB, PP, Republicanos e Podemos), de acordo com a definição encontrada a partir do questionário com cientistas políticos. A exceção é o PT, dono de R$ 604,2 milhões, perdendo apenas para o PL, que recebeu R$ 863 milhões.

Para Testa, Mesquita e Bolognesi, “o Centrão é populado por partidos fisiológicos, mas que abrem espaço justamente para a manifestação individual de ideologia, de modo que os partidos do Centrão sirvam como casa para uma rama de políticos conservadores. A diferença, então, reside justamente na distinção entre o partido a serviço do indivíduo, no caso do Centrão, e o indivíduo a serviço do partido, no caso dos demais partidos ideológicos”.

Em relação a definições anteriormente propostas, o estudo do trio coloca ênfase no fisiologismo e no clientelismo eleitoral como traços definidores do Centrão. “Isso não quer dizer que os outros partidos não sejam clientelistas, mas é a somatória do clientelismo como prática eleitoral com o fisiologismo como prática legislativa que coloca o parlamentar do Centrão como um ente autônomo ao partido, seja ao angariar votos, seja ao representar”, dizem os pesquisadores.

“A questão é entender como o Centrão vai lidar com a consolidação da reforma política de 2017, que foi feita para dar mais poder nas mãos dos líderes partidários. A cláusula de barreira ficando mais alta (até 2030), os fundos ficando maiores. Existe um equilíbiro em que a gente ainda não chegou”, diz Mesquita.

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BRASÍLIA – A reforma política de 2017, que buscou punir partidos com comportamento fisiológico, reduziu o número de siglas menores e concentrou recursos e poder nas mãos dos partidos médios do chamado “Centrão 2.0″, grupo reunido em torno de demandas clientelistas, em detrimento de uma agenda ideológica.

A conclusão é do estudo “Do fisiologismo ao poder: as reformas eleitorais e o centrão 2.0″, dos cientistas políticos Graziella Testa (FGV), Lara Mesquita (FGV) e Bruno Bolognesi (UFPR), que buscou apresentar pela primeira vez uma definição acadêmica do que compõe o Centrão – termo recorrente no jargão jornalístico – e descobrir se houve mudança no perfil dos deputados federais a partir das reformas de 2007 e 2017.

Votação no plenário da Câmara dos Deputados. Foto: Wilton Junior/Estadão

A terminação “2.0″ se refere à história da expressão “Centrão”, usada pela primeira vez no processo constituinte de 1987-1988 no Brasil, quando nasceu um bloco parlamentar de reação ao protagonismo da esquerda durante o debate sobre a Constituição Federal. Já o Centrão atual reaparece quando o “baixo clero” é alçado ao poder na Câmara dos Deputados, na transição dos mandatos de Dilma Rousseff, entre 2014 e 2015, em especial na figura do ex-deputado federal Eduardo Cunha, que chefiou a Casa durante o processo de impeachment da então presidente.

O conservadorismo permanece então como uma característica distintiva do Centrão, diz o estudo, baseado em dados da literatura acadêmica que os colocam no campo da direita. Apesar disso, outras legendas desse campo ideológico, como PSDB e Novo, não se enquadram na categoria, por serem “minimamente programáticos”.

Os pesquisadores partiram de três conjuntos de dados para chegar à definição de “Centrão 2.0″: questionário respondido por 379 cientistas políticos, análise da carreira dos deputados federais e informações sobre o comportamento das bancadas partidárias na Câmara. A pesquisa com a comunidade brasileira de cientistas políticos, que deu pontapé na investigação, chegou a nove siglas do Centrão, de acordo com os acadêmicos: PP, Republicanos, PL, PTB, MDB, União Brasil, Patriota, Podemos e PSD.

Nem todas essas siglas, no entanto, demonstram o mesmo caráter ideológico (qualidade oposta a ideológico ou programático), segundo a pesquisa. Quando se observa os comportamentos dessas legendas tanto na disputa eleitoral quanto na atuação legislativa, quatro partidos se encaixam de forma unânime na categoria: PSD, Podemos, PP e o Republicanos. Bolognesi os chamam de “núcleo duro” do Centrão.

No debruçar sobre a carreira dos congressistas, os pesquisadores identificaram que deputados federais do Centrão demonstram menos fidelidade partidária, a partir de dados segundo os quais esses parlamentares se filiam em média a mais siglas do que os demais antes de se elegerem (2,05 contra 1,67). Também são menores a proporção dos deputados do Centrão que ocupam cargos na direção de seus partidos (29,6% contra 36,9%) e a proporção dos que atuam na liderança de suas bancadas (9% contra 18,8%), se comparados a parlamentares de partidos mais ideológicos.

Parlamentares do Centrão têm menos vínculo com a sociedade civil (47,7% contra 57,6%) – como igrejas, sindicatos, clubes, grupos empresariais –, e mais frequentemente pertencem a clãs políticos (28,3% contra 20,1%). Também participam menos de projetos coletivos: lideram menos vezes frentes parlamentares durante o mandato (0,23 vez por mandato contra 0,33).

Os dados apontam que se tratam de parlamentares “com lealdade menor às legendas das quais faziam parte, ainda que se possa afirmar que lealdade partidária não seja um traço forte do sistema político brasileiro”, na avaliação dos pesquisadores.

O ano de 2007 é um marco divisório na apreciação dos dados levantados. A Justiça Eleitoral mudou o entendimento até então vigente e passou a reconhecer que o mandato de candidatos eleitos pela regra proporcional pertence ao partido e, assim, em caso de desfiliação ou filiação a outra legenda, o mandato volta para o partido político.

A decisão inaugurou uma nova forma de comportamento parlamentar: as legendas passaram com mais frequência a liberar a bancada para votar conforme quiser, isto é, quando o partido não fecha questão sobre determinada votação, permitindo a autonomia individual sobre aquela questão.

A liberação de bancada denotaria, na visão dos pesquisadores, uma “estratégia fisiológica e pragmática” por parte das lideranças que, diante de um tema que gera divisões internas, optam por não fechar questão e desagradar membros da legenda. Não havendo conflito acerca do tema em questão, a liderança partidária prefere o comportamento estratégico ao convicto: permite que sua bancada se divida sem que isso repercuta em punições para os parlamentares. “Em outros termos, partidos que liberam mais a bancada podem ser considerados mais fisiológicos no comportamento parlamentar que partidos que raramente o fazem”, diz o estudo.

“É curioso ver o quanto o pragmatismo rende. A gente observa que liberar a bancada tende a preservar a bancada no futuro. Quem deixa seus deputados livres tende a não perder suas cadeiras. Essa estratégia vale muito a pena para os dirigentes”, diz Bolognesi.

A cláusula de barreira criada na reforma política de 2017, que impôs um desempenho mínimo para que partidos tivessem acesso a recursos públicos para sua manutenção, é peça-chave no estudo de Testa, Mesquita e Bolognesi. Não sobreviveram ao dispositivo 14 siglas ao todo – todas consideradas integrantes do Centrão, de acordo com o estudo.

“Seria possível dizer, então, que o Centrão perdeu com a reforma de 2017? Não”, diz o artigo. “O que se pode dizer é que os pequenos partidos do Centrão perderam com a reforma de 2017. Já os partidos médios parecem ter herdado o legado dos pequenos que deixaram de receber recursos.”

Maiores partidos do Centrão se fortaleceram com cláusula de barreira

Os maiores partidos do Centrão não só sobreviveram à cláusula como se fortaleceram, e hoje dominam o acesso ao Orçamento. Sete dos oito partidos com maior verba do fundo eleitoral em 2024 (recurso destinado ao financiamento de candidaturas, mas distribuído conforme o tamanho das bancadas) eram do Centrão (PL, União, PSD, MDB, PP, Republicanos e Podemos), de acordo com a definição encontrada a partir do questionário com cientistas políticos. A exceção é o PT, dono de R$ 604,2 milhões, perdendo apenas para o PL, que recebeu R$ 863 milhões.

Para Testa, Mesquita e Bolognesi, “o Centrão é populado por partidos fisiológicos, mas que abrem espaço justamente para a manifestação individual de ideologia, de modo que os partidos do Centrão sirvam como casa para uma rama de políticos conservadores. A diferença, então, reside justamente na distinção entre o partido a serviço do indivíduo, no caso do Centrão, e o indivíduo a serviço do partido, no caso dos demais partidos ideológicos”.

Em relação a definições anteriormente propostas, o estudo do trio coloca ênfase no fisiologismo e no clientelismo eleitoral como traços definidores do Centrão. “Isso não quer dizer que os outros partidos não sejam clientelistas, mas é a somatória do clientelismo como prática eleitoral com o fisiologismo como prática legislativa que coloca o parlamentar do Centrão como um ente autônomo ao partido, seja ao angariar votos, seja ao representar”, dizem os pesquisadores.

“A questão é entender como o Centrão vai lidar com a consolidação da reforma política de 2017, que foi feita para dar mais poder nas mãos dos líderes partidários. A cláusula de barreira ficando mais alta (até 2030), os fundos ficando maiores. Existe um equilíbiro em que a gente ainda não chegou”, diz Mesquita.

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