Disputas de poder e o debate político-cultural brasileiro

Opinião|Madonna vale 40 Lulas e muito mais do que Bolsonaro


Talvez esteja na hora de a chamada esquerda refletir sobre os motivos pelos quais perdeu o domínio das ruas

Por Fabiano Lana

Saiu o número cabalístico de quantas pessoas presenciaram o presidente Lula no ato do 1º de Maio em Itaquera: 1.635 participantes, segundo o Monitor do Debate Político da Universidade de São Paulo (USP). Esperava-se em torno de 50 mil pessoas.

Sabemos que o evento obteve R$ 3 milhões da Petrobras e outros R$ 250 mil via Lei Rouanet. Fazendo-se as contas, chega-se a um número assombroso: gastou-se R$ 1.998,76, para cada pessoa que resolveu ir até o estacionamento do estádio do Corinthians naquele dia ensolarado para ouvir Lula pedir votos ilegalmente ao candidato do PSOL à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos, fora reclamar da falta de gente.

Ato das centrais sindicais com a presença de Lula e de ministros levou apenas 1.635 pessoas ao estacionamento do estádio do Corinthians, no 1º de Maio Foto: Taba Benedicto/Estadão
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Esta semana também teremos uma apresentação da cantora americana Madonna, de hits como Material Girl, que dominaram as pistas por tantos anos. A estimativa é que a apresentação custe ao todo R$ 50 milhões, também em parte custeada com dinheiro público. Estão previstas 1,5 milhão de pessoas nas areias de Copacabana na noite desse sábado. Podemos ser mais conservadores e falar em 1 milhão na audiência. O valor então ficaria em torno de R$ 50,00 por pessoa. Do ponto de vista apenas financeiro, deixando-se de lado a questão do entretenimento ou da política, Madonna valeria em torno de 40 Lulas.

Comparações despropositadas à parte, talvez esteja na hora de a chamada esquerda refletir sobre os motivos pelos quais perdeu o domínio das ruas. A melancolia é maior porque Lula é o homem das multidões das greves do ABC no final dos anos 70 e o PT foi bastante ativo nos movimentos de rua que pediam eleições diretas para presidente, há 40 anos. Desde então, era o partido das manifestações populares. Até 2013, imaginava-se que a direita brasileira havia perdido as ruas definitivamente, mas houve um renascimento.

A popularidade do presidente atual talvez seja equivalente ao seu antípoda político, Jair Bolsonaro, já que ambos dividiram os votos presidenciais de maneira quase unânime em 2022. Mas apenas um deles tem conseguido atrair multidões. Várias hipóteses estão na mesa. Uma delas, que deve ser aprofundada, seria que a esquerda deixou de ter um discurso universal. Fala apenas para grupos específicos, por exemplo, ao lidar com questões como raça ou gênero. Não possui, e isso não se limita ao Brasil, alguma ideia genérica o bastante para levar o povo às praças. O discurso do combate à pobreza e pela prosperidade econômica como guia não parece estar mais em primeiro lugar frente às pautas de grupos minoritários.

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Goste-se ou não, a direita bolsonarista possui um identitarismo mais amplo ao apelar para noções de pátria, Deus ou família. São atavismos que permanecem nas pessoas apesar de todos os esforços ditos iluministas de pensadores que sonhavam com um dia pelo qual apenas a pura razão iria guiar as decisões das pessoas. As imagens quase diárias de Bolsonaro sendo saudado por centenas em diversos locais do Brasil fazem tremer os que ainda colocam fé no iluminismo. Bolsonaristas atuantes são pessoas que se movem pela paixão que parece alimentar as seitas.

Estrutura para receber o show de Madonna, que tem público estimado em 1,5 milhão de pessoas no show deste sábado Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Podemos também voar um pouco mais baixo para descobrir as razões do fracasso do 1º de Maio. Desde a aprovação da reforma trabalhista, sindicatos hoje possuem menos poder de mobilização. Sem imposto sindical faltam recursos para transportes, infraestrutura e lanches. Também estão desconectados com trabalhadores que preferem se vincular a um aplicativo do que possuir uma carteira de trabalho. Além disso, falta o calor passional que os adversários à direita carregam, com seus discursos indignados e supremacia no mundo digital.

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Quanto ao centro democrático, que se pensa caudatário do iluminismo, melhor, neste momento, não marcar eventos nem mesmo no salão de festa do condomínio. O espírito do tempo parece pedir certa histeria e irreflexão. Quem só quer saber de dados e argumentos não irá a lugar algum.

Mas certa está, talvez, a multidão que vai às areias de Copacabana assistir a uma estrela da música pop. No sentido de que preferem se divertir do que serem manipulados por políticos populistas, mesmo que sejam de visões ideológicas antagônicas. Nesse sentido, sim, Madonna vale cerca de 40 Lulas e certamente muitas vezes mais do que Bolsonaro, nesse caso numa conta financeira que ainda precisa ser feita.

Saiu o número cabalístico de quantas pessoas presenciaram o presidente Lula no ato do 1º de Maio em Itaquera: 1.635 participantes, segundo o Monitor do Debate Político da Universidade de São Paulo (USP). Esperava-se em torno de 50 mil pessoas.

Sabemos que o evento obteve R$ 3 milhões da Petrobras e outros R$ 250 mil via Lei Rouanet. Fazendo-se as contas, chega-se a um número assombroso: gastou-se R$ 1.998,76, para cada pessoa que resolveu ir até o estacionamento do estádio do Corinthians naquele dia ensolarado para ouvir Lula pedir votos ilegalmente ao candidato do PSOL à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos, fora reclamar da falta de gente.

Ato das centrais sindicais com a presença de Lula e de ministros levou apenas 1.635 pessoas ao estacionamento do estádio do Corinthians, no 1º de Maio Foto: Taba Benedicto/Estadão

Esta semana também teremos uma apresentação da cantora americana Madonna, de hits como Material Girl, que dominaram as pistas por tantos anos. A estimativa é que a apresentação custe ao todo R$ 50 milhões, também em parte custeada com dinheiro público. Estão previstas 1,5 milhão de pessoas nas areias de Copacabana na noite desse sábado. Podemos ser mais conservadores e falar em 1 milhão na audiência. O valor então ficaria em torno de R$ 50,00 por pessoa. Do ponto de vista apenas financeiro, deixando-se de lado a questão do entretenimento ou da política, Madonna valeria em torno de 40 Lulas.

Comparações despropositadas à parte, talvez esteja na hora de a chamada esquerda refletir sobre os motivos pelos quais perdeu o domínio das ruas. A melancolia é maior porque Lula é o homem das multidões das greves do ABC no final dos anos 70 e o PT foi bastante ativo nos movimentos de rua que pediam eleições diretas para presidente, há 40 anos. Desde então, era o partido das manifestações populares. Até 2013, imaginava-se que a direita brasileira havia perdido as ruas definitivamente, mas houve um renascimento.

A popularidade do presidente atual talvez seja equivalente ao seu antípoda político, Jair Bolsonaro, já que ambos dividiram os votos presidenciais de maneira quase unânime em 2022. Mas apenas um deles tem conseguido atrair multidões. Várias hipóteses estão na mesa. Uma delas, que deve ser aprofundada, seria que a esquerda deixou de ter um discurso universal. Fala apenas para grupos específicos, por exemplo, ao lidar com questões como raça ou gênero. Não possui, e isso não se limita ao Brasil, alguma ideia genérica o bastante para levar o povo às praças. O discurso do combate à pobreza e pela prosperidade econômica como guia não parece estar mais em primeiro lugar frente às pautas de grupos minoritários.

Goste-se ou não, a direita bolsonarista possui um identitarismo mais amplo ao apelar para noções de pátria, Deus ou família. São atavismos que permanecem nas pessoas apesar de todos os esforços ditos iluministas de pensadores que sonhavam com um dia pelo qual apenas a pura razão iria guiar as decisões das pessoas. As imagens quase diárias de Bolsonaro sendo saudado por centenas em diversos locais do Brasil fazem tremer os que ainda colocam fé no iluminismo. Bolsonaristas atuantes são pessoas que se movem pela paixão que parece alimentar as seitas.

Estrutura para receber o show de Madonna, que tem público estimado em 1,5 milhão de pessoas no show deste sábado Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Podemos também voar um pouco mais baixo para descobrir as razões do fracasso do 1º de Maio. Desde a aprovação da reforma trabalhista, sindicatos hoje possuem menos poder de mobilização. Sem imposto sindical faltam recursos para transportes, infraestrutura e lanches. Também estão desconectados com trabalhadores que preferem se vincular a um aplicativo do que possuir uma carteira de trabalho. Além disso, falta o calor passional que os adversários à direita carregam, com seus discursos indignados e supremacia no mundo digital.

Quanto ao centro democrático, que se pensa caudatário do iluminismo, melhor, neste momento, não marcar eventos nem mesmo no salão de festa do condomínio. O espírito do tempo parece pedir certa histeria e irreflexão. Quem só quer saber de dados e argumentos não irá a lugar algum.

Mas certa está, talvez, a multidão que vai às areias de Copacabana assistir a uma estrela da música pop. No sentido de que preferem se divertir do que serem manipulados por políticos populistas, mesmo que sejam de visões ideológicas antagônicas. Nesse sentido, sim, Madonna vale cerca de 40 Lulas e certamente muitas vezes mais do que Bolsonaro, nesse caso numa conta financeira que ainda precisa ser feita.

Saiu o número cabalístico de quantas pessoas presenciaram o presidente Lula no ato do 1º de Maio em Itaquera: 1.635 participantes, segundo o Monitor do Debate Político da Universidade de São Paulo (USP). Esperava-se em torno de 50 mil pessoas.

Sabemos que o evento obteve R$ 3 milhões da Petrobras e outros R$ 250 mil via Lei Rouanet. Fazendo-se as contas, chega-se a um número assombroso: gastou-se R$ 1.998,76, para cada pessoa que resolveu ir até o estacionamento do estádio do Corinthians naquele dia ensolarado para ouvir Lula pedir votos ilegalmente ao candidato do PSOL à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos, fora reclamar da falta de gente.

Ato das centrais sindicais com a presença de Lula e de ministros levou apenas 1.635 pessoas ao estacionamento do estádio do Corinthians, no 1º de Maio Foto: Taba Benedicto/Estadão

Esta semana também teremos uma apresentação da cantora americana Madonna, de hits como Material Girl, que dominaram as pistas por tantos anos. A estimativa é que a apresentação custe ao todo R$ 50 milhões, também em parte custeada com dinheiro público. Estão previstas 1,5 milhão de pessoas nas areias de Copacabana na noite desse sábado. Podemos ser mais conservadores e falar em 1 milhão na audiência. O valor então ficaria em torno de R$ 50,00 por pessoa. Do ponto de vista apenas financeiro, deixando-se de lado a questão do entretenimento ou da política, Madonna valeria em torno de 40 Lulas.

Comparações despropositadas à parte, talvez esteja na hora de a chamada esquerda refletir sobre os motivos pelos quais perdeu o domínio das ruas. A melancolia é maior porque Lula é o homem das multidões das greves do ABC no final dos anos 70 e o PT foi bastante ativo nos movimentos de rua que pediam eleições diretas para presidente, há 40 anos. Desde então, era o partido das manifestações populares. Até 2013, imaginava-se que a direita brasileira havia perdido as ruas definitivamente, mas houve um renascimento.

A popularidade do presidente atual talvez seja equivalente ao seu antípoda político, Jair Bolsonaro, já que ambos dividiram os votos presidenciais de maneira quase unânime em 2022. Mas apenas um deles tem conseguido atrair multidões. Várias hipóteses estão na mesa. Uma delas, que deve ser aprofundada, seria que a esquerda deixou de ter um discurso universal. Fala apenas para grupos específicos, por exemplo, ao lidar com questões como raça ou gênero. Não possui, e isso não se limita ao Brasil, alguma ideia genérica o bastante para levar o povo às praças. O discurso do combate à pobreza e pela prosperidade econômica como guia não parece estar mais em primeiro lugar frente às pautas de grupos minoritários.

Goste-se ou não, a direita bolsonarista possui um identitarismo mais amplo ao apelar para noções de pátria, Deus ou família. São atavismos que permanecem nas pessoas apesar de todos os esforços ditos iluministas de pensadores que sonhavam com um dia pelo qual apenas a pura razão iria guiar as decisões das pessoas. As imagens quase diárias de Bolsonaro sendo saudado por centenas em diversos locais do Brasil fazem tremer os que ainda colocam fé no iluminismo. Bolsonaristas atuantes são pessoas que se movem pela paixão que parece alimentar as seitas.

Estrutura para receber o show de Madonna, que tem público estimado em 1,5 milhão de pessoas no show deste sábado Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Podemos também voar um pouco mais baixo para descobrir as razões do fracasso do 1º de Maio. Desde a aprovação da reforma trabalhista, sindicatos hoje possuem menos poder de mobilização. Sem imposto sindical faltam recursos para transportes, infraestrutura e lanches. Também estão desconectados com trabalhadores que preferem se vincular a um aplicativo do que possuir uma carteira de trabalho. Além disso, falta o calor passional que os adversários à direita carregam, com seus discursos indignados e supremacia no mundo digital.

Quanto ao centro democrático, que se pensa caudatário do iluminismo, melhor, neste momento, não marcar eventos nem mesmo no salão de festa do condomínio. O espírito do tempo parece pedir certa histeria e irreflexão. Quem só quer saber de dados e argumentos não irá a lugar algum.

Mas certa está, talvez, a multidão que vai às areias de Copacabana assistir a uma estrela da música pop. No sentido de que preferem se divertir do que serem manipulados por políticos populistas, mesmo que sejam de visões ideológicas antagônicas. Nesse sentido, sim, Madonna vale cerca de 40 Lulas e certamente muitas vezes mais do que Bolsonaro, nesse caso numa conta financeira que ainda precisa ser feita.

Opinião por Fabiano Lana

Fabiano Lana é formado em Comunicação Social pela UFMG e em Filosofia pela UnB, onde também tem mestrado na área. Foi repórter do Jornal do Brasil, entre outros veículos. Atua como consultor de comunicação. É autor do livro “Riobaldo agarra sua morte”, em que discute interseções entre jornalismo, política e ética.

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