Ex-araponga de bicheiro monta empresa de ‘inteligência’ e é recebido no Planalto e no Congresso


Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, esteve envolvido em alguns dos principais escândalos da política nacional na década passada e agora recicla ‘modus operandi’ para acessar gabinetes em nome de entidade; governo nega ter recorrido a serviços do espião condenado a 19 anos de cadeia que não quis dar entrevista

Por Vinícius Valfré e Gustavo Côrtes

BRASÍLIA – Um antigo agente do submundo do poder está de volta à plena atividade na capital federal. Conhecido por serviços de arapongagem prestados a empresários, políticos, policiais e ao PT nos idos dos anos 2000, Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, acaba de abrir uma empresa de inteligência em Brasília e circula por corredores do Palácio do Planalto e do Congresso.

As portas do poder só foram reabertas ao 3º sargento da reserva da Aeronáutica após a reascensão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em liberdade apesar de condenado a 19 anos de prisão, Dadá já foi recebido por integrantes da Casa Civil, da Secretaria de Relações Institucionais, da Secretaria-Geral e da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República.

O sargento da Aeronáutica Idalberto Matias de Araujo, o Dadá, trabalhava para o bicheiro Carlinhos Cachoeira e foi condenado a 19 anos de prisão; ele ainda recorre  Foto: Ed Ferreira/AE
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Aos 64 anos, ele também virou “habitué” de gabinetes da Câmara e do Senado e atua em sintonia com o deputado Vander Loubet (PT-MS). O sargento não quis dar entrevista. A Secom afirmou que a recepção ao sargento não serviu para tratar de serviços prestados por ele (leia mais abaixo).

Nas duas últimas décadas, Dadá se envolveu em escândalos que marcaram a política nacional. O principal deles foi consequência dos serviços prestados ao bicheiro Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, personagem que provocou um “terremoto” em Brasília depois de ser alvo da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, deflagrada em 2012.

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Dadá durante um dos depoimentos prestados à CPI dos Grampos, aberta no fim de 2008 Foto: André Dusek/Estadão

O serviço de espionagem, inclusive com grampos ilegais, colocou em Dadá a alcunha de “araponga do Cachoeira”, condição que ainda lhe rende revés judicial. O sargento foi condenado a 19 anos e três meses de prisão por crimes como corrupção ativa, organização criminosa e violação de sigilo funcional. Só ficou atrás das grades por 96 dias.

A volta aos serviços de inteligência, agora com um CNPJ, foi concretizada depois de ele ter sido beneficiado por uma decisão judicial. Em 28 de fevereiro, o ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), acolheu um pedido da defesa do sargento e determinou a devolução do processo dele ao primeiro grau da Justiça Federal em Goiás. A condenação não foi anulada, mas o juiz deverá refazer os cálculos da pena, o que não tem prazo para ocorrer. Quando a nova punição for apresentada, Dadá terá novamente todo o elevador processual para recursos, podendo retardar o cumprimento da pena.

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Em julho, foi a vez de Carlinhos Cachoeira ser beneficiado por decisão do ministro do STJ e ver a condenação voltar ao primeiro grau para recontagem da pena. A reportagem fez contato com uma das advogadas do empresário que disse que o consultaria, mas não deu retorno até o fechamento desta reportagem.

Questionado sobre eventuais medidas contra as decisões do STJ, o Ministério Público Federal de Goiás não se manifestou.

Na Operação Monte Carlo, a polícia desarticulou um esquema de corrupção e exploração de máquinas caça-níqueis e jogos de azar em Goiás e no Distrito Federal. A investigação avançou e apontou vínculos do esquema com políticos como o então senador Demóstenes Torres e com integrantes dos governos de Agnelo Queiroz (PT), no DF, e com o de Marconi Perillo (PSDB), no Goiás.

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Ao Estadão, Agnelo disse que Dadá, Cachoeira e o grupo criminoso tentaram lhe destruir. “Queriam desestabilizar o governo porque não tiveram acesso a negócios na coleta de lixo como anteriormente. Colocamos fiscalização rigorosa. Fui violentamente atacado por esse grupo criminoso. Felizmente, não vingou. A investigação da PF mostrou isso”, comentou.

Perillo afirmou que não conhece Dadá nem tem qualquer relação com a operação Monte Carlo.

O ‘modus operandi’ reeditado

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Hoje, Idalberto Araújo, o Dadá, peregrina por gabinetes usando um modus operandi semelhante ao que adotava na década passada: ele assume a liderança de uma discreta entidade de classe e, com uma pauta sindical debaixo do braço, fica respaldado para solicitar e ser recebido para as agendas.

Antes, era a Associação Brasileira dos Trabalhadores em Limpeza Urbana (Asbalurb). Hoje, ele responde pela Associação Nacional do Quadro Especial da Aeronáutica (Anquea), que diz representar 10,2 mil militares.

Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, é presidente da Associação Nacional do Quadro Especial da Aeronáutica desde dezembro; antes, era diretor da entidade Foto: @anquea_oficial via Instagram
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Com a entidade dos garis, ele intermediava, segundo a Polícia Federal, interesses do grupo de Carlinhos Cachoeira com o governo do DF por meio da empresa responsável pelo serviço de coleta de lixo. Havia indicação de pagamento de propina para integrantes do governo.

A premissa da Anquea, criada em 2017, é a de resgatar administrativamente uma promoção que sargentos do quadro especial da Força Aérea – entre os quais ele mesmo – não obtiveram há quarenta anos. O êxito do pleito poderia incrementar em mais ou menos R$ 3,5 mil os salários desses militares aposentados.

Dadá responde pela associação desde dezembro. De lá para cá, conseguiu assinaturas de deputados para a criação de uma Frente Parlamentar que ainda não saiu do papel. Se homologada, o presidente será o deputado Vander Loubet (PT-MS), que aceitou ser o “pai” da pauta na Câmara.

O petista disse que estava em campanha e não comentou.

A empresa de Dadá, a El Roi Inteligence, tem endereço registrado em um escritório de contabilidade na Asa Sul de Brasília e descreve como atuação central “atividades de vigilância e segurança privada”. Ela produz “relatórios de assessoramento” na área de inteligência e foi oficialmente aberta em julho. O Estadão apurou que ela tem clientes, mas não identificou quem são.

Policial da equipe de Paulo Pimenta recebeu araponga no Palácio

Apesar do histórico de araponga, Dadá foi ao Palácio do Planalto alegando tratar de pauta sindical. Um policial militar gaúcho que integra a equipe do ministro Paulo Pimenta, da Secom, recebeu Dadá para uma reunião de mais de uma hora, em outubro.

Ligado ao PT do Rio Grande do Sul, base de Pimenta, Delamar da Silva Jobim é gerente de projetos do Departamento de Articulação Institucional da Secretaria de Análise, Estratégia e Articulação da Secom. A versão do governo para a agenda é: a Anquea solicitou a agenda para “tratar sobre o Quadro Especial de Sargento da Aeronáutica”.

Mas por que uma entidade da Aeronáutica precisa discutir temas de interesse da classe com um funcionário da Secretaria de Comunicação? “O ministro também é deputado”, respondeu Delamar Jobim. Paulo Pimenta foi eleito deputado federal pelo PT do Rio Grande do Sul e nomeado ministro-chefe da Secom no início do governo por Lula.

Ex-procurador de Dirceu, dono de banco fake organizou agendas

Algumas das agendas no Palácio do Planalto e na Câmara foram viabilizadas por um outro personagem polêmico que vive na órbita do PT, o empresário Fernando Nascimento Silva Neto. A atuação dele por meio de um banco lastreado em documento falso do Tesouro Nacional foi revelada pelo Estadão.

Filiado ao PT, Fernando Neto é ex-procurador do ex-ministro José Dirceu e assumiu a frente do Atualbank, um “banco” não autorizado pelo Banco Central e ligado a um estelionatário do Mato Grosso. A empresa é alvo de uma investigação da Polícia Civil de São Paulo.

Dadá com o empresário petista Fernando Neto, dono de um "banco" investigado pela Polícia Civil de São Paulo, na Câmara dos Deputados, em junho de 2023 Foto: @anquea_oficial via Instagram

Ex-servidor do gabinete do deputado Paulo Guedes (PT-MG), Fernando Neto abriu para a associação de Dadá portas na Câmara e na Presidência da República. Eles estiveram, em janeiro, com Cândido Hilário, assessor da Secretaria-Geral da Presidência (SGP) ligado à Central Única dos Trabalhadores (CUT).

“Os movimentos sociais e associações me procuram. Eu nem sabia disso (do histórico de Dadá). Recebi como recebo muita gente. Não tenho relação pessoal com ele. Com o Fernando sim, que é meu amigo pessoal”, disse Hilário.

Casa Civil liberou acesso de militar, mas diz que não houve agenda

Dos quatro ministérios que funcionam no Palácio do Planalto e que receberam Dadá em 2023 e 2024, a Casa Civil, chefiada por Rui Costa, foi o único a dar uma versão distinta sobre a visita do araponga condenado no fim do ano passado. Em nota, disse apenas que “não foi identificado registro de agenda”.

Entretanto, os registros oficiais da portaria obtidos pelo Estadão – e detalhados no pedido de explicações feito à pasta – mostram que o acesso de Dadá ao Planalto foi liberado pela diretoria de gestão de pessoas da Casa Civil às 13h38 do dia 28 de setembro de 2023. O araponga só saiu do Planalto às 16h16.

Questionada sobre a contradição, a pasta afirmou que “mantemos a informação de que não foi identificada nenhuma agenda dessa pessoa com nenhum representante da Casa Civil”.

A Secretaria de Relações Institucionais informou que Idalberto foi recebido “em audiências com a Coordenadoria Especial de Acompanhamento Governamental como um dos representantes da Anquea”. A mesma informação foi apresentada pela Secom. A SGP não respondeu perguntas sobre o araponga condenado ou sobre os serviços prestados por ele. Disse apenas que o militar não esteve com o ministro.

Polêmicas com dossiê para campanha de Dilma e aliança com delegado

Além da Operação Monte Carlo, o sargento Dadá também apareceu em outras duas crises políticas. Em 2010, foi escalado para trabalhar na elaboração de um suposto dossiê para a campanha de Dilma Rousseff (PT) contra o então governador de São Paulo, José Serra, familiares e aliados dele.

O material seria usado na campanha eleitoral daquele ano. Em entrevista à Revista Veja, o delegado aposentado da PF Onésimo Sousa, a quem Dadá responderia, disse que o serviço também envolveria a identificação de um suposto petista sabotador dentro do núcleo de Dilma.

“Queriam que a gente identificasse a origem de vazamentos que estavam acontecendo dentro do comitê. Havia suspeita de que um dos coordenadores da campanha estaria sabotando o trabalho da equipe. Depois, queriam investigações sobre o governador José Serra (PSDB-SP) e sobre o deputado Marcelo Itagiba (PSDB-RJ). Era para levantar tudo, inclusive coisas pessoais”, disse.

Àquela altura, Dadá já tinha um longo currículo em serviços de inteligência. Foram mais de duas décadas no departamento de inteligência da Aeronáutica, como agente de campo. Um trabalho que lhe deu acessos e contatos que mais tarde fizeram dele um agente cobiçado em Brasília pelo submundo do poder.

Policiais federais do serviço oficial também recorriam aos préstimos do militar tanto para missões oficiais quanto para disputas internas. Dadá auxiliou, por exemplo, o então delegado Protógenes Queiroz na Operação Satiagraha, deflagrada em 2008, que mirou personagens como o banqueiro Daniel Dantas.

A condução dos trabalhos resultou na abertura de uma CPI contra o que foi classificado como proliferação de interceptações ilegais e mercado clandestino de espionagem. Dadá foi chamado duas vezes para prestar depoimentos e acabou indiciado por vazamento de informações sigilosas.

BRASÍLIA – Um antigo agente do submundo do poder está de volta à plena atividade na capital federal. Conhecido por serviços de arapongagem prestados a empresários, políticos, policiais e ao PT nos idos dos anos 2000, Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, acaba de abrir uma empresa de inteligência em Brasília e circula por corredores do Palácio do Planalto e do Congresso.

As portas do poder só foram reabertas ao 3º sargento da reserva da Aeronáutica após a reascensão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em liberdade apesar de condenado a 19 anos de prisão, Dadá já foi recebido por integrantes da Casa Civil, da Secretaria de Relações Institucionais, da Secretaria-Geral e da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República.

O sargento da Aeronáutica Idalberto Matias de Araujo, o Dadá, trabalhava para o bicheiro Carlinhos Cachoeira e foi condenado a 19 anos de prisão; ele ainda recorre  Foto: Ed Ferreira/AE

Aos 64 anos, ele também virou “habitué” de gabinetes da Câmara e do Senado e atua em sintonia com o deputado Vander Loubet (PT-MS). O sargento não quis dar entrevista. A Secom afirmou que a recepção ao sargento não serviu para tratar de serviços prestados por ele (leia mais abaixo).

Nas duas últimas décadas, Dadá se envolveu em escândalos que marcaram a política nacional. O principal deles foi consequência dos serviços prestados ao bicheiro Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, personagem que provocou um “terremoto” em Brasília depois de ser alvo da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, deflagrada em 2012.

Dadá durante um dos depoimentos prestados à CPI dos Grampos, aberta no fim de 2008 Foto: André Dusek/Estadão

O serviço de espionagem, inclusive com grampos ilegais, colocou em Dadá a alcunha de “araponga do Cachoeira”, condição que ainda lhe rende revés judicial. O sargento foi condenado a 19 anos e três meses de prisão por crimes como corrupção ativa, organização criminosa e violação de sigilo funcional. Só ficou atrás das grades por 96 dias.

A volta aos serviços de inteligência, agora com um CNPJ, foi concretizada depois de ele ter sido beneficiado por uma decisão judicial. Em 28 de fevereiro, o ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), acolheu um pedido da defesa do sargento e determinou a devolução do processo dele ao primeiro grau da Justiça Federal em Goiás. A condenação não foi anulada, mas o juiz deverá refazer os cálculos da pena, o que não tem prazo para ocorrer. Quando a nova punição for apresentada, Dadá terá novamente todo o elevador processual para recursos, podendo retardar o cumprimento da pena.

Em julho, foi a vez de Carlinhos Cachoeira ser beneficiado por decisão do ministro do STJ e ver a condenação voltar ao primeiro grau para recontagem da pena. A reportagem fez contato com uma das advogadas do empresário que disse que o consultaria, mas não deu retorno até o fechamento desta reportagem.

Questionado sobre eventuais medidas contra as decisões do STJ, o Ministério Público Federal de Goiás não se manifestou.

Na Operação Monte Carlo, a polícia desarticulou um esquema de corrupção e exploração de máquinas caça-níqueis e jogos de azar em Goiás e no Distrito Federal. A investigação avançou e apontou vínculos do esquema com políticos como o então senador Demóstenes Torres e com integrantes dos governos de Agnelo Queiroz (PT), no DF, e com o de Marconi Perillo (PSDB), no Goiás.

Ao Estadão, Agnelo disse que Dadá, Cachoeira e o grupo criminoso tentaram lhe destruir. “Queriam desestabilizar o governo porque não tiveram acesso a negócios na coleta de lixo como anteriormente. Colocamos fiscalização rigorosa. Fui violentamente atacado por esse grupo criminoso. Felizmente, não vingou. A investigação da PF mostrou isso”, comentou.

Perillo afirmou que não conhece Dadá nem tem qualquer relação com a operação Monte Carlo.

O ‘modus operandi’ reeditado

Hoje, Idalberto Araújo, o Dadá, peregrina por gabinetes usando um modus operandi semelhante ao que adotava na década passada: ele assume a liderança de uma discreta entidade de classe e, com uma pauta sindical debaixo do braço, fica respaldado para solicitar e ser recebido para as agendas.

Antes, era a Associação Brasileira dos Trabalhadores em Limpeza Urbana (Asbalurb). Hoje, ele responde pela Associação Nacional do Quadro Especial da Aeronáutica (Anquea), que diz representar 10,2 mil militares.

Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, é presidente da Associação Nacional do Quadro Especial da Aeronáutica desde dezembro; antes, era diretor da entidade Foto: @anquea_oficial via Instagram

Com a entidade dos garis, ele intermediava, segundo a Polícia Federal, interesses do grupo de Carlinhos Cachoeira com o governo do DF por meio da empresa responsável pelo serviço de coleta de lixo. Havia indicação de pagamento de propina para integrantes do governo.

A premissa da Anquea, criada em 2017, é a de resgatar administrativamente uma promoção que sargentos do quadro especial da Força Aérea – entre os quais ele mesmo – não obtiveram há quarenta anos. O êxito do pleito poderia incrementar em mais ou menos R$ 3,5 mil os salários desses militares aposentados.

Dadá responde pela associação desde dezembro. De lá para cá, conseguiu assinaturas de deputados para a criação de uma Frente Parlamentar que ainda não saiu do papel. Se homologada, o presidente será o deputado Vander Loubet (PT-MS), que aceitou ser o “pai” da pauta na Câmara.

O petista disse que estava em campanha e não comentou.

A empresa de Dadá, a El Roi Inteligence, tem endereço registrado em um escritório de contabilidade na Asa Sul de Brasília e descreve como atuação central “atividades de vigilância e segurança privada”. Ela produz “relatórios de assessoramento” na área de inteligência e foi oficialmente aberta em julho. O Estadão apurou que ela tem clientes, mas não identificou quem são.

Policial da equipe de Paulo Pimenta recebeu araponga no Palácio

Apesar do histórico de araponga, Dadá foi ao Palácio do Planalto alegando tratar de pauta sindical. Um policial militar gaúcho que integra a equipe do ministro Paulo Pimenta, da Secom, recebeu Dadá para uma reunião de mais de uma hora, em outubro.

Ligado ao PT do Rio Grande do Sul, base de Pimenta, Delamar da Silva Jobim é gerente de projetos do Departamento de Articulação Institucional da Secretaria de Análise, Estratégia e Articulação da Secom. A versão do governo para a agenda é: a Anquea solicitou a agenda para “tratar sobre o Quadro Especial de Sargento da Aeronáutica”.

Mas por que uma entidade da Aeronáutica precisa discutir temas de interesse da classe com um funcionário da Secretaria de Comunicação? “O ministro também é deputado”, respondeu Delamar Jobim. Paulo Pimenta foi eleito deputado federal pelo PT do Rio Grande do Sul e nomeado ministro-chefe da Secom no início do governo por Lula.

Ex-procurador de Dirceu, dono de banco fake organizou agendas

Algumas das agendas no Palácio do Planalto e na Câmara foram viabilizadas por um outro personagem polêmico que vive na órbita do PT, o empresário Fernando Nascimento Silva Neto. A atuação dele por meio de um banco lastreado em documento falso do Tesouro Nacional foi revelada pelo Estadão.

Filiado ao PT, Fernando Neto é ex-procurador do ex-ministro José Dirceu e assumiu a frente do Atualbank, um “banco” não autorizado pelo Banco Central e ligado a um estelionatário do Mato Grosso. A empresa é alvo de uma investigação da Polícia Civil de São Paulo.

Dadá com o empresário petista Fernando Neto, dono de um "banco" investigado pela Polícia Civil de São Paulo, na Câmara dos Deputados, em junho de 2023 Foto: @anquea_oficial via Instagram

Ex-servidor do gabinete do deputado Paulo Guedes (PT-MG), Fernando Neto abriu para a associação de Dadá portas na Câmara e na Presidência da República. Eles estiveram, em janeiro, com Cândido Hilário, assessor da Secretaria-Geral da Presidência (SGP) ligado à Central Única dos Trabalhadores (CUT).

“Os movimentos sociais e associações me procuram. Eu nem sabia disso (do histórico de Dadá). Recebi como recebo muita gente. Não tenho relação pessoal com ele. Com o Fernando sim, que é meu amigo pessoal”, disse Hilário.

Casa Civil liberou acesso de militar, mas diz que não houve agenda

Dos quatro ministérios que funcionam no Palácio do Planalto e que receberam Dadá em 2023 e 2024, a Casa Civil, chefiada por Rui Costa, foi o único a dar uma versão distinta sobre a visita do araponga condenado no fim do ano passado. Em nota, disse apenas que “não foi identificado registro de agenda”.

Entretanto, os registros oficiais da portaria obtidos pelo Estadão – e detalhados no pedido de explicações feito à pasta – mostram que o acesso de Dadá ao Planalto foi liberado pela diretoria de gestão de pessoas da Casa Civil às 13h38 do dia 28 de setembro de 2023. O araponga só saiu do Planalto às 16h16.

Questionada sobre a contradição, a pasta afirmou que “mantemos a informação de que não foi identificada nenhuma agenda dessa pessoa com nenhum representante da Casa Civil”.

A Secretaria de Relações Institucionais informou que Idalberto foi recebido “em audiências com a Coordenadoria Especial de Acompanhamento Governamental como um dos representantes da Anquea”. A mesma informação foi apresentada pela Secom. A SGP não respondeu perguntas sobre o araponga condenado ou sobre os serviços prestados por ele. Disse apenas que o militar não esteve com o ministro.

Polêmicas com dossiê para campanha de Dilma e aliança com delegado

Além da Operação Monte Carlo, o sargento Dadá também apareceu em outras duas crises políticas. Em 2010, foi escalado para trabalhar na elaboração de um suposto dossiê para a campanha de Dilma Rousseff (PT) contra o então governador de São Paulo, José Serra, familiares e aliados dele.

O material seria usado na campanha eleitoral daquele ano. Em entrevista à Revista Veja, o delegado aposentado da PF Onésimo Sousa, a quem Dadá responderia, disse que o serviço também envolveria a identificação de um suposto petista sabotador dentro do núcleo de Dilma.

“Queriam que a gente identificasse a origem de vazamentos que estavam acontecendo dentro do comitê. Havia suspeita de que um dos coordenadores da campanha estaria sabotando o trabalho da equipe. Depois, queriam investigações sobre o governador José Serra (PSDB-SP) e sobre o deputado Marcelo Itagiba (PSDB-RJ). Era para levantar tudo, inclusive coisas pessoais”, disse.

Àquela altura, Dadá já tinha um longo currículo em serviços de inteligência. Foram mais de duas décadas no departamento de inteligência da Aeronáutica, como agente de campo. Um trabalho que lhe deu acessos e contatos que mais tarde fizeram dele um agente cobiçado em Brasília pelo submundo do poder.

Policiais federais do serviço oficial também recorriam aos préstimos do militar tanto para missões oficiais quanto para disputas internas. Dadá auxiliou, por exemplo, o então delegado Protógenes Queiroz na Operação Satiagraha, deflagrada em 2008, que mirou personagens como o banqueiro Daniel Dantas.

A condução dos trabalhos resultou na abertura de uma CPI contra o que foi classificado como proliferação de interceptações ilegais e mercado clandestino de espionagem. Dadá foi chamado duas vezes para prestar depoimentos e acabou indiciado por vazamento de informações sigilosas.

BRASÍLIA – Um antigo agente do submundo do poder está de volta à plena atividade na capital federal. Conhecido por serviços de arapongagem prestados a empresários, políticos, policiais e ao PT nos idos dos anos 2000, Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, acaba de abrir uma empresa de inteligência em Brasília e circula por corredores do Palácio do Planalto e do Congresso.

As portas do poder só foram reabertas ao 3º sargento da reserva da Aeronáutica após a reascensão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em liberdade apesar de condenado a 19 anos de prisão, Dadá já foi recebido por integrantes da Casa Civil, da Secretaria de Relações Institucionais, da Secretaria-Geral e da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República.

O sargento da Aeronáutica Idalberto Matias de Araujo, o Dadá, trabalhava para o bicheiro Carlinhos Cachoeira e foi condenado a 19 anos de prisão; ele ainda recorre  Foto: Ed Ferreira/AE

Aos 64 anos, ele também virou “habitué” de gabinetes da Câmara e do Senado e atua em sintonia com o deputado Vander Loubet (PT-MS). O sargento não quis dar entrevista. A Secom afirmou que a recepção ao sargento não serviu para tratar de serviços prestados por ele (leia mais abaixo).

Nas duas últimas décadas, Dadá se envolveu em escândalos que marcaram a política nacional. O principal deles foi consequência dos serviços prestados ao bicheiro Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, personagem que provocou um “terremoto” em Brasília depois de ser alvo da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, deflagrada em 2012.

Dadá durante um dos depoimentos prestados à CPI dos Grampos, aberta no fim de 2008 Foto: André Dusek/Estadão

O serviço de espionagem, inclusive com grampos ilegais, colocou em Dadá a alcunha de “araponga do Cachoeira”, condição que ainda lhe rende revés judicial. O sargento foi condenado a 19 anos e três meses de prisão por crimes como corrupção ativa, organização criminosa e violação de sigilo funcional. Só ficou atrás das grades por 96 dias.

A volta aos serviços de inteligência, agora com um CNPJ, foi concretizada depois de ele ter sido beneficiado por uma decisão judicial. Em 28 de fevereiro, o ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), acolheu um pedido da defesa do sargento e determinou a devolução do processo dele ao primeiro grau da Justiça Federal em Goiás. A condenação não foi anulada, mas o juiz deverá refazer os cálculos da pena, o que não tem prazo para ocorrer. Quando a nova punição for apresentada, Dadá terá novamente todo o elevador processual para recursos, podendo retardar o cumprimento da pena.

Em julho, foi a vez de Carlinhos Cachoeira ser beneficiado por decisão do ministro do STJ e ver a condenação voltar ao primeiro grau para recontagem da pena. A reportagem fez contato com uma das advogadas do empresário que disse que o consultaria, mas não deu retorno até o fechamento desta reportagem.

Questionado sobre eventuais medidas contra as decisões do STJ, o Ministério Público Federal de Goiás não se manifestou.

Na Operação Monte Carlo, a polícia desarticulou um esquema de corrupção e exploração de máquinas caça-níqueis e jogos de azar em Goiás e no Distrito Federal. A investigação avançou e apontou vínculos do esquema com políticos como o então senador Demóstenes Torres e com integrantes dos governos de Agnelo Queiroz (PT), no DF, e com o de Marconi Perillo (PSDB), no Goiás.

Ao Estadão, Agnelo disse que Dadá, Cachoeira e o grupo criminoso tentaram lhe destruir. “Queriam desestabilizar o governo porque não tiveram acesso a negócios na coleta de lixo como anteriormente. Colocamos fiscalização rigorosa. Fui violentamente atacado por esse grupo criminoso. Felizmente, não vingou. A investigação da PF mostrou isso”, comentou.

Perillo afirmou que não conhece Dadá nem tem qualquer relação com a operação Monte Carlo.

O ‘modus operandi’ reeditado

Hoje, Idalberto Araújo, o Dadá, peregrina por gabinetes usando um modus operandi semelhante ao que adotava na década passada: ele assume a liderança de uma discreta entidade de classe e, com uma pauta sindical debaixo do braço, fica respaldado para solicitar e ser recebido para as agendas.

Antes, era a Associação Brasileira dos Trabalhadores em Limpeza Urbana (Asbalurb). Hoje, ele responde pela Associação Nacional do Quadro Especial da Aeronáutica (Anquea), que diz representar 10,2 mil militares.

Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, é presidente da Associação Nacional do Quadro Especial da Aeronáutica desde dezembro; antes, era diretor da entidade Foto: @anquea_oficial via Instagram

Com a entidade dos garis, ele intermediava, segundo a Polícia Federal, interesses do grupo de Carlinhos Cachoeira com o governo do DF por meio da empresa responsável pelo serviço de coleta de lixo. Havia indicação de pagamento de propina para integrantes do governo.

A premissa da Anquea, criada em 2017, é a de resgatar administrativamente uma promoção que sargentos do quadro especial da Força Aérea – entre os quais ele mesmo – não obtiveram há quarenta anos. O êxito do pleito poderia incrementar em mais ou menos R$ 3,5 mil os salários desses militares aposentados.

Dadá responde pela associação desde dezembro. De lá para cá, conseguiu assinaturas de deputados para a criação de uma Frente Parlamentar que ainda não saiu do papel. Se homologada, o presidente será o deputado Vander Loubet (PT-MS), que aceitou ser o “pai” da pauta na Câmara.

O petista disse que estava em campanha e não comentou.

A empresa de Dadá, a El Roi Inteligence, tem endereço registrado em um escritório de contabilidade na Asa Sul de Brasília e descreve como atuação central “atividades de vigilância e segurança privada”. Ela produz “relatórios de assessoramento” na área de inteligência e foi oficialmente aberta em julho. O Estadão apurou que ela tem clientes, mas não identificou quem são.

Policial da equipe de Paulo Pimenta recebeu araponga no Palácio

Apesar do histórico de araponga, Dadá foi ao Palácio do Planalto alegando tratar de pauta sindical. Um policial militar gaúcho que integra a equipe do ministro Paulo Pimenta, da Secom, recebeu Dadá para uma reunião de mais de uma hora, em outubro.

Ligado ao PT do Rio Grande do Sul, base de Pimenta, Delamar da Silva Jobim é gerente de projetos do Departamento de Articulação Institucional da Secretaria de Análise, Estratégia e Articulação da Secom. A versão do governo para a agenda é: a Anquea solicitou a agenda para “tratar sobre o Quadro Especial de Sargento da Aeronáutica”.

Mas por que uma entidade da Aeronáutica precisa discutir temas de interesse da classe com um funcionário da Secretaria de Comunicação? “O ministro também é deputado”, respondeu Delamar Jobim. Paulo Pimenta foi eleito deputado federal pelo PT do Rio Grande do Sul e nomeado ministro-chefe da Secom no início do governo por Lula.

Ex-procurador de Dirceu, dono de banco fake organizou agendas

Algumas das agendas no Palácio do Planalto e na Câmara foram viabilizadas por um outro personagem polêmico que vive na órbita do PT, o empresário Fernando Nascimento Silva Neto. A atuação dele por meio de um banco lastreado em documento falso do Tesouro Nacional foi revelada pelo Estadão.

Filiado ao PT, Fernando Neto é ex-procurador do ex-ministro José Dirceu e assumiu a frente do Atualbank, um “banco” não autorizado pelo Banco Central e ligado a um estelionatário do Mato Grosso. A empresa é alvo de uma investigação da Polícia Civil de São Paulo.

Dadá com o empresário petista Fernando Neto, dono de um "banco" investigado pela Polícia Civil de São Paulo, na Câmara dos Deputados, em junho de 2023 Foto: @anquea_oficial via Instagram

Ex-servidor do gabinete do deputado Paulo Guedes (PT-MG), Fernando Neto abriu para a associação de Dadá portas na Câmara e na Presidência da República. Eles estiveram, em janeiro, com Cândido Hilário, assessor da Secretaria-Geral da Presidência (SGP) ligado à Central Única dos Trabalhadores (CUT).

“Os movimentos sociais e associações me procuram. Eu nem sabia disso (do histórico de Dadá). Recebi como recebo muita gente. Não tenho relação pessoal com ele. Com o Fernando sim, que é meu amigo pessoal”, disse Hilário.

Casa Civil liberou acesso de militar, mas diz que não houve agenda

Dos quatro ministérios que funcionam no Palácio do Planalto e que receberam Dadá em 2023 e 2024, a Casa Civil, chefiada por Rui Costa, foi o único a dar uma versão distinta sobre a visita do araponga condenado no fim do ano passado. Em nota, disse apenas que “não foi identificado registro de agenda”.

Entretanto, os registros oficiais da portaria obtidos pelo Estadão – e detalhados no pedido de explicações feito à pasta – mostram que o acesso de Dadá ao Planalto foi liberado pela diretoria de gestão de pessoas da Casa Civil às 13h38 do dia 28 de setembro de 2023. O araponga só saiu do Planalto às 16h16.

Questionada sobre a contradição, a pasta afirmou que “mantemos a informação de que não foi identificada nenhuma agenda dessa pessoa com nenhum representante da Casa Civil”.

A Secretaria de Relações Institucionais informou que Idalberto foi recebido “em audiências com a Coordenadoria Especial de Acompanhamento Governamental como um dos representantes da Anquea”. A mesma informação foi apresentada pela Secom. A SGP não respondeu perguntas sobre o araponga condenado ou sobre os serviços prestados por ele. Disse apenas que o militar não esteve com o ministro.

Polêmicas com dossiê para campanha de Dilma e aliança com delegado

Além da Operação Monte Carlo, o sargento Dadá também apareceu em outras duas crises políticas. Em 2010, foi escalado para trabalhar na elaboração de um suposto dossiê para a campanha de Dilma Rousseff (PT) contra o então governador de São Paulo, José Serra, familiares e aliados dele.

O material seria usado na campanha eleitoral daquele ano. Em entrevista à Revista Veja, o delegado aposentado da PF Onésimo Sousa, a quem Dadá responderia, disse que o serviço também envolveria a identificação de um suposto petista sabotador dentro do núcleo de Dilma.

“Queriam que a gente identificasse a origem de vazamentos que estavam acontecendo dentro do comitê. Havia suspeita de que um dos coordenadores da campanha estaria sabotando o trabalho da equipe. Depois, queriam investigações sobre o governador José Serra (PSDB-SP) e sobre o deputado Marcelo Itagiba (PSDB-RJ). Era para levantar tudo, inclusive coisas pessoais”, disse.

Àquela altura, Dadá já tinha um longo currículo em serviços de inteligência. Foram mais de duas décadas no departamento de inteligência da Aeronáutica, como agente de campo. Um trabalho que lhe deu acessos e contatos que mais tarde fizeram dele um agente cobiçado em Brasília pelo submundo do poder.

Policiais federais do serviço oficial também recorriam aos préstimos do militar tanto para missões oficiais quanto para disputas internas. Dadá auxiliou, por exemplo, o então delegado Protógenes Queiroz na Operação Satiagraha, deflagrada em 2008, que mirou personagens como o banqueiro Daniel Dantas.

A condução dos trabalhos resultou na abertura de uma CPI contra o que foi classificado como proliferação de interceptações ilegais e mercado clandestino de espionagem. Dadá foi chamado duas vezes para prestar depoimentos e acabou indiciado por vazamento de informações sigilosas.

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