A aliança das eleições de 2018 estampada pelo slogan Bolsodoria, usado pelo governador paulista, João Doria (PSDB-SP), para vencer a disputa na onda que elegeu Jair Bolsonaro (PSL), ficou para trás.
De olho nas eleições de 2022, ambos abandonaram os tempos em que faziam flexões de braço lado a lado e passaram a fazer ataques públicos um contra o outro.
O mais recente atrito aconteceu nesta quarta-feira, 5, quando o governador de São Paulo chamou de "populista e pouco responsável" a atitude de Bolsonaro de responsabilizar os Estados pela alta do preço nos combustíveis. O presidente disse que zeraria o imposto federal caso os governadores zerassem o ICMS sobre a gasolina e o diesel. Em entrevista ao Estado, questionado sobre a declaração de Doria, Bolsonaro se negou a responder a crítica do governador: "vamos falar de coisa séria?", disse.
Abaixo, o Estado relembra em ordem cronológica os desentendimentos públicos entre Bolsonaro e Doria:
“Não é hora de eleição. É momento de gestão” - 24 de junho
O primeiro ‘conflito’ entre Bolsonaro e Doria esteve relacionado à disputa entre São Paulo e Rio pela realização do GP Brasil de Fórmula 1, cujo contrato vence em 2020. O presidente afirmou que a disputa tem “99% ou mais” de chance em ser transferida para o Rio de Janeiro, enquanto o governador defendeu a manutenção da prova na capital paulista.
Na mesma ocasião, Bolsonaro também aproveitou a oportunidade para provocar Doria: “A imprensa diz que ele será candidato à Presidência em 2022, então ele tem de pensar no Brasil. Se ele disputar a reeleição, aí ele pensa no seu Estado”, afirmou, dois dias após confirmar sua própria candidatura à reeleição para o cargo. “A questão da Fórmula 1 não é política. É econômica. Não é hora de eleição. É momento de gestão”, rebateu o tucano.
“Declaração infeliz” - 29 de julho
Quatro dias após o presidente ter provocado polêmica nas redes sociais ao afirmar que sabia o que ocorreu com Fernando Santa Cruz, pai do atual presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, que foi morto durante a ditadura militar. O governador afirmou que a fala (“Se ele quiser saber como o pai morreu, eu conto”) foi “infeliz”.
“Como filho de um deputado que foi cassado na época do regime militar, eu acho que foi uma declaração infeliz”, disse sobre os comentários do presidente de que Santa Cruz desapareceu no Rio de Janeiro.
“Nunca tivemos alinhamento” - 30 de julho
Um dia depois da crítica, Doria foi questionado em entrevista à rádio CBN sobre seu apoio ao presidente durante a campanha eleitoral de 2018, ocasião em que afirmou: “Nunca tivemos alinhamento com o governo Bolsonaro”.
“A história não se apaga com decretos ou declarações” - 8 de agosto
Em entrevista concedida ao Estado, Doria voltou a criticar as declarações de Bolsonaro sobre o pai de Santa Cruz. “Sou filho de uma vítima da ditadura e não posso me calar. A história não se apaga com decretos ou declarações. O Brasil teve uma ditadura e um golpe em 1964, mas isso não significa que vamos fazer tribunais condenatórios eternamente”, disparou o governador.
Ao longo de sua carreira política, Bolsonaro sempre defendeu a ditadura militar (1964-1985): “Não houve golpe militar em 1964. Quem declarou vago o cargo do presidente na época foi o Parlamento. Era a regra em vigor”, disse em entrevista de 2018. Este ano, ele recomendou que quartéis celebrassem a “data histórica” e referiu-se ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, primeiro militar condenado por sequestro e tortura durante a ditadura, como “herói nacional”.
“Jamais nomearia meu filho embaixador” - 21 de agosto
A indicação do presidente para que seu filho Eduardo Bolsonaro assuma o comando da Embaixada do Brasil em Washington também foi alvo de críticas pelo tucano: “Eu jamais nomearia meu filho nem ninguém da minha família para nenhuma função pública, ainda mais numa circunstância de uma embaixada que é a mais importante embaixada brasileira no exterior”, declarou em entrevista ao UOL.
No início do mês, Bolsonaro havia defendido a indicação de Eduardo com o argumento “tem que ser filho de alguém, por que não meu?”. A essa altura, os ataques de Doria ao presidente já tinham chamado atenção da alta cúpula do PSDB, que ainda não havia dado respaldo à estratégia do governador.
“Doria mamou nos governos do PT! Ihuuu” - 29 de agosto
A situação escalou para um confronto direto na última live feita pelo presidente da República em suas redes sociais, nesta quinta, 29, quando ele acusou Doria de ter se beneficiado durante os governos do PT.
“João Doria, comprou também? Explica isso aí. Só peixe, amigão do Lula e da Dilma. Vejo Doria falando ‘minha bandeira jamais será vermelha’. É brincadeira. Quando estava mamando a bandeira lá, a bandeira era vermelha foiçasso e um martelo sem problema nenhum, né?”, disse o presidente, referindo-se à compra de aviões com financiamento do BNDES.
Mais cedo no mesmo dia, o governador tucano, durante viagem à Alemanha, afirmou que a crise ambiental estava gerando preocupação em investidores europeus e que “é preciso que o Brasil, como país, manifeste claramente seu respeito pela opinião pública, seja europeia, seja internacional”.
“Nunca mamei em teta nenhuma” - 30 de agosto
Em resposta à provocação do presidente, Doria respondeu, durante entrevista ao Broadcast em Berlim, se manteria alguma relação de amizade com os ex-presidentes do PT. "Não, ao contrário. Tenho posição bem distinta. Nunca precisei mamar em teta nenhuma. Quero Lula e Dilma distantes. Se possível, do Brasil até".
"Doria está morto" (para 2022) - 31 de agosto
Segundo Bolsonaro, em 31 de agosto, o governador tem "enchido o saco" e, por isso, ele tem respondido à altura. Bolsonaro afirmou ainda que Doria era “peixe” do PT e que começou a dizer que sua “bandeira não era vermelha” somente após a eleição de Dilma Rousseff, em 2010. "Doria está morto", disse, sobre 2022.
Bolsonaro participou de um churrasco no quartel-general do Exército, em Brasília. Pouco depois de entrar, o presidente mandou os seguranças convidarem um grupo de jornalistas e motoristas de veículos de comunicação que o esperavam na porta para participar do evento. Ele conversou por cerca de uma hora e meia com os jornalistas. A conversa não pôde ser gravada e todos foram orientados a deixaros celulares do lado de fora.
"Doria é uma 'ejaculação precoce'" - 4 de setembro
O presidente afirmou que Doria não tem chance de vitória em 2022 por ser uma "ejaculação precoce" e não ter, em sua avaliação, apoio popular. A declaração foi dada ao jornal Folha de S. Paulo. Ele reafirmou que, "se estiver bem" em 2022, tem a intenção de ser candidato à reeleição.
Mais tarde, a mulher de Doria, Bia Doria, escreveu no Instagram: "Como mulher, mãe e primeira-dama do Estado de São Paulo, repudio com veemência as declarações do Presidente da República, que usa expressões chulas, que ferem e desrespeitam a família brasileira e a importância do cargo que ocupa". O governador curtiu a publicação da esposa.
reference"Que o presidente trabalhe mais e tuíte menos" - 20 de setembro
O presidente Jair Bolsonaro demonstrou insatisfação com o fato de não ter sido citado nas notícias de um investimento de R$ 1 bilhão da montadora Toyota em sua fábrica de Sorocaba, em São Paulo, anunciado na quinta, 19. O governador do Estado, João Doria, está no Japão, onde acompanhou o anúncio e, em resposta ao presidente, nesta sexta, disse que Bolsonaro confunde projetos e sugeriu ao presidente trabalhar mais e tuitar menos.
"Nunca fui bolsonarista" - 3 de outubro
No início de outubro, Doria disse em entrevista à GloboNews que nunca foi bolsonarista e que apenas "incorporou" o slogan "BolsoDoria" na eleição de 2018, em que chegou a usar camisetas no 2º turno pedindo votos também para o então candidato Jair Bolsonaro.
"Nunca fui bolsonarista", disse o governador. "O 'Bolsodoria' não fui eu criei. Esse movimento nasceu no interior de São Paulo, ma eu incorporei. Eu jamais votaria no Fernando Haddad (PT, adversário de Bolsonaro no 2º turno). Naquela circunstâncias, uma eleição em que eu enfrentava todos os partidos de esquerda e até parte do meu partido, com Bolsonaro contra essa esquerda, qual era meu caminho?"
Em evento juntos, Doria baixa o tom - 11 de outubro
Na primeira vez que os dois se encontram em um evento público desde a sequência de declarações críticas de um contra o outro, Doria baixou o tom que vinha utilizando ao comentar sua relação com Bolsonaro. Em evento da Polícia Militar de São Paulo, o tucano disse que o presidente, assim como seus ministros, é um "amigo dos brasileiros em São Paulo".
"Fiz questão de estar presente para mostrar que o Estado de São Paulo é parceiro das boas ações do Brasil. O que for positivo para o Brasil e para São Paulo,o governador estará ao lado. Em São Paulo, não fazemos oposição ao Brasil", disse Doria.
Bolsonaro, ao discursar, elogiou militares, criticou governos que o antecederam e, ao público, disse que as pessoas são "os únicos a quem deve obediência". Citou protocolarmente Doria no início de sua fala e depois não fez mais menções ao governador.
Troca de farpas após proposta de zerar o ICMS dos combustíveis - 5 de outubro
O governador de São Paulo chamou de "populista e pouco responsável" a atitude de Bolsonaro de responsabilizar os Estados pela alta do preço nos combustíveis. Antes, o presidente havia afirmado que zeraria o imposto federal se os governadores zerassem o ICMS. "Está feito o desafio aqui. Eu zero o (imposto) federal hoje e eles (governadores) zeram ICMS. Se topar, eu aceito. Está ok?", afirmou o Bolsonaro.
Doria, por sua vez, afirmou que o "desafio" não passava de "uma bravata". "A bravata me lembra populismo, populismo me lembra algo ruim para o Brasil."
Em entrevista ao Estado, questionado sobre a fala de Doria, Bolsonaro respondeu com deboche. "Vamos falar de coisa séria? Não vem me falar desse nome do governador de São Paulo para mim, não. Pergunte se ele sabe o que é 'Bolsodoria' e se o autorizei a usar alguma vez na vida. Esquece."