Disputas de poder e o debate político-cultural brasileiro

Opinião|A maior ameaça ao governo Lula segue sendo o PT


O incrível é que tudo que os petistas pregam em economia já foi testado na gestão Dilma Rousseff e o resultado todo mundo sentiu na pele a partir de 2015

Por Fabiano Lana

O que ameaça o governo Lula não é exatamente o orçamento impositivo, os planos maquiavélicos de Elon Musk para interferir nas eleições e nem mesmo as ambições da tal “extrema-direita” bolsonarista. O que tem potencial de arruinar a gestão são as ideias e intenções do Partido dos Trabalhadores. Se depender do PT, o arcabouço fiscal atual deve ser abandonado, os juros devem ser baixados na marra, as reformas para controlar o contínuo aumento de gastos do governo não são necessárias, e, de quebra, devemos abraçar o ditador Nicolás Maduro como legítimo presidente da vizinha Venezuela, o que faz desconfiarmos de seu compromisso democrático.

“Entre mexer na vinculação do salário mínimo e mudar o arcabouço, tem de mudar o arcabouço. Simples assim”, afirmou a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann, à repórter Vera Rosa, do Estadão. “A economia só está crescendo por causa da renda, alavancada pelo Estado brasileiro”, continuou a presidente, que citou o aumento do Bolsa Família e a desoneração do Imposto de Renda para quem ganha dois salários mínimos como exemplos de ações que impulsionam o desenvolvimento.

O presidente Lula e a presidente do PT Gleisi Hoffmann. Foto: André Duzek/Estadão Foto: Estadão
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O raciocínio da dirigente partidária pode indicar uma preocupação com a área social, em tese tão cara ao petismo. Mas, na prática, significa um desconhecimento de como funciona a economia e, mais grave, dos limites e barreiras dos processos econômicos. O problema é que esse tipo de visão, no longo prazo, costuma ter efeito contrário ao pretendido.

Gleisi representa um quase-dogma do petismo que vê o Estado como uma espécie de fonte infinita de recursos – numa certa reminiscência de um mundo pré-queda do Muro de Berlim, ou, para ser mais condescendente, nostálgica dos tempos em que o keynesianismo era uma solução sem efeitos colaterais inflacionários. O partido não costuma olhar muito para o outro lado: quem financia o Estado. Numa cabeça standart do petismo, vale girar cada vez mais o parafuso em busca do último centavo da sociedade para que o Estado possa prover a todos. O outro lado da moeda é uma carga tributária que pode asfixiar setores que querem de fato investir para gerar empregos.

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Além disso, parece haver pouca preocupação com equilíbrio das finanças. Mas não respeitar o arcabouço fiscal, como quer o petismo, significa aumentar a dívida pública. A decorrência é crescimento da desconfiança do mercado e a subida dos juros. Como resposta a esse efeito, o PT quer que o Banco Central deixe de ser independente para que possa segurar as taxas de maneira artificial. Daí que o discurso de ódio contra o presidente atual do BC, Roberto Campos Neto, tem raízes mais profundas do que uma diatribe política.

Muitas vezes os acontecimentos têm causas, não culpas. Nisso entra a necessidade de certas reformas, como a da Previdência. A cada ano os brasileiros têm tido menos filhos e vivido mais. A rápida mudança demográfica brasileira, portanto, tem como consequência menos gente para contribuir para o INSS e mais pessoas para receber aposentadorias. Solução petista: negar a existência da aritmética e adjetivar tais reformas como neoliberais, etc. Enfim, se confiar na matemática é ser neoliberal, melhor abraçar a tentativa de injúria com orgulho.

Bom, o incrível é que tudo isso que o PT prega já foi testado na gestão Dilma Rousseff. O resultado todo mundo sentiu na pele a partir de 2015: volta da inflação para dois dígitos, subida fortíssima das taxas do desemprego, volta do déficit colossal, quebra da confiança dos agentes econômicos, rebelião política e impeachment. Um comentário em vão: o influencer Lucas Neto, que provavelmente tem dificuldades de ler gráficos, deu a entender em postagem - uma pequena fake news - que esse processo começou em 2016, com o PT fora do poder. Mas isso tem mais a ver com uma sociedade que resolveu dar tanta importância para influencers e coachs do que buscar entender os acontecimentos econômicos.

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Na mitologia petista, a crise de 2015 foi de responsabilidade da Lava-Jato, do Departamento de Estado Americano (mais fake news...), do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, da seca, do candidato derrotado Aécio Neves. Infelizmente nem todos eles, mesmo agindo em conjunto, não teriam o poder de provocar uma recessão que fez o país decair quase 8% do Produto Interno Bruto em apenas dois anos. Ah, antes que nos esqueçamos: nas quimeras petistas a Venezuela é uma democracia e a maior responsabilidade pela crise por lá são as sanções “estadunidenses”. Enfim, não erram nunca e o culpado é sempre um outro, externo, a ser nomeado.

Enfim, muitas vezes o esforço da política é fazer prevalecer a sua versão e o PT faz esse jogo até mesmo com alguma eficiência. O problema é que existe o mundo real, a economia real, acima dos discursos políticos. E, no caso, as ideias do petismo são bastante perigosas para os brasileiros. Lula e o ministro da Fazenda Fernando Haddad que tentem controlar os próprios amigos – mais letais do que os inimigos neste momento em que o golpismo, esperemos que definitivamente, já está debelado.

O que ameaça o governo Lula não é exatamente o orçamento impositivo, os planos maquiavélicos de Elon Musk para interferir nas eleições e nem mesmo as ambições da tal “extrema-direita” bolsonarista. O que tem potencial de arruinar a gestão são as ideias e intenções do Partido dos Trabalhadores. Se depender do PT, o arcabouço fiscal atual deve ser abandonado, os juros devem ser baixados na marra, as reformas para controlar o contínuo aumento de gastos do governo não são necessárias, e, de quebra, devemos abraçar o ditador Nicolás Maduro como legítimo presidente da vizinha Venezuela, o que faz desconfiarmos de seu compromisso democrático.

“Entre mexer na vinculação do salário mínimo e mudar o arcabouço, tem de mudar o arcabouço. Simples assim”, afirmou a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann, à repórter Vera Rosa, do Estadão. “A economia só está crescendo por causa da renda, alavancada pelo Estado brasileiro”, continuou a presidente, que citou o aumento do Bolsa Família e a desoneração do Imposto de Renda para quem ganha dois salários mínimos como exemplos de ações que impulsionam o desenvolvimento.

O presidente Lula e a presidente do PT Gleisi Hoffmann. Foto: André Duzek/Estadão Foto: Estadão

O raciocínio da dirigente partidária pode indicar uma preocupação com a área social, em tese tão cara ao petismo. Mas, na prática, significa um desconhecimento de como funciona a economia e, mais grave, dos limites e barreiras dos processos econômicos. O problema é que esse tipo de visão, no longo prazo, costuma ter efeito contrário ao pretendido.

Gleisi representa um quase-dogma do petismo que vê o Estado como uma espécie de fonte infinita de recursos – numa certa reminiscência de um mundo pré-queda do Muro de Berlim, ou, para ser mais condescendente, nostálgica dos tempos em que o keynesianismo era uma solução sem efeitos colaterais inflacionários. O partido não costuma olhar muito para o outro lado: quem financia o Estado. Numa cabeça standart do petismo, vale girar cada vez mais o parafuso em busca do último centavo da sociedade para que o Estado possa prover a todos. O outro lado da moeda é uma carga tributária que pode asfixiar setores que querem de fato investir para gerar empregos.

Além disso, parece haver pouca preocupação com equilíbrio das finanças. Mas não respeitar o arcabouço fiscal, como quer o petismo, significa aumentar a dívida pública. A decorrência é crescimento da desconfiança do mercado e a subida dos juros. Como resposta a esse efeito, o PT quer que o Banco Central deixe de ser independente para que possa segurar as taxas de maneira artificial. Daí que o discurso de ódio contra o presidente atual do BC, Roberto Campos Neto, tem raízes mais profundas do que uma diatribe política.

Muitas vezes os acontecimentos têm causas, não culpas. Nisso entra a necessidade de certas reformas, como a da Previdência. A cada ano os brasileiros têm tido menos filhos e vivido mais. A rápida mudança demográfica brasileira, portanto, tem como consequência menos gente para contribuir para o INSS e mais pessoas para receber aposentadorias. Solução petista: negar a existência da aritmética e adjetivar tais reformas como neoliberais, etc. Enfim, se confiar na matemática é ser neoliberal, melhor abraçar a tentativa de injúria com orgulho.

Bom, o incrível é que tudo isso que o PT prega já foi testado na gestão Dilma Rousseff. O resultado todo mundo sentiu na pele a partir de 2015: volta da inflação para dois dígitos, subida fortíssima das taxas do desemprego, volta do déficit colossal, quebra da confiança dos agentes econômicos, rebelião política e impeachment. Um comentário em vão: o influencer Lucas Neto, que provavelmente tem dificuldades de ler gráficos, deu a entender em postagem - uma pequena fake news - que esse processo começou em 2016, com o PT fora do poder. Mas isso tem mais a ver com uma sociedade que resolveu dar tanta importância para influencers e coachs do que buscar entender os acontecimentos econômicos.

Na mitologia petista, a crise de 2015 foi de responsabilidade da Lava-Jato, do Departamento de Estado Americano (mais fake news...), do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, da seca, do candidato derrotado Aécio Neves. Infelizmente nem todos eles, mesmo agindo em conjunto, não teriam o poder de provocar uma recessão que fez o país decair quase 8% do Produto Interno Bruto em apenas dois anos. Ah, antes que nos esqueçamos: nas quimeras petistas a Venezuela é uma democracia e a maior responsabilidade pela crise por lá são as sanções “estadunidenses”. Enfim, não erram nunca e o culpado é sempre um outro, externo, a ser nomeado.

Enfim, muitas vezes o esforço da política é fazer prevalecer a sua versão e o PT faz esse jogo até mesmo com alguma eficiência. O problema é que existe o mundo real, a economia real, acima dos discursos políticos. E, no caso, as ideias do petismo são bastante perigosas para os brasileiros. Lula e o ministro da Fazenda Fernando Haddad que tentem controlar os próprios amigos – mais letais do que os inimigos neste momento em que o golpismo, esperemos que definitivamente, já está debelado.

O que ameaça o governo Lula não é exatamente o orçamento impositivo, os planos maquiavélicos de Elon Musk para interferir nas eleições e nem mesmo as ambições da tal “extrema-direita” bolsonarista. O que tem potencial de arruinar a gestão são as ideias e intenções do Partido dos Trabalhadores. Se depender do PT, o arcabouço fiscal atual deve ser abandonado, os juros devem ser baixados na marra, as reformas para controlar o contínuo aumento de gastos do governo não são necessárias, e, de quebra, devemos abraçar o ditador Nicolás Maduro como legítimo presidente da vizinha Venezuela, o que faz desconfiarmos de seu compromisso democrático.

“Entre mexer na vinculação do salário mínimo e mudar o arcabouço, tem de mudar o arcabouço. Simples assim”, afirmou a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann, à repórter Vera Rosa, do Estadão. “A economia só está crescendo por causa da renda, alavancada pelo Estado brasileiro”, continuou a presidente, que citou o aumento do Bolsa Família e a desoneração do Imposto de Renda para quem ganha dois salários mínimos como exemplos de ações que impulsionam o desenvolvimento.

O presidente Lula e a presidente do PT Gleisi Hoffmann. Foto: André Duzek/Estadão Foto: Estadão

O raciocínio da dirigente partidária pode indicar uma preocupação com a área social, em tese tão cara ao petismo. Mas, na prática, significa um desconhecimento de como funciona a economia e, mais grave, dos limites e barreiras dos processos econômicos. O problema é que esse tipo de visão, no longo prazo, costuma ter efeito contrário ao pretendido.

Gleisi representa um quase-dogma do petismo que vê o Estado como uma espécie de fonte infinita de recursos – numa certa reminiscência de um mundo pré-queda do Muro de Berlim, ou, para ser mais condescendente, nostálgica dos tempos em que o keynesianismo era uma solução sem efeitos colaterais inflacionários. O partido não costuma olhar muito para o outro lado: quem financia o Estado. Numa cabeça standart do petismo, vale girar cada vez mais o parafuso em busca do último centavo da sociedade para que o Estado possa prover a todos. O outro lado da moeda é uma carga tributária que pode asfixiar setores que querem de fato investir para gerar empregos.

Além disso, parece haver pouca preocupação com equilíbrio das finanças. Mas não respeitar o arcabouço fiscal, como quer o petismo, significa aumentar a dívida pública. A decorrência é crescimento da desconfiança do mercado e a subida dos juros. Como resposta a esse efeito, o PT quer que o Banco Central deixe de ser independente para que possa segurar as taxas de maneira artificial. Daí que o discurso de ódio contra o presidente atual do BC, Roberto Campos Neto, tem raízes mais profundas do que uma diatribe política.

Muitas vezes os acontecimentos têm causas, não culpas. Nisso entra a necessidade de certas reformas, como a da Previdência. A cada ano os brasileiros têm tido menos filhos e vivido mais. A rápida mudança demográfica brasileira, portanto, tem como consequência menos gente para contribuir para o INSS e mais pessoas para receber aposentadorias. Solução petista: negar a existência da aritmética e adjetivar tais reformas como neoliberais, etc. Enfim, se confiar na matemática é ser neoliberal, melhor abraçar a tentativa de injúria com orgulho.

Bom, o incrível é que tudo isso que o PT prega já foi testado na gestão Dilma Rousseff. O resultado todo mundo sentiu na pele a partir de 2015: volta da inflação para dois dígitos, subida fortíssima das taxas do desemprego, volta do déficit colossal, quebra da confiança dos agentes econômicos, rebelião política e impeachment. Um comentário em vão: o influencer Lucas Neto, que provavelmente tem dificuldades de ler gráficos, deu a entender em postagem - uma pequena fake news - que esse processo começou em 2016, com o PT fora do poder. Mas isso tem mais a ver com uma sociedade que resolveu dar tanta importância para influencers e coachs do que buscar entender os acontecimentos econômicos.

Na mitologia petista, a crise de 2015 foi de responsabilidade da Lava-Jato, do Departamento de Estado Americano (mais fake news...), do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, da seca, do candidato derrotado Aécio Neves. Infelizmente nem todos eles, mesmo agindo em conjunto, não teriam o poder de provocar uma recessão que fez o país decair quase 8% do Produto Interno Bruto em apenas dois anos. Ah, antes que nos esqueçamos: nas quimeras petistas a Venezuela é uma democracia e a maior responsabilidade pela crise por lá são as sanções “estadunidenses”. Enfim, não erram nunca e o culpado é sempre um outro, externo, a ser nomeado.

Enfim, muitas vezes o esforço da política é fazer prevalecer a sua versão e o PT faz esse jogo até mesmo com alguma eficiência. O problema é que existe o mundo real, a economia real, acima dos discursos políticos. E, no caso, as ideias do petismo são bastante perigosas para os brasileiros. Lula e o ministro da Fazenda Fernando Haddad que tentem controlar os próprios amigos – mais letais do que os inimigos neste momento em que o golpismo, esperemos que definitivamente, já está debelado.

Opinião por Fabiano Lana

Fabiano Lana é formado em Comunicação Social pela UFMG e em Filosofia pela UnB, onde também tem mestrado na área. Foi repórter do Jornal do Brasil, entre outros veículos. Atua como consultor de comunicação. É autor do livro “Riobaldo agarra sua morte”, em que discute interseções entre jornalismo, política e ética.

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