Gasto de deputados da Alesp com autopromoção mais do que dobra em 2023 e passa de R$ 3 milhões


Autopromoção de deputados estaduais de São Paulo bateu recorde na série histórica no ano pré-eleitoral. Deputados alegam cumprir regra. Cota para divulgar mandato foi criada em 2021.

Por Juliano Galisi
Atualização:

Os deputados estaduais de São Paulo gastaram mais de R$ 3 milhões em dinheiro público para autopromoção em 2023. O valor mais do que dobra a soma do ano anterior: em 2022, o gasto da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) com publicidade dos parlamentares foi de R$ 1.342.162,61. Procurados, os deputados citados no levantamento argumentaram cumprir as regras estabelecidas.

Em 2024, ano de eleições municipais, nas quais muitos deputados da Alesp pleiteiam os Executivos de suas respectivas bases, o valor tende a aumentar. Será a primeira eleição nos municípios paulistas desde que a cota para divulgação foi criada. A última atualização dos dados no portal da Casa, utilizados no levantamento do Estadão, é de 25 de janeiro e, por isso, não é possível contabilizar ainda os gastos do primeiro mês deste ano.

continua após a publicidade

O deputado estadual que mais gastou com a modalidade em 2023 foi Rogério Nogueira (PSDB). Foram R$ 110.000 com autopromoção, em 11 parcelas contínuas de R$ 10.000 mensais destinadas a uma agência de marketing. A deputada Leci Brandão (PCdoB) também superou a cifra dos R$ 100.000: de janeiro a dezembro, o gabinete de Brandão gastou R$ 102.100 com publicidade. Itamar Borges (MDB) aparece logo atrás, com R$ 94.853,32 gastos em propaganda no ano passado.

Há ainda um comparativo proporcional dos parlamentares que mais alocaram recursos de suas cotas com autopromoção. A deputada Carla Morando (PSDB), por exemplo, gastou 57,24% de toda a cota que solicitou em 2023 com serviços de publicidade do seu mandato. Na sequência, está Fabiana Bolsonaro (PL), com 49,93% da cota demandada no ano para despesas do tipo.

continua após a publicidade

Os ex-deputados Bruno Ganem e Dr. Raul, do Podemos, aparecem logo atrás de Fabiana, com 48,66% e 46,89% da cota, respectivamente, para publicidade pessoal. Eles não exercem mandato na atual legislatura, que teve início em março de 2023, e constam no sistema de contas pelos gastos que solicitaram nos primeiros meses do ano passado, de 1º de janeiro a 15 de março. O terceiro deputado em exercício que mais gastou proporcionalmente com autopromoção é Gil Diniz (PL), com 44,73% da cota solicitada em propaganda, seguido por Valdomiro Lopes (PSB), com 39,48%, e Rogério Nogueira, com 37,54%.

Verba é pública, mas faltam diretrizes para o uso do recurso

continua após a publicidade

A verba para publicidade é oriunda da cota parlamentar. Todo mês, os 94 deputados estaduais de São Paulo têm direito a aproximadamente R$ 40 mil para cobrir “despesas inerentes ao pleno exercício das atividades parlamentares”, como diz o Regimento Interno da Casa.

A finalidade “Divulgação da Atividade Parlamentar” é a mais nova opção de gastos com a verba pública, criada por um ato da Mesa de novembro de 2021, e replica um modelo já vigente na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

A despesa com publicidade, por si só, não é um problema. “A lógica do parlamentar é se comunicar com as pessoas. É do trabalho fazer a divulgação dos atos, por isso eles têm cota para isso”, explicou Marcelo Vitorino, consultor em marketing político e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Consultada sobre as regras para a utilização da cota de publicidade, a Alesp informou, por nota, que “cada gabinete é autônomo sobre a forma como se comunica com a população”.

continua após a publicidade

“Quando se criou essa rubrica, a ideia era dar condições ao parlamentar para divulgar à sua base aquilo que ele tem feito. É uma prestação de contas, mas, com a falta de regulamentação, cada deputado faz a divulgação à sua maneira. Muitas vezes, impulsionam posições sociais que não têm a ver com o mandato”, disse Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS, especializado em fiscalização de políticas públicas.

Questionado sobre a finalidade dos recursos para publicidade, o deputado Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp, como um abaixo-assinado contra a “saidinha” de presos e publicações contra o aborto. Para Lopes, os temas integram sua atividade como parlamentar. “Não posso me restringir só às questões do Estado. São Paulo faz parte do País, somos uma federação. Quando você proíbe ou libera o aborto, você o faz no País todo, o que inclui São Paulo”, disse.

Deputado estadual Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp com recurso para publicidade Foto: Biblioteca de anúncios do Facebook
continua após a publicidade

Para o professor Vitorino, opiniões sobre pautas sociais têm carga política, mas não deixam de ser de natureza pessoal. “A não ser que, dentro do Parlamento, haja uma discussão sobre o tema, na qual você vai pautar o assunto. Fora da proposição legal, é uma opinião pessoal”, afirmou o consultor. O aborto ou a “saidinha” escapam à prerrogativa do Legislativo estadual.

Fiscalização dos gastos e do conteúdo

O controle institucional da publicidade, por enquanto, é meramente contábil. O gabinete de cada deputado apresenta um documento atestando a despesa e o valor é ressarcido. “Não existe fiscalização do material produzido, pois esse tipo de despesa, inclusive na Alesp, não especifica o que pode ser feito. Falta uma regra mais rígida para direcionar de que forma o recurso público pode ser utilizado”, disse Lúcio Big.

continua após a publicidade

Se faltam diretrizes quanto à produção, a fiscalização dos gastos também deixa a desejar, segundo Big. Para ele, a Alesp deveria apresentar publicamente as notas fiscais das despesas, como ocorre na Câmara dos Deputados, no Senado e na Câmara Municipal paulistana. Além disso, a plataforma da Assembleia não disponibiliza as despesas acumuladas no ano com encargos de gabinete de forma acessível ao cidadão. A visualização dos dados só está disponível em agrupamentos mensais.

Questionada sobre a fiscalização dos encargos de gabinete, a Alesp disse, por nota, que o ressarcimento das despesas é deferido ou negado somente após “criteriosa análise da documentação”. As solicitações, acrescentou a Casa, são analisadas pelo Núcleo de Fiscalização e Controle.

Como não existe a exigência de apresentar o material que foi produzido, acaba que nem a Casa legislativa nem o terceiro setor fiscaliza. A sociedade civil não dispõe de elementos para fiscalizar

Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS

A Alesp não fiscaliza o conteúdo divulgado, mas há dados disponíveis de forma pública, conforme a política de uso da Meta, administradora do Facebook e do Instagram. É diretriz da big tech que os anúncios de temas sociais e políticos, subsidiados com verba pública ou não, sejam discriminados nesta categoria. Por meio de um painel denominado Biblioteca de Anúncios, é possível visualizar todas as publicações impulsionadas por determinado perfil com ações de marketing.

Política de boas práticas, regras e formação

A publicidade do mandato não é problema – uma estratégia digital de marketing, muito menos, pois as redes sociais tendem a baratear as ações de comunicação e produzir resultados mais efetivos. “Desde que bem feito e bem planejado, o impulsionamento de conteúdo é o melhor meio de comunicação que existe para um parlamentar”, disse Marcelo Vitorino.

A maior vantagem, segundo o consultor, é a segmentação, tanto do conteúdo veiculado quanto do público atingido. Por mais que propagandas na internet não tenham o mesmo alcance do que em outros meios de comunicação, anúncios digitais possibilitam melhor custo-benefício, pois delimitam com maior precisão a mensagem transmitida e o público que a receberá.

Para Vitorino, porém, o uso positivo desse potencial demandaria das Casas legislativas uma política de boas práticas para as ferramentas. “Tem que ter regras e uma formação”, disse o professor da ESPM. Normas que esclarecessem a atual penumbra quanto ao conteúdo que pode ser impulsionado e formação, por sua vez, para que os recursos sejam bem alocados. Do contrário, segundo Marcelo Vitorino, seria “desperdício do erário”. No momento, a Alesp não tem nem uma coisa nem outra.

Gasto tende a aumentar em ano eleitoral

Em 2024, os municípios brasileiros escolhem prefeitos e vereadores e muitos deputados estaduais já estão de olho nas disputas aos Executivos de suas respectivas bases eleitorais, seja para figurar no pleito, seja no apoio aos aliados locais. Nesse contexto, o gasto com ações de publicidade dos parlamentares tende a aumentar.

Lúcio Big projeta esse cenário com base na experiência de fiscalização no Legislativo federal. “Não só tende a aumentar como irá. Historicamente, sempre aumenta. É tão cristalino quanto a água: vai chegando o final do ano, a despesa com divulgação aumenta. Em ano de eleição, então, deslancha”, disse o diretor-presidente do OPS.

Nas cidades paulistas, a eleição deste ano será a primeira com a cota de divulgação da Alesp em vigor. Isso pode modificar os cenários eleitorais pelo Estado na medida em que um candidato, eventualmente, tenha passado os últimos anos com acesso a esse recurso, enquanto seus adversários nas urnas, não.

Para Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil, a cota de divulgação dos deputados não só é prerrogativa do mandato como cumpre uma função democrática. Entretanto, é inevitável que o acesso aos recursos de autopromoção possa desequilibrar uma eleição. “Há um dever e um direito ao demonstrar à base o que parlamentar está fazendo. Mas, o que acontece é: o detentor de um cargo público vai usar dos recursos que tem para se promover eleitoralmente. A partir do momento em que se faz isso, você acaba com o princípio da isonomia entre candidatos”, disse. Esse dilema, segundo ela, é uma “linha tênue”.

A Alesp precisa zelar pelo uso da verba de forma adequada. A Casa deveria emitir um ato definindo melhor do que se trata a divulgação, com o que pode ser gasto e como isso não deve ser confundido com propaganda eleitoral

Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil

O que dizem os citados

O Estadão buscou contato com todos os deputados em exercício elencados nos gráficos. A assessoria de Rogério Nogueira disse que o gasto “é permitido pela Assembleia”, sendo “um dos principais meios de prestação de contas do trabalho do deputado”. Já o gabinete de Leci Brandão argumentou que a deputada “tem uma produção legislativa extensa e consistente” e a cota de divulgação é utilizada “rigorosamente dentro do que a lei permite”. Na mesma linha, os assessores de Itamar Borges afirmaram que a despesa está “em total conformidade com as normas da Alesp”.

Dirceu Dalben, por meio da chefia de gabinete, informou para a reportagem que o gasto com divulgação diz respeito à proposição legislativa, com destaque para as frentes parlamentares coordenadas pelo deputado. A assessoria de Carla Morando disse que a região do ABC, base eleitoral da deputada, “não tem rede de televisão, rádio ou jornais de grande circulação, o que obriga a parlamentar a publicar sobre seu mandato” nas redes sociais. A verba para essa finalidade é “legalmente autorizada para transparência”.

Em nota, Paulo Mansur afirmou que “toda a verba do gabinete é investida de maneira consciente e responsável”, evitando “qualquer gasto com o dinheiro público que não seja relacionado ao mandato”. Valdomiro Lopes, em entrevista, disse que “usa os recursos com muito critério”. Os gastos, segundo o parlamentar, são compatíveis com os utilizados pelos demais deputados do interior paulista.

A assessoria de Dani Alonso afirmou que “os recursos são utilizados de maneira estritamente legal e transparente”. Segundo a nota, a divulgação do mandato da deputada é “ampla e abrange todo o Estado de São Paulo”, com ênfase nas áreas de “Polícia Militar, agronegócio, rodeios e comércio de materiais de construção”. Solange Freitas disse que “a comunicação com a população é fundamental para a transparência” e que a divulgação do mandato é uma prestação de contas.

Em nota, Capitão Telhada disse que “os gastos do gabinete são realizados em conformidade com a legislação vigente e são submetidos à aprovação da Alesp mensalmente”. Beth Sahão, em nota, afirmou que “os gastos são plenamente compatíveis com o exercício do mandato”.

As assessorias de Clarice Ganem, Gil Diniz, Rômulo Fernandes e Ricardo França foram demandadas e acusaram o recebimento das perguntas, mas não responderam ao Estadão até a publicação desta reportagem.

Tenente Coimbra e Fabiana Bolsonaro preferiram não se manifestar. Fabiana não tem parentesco algum com Jair Bolsonaro (PL), mas adotou o sobrenome como homenagem ao ex-presidente. Na Alesp, há outra “Bolsonaro”: a Valéria Bolsonaro, casada com um primo de segundo grau de Jair.

Os deputados estaduais de São Paulo gastaram mais de R$ 3 milhões em dinheiro público para autopromoção em 2023. O valor mais do que dobra a soma do ano anterior: em 2022, o gasto da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) com publicidade dos parlamentares foi de R$ 1.342.162,61. Procurados, os deputados citados no levantamento argumentaram cumprir as regras estabelecidas.

Em 2024, ano de eleições municipais, nas quais muitos deputados da Alesp pleiteiam os Executivos de suas respectivas bases, o valor tende a aumentar. Será a primeira eleição nos municípios paulistas desde que a cota para divulgação foi criada. A última atualização dos dados no portal da Casa, utilizados no levantamento do Estadão, é de 25 de janeiro e, por isso, não é possível contabilizar ainda os gastos do primeiro mês deste ano.

O deputado estadual que mais gastou com a modalidade em 2023 foi Rogério Nogueira (PSDB). Foram R$ 110.000 com autopromoção, em 11 parcelas contínuas de R$ 10.000 mensais destinadas a uma agência de marketing. A deputada Leci Brandão (PCdoB) também superou a cifra dos R$ 100.000: de janeiro a dezembro, o gabinete de Brandão gastou R$ 102.100 com publicidade. Itamar Borges (MDB) aparece logo atrás, com R$ 94.853,32 gastos em propaganda no ano passado.

Há ainda um comparativo proporcional dos parlamentares que mais alocaram recursos de suas cotas com autopromoção. A deputada Carla Morando (PSDB), por exemplo, gastou 57,24% de toda a cota que solicitou em 2023 com serviços de publicidade do seu mandato. Na sequência, está Fabiana Bolsonaro (PL), com 49,93% da cota demandada no ano para despesas do tipo.

Os ex-deputados Bruno Ganem e Dr. Raul, do Podemos, aparecem logo atrás de Fabiana, com 48,66% e 46,89% da cota, respectivamente, para publicidade pessoal. Eles não exercem mandato na atual legislatura, que teve início em março de 2023, e constam no sistema de contas pelos gastos que solicitaram nos primeiros meses do ano passado, de 1º de janeiro a 15 de março. O terceiro deputado em exercício que mais gastou proporcionalmente com autopromoção é Gil Diniz (PL), com 44,73% da cota solicitada em propaganda, seguido por Valdomiro Lopes (PSB), com 39,48%, e Rogério Nogueira, com 37,54%.

Verba é pública, mas faltam diretrizes para o uso do recurso

A verba para publicidade é oriunda da cota parlamentar. Todo mês, os 94 deputados estaduais de São Paulo têm direito a aproximadamente R$ 40 mil para cobrir “despesas inerentes ao pleno exercício das atividades parlamentares”, como diz o Regimento Interno da Casa.

A finalidade “Divulgação da Atividade Parlamentar” é a mais nova opção de gastos com a verba pública, criada por um ato da Mesa de novembro de 2021, e replica um modelo já vigente na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

A despesa com publicidade, por si só, não é um problema. “A lógica do parlamentar é se comunicar com as pessoas. É do trabalho fazer a divulgação dos atos, por isso eles têm cota para isso”, explicou Marcelo Vitorino, consultor em marketing político e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Consultada sobre as regras para a utilização da cota de publicidade, a Alesp informou, por nota, que “cada gabinete é autônomo sobre a forma como se comunica com a população”.

“Quando se criou essa rubrica, a ideia era dar condições ao parlamentar para divulgar à sua base aquilo que ele tem feito. É uma prestação de contas, mas, com a falta de regulamentação, cada deputado faz a divulgação à sua maneira. Muitas vezes, impulsionam posições sociais que não têm a ver com o mandato”, disse Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS, especializado em fiscalização de políticas públicas.

Questionado sobre a finalidade dos recursos para publicidade, o deputado Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp, como um abaixo-assinado contra a “saidinha” de presos e publicações contra o aborto. Para Lopes, os temas integram sua atividade como parlamentar. “Não posso me restringir só às questões do Estado. São Paulo faz parte do País, somos uma federação. Quando você proíbe ou libera o aborto, você o faz no País todo, o que inclui São Paulo”, disse.

Deputado estadual Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp com recurso para publicidade Foto: Biblioteca de anúncios do Facebook

Para o professor Vitorino, opiniões sobre pautas sociais têm carga política, mas não deixam de ser de natureza pessoal. “A não ser que, dentro do Parlamento, haja uma discussão sobre o tema, na qual você vai pautar o assunto. Fora da proposição legal, é uma opinião pessoal”, afirmou o consultor. O aborto ou a “saidinha” escapam à prerrogativa do Legislativo estadual.

Fiscalização dos gastos e do conteúdo

O controle institucional da publicidade, por enquanto, é meramente contábil. O gabinete de cada deputado apresenta um documento atestando a despesa e o valor é ressarcido. “Não existe fiscalização do material produzido, pois esse tipo de despesa, inclusive na Alesp, não especifica o que pode ser feito. Falta uma regra mais rígida para direcionar de que forma o recurso público pode ser utilizado”, disse Lúcio Big.

Se faltam diretrizes quanto à produção, a fiscalização dos gastos também deixa a desejar, segundo Big. Para ele, a Alesp deveria apresentar publicamente as notas fiscais das despesas, como ocorre na Câmara dos Deputados, no Senado e na Câmara Municipal paulistana. Além disso, a plataforma da Assembleia não disponibiliza as despesas acumuladas no ano com encargos de gabinete de forma acessível ao cidadão. A visualização dos dados só está disponível em agrupamentos mensais.

Questionada sobre a fiscalização dos encargos de gabinete, a Alesp disse, por nota, que o ressarcimento das despesas é deferido ou negado somente após “criteriosa análise da documentação”. As solicitações, acrescentou a Casa, são analisadas pelo Núcleo de Fiscalização e Controle.

Como não existe a exigência de apresentar o material que foi produzido, acaba que nem a Casa legislativa nem o terceiro setor fiscaliza. A sociedade civil não dispõe de elementos para fiscalizar

Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS

A Alesp não fiscaliza o conteúdo divulgado, mas há dados disponíveis de forma pública, conforme a política de uso da Meta, administradora do Facebook e do Instagram. É diretriz da big tech que os anúncios de temas sociais e políticos, subsidiados com verba pública ou não, sejam discriminados nesta categoria. Por meio de um painel denominado Biblioteca de Anúncios, é possível visualizar todas as publicações impulsionadas por determinado perfil com ações de marketing.

Política de boas práticas, regras e formação

A publicidade do mandato não é problema – uma estratégia digital de marketing, muito menos, pois as redes sociais tendem a baratear as ações de comunicação e produzir resultados mais efetivos. “Desde que bem feito e bem planejado, o impulsionamento de conteúdo é o melhor meio de comunicação que existe para um parlamentar”, disse Marcelo Vitorino.

A maior vantagem, segundo o consultor, é a segmentação, tanto do conteúdo veiculado quanto do público atingido. Por mais que propagandas na internet não tenham o mesmo alcance do que em outros meios de comunicação, anúncios digitais possibilitam melhor custo-benefício, pois delimitam com maior precisão a mensagem transmitida e o público que a receberá.

Para Vitorino, porém, o uso positivo desse potencial demandaria das Casas legislativas uma política de boas práticas para as ferramentas. “Tem que ter regras e uma formação”, disse o professor da ESPM. Normas que esclarecessem a atual penumbra quanto ao conteúdo que pode ser impulsionado e formação, por sua vez, para que os recursos sejam bem alocados. Do contrário, segundo Marcelo Vitorino, seria “desperdício do erário”. No momento, a Alesp não tem nem uma coisa nem outra.

Gasto tende a aumentar em ano eleitoral

Em 2024, os municípios brasileiros escolhem prefeitos e vereadores e muitos deputados estaduais já estão de olho nas disputas aos Executivos de suas respectivas bases eleitorais, seja para figurar no pleito, seja no apoio aos aliados locais. Nesse contexto, o gasto com ações de publicidade dos parlamentares tende a aumentar.

Lúcio Big projeta esse cenário com base na experiência de fiscalização no Legislativo federal. “Não só tende a aumentar como irá. Historicamente, sempre aumenta. É tão cristalino quanto a água: vai chegando o final do ano, a despesa com divulgação aumenta. Em ano de eleição, então, deslancha”, disse o diretor-presidente do OPS.

Nas cidades paulistas, a eleição deste ano será a primeira com a cota de divulgação da Alesp em vigor. Isso pode modificar os cenários eleitorais pelo Estado na medida em que um candidato, eventualmente, tenha passado os últimos anos com acesso a esse recurso, enquanto seus adversários nas urnas, não.

Para Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil, a cota de divulgação dos deputados não só é prerrogativa do mandato como cumpre uma função democrática. Entretanto, é inevitável que o acesso aos recursos de autopromoção possa desequilibrar uma eleição. “Há um dever e um direito ao demonstrar à base o que parlamentar está fazendo. Mas, o que acontece é: o detentor de um cargo público vai usar dos recursos que tem para se promover eleitoralmente. A partir do momento em que se faz isso, você acaba com o princípio da isonomia entre candidatos”, disse. Esse dilema, segundo ela, é uma “linha tênue”.

A Alesp precisa zelar pelo uso da verba de forma adequada. A Casa deveria emitir um ato definindo melhor do que se trata a divulgação, com o que pode ser gasto e como isso não deve ser confundido com propaganda eleitoral

Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil

O que dizem os citados

O Estadão buscou contato com todos os deputados em exercício elencados nos gráficos. A assessoria de Rogério Nogueira disse que o gasto “é permitido pela Assembleia”, sendo “um dos principais meios de prestação de contas do trabalho do deputado”. Já o gabinete de Leci Brandão argumentou que a deputada “tem uma produção legislativa extensa e consistente” e a cota de divulgação é utilizada “rigorosamente dentro do que a lei permite”. Na mesma linha, os assessores de Itamar Borges afirmaram que a despesa está “em total conformidade com as normas da Alesp”.

Dirceu Dalben, por meio da chefia de gabinete, informou para a reportagem que o gasto com divulgação diz respeito à proposição legislativa, com destaque para as frentes parlamentares coordenadas pelo deputado. A assessoria de Carla Morando disse que a região do ABC, base eleitoral da deputada, “não tem rede de televisão, rádio ou jornais de grande circulação, o que obriga a parlamentar a publicar sobre seu mandato” nas redes sociais. A verba para essa finalidade é “legalmente autorizada para transparência”.

Em nota, Paulo Mansur afirmou que “toda a verba do gabinete é investida de maneira consciente e responsável”, evitando “qualquer gasto com o dinheiro público que não seja relacionado ao mandato”. Valdomiro Lopes, em entrevista, disse que “usa os recursos com muito critério”. Os gastos, segundo o parlamentar, são compatíveis com os utilizados pelos demais deputados do interior paulista.

A assessoria de Dani Alonso afirmou que “os recursos são utilizados de maneira estritamente legal e transparente”. Segundo a nota, a divulgação do mandato da deputada é “ampla e abrange todo o Estado de São Paulo”, com ênfase nas áreas de “Polícia Militar, agronegócio, rodeios e comércio de materiais de construção”. Solange Freitas disse que “a comunicação com a população é fundamental para a transparência” e que a divulgação do mandato é uma prestação de contas.

Em nota, Capitão Telhada disse que “os gastos do gabinete são realizados em conformidade com a legislação vigente e são submetidos à aprovação da Alesp mensalmente”. Beth Sahão, em nota, afirmou que “os gastos são plenamente compatíveis com o exercício do mandato”.

As assessorias de Clarice Ganem, Gil Diniz, Rômulo Fernandes e Ricardo França foram demandadas e acusaram o recebimento das perguntas, mas não responderam ao Estadão até a publicação desta reportagem.

Tenente Coimbra e Fabiana Bolsonaro preferiram não se manifestar. Fabiana não tem parentesco algum com Jair Bolsonaro (PL), mas adotou o sobrenome como homenagem ao ex-presidente. Na Alesp, há outra “Bolsonaro”: a Valéria Bolsonaro, casada com um primo de segundo grau de Jair.

Os deputados estaduais de São Paulo gastaram mais de R$ 3 milhões em dinheiro público para autopromoção em 2023. O valor mais do que dobra a soma do ano anterior: em 2022, o gasto da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) com publicidade dos parlamentares foi de R$ 1.342.162,61. Procurados, os deputados citados no levantamento argumentaram cumprir as regras estabelecidas.

Em 2024, ano de eleições municipais, nas quais muitos deputados da Alesp pleiteiam os Executivos de suas respectivas bases, o valor tende a aumentar. Será a primeira eleição nos municípios paulistas desde que a cota para divulgação foi criada. A última atualização dos dados no portal da Casa, utilizados no levantamento do Estadão, é de 25 de janeiro e, por isso, não é possível contabilizar ainda os gastos do primeiro mês deste ano.

O deputado estadual que mais gastou com a modalidade em 2023 foi Rogério Nogueira (PSDB). Foram R$ 110.000 com autopromoção, em 11 parcelas contínuas de R$ 10.000 mensais destinadas a uma agência de marketing. A deputada Leci Brandão (PCdoB) também superou a cifra dos R$ 100.000: de janeiro a dezembro, o gabinete de Brandão gastou R$ 102.100 com publicidade. Itamar Borges (MDB) aparece logo atrás, com R$ 94.853,32 gastos em propaganda no ano passado.

Há ainda um comparativo proporcional dos parlamentares que mais alocaram recursos de suas cotas com autopromoção. A deputada Carla Morando (PSDB), por exemplo, gastou 57,24% de toda a cota que solicitou em 2023 com serviços de publicidade do seu mandato. Na sequência, está Fabiana Bolsonaro (PL), com 49,93% da cota demandada no ano para despesas do tipo.

Os ex-deputados Bruno Ganem e Dr. Raul, do Podemos, aparecem logo atrás de Fabiana, com 48,66% e 46,89% da cota, respectivamente, para publicidade pessoal. Eles não exercem mandato na atual legislatura, que teve início em março de 2023, e constam no sistema de contas pelos gastos que solicitaram nos primeiros meses do ano passado, de 1º de janeiro a 15 de março. O terceiro deputado em exercício que mais gastou proporcionalmente com autopromoção é Gil Diniz (PL), com 44,73% da cota solicitada em propaganda, seguido por Valdomiro Lopes (PSB), com 39,48%, e Rogério Nogueira, com 37,54%.

Verba é pública, mas faltam diretrizes para o uso do recurso

A verba para publicidade é oriunda da cota parlamentar. Todo mês, os 94 deputados estaduais de São Paulo têm direito a aproximadamente R$ 40 mil para cobrir “despesas inerentes ao pleno exercício das atividades parlamentares”, como diz o Regimento Interno da Casa.

A finalidade “Divulgação da Atividade Parlamentar” é a mais nova opção de gastos com a verba pública, criada por um ato da Mesa de novembro de 2021, e replica um modelo já vigente na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

A despesa com publicidade, por si só, não é um problema. “A lógica do parlamentar é se comunicar com as pessoas. É do trabalho fazer a divulgação dos atos, por isso eles têm cota para isso”, explicou Marcelo Vitorino, consultor em marketing político e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Consultada sobre as regras para a utilização da cota de publicidade, a Alesp informou, por nota, que “cada gabinete é autônomo sobre a forma como se comunica com a população”.

“Quando se criou essa rubrica, a ideia era dar condições ao parlamentar para divulgar à sua base aquilo que ele tem feito. É uma prestação de contas, mas, com a falta de regulamentação, cada deputado faz a divulgação à sua maneira. Muitas vezes, impulsionam posições sociais que não têm a ver com o mandato”, disse Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS, especializado em fiscalização de políticas públicas.

Questionado sobre a finalidade dos recursos para publicidade, o deputado Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp, como um abaixo-assinado contra a “saidinha” de presos e publicações contra o aborto. Para Lopes, os temas integram sua atividade como parlamentar. “Não posso me restringir só às questões do Estado. São Paulo faz parte do País, somos uma federação. Quando você proíbe ou libera o aborto, você o faz no País todo, o que inclui São Paulo”, disse.

Deputado estadual Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp com recurso para publicidade Foto: Biblioteca de anúncios do Facebook

Para o professor Vitorino, opiniões sobre pautas sociais têm carga política, mas não deixam de ser de natureza pessoal. “A não ser que, dentro do Parlamento, haja uma discussão sobre o tema, na qual você vai pautar o assunto. Fora da proposição legal, é uma opinião pessoal”, afirmou o consultor. O aborto ou a “saidinha” escapam à prerrogativa do Legislativo estadual.

Fiscalização dos gastos e do conteúdo

O controle institucional da publicidade, por enquanto, é meramente contábil. O gabinete de cada deputado apresenta um documento atestando a despesa e o valor é ressarcido. “Não existe fiscalização do material produzido, pois esse tipo de despesa, inclusive na Alesp, não especifica o que pode ser feito. Falta uma regra mais rígida para direcionar de que forma o recurso público pode ser utilizado”, disse Lúcio Big.

Se faltam diretrizes quanto à produção, a fiscalização dos gastos também deixa a desejar, segundo Big. Para ele, a Alesp deveria apresentar publicamente as notas fiscais das despesas, como ocorre na Câmara dos Deputados, no Senado e na Câmara Municipal paulistana. Além disso, a plataforma da Assembleia não disponibiliza as despesas acumuladas no ano com encargos de gabinete de forma acessível ao cidadão. A visualização dos dados só está disponível em agrupamentos mensais.

Questionada sobre a fiscalização dos encargos de gabinete, a Alesp disse, por nota, que o ressarcimento das despesas é deferido ou negado somente após “criteriosa análise da documentação”. As solicitações, acrescentou a Casa, são analisadas pelo Núcleo de Fiscalização e Controle.

Como não existe a exigência de apresentar o material que foi produzido, acaba que nem a Casa legislativa nem o terceiro setor fiscaliza. A sociedade civil não dispõe de elementos para fiscalizar

Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS

A Alesp não fiscaliza o conteúdo divulgado, mas há dados disponíveis de forma pública, conforme a política de uso da Meta, administradora do Facebook e do Instagram. É diretriz da big tech que os anúncios de temas sociais e políticos, subsidiados com verba pública ou não, sejam discriminados nesta categoria. Por meio de um painel denominado Biblioteca de Anúncios, é possível visualizar todas as publicações impulsionadas por determinado perfil com ações de marketing.

Política de boas práticas, regras e formação

A publicidade do mandato não é problema – uma estratégia digital de marketing, muito menos, pois as redes sociais tendem a baratear as ações de comunicação e produzir resultados mais efetivos. “Desde que bem feito e bem planejado, o impulsionamento de conteúdo é o melhor meio de comunicação que existe para um parlamentar”, disse Marcelo Vitorino.

A maior vantagem, segundo o consultor, é a segmentação, tanto do conteúdo veiculado quanto do público atingido. Por mais que propagandas na internet não tenham o mesmo alcance do que em outros meios de comunicação, anúncios digitais possibilitam melhor custo-benefício, pois delimitam com maior precisão a mensagem transmitida e o público que a receberá.

Para Vitorino, porém, o uso positivo desse potencial demandaria das Casas legislativas uma política de boas práticas para as ferramentas. “Tem que ter regras e uma formação”, disse o professor da ESPM. Normas que esclarecessem a atual penumbra quanto ao conteúdo que pode ser impulsionado e formação, por sua vez, para que os recursos sejam bem alocados. Do contrário, segundo Marcelo Vitorino, seria “desperdício do erário”. No momento, a Alesp não tem nem uma coisa nem outra.

Gasto tende a aumentar em ano eleitoral

Em 2024, os municípios brasileiros escolhem prefeitos e vereadores e muitos deputados estaduais já estão de olho nas disputas aos Executivos de suas respectivas bases eleitorais, seja para figurar no pleito, seja no apoio aos aliados locais. Nesse contexto, o gasto com ações de publicidade dos parlamentares tende a aumentar.

Lúcio Big projeta esse cenário com base na experiência de fiscalização no Legislativo federal. “Não só tende a aumentar como irá. Historicamente, sempre aumenta. É tão cristalino quanto a água: vai chegando o final do ano, a despesa com divulgação aumenta. Em ano de eleição, então, deslancha”, disse o diretor-presidente do OPS.

Nas cidades paulistas, a eleição deste ano será a primeira com a cota de divulgação da Alesp em vigor. Isso pode modificar os cenários eleitorais pelo Estado na medida em que um candidato, eventualmente, tenha passado os últimos anos com acesso a esse recurso, enquanto seus adversários nas urnas, não.

Para Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil, a cota de divulgação dos deputados não só é prerrogativa do mandato como cumpre uma função democrática. Entretanto, é inevitável que o acesso aos recursos de autopromoção possa desequilibrar uma eleição. “Há um dever e um direito ao demonstrar à base o que parlamentar está fazendo. Mas, o que acontece é: o detentor de um cargo público vai usar dos recursos que tem para se promover eleitoralmente. A partir do momento em que se faz isso, você acaba com o princípio da isonomia entre candidatos”, disse. Esse dilema, segundo ela, é uma “linha tênue”.

A Alesp precisa zelar pelo uso da verba de forma adequada. A Casa deveria emitir um ato definindo melhor do que se trata a divulgação, com o que pode ser gasto e como isso não deve ser confundido com propaganda eleitoral

Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil

O que dizem os citados

O Estadão buscou contato com todos os deputados em exercício elencados nos gráficos. A assessoria de Rogério Nogueira disse que o gasto “é permitido pela Assembleia”, sendo “um dos principais meios de prestação de contas do trabalho do deputado”. Já o gabinete de Leci Brandão argumentou que a deputada “tem uma produção legislativa extensa e consistente” e a cota de divulgação é utilizada “rigorosamente dentro do que a lei permite”. Na mesma linha, os assessores de Itamar Borges afirmaram que a despesa está “em total conformidade com as normas da Alesp”.

Dirceu Dalben, por meio da chefia de gabinete, informou para a reportagem que o gasto com divulgação diz respeito à proposição legislativa, com destaque para as frentes parlamentares coordenadas pelo deputado. A assessoria de Carla Morando disse que a região do ABC, base eleitoral da deputada, “não tem rede de televisão, rádio ou jornais de grande circulação, o que obriga a parlamentar a publicar sobre seu mandato” nas redes sociais. A verba para essa finalidade é “legalmente autorizada para transparência”.

Em nota, Paulo Mansur afirmou que “toda a verba do gabinete é investida de maneira consciente e responsável”, evitando “qualquer gasto com o dinheiro público que não seja relacionado ao mandato”. Valdomiro Lopes, em entrevista, disse que “usa os recursos com muito critério”. Os gastos, segundo o parlamentar, são compatíveis com os utilizados pelos demais deputados do interior paulista.

A assessoria de Dani Alonso afirmou que “os recursos são utilizados de maneira estritamente legal e transparente”. Segundo a nota, a divulgação do mandato da deputada é “ampla e abrange todo o Estado de São Paulo”, com ênfase nas áreas de “Polícia Militar, agronegócio, rodeios e comércio de materiais de construção”. Solange Freitas disse que “a comunicação com a população é fundamental para a transparência” e que a divulgação do mandato é uma prestação de contas.

Em nota, Capitão Telhada disse que “os gastos do gabinete são realizados em conformidade com a legislação vigente e são submetidos à aprovação da Alesp mensalmente”. Beth Sahão, em nota, afirmou que “os gastos são plenamente compatíveis com o exercício do mandato”.

As assessorias de Clarice Ganem, Gil Diniz, Rômulo Fernandes e Ricardo França foram demandadas e acusaram o recebimento das perguntas, mas não responderam ao Estadão até a publicação desta reportagem.

Tenente Coimbra e Fabiana Bolsonaro preferiram não se manifestar. Fabiana não tem parentesco algum com Jair Bolsonaro (PL), mas adotou o sobrenome como homenagem ao ex-presidente. Na Alesp, há outra “Bolsonaro”: a Valéria Bolsonaro, casada com um primo de segundo grau de Jair.

Os deputados estaduais de São Paulo gastaram mais de R$ 3 milhões em dinheiro público para autopromoção em 2023. O valor mais do que dobra a soma do ano anterior: em 2022, o gasto da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) com publicidade dos parlamentares foi de R$ 1.342.162,61. Procurados, os deputados citados no levantamento argumentaram cumprir as regras estabelecidas.

Em 2024, ano de eleições municipais, nas quais muitos deputados da Alesp pleiteiam os Executivos de suas respectivas bases, o valor tende a aumentar. Será a primeira eleição nos municípios paulistas desde que a cota para divulgação foi criada. A última atualização dos dados no portal da Casa, utilizados no levantamento do Estadão, é de 25 de janeiro e, por isso, não é possível contabilizar ainda os gastos do primeiro mês deste ano.

O deputado estadual que mais gastou com a modalidade em 2023 foi Rogério Nogueira (PSDB). Foram R$ 110.000 com autopromoção, em 11 parcelas contínuas de R$ 10.000 mensais destinadas a uma agência de marketing. A deputada Leci Brandão (PCdoB) também superou a cifra dos R$ 100.000: de janeiro a dezembro, o gabinete de Brandão gastou R$ 102.100 com publicidade. Itamar Borges (MDB) aparece logo atrás, com R$ 94.853,32 gastos em propaganda no ano passado.

Há ainda um comparativo proporcional dos parlamentares que mais alocaram recursos de suas cotas com autopromoção. A deputada Carla Morando (PSDB), por exemplo, gastou 57,24% de toda a cota que solicitou em 2023 com serviços de publicidade do seu mandato. Na sequência, está Fabiana Bolsonaro (PL), com 49,93% da cota demandada no ano para despesas do tipo.

Os ex-deputados Bruno Ganem e Dr. Raul, do Podemos, aparecem logo atrás de Fabiana, com 48,66% e 46,89% da cota, respectivamente, para publicidade pessoal. Eles não exercem mandato na atual legislatura, que teve início em março de 2023, e constam no sistema de contas pelos gastos que solicitaram nos primeiros meses do ano passado, de 1º de janeiro a 15 de março. O terceiro deputado em exercício que mais gastou proporcionalmente com autopromoção é Gil Diniz (PL), com 44,73% da cota solicitada em propaganda, seguido por Valdomiro Lopes (PSB), com 39,48%, e Rogério Nogueira, com 37,54%.

Verba é pública, mas faltam diretrizes para o uso do recurso

A verba para publicidade é oriunda da cota parlamentar. Todo mês, os 94 deputados estaduais de São Paulo têm direito a aproximadamente R$ 40 mil para cobrir “despesas inerentes ao pleno exercício das atividades parlamentares”, como diz o Regimento Interno da Casa.

A finalidade “Divulgação da Atividade Parlamentar” é a mais nova opção de gastos com a verba pública, criada por um ato da Mesa de novembro de 2021, e replica um modelo já vigente na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

A despesa com publicidade, por si só, não é um problema. “A lógica do parlamentar é se comunicar com as pessoas. É do trabalho fazer a divulgação dos atos, por isso eles têm cota para isso”, explicou Marcelo Vitorino, consultor em marketing político e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Consultada sobre as regras para a utilização da cota de publicidade, a Alesp informou, por nota, que “cada gabinete é autônomo sobre a forma como se comunica com a população”.

“Quando se criou essa rubrica, a ideia era dar condições ao parlamentar para divulgar à sua base aquilo que ele tem feito. É uma prestação de contas, mas, com a falta de regulamentação, cada deputado faz a divulgação à sua maneira. Muitas vezes, impulsionam posições sociais que não têm a ver com o mandato”, disse Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS, especializado em fiscalização de políticas públicas.

Questionado sobre a finalidade dos recursos para publicidade, o deputado Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp, como um abaixo-assinado contra a “saidinha” de presos e publicações contra o aborto. Para Lopes, os temas integram sua atividade como parlamentar. “Não posso me restringir só às questões do Estado. São Paulo faz parte do País, somos uma federação. Quando você proíbe ou libera o aborto, você o faz no País todo, o que inclui São Paulo”, disse.

Deputado estadual Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp com recurso para publicidade Foto: Biblioteca de anúncios do Facebook

Para o professor Vitorino, opiniões sobre pautas sociais têm carga política, mas não deixam de ser de natureza pessoal. “A não ser que, dentro do Parlamento, haja uma discussão sobre o tema, na qual você vai pautar o assunto. Fora da proposição legal, é uma opinião pessoal”, afirmou o consultor. O aborto ou a “saidinha” escapam à prerrogativa do Legislativo estadual.

Fiscalização dos gastos e do conteúdo

O controle institucional da publicidade, por enquanto, é meramente contábil. O gabinete de cada deputado apresenta um documento atestando a despesa e o valor é ressarcido. “Não existe fiscalização do material produzido, pois esse tipo de despesa, inclusive na Alesp, não especifica o que pode ser feito. Falta uma regra mais rígida para direcionar de que forma o recurso público pode ser utilizado”, disse Lúcio Big.

Se faltam diretrizes quanto à produção, a fiscalização dos gastos também deixa a desejar, segundo Big. Para ele, a Alesp deveria apresentar publicamente as notas fiscais das despesas, como ocorre na Câmara dos Deputados, no Senado e na Câmara Municipal paulistana. Além disso, a plataforma da Assembleia não disponibiliza as despesas acumuladas no ano com encargos de gabinete de forma acessível ao cidadão. A visualização dos dados só está disponível em agrupamentos mensais.

Questionada sobre a fiscalização dos encargos de gabinete, a Alesp disse, por nota, que o ressarcimento das despesas é deferido ou negado somente após “criteriosa análise da documentação”. As solicitações, acrescentou a Casa, são analisadas pelo Núcleo de Fiscalização e Controle.

Como não existe a exigência de apresentar o material que foi produzido, acaba que nem a Casa legislativa nem o terceiro setor fiscaliza. A sociedade civil não dispõe de elementos para fiscalizar

Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS

A Alesp não fiscaliza o conteúdo divulgado, mas há dados disponíveis de forma pública, conforme a política de uso da Meta, administradora do Facebook e do Instagram. É diretriz da big tech que os anúncios de temas sociais e políticos, subsidiados com verba pública ou não, sejam discriminados nesta categoria. Por meio de um painel denominado Biblioteca de Anúncios, é possível visualizar todas as publicações impulsionadas por determinado perfil com ações de marketing.

Política de boas práticas, regras e formação

A publicidade do mandato não é problema – uma estratégia digital de marketing, muito menos, pois as redes sociais tendem a baratear as ações de comunicação e produzir resultados mais efetivos. “Desde que bem feito e bem planejado, o impulsionamento de conteúdo é o melhor meio de comunicação que existe para um parlamentar”, disse Marcelo Vitorino.

A maior vantagem, segundo o consultor, é a segmentação, tanto do conteúdo veiculado quanto do público atingido. Por mais que propagandas na internet não tenham o mesmo alcance do que em outros meios de comunicação, anúncios digitais possibilitam melhor custo-benefício, pois delimitam com maior precisão a mensagem transmitida e o público que a receberá.

Para Vitorino, porém, o uso positivo desse potencial demandaria das Casas legislativas uma política de boas práticas para as ferramentas. “Tem que ter regras e uma formação”, disse o professor da ESPM. Normas que esclarecessem a atual penumbra quanto ao conteúdo que pode ser impulsionado e formação, por sua vez, para que os recursos sejam bem alocados. Do contrário, segundo Marcelo Vitorino, seria “desperdício do erário”. No momento, a Alesp não tem nem uma coisa nem outra.

Gasto tende a aumentar em ano eleitoral

Em 2024, os municípios brasileiros escolhem prefeitos e vereadores e muitos deputados estaduais já estão de olho nas disputas aos Executivos de suas respectivas bases eleitorais, seja para figurar no pleito, seja no apoio aos aliados locais. Nesse contexto, o gasto com ações de publicidade dos parlamentares tende a aumentar.

Lúcio Big projeta esse cenário com base na experiência de fiscalização no Legislativo federal. “Não só tende a aumentar como irá. Historicamente, sempre aumenta. É tão cristalino quanto a água: vai chegando o final do ano, a despesa com divulgação aumenta. Em ano de eleição, então, deslancha”, disse o diretor-presidente do OPS.

Nas cidades paulistas, a eleição deste ano será a primeira com a cota de divulgação da Alesp em vigor. Isso pode modificar os cenários eleitorais pelo Estado na medida em que um candidato, eventualmente, tenha passado os últimos anos com acesso a esse recurso, enquanto seus adversários nas urnas, não.

Para Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil, a cota de divulgação dos deputados não só é prerrogativa do mandato como cumpre uma função democrática. Entretanto, é inevitável que o acesso aos recursos de autopromoção possa desequilibrar uma eleição. “Há um dever e um direito ao demonstrar à base o que parlamentar está fazendo. Mas, o que acontece é: o detentor de um cargo público vai usar dos recursos que tem para se promover eleitoralmente. A partir do momento em que se faz isso, você acaba com o princípio da isonomia entre candidatos”, disse. Esse dilema, segundo ela, é uma “linha tênue”.

A Alesp precisa zelar pelo uso da verba de forma adequada. A Casa deveria emitir um ato definindo melhor do que se trata a divulgação, com o que pode ser gasto e como isso não deve ser confundido com propaganda eleitoral

Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil

O que dizem os citados

O Estadão buscou contato com todos os deputados em exercício elencados nos gráficos. A assessoria de Rogério Nogueira disse que o gasto “é permitido pela Assembleia”, sendo “um dos principais meios de prestação de contas do trabalho do deputado”. Já o gabinete de Leci Brandão argumentou que a deputada “tem uma produção legislativa extensa e consistente” e a cota de divulgação é utilizada “rigorosamente dentro do que a lei permite”. Na mesma linha, os assessores de Itamar Borges afirmaram que a despesa está “em total conformidade com as normas da Alesp”.

Dirceu Dalben, por meio da chefia de gabinete, informou para a reportagem que o gasto com divulgação diz respeito à proposição legislativa, com destaque para as frentes parlamentares coordenadas pelo deputado. A assessoria de Carla Morando disse que a região do ABC, base eleitoral da deputada, “não tem rede de televisão, rádio ou jornais de grande circulação, o que obriga a parlamentar a publicar sobre seu mandato” nas redes sociais. A verba para essa finalidade é “legalmente autorizada para transparência”.

Em nota, Paulo Mansur afirmou que “toda a verba do gabinete é investida de maneira consciente e responsável”, evitando “qualquer gasto com o dinheiro público que não seja relacionado ao mandato”. Valdomiro Lopes, em entrevista, disse que “usa os recursos com muito critério”. Os gastos, segundo o parlamentar, são compatíveis com os utilizados pelos demais deputados do interior paulista.

A assessoria de Dani Alonso afirmou que “os recursos são utilizados de maneira estritamente legal e transparente”. Segundo a nota, a divulgação do mandato da deputada é “ampla e abrange todo o Estado de São Paulo”, com ênfase nas áreas de “Polícia Militar, agronegócio, rodeios e comércio de materiais de construção”. Solange Freitas disse que “a comunicação com a população é fundamental para a transparência” e que a divulgação do mandato é uma prestação de contas.

Em nota, Capitão Telhada disse que “os gastos do gabinete são realizados em conformidade com a legislação vigente e são submetidos à aprovação da Alesp mensalmente”. Beth Sahão, em nota, afirmou que “os gastos são plenamente compatíveis com o exercício do mandato”.

As assessorias de Clarice Ganem, Gil Diniz, Rômulo Fernandes e Ricardo França foram demandadas e acusaram o recebimento das perguntas, mas não responderam ao Estadão até a publicação desta reportagem.

Tenente Coimbra e Fabiana Bolsonaro preferiram não se manifestar. Fabiana não tem parentesco algum com Jair Bolsonaro (PL), mas adotou o sobrenome como homenagem ao ex-presidente. Na Alesp, há outra “Bolsonaro”: a Valéria Bolsonaro, casada com um primo de segundo grau de Jair.

Os deputados estaduais de São Paulo gastaram mais de R$ 3 milhões em dinheiro público para autopromoção em 2023. O valor mais do que dobra a soma do ano anterior: em 2022, o gasto da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) com publicidade dos parlamentares foi de R$ 1.342.162,61. Procurados, os deputados citados no levantamento argumentaram cumprir as regras estabelecidas.

Em 2024, ano de eleições municipais, nas quais muitos deputados da Alesp pleiteiam os Executivos de suas respectivas bases, o valor tende a aumentar. Será a primeira eleição nos municípios paulistas desde que a cota para divulgação foi criada. A última atualização dos dados no portal da Casa, utilizados no levantamento do Estadão, é de 25 de janeiro e, por isso, não é possível contabilizar ainda os gastos do primeiro mês deste ano.

O deputado estadual que mais gastou com a modalidade em 2023 foi Rogério Nogueira (PSDB). Foram R$ 110.000 com autopromoção, em 11 parcelas contínuas de R$ 10.000 mensais destinadas a uma agência de marketing. A deputada Leci Brandão (PCdoB) também superou a cifra dos R$ 100.000: de janeiro a dezembro, o gabinete de Brandão gastou R$ 102.100 com publicidade. Itamar Borges (MDB) aparece logo atrás, com R$ 94.853,32 gastos em propaganda no ano passado.

Há ainda um comparativo proporcional dos parlamentares que mais alocaram recursos de suas cotas com autopromoção. A deputada Carla Morando (PSDB), por exemplo, gastou 57,24% de toda a cota que solicitou em 2023 com serviços de publicidade do seu mandato. Na sequência, está Fabiana Bolsonaro (PL), com 49,93% da cota demandada no ano para despesas do tipo.

Os ex-deputados Bruno Ganem e Dr. Raul, do Podemos, aparecem logo atrás de Fabiana, com 48,66% e 46,89% da cota, respectivamente, para publicidade pessoal. Eles não exercem mandato na atual legislatura, que teve início em março de 2023, e constam no sistema de contas pelos gastos que solicitaram nos primeiros meses do ano passado, de 1º de janeiro a 15 de março. O terceiro deputado em exercício que mais gastou proporcionalmente com autopromoção é Gil Diniz (PL), com 44,73% da cota solicitada em propaganda, seguido por Valdomiro Lopes (PSB), com 39,48%, e Rogério Nogueira, com 37,54%.

Verba é pública, mas faltam diretrizes para o uso do recurso

A verba para publicidade é oriunda da cota parlamentar. Todo mês, os 94 deputados estaduais de São Paulo têm direito a aproximadamente R$ 40 mil para cobrir “despesas inerentes ao pleno exercício das atividades parlamentares”, como diz o Regimento Interno da Casa.

A finalidade “Divulgação da Atividade Parlamentar” é a mais nova opção de gastos com a verba pública, criada por um ato da Mesa de novembro de 2021, e replica um modelo já vigente na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

A despesa com publicidade, por si só, não é um problema. “A lógica do parlamentar é se comunicar com as pessoas. É do trabalho fazer a divulgação dos atos, por isso eles têm cota para isso”, explicou Marcelo Vitorino, consultor em marketing político e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Consultada sobre as regras para a utilização da cota de publicidade, a Alesp informou, por nota, que “cada gabinete é autônomo sobre a forma como se comunica com a população”.

“Quando se criou essa rubrica, a ideia era dar condições ao parlamentar para divulgar à sua base aquilo que ele tem feito. É uma prestação de contas, mas, com a falta de regulamentação, cada deputado faz a divulgação à sua maneira. Muitas vezes, impulsionam posições sociais que não têm a ver com o mandato”, disse Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS, especializado em fiscalização de políticas públicas.

Questionado sobre a finalidade dos recursos para publicidade, o deputado Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp, como um abaixo-assinado contra a “saidinha” de presos e publicações contra o aborto. Para Lopes, os temas integram sua atividade como parlamentar. “Não posso me restringir só às questões do Estado. São Paulo faz parte do País, somos uma federação. Quando você proíbe ou libera o aborto, você o faz no País todo, o que inclui São Paulo”, disse.

Deputado estadual Valdomiro Lopes admitiu ter pagado anúncios sobre temas alheios à Alesp com recurso para publicidade Foto: Biblioteca de anúncios do Facebook

Para o professor Vitorino, opiniões sobre pautas sociais têm carga política, mas não deixam de ser de natureza pessoal. “A não ser que, dentro do Parlamento, haja uma discussão sobre o tema, na qual você vai pautar o assunto. Fora da proposição legal, é uma opinião pessoal”, afirmou o consultor. O aborto ou a “saidinha” escapam à prerrogativa do Legislativo estadual.

Fiscalização dos gastos e do conteúdo

O controle institucional da publicidade, por enquanto, é meramente contábil. O gabinete de cada deputado apresenta um documento atestando a despesa e o valor é ressarcido. “Não existe fiscalização do material produzido, pois esse tipo de despesa, inclusive na Alesp, não especifica o que pode ser feito. Falta uma regra mais rígida para direcionar de que forma o recurso público pode ser utilizado”, disse Lúcio Big.

Se faltam diretrizes quanto à produção, a fiscalização dos gastos também deixa a desejar, segundo Big. Para ele, a Alesp deveria apresentar publicamente as notas fiscais das despesas, como ocorre na Câmara dos Deputados, no Senado e na Câmara Municipal paulistana. Além disso, a plataforma da Assembleia não disponibiliza as despesas acumuladas no ano com encargos de gabinete de forma acessível ao cidadão. A visualização dos dados só está disponível em agrupamentos mensais.

Questionada sobre a fiscalização dos encargos de gabinete, a Alesp disse, por nota, que o ressarcimento das despesas é deferido ou negado somente após “criteriosa análise da documentação”. As solicitações, acrescentou a Casa, são analisadas pelo Núcleo de Fiscalização e Controle.

Como não existe a exigência de apresentar o material que foi produzido, acaba que nem a Casa legislativa nem o terceiro setor fiscaliza. A sociedade civil não dispõe de elementos para fiscalizar

Lúcio Big, diretor-presidente do Instituto OPS

A Alesp não fiscaliza o conteúdo divulgado, mas há dados disponíveis de forma pública, conforme a política de uso da Meta, administradora do Facebook e do Instagram. É diretriz da big tech que os anúncios de temas sociais e políticos, subsidiados com verba pública ou não, sejam discriminados nesta categoria. Por meio de um painel denominado Biblioteca de Anúncios, é possível visualizar todas as publicações impulsionadas por determinado perfil com ações de marketing.

Política de boas práticas, regras e formação

A publicidade do mandato não é problema – uma estratégia digital de marketing, muito menos, pois as redes sociais tendem a baratear as ações de comunicação e produzir resultados mais efetivos. “Desde que bem feito e bem planejado, o impulsionamento de conteúdo é o melhor meio de comunicação que existe para um parlamentar”, disse Marcelo Vitorino.

A maior vantagem, segundo o consultor, é a segmentação, tanto do conteúdo veiculado quanto do público atingido. Por mais que propagandas na internet não tenham o mesmo alcance do que em outros meios de comunicação, anúncios digitais possibilitam melhor custo-benefício, pois delimitam com maior precisão a mensagem transmitida e o público que a receberá.

Para Vitorino, porém, o uso positivo desse potencial demandaria das Casas legislativas uma política de boas práticas para as ferramentas. “Tem que ter regras e uma formação”, disse o professor da ESPM. Normas que esclarecessem a atual penumbra quanto ao conteúdo que pode ser impulsionado e formação, por sua vez, para que os recursos sejam bem alocados. Do contrário, segundo Marcelo Vitorino, seria “desperdício do erário”. No momento, a Alesp não tem nem uma coisa nem outra.

Gasto tende a aumentar em ano eleitoral

Em 2024, os municípios brasileiros escolhem prefeitos e vereadores e muitos deputados estaduais já estão de olho nas disputas aos Executivos de suas respectivas bases eleitorais, seja para figurar no pleito, seja no apoio aos aliados locais. Nesse contexto, o gasto com ações de publicidade dos parlamentares tende a aumentar.

Lúcio Big projeta esse cenário com base na experiência de fiscalização no Legislativo federal. “Não só tende a aumentar como irá. Historicamente, sempre aumenta. É tão cristalino quanto a água: vai chegando o final do ano, a despesa com divulgação aumenta. Em ano de eleição, então, deslancha”, disse o diretor-presidente do OPS.

Nas cidades paulistas, a eleição deste ano será a primeira com a cota de divulgação da Alesp em vigor. Isso pode modificar os cenários eleitorais pelo Estado na medida em que um candidato, eventualmente, tenha passado os últimos anos com acesso a esse recurso, enquanto seus adversários nas urnas, não.

Para Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil, a cota de divulgação dos deputados não só é prerrogativa do mandato como cumpre uma função democrática. Entretanto, é inevitável que o acesso aos recursos de autopromoção possa desequilibrar uma eleição. “Há um dever e um direito ao demonstrar à base o que parlamentar está fazendo. Mas, o que acontece é: o detentor de um cargo público vai usar dos recursos que tem para se promover eleitoralmente. A partir do momento em que se faz isso, você acaba com o princípio da isonomia entre candidatos”, disse. Esse dilema, segundo ela, é uma “linha tênue”.

A Alesp precisa zelar pelo uso da verba de forma adequada. A Casa deveria emitir um ato definindo melhor do que se trata a divulgação, com o que pode ser gasto e como isso não deve ser confundido com propaganda eleitoral

Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil

O que dizem os citados

O Estadão buscou contato com todos os deputados em exercício elencados nos gráficos. A assessoria de Rogério Nogueira disse que o gasto “é permitido pela Assembleia”, sendo “um dos principais meios de prestação de contas do trabalho do deputado”. Já o gabinete de Leci Brandão argumentou que a deputada “tem uma produção legislativa extensa e consistente” e a cota de divulgação é utilizada “rigorosamente dentro do que a lei permite”. Na mesma linha, os assessores de Itamar Borges afirmaram que a despesa está “em total conformidade com as normas da Alesp”.

Dirceu Dalben, por meio da chefia de gabinete, informou para a reportagem que o gasto com divulgação diz respeito à proposição legislativa, com destaque para as frentes parlamentares coordenadas pelo deputado. A assessoria de Carla Morando disse que a região do ABC, base eleitoral da deputada, “não tem rede de televisão, rádio ou jornais de grande circulação, o que obriga a parlamentar a publicar sobre seu mandato” nas redes sociais. A verba para essa finalidade é “legalmente autorizada para transparência”.

Em nota, Paulo Mansur afirmou que “toda a verba do gabinete é investida de maneira consciente e responsável”, evitando “qualquer gasto com o dinheiro público que não seja relacionado ao mandato”. Valdomiro Lopes, em entrevista, disse que “usa os recursos com muito critério”. Os gastos, segundo o parlamentar, são compatíveis com os utilizados pelos demais deputados do interior paulista.

A assessoria de Dani Alonso afirmou que “os recursos são utilizados de maneira estritamente legal e transparente”. Segundo a nota, a divulgação do mandato da deputada é “ampla e abrange todo o Estado de São Paulo”, com ênfase nas áreas de “Polícia Militar, agronegócio, rodeios e comércio de materiais de construção”. Solange Freitas disse que “a comunicação com a população é fundamental para a transparência” e que a divulgação do mandato é uma prestação de contas.

Em nota, Capitão Telhada disse que “os gastos do gabinete são realizados em conformidade com a legislação vigente e são submetidos à aprovação da Alesp mensalmente”. Beth Sahão, em nota, afirmou que “os gastos são plenamente compatíveis com o exercício do mandato”.

As assessorias de Clarice Ganem, Gil Diniz, Rômulo Fernandes e Ricardo França foram demandadas e acusaram o recebimento das perguntas, mas não responderam ao Estadão até a publicação desta reportagem.

Tenente Coimbra e Fabiana Bolsonaro preferiram não se manifestar. Fabiana não tem parentesco algum com Jair Bolsonaro (PL), mas adotou o sobrenome como homenagem ao ex-presidente. Na Alesp, há outra “Bolsonaro”: a Valéria Bolsonaro, casada com um primo de segundo grau de Jair.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.