Disputas de poder e o debate político-cultural brasileiro

Opinião|Militares brasileiros sempre planejaram golpes estapafúrdios, mas alguns prosperaram


Talvez a nossa sorte em 2022 seja que parte do oficialato resistiu aos devaneios golpistas

Por Fabiano Lana

Uma das justificativas utilizadas para tentar minimizar a tentativa de golpe de Estado que ocorreria no final de 2022 é dizer por aí que se tratava de um delírio de meia dúzia de militares delirantes. Que planejar conspiração não é crime e por aí vai. O raciocínio não leva em conta que os golpes bem-sucedidos na história do Brasil partiram de ações ou tresloucadas ou de arroubos não planejados. Já acusado de tramar um atentado no qual o sistema de abastecimento de água do Rio de Janeiro seria atingido, o que abreviou sua carreira militar, o ex-presidente Jair Bolsonaro foi formado nessa cultura sublevações.

Tome se o caso da decisão do general Olímpio Mourão Filho, comandante da 4ª divisão de infantaria. Aparentemente sem consultar os superiores, na noite do dia 31 de março de 1964 partiu de Juiz de Fora, Minas Gerais, em direção ao Rio de Janeiro para tomar o poder do então presidente João Goulart. Acabou precipitando uma ação longamente calculada, de expulsar Jango, mas não executada. O resultado foram 21 anos de ditadura que começou, diga-se de passagem, com o apoio de grande parte da classe média, das classes empresariais e mesmo da elite política.

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Policiamento em Laranjeiras, próximo à casa do presidente João Goulart, no golpe de 1964 Foto: Arquivo/Estadão

Cerca de três décadas antes, um estratagema inventado pelo mesmo Mourão Filho, o Plano Cohen, que colocava o Brasil sob o risco iminente de uma insurreição comunista, foi uma das principais justificativas para Getúlio Vargas dar um autogolpe e instalar o Estado Novo, que durou oito anos. Tudo a partir de um engenho fantasioso. Getúlio, aliás, que também caiu por outro golpe, mas pelo menos para instalar uma breve democracia.

Há também uma série de tentativas que deram errado. Como as rebeliões da Força Aérea para impedir a posse de Juscelino Kubitschek – militares envolvidos anistiados estiveram envolvidos no golpe de 1964, aliás. Houve um plano do brigadeiro João Paulo Burnier de explodir o Gasômetro, no Rio de Janeiro e colocar a culpa na oposição, no final dos anos 60. Foi impedido por militares legalistas. Imagine o tanto de esquemas que nunca chegaram ao público. “Quando um golpe “dá certo” (para os golpistas), ninguém se lembra de que ele começou com uma iniciativa ousada. Quando um golpe fracassa, a tendência é ridicularizar o plano como delirante ou inviável”, afirmou, no “X”, o professor titular de história do Brasil na UFRJ, Carlos Fico.

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Talvez a nossa sorte em 2022 seja que parte do oficialato resistiu aos devaneios golpistas, assim como resistiram à pressão dos perturbados que foram para a porta dos quartéis pedir golpe de Estado até descerem à Esplanada dos Ministérios para quebrar os três poderes no dia 8 de janeiro de 2023. Pode ser que a sociedade esteja mais consciente da importância da democracia e os militares tiveram que recuar. São muitas lacunas que precisam ser esclarecidas. Mas o fato é que esse mundo de derrubadas, bombas, insubordinação e indisciplina – além da admiração pelo regime instalado em 1964 - foi o que forjou Jair Bolsonaro. Em outras palavras, foi criado em um ninho de golpistas alucinados.

Uma das justificativas utilizadas para tentar minimizar a tentativa de golpe de Estado que ocorreria no final de 2022 é dizer por aí que se tratava de um delírio de meia dúzia de militares delirantes. Que planejar conspiração não é crime e por aí vai. O raciocínio não leva em conta que os golpes bem-sucedidos na história do Brasil partiram de ações ou tresloucadas ou de arroubos não planejados. Já acusado de tramar um atentado no qual o sistema de abastecimento de água do Rio de Janeiro seria atingido, o que abreviou sua carreira militar, o ex-presidente Jair Bolsonaro foi formado nessa cultura sublevações.

Tome se o caso da decisão do general Olímpio Mourão Filho, comandante da 4ª divisão de infantaria. Aparentemente sem consultar os superiores, na noite do dia 31 de março de 1964 partiu de Juiz de Fora, Minas Gerais, em direção ao Rio de Janeiro para tomar o poder do então presidente João Goulart. Acabou precipitando uma ação longamente calculada, de expulsar Jango, mas não executada. O resultado foram 21 anos de ditadura que começou, diga-se de passagem, com o apoio de grande parte da classe média, das classes empresariais e mesmo da elite política.

Policiamento em Laranjeiras, próximo à casa do presidente João Goulart, no golpe de 1964 Foto: Arquivo/Estadão

Cerca de três décadas antes, um estratagema inventado pelo mesmo Mourão Filho, o Plano Cohen, que colocava o Brasil sob o risco iminente de uma insurreição comunista, foi uma das principais justificativas para Getúlio Vargas dar um autogolpe e instalar o Estado Novo, que durou oito anos. Tudo a partir de um engenho fantasioso. Getúlio, aliás, que também caiu por outro golpe, mas pelo menos para instalar uma breve democracia.

Há também uma série de tentativas que deram errado. Como as rebeliões da Força Aérea para impedir a posse de Juscelino Kubitschek – militares envolvidos anistiados estiveram envolvidos no golpe de 1964, aliás. Houve um plano do brigadeiro João Paulo Burnier de explodir o Gasômetro, no Rio de Janeiro e colocar a culpa na oposição, no final dos anos 60. Foi impedido por militares legalistas. Imagine o tanto de esquemas que nunca chegaram ao público. “Quando um golpe “dá certo” (para os golpistas), ninguém se lembra de que ele começou com uma iniciativa ousada. Quando um golpe fracassa, a tendência é ridicularizar o plano como delirante ou inviável”, afirmou, no “X”, o professor titular de história do Brasil na UFRJ, Carlos Fico.

Talvez a nossa sorte em 2022 seja que parte do oficialato resistiu aos devaneios golpistas, assim como resistiram à pressão dos perturbados que foram para a porta dos quartéis pedir golpe de Estado até descerem à Esplanada dos Ministérios para quebrar os três poderes no dia 8 de janeiro de 2023. Pode ser que a sociedade esteja mais consciente da importância da democracia e os militares tiveram que recuar. São muitas lacunas que precisam ser esclarecidas. Mas o fato é que esse mundo de derrubadas, bombas, insubordinação e indisciplina – além da admiração pelo regime instalado em 1964 - foi o que forjou Jair Bolsonaro. Em outras palavras, foi criado em um ninho de golpistas alucinados.

Uma das justificativas utilizadas para tentar minimizar a tentativa de golpe de Estado que ocorreria no final de 2022 é dizer por aí que se tratava de um delírio de meia dúzia de militares delirantes. Que planejar conspiração não é crime e por aí vai. O raciocínio não leva em conta que os golpes bem-sucedidos na história do Brasil partiram de ações ou tresloucadas ou de arroubos não planejados. Já acusado de tramar um atentado no qual o sistema de abastecimento de água do Rio de Janeiro seria atingido, o que abreviou sua carreira militar, o ex-presidente Jair Bolsonaro foi formado nessa cultura sublevações.

Tome se o caso da decisão do general Olímpio Mourão Filho, comandante da 4ª divisão de infantaria. Aparentemente sem consultar os superiores, na noite do dia 31 de março de 1964 partiu de Juiz de Fora, Minas Gerais, em direção ao Rio de Janeiro para tomar o poder do então presidente João Goulart. Acabou precipitando uma ação longamente calculada, de expulsar Jango, mas não executada. O resultado foram 21 anos de ditadura que começou, diga-se de passagem, com o apoio de grande parte da classe média, das classes empresariais e mesmo da elite política.

Policiamento em Laranjeiras, próximo à casa do presidente João Goulart, no golpe de 1964 Foto: Arquivo/Estadão

Cerca de três décadas antes, um estratagema inventado pelo mesmo Mourão Filho, o Plano Cohen, que colocava o Brasil sob o risco iminente de uma insurreição comunista, foi uma das principais justificativas para Getúlio Vargas dar um autogolpe e instalar o Estado Novo, que durou oito anos. Tudo a partir de um engenho fantasioso. Getúlio, aliás, que também caiu por outro golpe, mas pelo menos para instalar uma breve democracia.

Há também uma série de tentativas que deram errado. Como as rebeliões da Força Aérea para impedir a posse de Juscelino Kubitschek – militares envolvidos anistiados estiveram envolvidos no golpe de 1964, aliás. Houve um plano do brigadeiro João Paulo Burnier de explodir o Gasômetro, no Rio de Janeiro e colocar a culpa na oposição, no final dos anos 60. Foi impedido por militares legalistas. Imagine o tanto de esquemas que nunca chegaram ao público. “Quando um golpe “dá certo” (para os golpistas), ninguém se lembra de que ele começou com uma iniciativa ousada. Quando um golpe fracassa, a tendência é ridicularizar o plano como delirante ou inviável”, afirmou, no “X”, o professor titular de história do Brasil na UFRJ, Carlos Fico.

Talvez a nossa sorte em 2022 seja que parte do oficialato resistiu aos devaneios golpistas, assim como resistiram à pressão dos perturbados que foram para a porta dos quartéis pedir golpe de Estado até descerem à Esplanada dos Ministérios para quebrar os três poderes no dia 8 de janeiro de 2023. Pode ser que a sociedade esteja mais consciente da importância da democracia e os militares tiveram que recuar. São muitas lacunas que precisam ser esclarecidas. Mas o fato é que esse mundo de derrubadas, bombas, insubordinação e indisciplina – além da admiração pelo regime instalado em 1964 - foi o que forjou Jair Bolsonaro. Em outras palavras, foi criado em um ninho de golpistas alucinados.

Opinião por Fabiano Lana

Fabiano Lana é formado em Comunicação Social pela UFMG e em Filosofia pela UnB, onde também tem mestrado na área. Foi repórter do Jornal do Brasil, entre outros veículos. Atua como consultor de comunicação. É autor do livro “Riobaldo agarra sua morte”, em que discute interseções entre jornalismo, política e ética.

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