Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

O planejamento e a visão estratégica nas relações exteriores*


Por Redação

Benoni Belli, é Secretário de Planejamento Diplomático do Ministério das Relações Exteriores.

 

Há 70 anos, ao ser nomeado o primeiro diretor de planejamento do Departamento de Estado dos EUA, o diplomata George Kennan recebeu de seu chefe, o Secretário de Estado George Marshall, um único conselho, tão sucinto quanto penetrante: evite as trivialidades. Como bom estrategista, entendeu que era preciso ter clareza das prioridades e dos objetivos a perseguir, casando-os com os meios mais adequados. O trabalho de planejamento diplomático enfrenta hoje desafios semelhantes, mas com o agravante de que o mundo ficou ainda mais imprevisível e complexo desde a época de Kennan, naquele início de Guerra Fria. Por isso mesmo, o planejamento estratégico continua mais relevante do que nunca.

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A elaboração de uma estratégia de inserção internacional por meio do esforço de planejamento diplomático deve lidar com incertezas internas e externas, que são seus condicionantes. As incertezas domésticas derivam da oscilação da conjuntura política e econômica, bem como da complexa construção de consensos. Esses são fatores cambiantes por natureza, que podem favorecer ou dificultar a definição de grandes objetivos nas áreas do desenvolvimento, do comércio, da paz e segurança, dos direitos humanos, entre outras. Quanto maior o grau de consenso, mais segura será a base sobre a qual o planejamento de política exterior projetará suas prioridades e definirá seus objetivos e metas. E, inversamente, a dificuldade de planejar cresce com a polarização política doméstica.

Em política externa, o fato de se lidar com um ambiente em que convivem várias soberanias é um complicador em relação às demais políticas públicas. Basta lembrar, a título ilustrativo, que os cálculos de política externa são afetados por multiplicidade de eventos internacionais que podem tomar direções inesperadas: a concretização de cenários improváveis em eleições e consultas populares; a ascensão de forças políticas antiglobalização em determinadas partes do mundo; o aumento da tensão geopolítica em função de comportamentos imprevisíveis de líderes políticos. Em alguns casos, é possível identificar tendências, analisar riscos e antecipar cenários. Na maioria das vezes, porém, a realidade surpreende, põe por terra pressupostos e invalida conclusões.

Diante dos constrangimentos impostos pelo imponderável da conjuntura interna e pelo dinamismo do sistema internacional, pareceria legítimo perguntar qual seria o ganho a ser obtido em um esforço de planejamento de política externa. A grande vantagem é precisamente evitar as trivialidades, concentrando-se na identificação das prioridades e na abertura de espaços para realização dos objetivos definidos pelo país. O processo de planejamento pressupõe esforço sistemático de reflexão sobre os rumos da ordem global, consultas (no governo e com a sociedade) e identificação de riscos e oportunidades, gerando uma massa crítica de conhecimento e conectando atores relevantes que podem oferecer visões, ideias e propostas sobre como melhor perseguir os interesses do país. O resultado é uma política mais consciente dos riscos derivados do ambiente em que opera, dos interesses em jogo e das prioridades que devem ser perseguidas.

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A atividade de planejamento constitui ferramenta valiosa para desenhar e formular políticas, ao propiciar reflexão estruturada sobre os desafios internacionais e apontar caminhos possíveis para a perseguição dos interesses nacionais. Mudanças bruscas e o aumento da incerteza tornam a tarefa mais difícil, porém ainda mais necessária. Afinal, a bússola é instrumento mais útil em meio à tempestade do que em dias de horizonte desanuviado. Antecipar-se a tendências e preparar-se para o mundo que desponta no horizonte, inclusive para o caso de confirmação de cenários menos favoráveis, não se confunde com previsões destituídas de base objetiva. Não há bola de cristal na atividade de planejar, cuja ambição se limita a apontar caminhos para moldar a realidade internacional aos interesses nacionais, evitando que sejamos tragados pelo fluxo incessante dos acontecimentos.

Hoje, a realidade se mostra particularmente incerta com o descompasso entre as regras vigentes nos diversos tabuleiros das relações internacionais e a efetiva distribuição mundial do poder político e econômico (o Conselho de Segurança da ONU congelado no tempo é o exemplo emblemático). Além disso, há um evidente mal-estar com a globalização, que ameaça abalar alguns pilares da ordem mundial construída no pós-Segunda Guerra (o protecionismo e a xenofobia soam alarmes preocupantes). O planejamento estratégico deve lidar com essa realidade e ensejar um questionamento permanente, aliando pensamento crítico à formulação da política externa.

Diante das transformações em curso, qual configuração de poder mundial prevalecerá no século XXI? A ascensão dos chamados países emergentes consolidará um sistema mais equilibrado e aberto aos interesses do Brasil? A existência de novos polos de poder garantirá mais estabilidade e prosperidade para todos ou, ao contrário, inaugurará uma nova era de rivalidades e tensões entre grandes potências? Será possível encontrar soluções globais aos grandes desafios na área da paz e segurança, do desarmamento, da mudança do clima e do desenvolvimento? O populismo e o discurso xenófobo lograrão enfraquecer o compromisso internacional com os direitos humanos e com o sistema de comércio aberto?

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Ao formular perguntas desse tipo, o planejamento estratégico funde pensamento e ação. Não faz diagnóstico e nem desenha cenários por simples diletantismo, mas com sentido prático, buscando moldar a política externa às reais necessidades do país, com a flexibilidade para realizar adequações exigidas pela marcha dos acontecimentos. Procura dar um sentido estratégico à ação externa. E estratégia significa clareza de prioridades e objetivos, acompanhada da definição de meios para persegui-los. Em suma, significa evitar a armadilha das trivialidades, o que, se não garante êxito total da estratégia resultante, ao menos aumenta a chance de se obter o melhor resultado possível diante das circunstâncias, inclusive em períodos de alta volatilidade e incerteza.

*Este artigo foi escrito a título pessoal e não reflete necessariamente posições oficiais do MRE.

Benoni Belli, é Secretário de Planejamento Diplomático do Ministério das Relações Exteriores.

 

Há 70 anos, ao ser nomeado o primeiro diretor de planejamento do Departamento de Estado dos EUA, o diplomata George Kennan recebeu de seu chefe, o Secretário de Estado George Marshall, um único conselho, tão sucinto quanto penetrante: evite as trivialidades. Como bom estrategista, entendeu que era preciso ter clareza das prioridades e dos objetivos a perseguir, casando-os com os meios mais adequados. O trabalho de planejamento diplomático enfrenta hoje desafios semelhantes, mas com o agravante de que o mundo ficou ainda mais imprevisível e complexo desde a época de Kennan, naquele início de Guerra Fria. Por isso mesmo, o planejamento estratégico continua mais relevante do que nunca.

A elaboração de uma estratégia de inserção internacional por meio do esforço de planejamento diplomático deve lidar com incertezas internas e externas, que são seus condicionantes. As incertezas domésticas derivam da oscilação da conjuntura política e econômica, bem como da complexa construção de consensos. Esses são fatores cambiantes por natureza, que podem favorecer ou dificultar a definição de grandes objetivos nas áreas do desenvolvimento, do comércio, da paz e segurança, dos direitos humanos, entre outras. Quanto maior o grau de consenso, mais segura será a base sobre a qual o planejamento de política exterior projetará suas prioridades e definirá seus objetivos e metas. E, inversamente, a dificuldade de planejar cresce com a polarização política doméstica.

Em política externa, o fato de se lidar com um ambiente em que convivem várias soberanias é um complicador em relação às demais políticas públicas. Basta lembrar, a título ilustrativo, que os cálculos de política externa são afetados por multiplicidade de eventos internacionais que podem tomar direções inesperadas: a concretização de cenários improváveis em eleições e consultas populares; a ascensão de forças políticas antiglobalização em determinadas partes do mundo; o aumento da tensão geopolítica em função de comportamentos imprevisíveis de líderes políticos. Em alguns casos, é possível identificar tendências, analisar riscos e antecipar cenários. Na maioria das vezes, porém, a realidade surpreende, põe por terra pressupostos e invalida conclusões.

Diante dos constrangimentos impostos pelo imponderável da conjuntura interna e pelo dinamismo do sistema internacional, pareceria legítimo perguntar qual seria o ganho a ser obtido em um esforço de planejamento de política externa. A grande vantagem é precisamente evitar as trivialidades, concentrando-se na identificação das prioridades e na abertura de espaços para realização dos objetivos definidos pelo país. O processo de planejamento pressupõe esforço sistemático de reflexão sobre os rumos da ordem global, consultas (no governo e com a sociedade) e identificação de riscos e oportunidades, gerando uma massa crítica de conhecimento e conectando atores relevantes que podem oferecer visões, ideias e propostas sobre como melhor perseguir os interesses do país. O resultado é uma política mais consciente dos riscos derivados do ambiente em que opera, dos interesses em jogo e das prioridades que devem ser perseguidas.

A atividade de planejamento constitui ferramenta valiosa para desenhar e formular políticas, ao propiciar reflexão estruturada sobre os desafios internacionais e apontar caminhos possíveis para a perseguição dos interesses nacionais. Mudanças bruscas e o aumento da incerteza tornam a tarefa mais difícil, porém ainda mais necessária. Afinal, a bússola é instrumento mais útil em meio à tempestade do que em dias de horizonte desanuviado. Antecipar-se a tendências e preparar-se para o mundo que desponta no horizonte, inclusive para o caso de confirmação de cenários menos favoráveis, não se confunde com previsões destituídas de base objetiva. Não há bola de cristal na atividade de planejar, cuja ambição se limita a apontar caminhos para moldar a realidade internacional aos interesses nacionais, evitando que sejamos tragados pelo fluxo incessante dos acontecimentos.

Hoje, a realidade se mostra particularmente incerta com o descompasso entre as regras vigentes nos diversos tabuleiros das relações internacionais e a efetiva distribuição mundial do poder político e econômico (o Conselho de Segurança da ONU congelado no tempo é o exemplo emblemático). Além disso, há um evidente mal-estar com a globalização, que ameaça abalar alguns pilares da ordem mundial construída no pós-Segunda Guerra (o protecionismo e a xenofobia soam alarmes preocupantes). O planejamento estratégico deve lidar com essa realidade e ensejar um questionamento permanente, aliando pensamento crítico à formulação da política externa.

Diante das transformações em curso, qual configuração de poder mundial prevalecerá no século XXI? A ascensão dos chamados países emergentes consolidará um sistema mais equilibrado e aberto aos interesses do Brasil? A existência de novos polos de poder garantirá mais estabilidade e prosperidade para todos ou, ao contrário, inaugurará uma nova era de rivalidades e tensões entre grandes potências? Será possível encontrar soluções globais aos grandes desafios na área da paz e segurança, do desarmamento, da mudança do clima e do desenvolvimento? O populismo e o discurso xenófobo lograrão enfraquecer o compromisso internacional com os direitos humanos e com o sistema de comércio aberto?

Ao formular perguntas desse tipo, o planejamento estratégico funde pensamento e ação. Não faz diagnóstico e nem desenha cenários por simples diletantismo, mas com sentido prático, buscando moldar a política externa às reais necessidades do país, com a flexibilidade para realizar adequações exigidas pela marcha dos acontecimentos. Procura dar um sentido estratégico à ação externa. E estratégia significa clareza de prioridades e objetivos, acompanhada da definição de meios para persegui-los. Em suma, significa evitar a armadilha das trivialidades, o que, se não garante êxito total da estratégia resultante, ao menos aumenta a chance de se obter o melhor resultado possível diante das circunstâncias, inclusive em períodos de alta volatilidade e incerteza.

*Este artigo foi escrito a título pessoal e não reflete necessariamente posições oficiais do MRE.

Benoni Belli, é Secretário de Planejamento Diplomático do Ministério das Relações Exteriores.

 

Há 70 anos, ao ser nomeado o primeiro diretor de planejamento do Departamento de Estado dos EUA, o diplomata George Kennan recebeu de seu chefe, o Secretário de Estado George Marshall, um único conselho, tão sucinto quanto penetrante: evite as trivialidades. Como bom estrategista, entendeu que era preciso ter clareza das prioridades e dos objetivos a perseguir, casando-os com os meios mais adequados. O trabalho de planejamento diplomático enfrenta hoje desafios semelhantes, mas com o agravante de que o mundo ficou ainda mais imprevisível e complexo desde a época de Kennan, naquele início de Guerra Fria. Por isso mesmo, o planejamento estratégico continua mais relevante do que nunca.

A elaboração de uma estratégia de inserção internacional por meio do esforço de planejamento diplomático deve lidar com incertezas internas e externas, que são seus condicionantes. As incertezas domésticas derivam da oscilação da conjuntura política e econômica, bem como da complexa construção de consensos. Esses são fatores cambiantes por natureza, que podem favorecer ou dificultar a definição de grandes objetivos nas áreas do desenvolvimento, do comércio, da paz e segurança, dos direitos humanos, entre outras. Quanto maior o grau de consenso, mais segura será a base sobre a qual o planejamento de política exterior projetará suas prioridades e definirá seus objetivos e metas. E, inversamente, a dificuldade de planejar cresce com a polarização política doméstica.

Em política externa, o fato de se lidar com um ambiente em que convivem várias soberanias é um complicador em relação às demais políticas públicas. Basta lembrar, a título ilustrativo, que os cálculos de política externa são afetados por multiplicidade de eventos internacionais que podem tomar direções inesperadas: a concretização de cenários improváveis em eleições e consultas populares; a ascensão de forças políticas antiglobalização em determinadas partes do mundo; o aumento da tensão geopolítica em função de comportamentos imprevisíveis de líderes políticos. Em alguns casos, é possível identificar tendências, analisar riscos e antecipar cenários. Na maioria das vezes, porém, a realidade surpreende, põe por terra pressupostos e invalida conclusões.

Diante dos constrangimentos impostos pelo imponderável da conjuntura interna e pelo dinamismo do sistema internacional, pareceria legítimo perguntar qual seria o ganho a ser obtido em um esforço de planejamento de política externa. A grande vantagem é precisamente evitar as trivialidades, concentrando-se na identificação das prioridades e na abertura de espaços para realização dos objetivos definidos pelo país. O processo de planejamento pressupõe esforço sistemático de reflexão sobre os rumos da ordem global, consultas (no governo e com a sociedade) e identificação de riscos e oportunidades, gerando uma massa crítica de conhecimento e conectando atores relevantes que podem oferecer visões, ideias e propostas sobre como melhor perseguir os interesses do país. O resultado é uma política mais consciente dos riscos derivados do ambiente em que opera, dos interesses em jogo e das prioridades que devem ser perseguidas.

A atividade de planejamento constitui ferramenta valiosa para desenhar e formular políticas, ao propiciar reflexão estruturada sobre os desafios internacionais e apontar caminhos possíveis para a perseguição dos interesses nacionais. Mudanças bruscas e o aumento da incerteza tornam a tarefa mais difícil, porém ainda mais necessária. Afinal, a bússola é instrumento mais útil em meio à tempestade do que em dias de horizonte desanuviado. Antecipar-se a tendências e preparar-se para o mundo que desponta no horizonte, inclusive para o caso de confirmação de cenários menos favoráveis, não se confunde com previsões destituídas de base objetiva. Não há bola de cristal na atividade de planejar, cuja ambição se limita a apontar caminhos para moldar a realidade internacional aos interesses nacionais, evitando que sejamos tragados pelo fluxo incessante dos acontecimentos.

Hoje, a realidade se mostra particularmente incerta com o descompasso entre as regras vigentes nos diversos tabuleiros das relações internacionais e a efetiva distribuição mundial do poder político e econômico (o Conselho de Segurança da ONU congelado no tempo é o exemplo emblemático). Além disso, há um evidente mal-estar com a globalização, que ameaça abalar alguns pilares da ordem mundial construída no pós-Segunda Guerra (o protecionismo e a xenofobia soam alarmes preocupantes). O planejamento estratégico deve lidar com essa realidade e ensejar um questionamento permanente, aliando pensamento crítico à formulação da política externa.

Diante das transformações em curso, qual configuração de poder mundial prevalecerá no século XXI? A ascensão dos chamados países emergentes consolidará um sistema mais equilibrado e aberto aos interesses do Brasil? A existência de novos polos de poder garantirá mais estabilidade e prosperidade para todos ou, ao contrário, inaugurará uma nova era de rivalidades e tensões entre grandes potências? Será possível encontrar soluções globais aos grandes desafios na área da paz e segurança, do desarmamento, da mudança do clima e do desenvolvimento? O populismo e o discurso xenófobo lograrão enfraquecer o compromisso internacional com os direitos humanos e com o sistema de comércio aberto?

Ao formular perguntas desse tipo, o planejamento estratégico funde pensamento e ação. Não faz diagnóstico e nem desenha cenários por simples diletantismo, mas com sentido prático, buscando moldar a política externa às reais necessidades do país, com a flexibilidade para realizar adequações exigidas pela marcha dos acontecimentos. Procura dar um sentido estratégico à ação externa. E estratégia significa clareza de prioridades e objetivos, acompanhada da definição de meios para persegui-los. Em suma, significa evitar a armadilha das trivialidades, o que, se não garante êxito total da estratégia resultante, ao menos aumenta a chance de se obter o melhor resultado possível diante das circunstâncias, inclusive em períodos de alta volatilidade e incerteza.

*Este artigo foi escrito a título pessoal e não reflete necessariamente posições oficiais do MRE.

Benoni Belli, é Secretário de Planejamento Diplomático do Ministério das Relações Exteriores.

 

Há 70 anos, ao ser nomeado o primeiro diretor de planejamento do Departamento de Estado dos EUA, o diplomata George Kennan recebeu de seu chefe, o Secretário de Estado George Marshall, um único conselho, tão sucinto quanto penetrante: evite as trivialidades. Como bom estrategista, entendeu que era preciso ter clareza das prioridades e dos objetivos a perseguir, casando-os com os meios mais adequados. O trabalho de planejamento diplomático enfrenta hoje desafios semelhantes, mas com o agravante de que o mundo ficou ainda mais imprevisível e complexo desde a época de Kennan, naquele início de Guerra Fria. Por isso mesmo, o planejamento estratégico continua mais relevante do que nunca.

A elaboração de uma estratégia de inserção internacional por meio do esforço de planejamento diplomático deve lidar com incertezas internas e externas, que são seus condicionantes. As incertezas domésticas derivam da oscilação da conjuntura política e econômica, bem como da complexa construção de consensos. Esses são fatores cambiantes por natureza, que podem favorecer ou dificultar a definição de grandes objetivos nas áreas do desenvolvimento, do comércio, da paz e segurança, dos direitos humanos, entre outras. Quanto maior o grau de consenso, mais segura será a base sobre a qual o planejamento de política exterior projetará suas prioridades e definirá seus objetivos e metas. E, inversamente, a dificuldade de planejar cresce com a polarização política doméstica.

Em política externa, o fato de se lidar com um ambiente em que convivem várias soberanias é um complicador em relação às demais políticas públicas. Basta lembrar, a título ilustrativo, que os cálculos de política externa são afetados por multiplicidade de eventos internacionais que podem tomar direções inesperadas: a concretização de cenários improváveis em eleições e consultas populares; a ascensão de forças políticas antiglobalização em determinadas partes do mundo; o aumento da tensão geopolítica em função de comportamentos imprevisíveis de líderes políticos. Em alguns casos, é possível identificar tendências, analisar riscos e antecipar cenários. Na maioria das vezes, porém, a realidade surpreende, põe por terra pressupostos e invalida conclusões.

Diante dos constrangimentos impostos pelo imponderável da conjuntura interna e pelo dinamismo do sistema internacional, pareceria legítimo perguntar qual seria o ganho a ser obtido em um esforço de planejamento de política externa. A grande vantagem é precisamente evitar as trivialidades, concentrando-se na identificação das prioridades e na abertura de espaços para realização dos objetivos definidos pelo país. O processo de planejamento pressupõe esforço sistemático de reflexão sobre os rumos da ordem global, consultas (no governo e com a sociedade) e identificação de riscos e oportunidades, gerando uma massa crítica de conhecimento e conectando atores relevantes que podem oferecer visões, ideias e propostas sobre como melhor perseguir os interesses do país. O resultado é uma política mais consciente dos riscos derivados do ambiente em que opera, dos interesses em jogo e das prioridades que devem ser perseguidas.

A atividade de planejamento constitui ferramenta valiosa para desenhar e formular políticas, ao propiciar reflexão estruturada sobre os desafios internacionais e apontar caminhos possíveis para a perseguição dos interesses nacionais. Mudanças bruscas e o aumento da incerteza tornam a tarefa mais difícil, porém ainda mais necessária. Afinal, a bússola é instrumento mais útil em meio à tempestade do que em dias de horizonte desanuviado. Antecipar-se a tendências e preparar-se para o mundo que desponta no horizonte, inclusive para o caso de confirmação de cenários menos favoráveis, não se confunde com previsões destituídas de base objetiva. Não há bola de cristal na atividade de planejar, cuja ambição se limita a apontar caminhos para moldar a realidade internacional aos interesses nacionais, evitando que sejamos tragados pelo fluxo incessante dos acontecimentos.

Hoje, a realidade se mostra particularmente incerta com o descompasso entre as regras vigentes nos diversos tabuleiros das relações internacionais e a efetiva distribuição mundial do poder político e econômico (o Conselho de Segurança da ONU congelado no tempo é o exemplo emblemático). Além disso, há um evidente mal-estar com a globalização, que ameaça abalar alguns pilares da ordem mundial construída no pós-Segunda Guerra (o protecionismo e a xenofobia soam alarmes preocupantes). O planejamento estratégico deve lidar com essa realidade e ensejar um questionamento permanente, aliando pensamento crítico à formulação da política externa.

Diante das transformações em curso, qual configuração de poder mundial prevalecerá no século XXI? A ascensão dos chamados países emergentes consolidará um sistema mais equilibrado e aberto aos interesses do Brasil? A existência de novos polos de poder garantirá mais estabilidade e prosperidade para todos ou, ao contrário, inaugurará uma nova era de rivalidades e tensões entre grandes potências? Será possível encontrar soluções globais aos grandes desafios na área da paz e segurança, do desarmamento, da mudança do clima e do desenvolvimento? O populismo e o discurso xenófobo lograrão enfraquecer o compromisso internacional com os direitos humanos e com o sistema de comércio aberto?

Ao formular perguntas desse tipo, o planejamento estratégico funde pensamento e ação. Não faz diagnóstico e nem desenha cenários por simples diletantismo, mas com sentido prático, buscando moldar a política externa às reais necessidades do país, com a flexibilidade para realizar adequações exigidas pela marcha dos acontecimentos. Procura dar um sentido estratégico à ação externa. E estratégia significa clareza de prioridades e objetivos, acompanhada da definição de meios para persegui-los. Em suma, significa evitar a armadilha das trivialidades, o que, se não garante êxito total da estratégia resultante, ao menos aumenta a chance de se obter o melhor resultado possível diante das circunstâncias, inclusive em períodos de alta volatilidade e incerteza.

*Este artigo foi escrito a título pessoal e não reflete necessariamente posições oficiais do MRE.

Benoni Belli, é Secretário de Planejamento Diplomático do Ministério das Relações Exteriores.

 

Há 70 anos, ao ser nomeado o primeiro diretor de planejamento do Departamento de Estado dos EUA, o diplomata George Kennan recebeu de seu chefe, o Secretário de Estado George Marshall, um único conselho, tão sucinto quanto penetrante: evite as trivialidades. Como bom estrategista, entendeu que era preciso ter clareza das prioridades e dos objetivos a perseguir, casando-os com os meios mais adequados. O trabalho de planejamento diplomático enfrenta hoje desafios semelhantes, mas com o agravante de que o mundo ficou ainda mais imprevisível e complexo desde a época de Kennan, naquele início de Guerra Fria. Por isso mesmo, o planejamento estratégico continua mais relevante do que nunca.

A elaboração de uma estratégia de inserção internacional por meio do esforço de planejamento diplomático deve lidar com incertezas internas e externas, que são seus condicionantes. As incertezas domésticas derivam da oscilação da conjuntura política e econômica, bem como da complexa construção de consensos. Esses são fatores cambiantes por natureza, que podem favorecer ou dificultar a definição de grandes objetivos nas áreas do desenvolvimento, do comércio, da paz e segurança, dos direitos humanos, entre outras. Quanto maior o grau de consenso, mais segura será a base sobre a qual o planejamento de política exterior projetará suas prioridades e definirá seus objetivos e metas. E, inversamente, a dificuldade de planejar cresce com a polarização política doméstica.

Em política externa, o fato de se lidar com um ambiente em que convivem várias soberanias é um complicador em relação às demais políticas públicas. Basta lembrar, a título ilustrativo, que os cálculos de política externa são afetados por multiplicidade de eventos internacionais que podem tomar direções inesperadas: a concretização de cenários improváveis em eleições e consultas populares; a ascensão de forças políticas antiglobalização em determinadas partes do mundo; o aumento da tensão geopolítica em função de comportamentos imprevisíveis de líderes políticos. Em alguns casos, é possível identificar tendências, analisar riscos e antecipar cenários. Na maioria das vezes, porém, a realidade surpreende, põe por terra pressupostos e invalida conclusões.

Diante dos constrangimentos impostos pelo imponderável da conjuntura interna e pelo dinamismo do sistema internacional, pareceria legítimo perguntar qual seria o ganho a ser obtido em um esforço de planejamento de política externa. A grande vantagem é precisamente evitar as trivialidades, concentrando-se na identificação das prioridades e na abertura de espaços para realização dos objetivos definidos pelo país. O processo de planejamento pressupõe esforço sistemático de reflexão sobre os rumos da ordem global, consultas (no governo e com a sociedade) e identificação de riscos e oportunidades, gerando uma massa crítica de conhecimento e conectando atores relevantes que podem oferecer visões, ideias e propostas sobre como melhor perseguir os interesses do país. O resultado é uma política mais consciente dos riscos derivados do ambiente em que opera, dos interesses em jogo e das prioridades que devem ser perseguidas.

A atividade de planejamento constitui ferramenta valiosa para desenhar e formular políticas, ao propiciar reflexão estruturada sobre os desafios internacionais e apontar caminhos possíveis para a perseguição dos interesses nacionais. Mudanças bruscas e o aumento da incerteza tornam a tarefa mais difícil, porém ainda mais necessária. Afinal, a bússola é instrumento mais útil em meio à tempestade do que em dias de horizonte desanuviado. Antecipar-se a tendências e preparar-se para o mundo que desponta no horizonte, inclusive para o caso de confirmação de cenários menos favoráveis, não se confunde com previsões destituídas de base objetiva. Não há bola de cristal na atividade de planejar, cuja ambição se limita a apontar caminhos para moldar a realidade internacional aos interesses nacionais, evitando que sejamos tragados pelo fluxo incessante dos acontecimentos.

Hoje, a realidade se mostra particularmente incerta com o descompasso entre as regras vigentes nos diversos tabuleiros das relações internacionais e a efetiva distribuição mundial do poder político e econômico (o Conselho de Segurança da ONU congelado no tempo é o exemplo emblemático). Além disso, há um evidente mal-estar com a globalização, que ameaça abalar alguns pilares da ordem mundial construída no pós-Segunda Guerra (o protecionismo e a xenofobia soam alarmes preocupantes). O planejamento estratégico deve lidar com essa realidade e ensejar um questionamento permanente, aliando pensamento crítico à formulação da política externa.

Diante das transformações em curso, qual configuração de poder mundial prevalecerá no século XXI? A ascensão dos chamados países emergentes consolidará um sistema mais equilibrado e aberto aos interesses do Brasil? A existência de novos polos de poder garantirá mais estabilidade e prosperidade para todos ou, ao contrário, inaugurará uma nova era de rivalidades e tensões entre grandes potências? Será possível encontrar soluções globais aos grandes desafios na área da paz e segurança, do desarmamento, da mudança do clima e do desenvolvimento? O populismo e o discurso xenófobo lograrão enfraquecer o compromisso internacional com os direitos humanos e com o sistema de comércio aberto?

Ao formular perguntas desse tipo, o planejamento estratégico funde pensamento e ação. Não faz diagnóstico e nem desenha cenários por simples diletantismo, mas com sentido prático, buscando moldar a política externa às reais necessidades do país, com a flexibilidade para realizar adequações exigidas pela marcha dos acontecimentos. Procura dar um sentido estratégico à ação externa. E estratégia significa clareza de prioridades e objetivos, acompanhada da definição de meios para persegui-los. Em suma, significa evitar a armadilha das trivialidades, o que, se não garante êxito total da estratégia resultante, ao menos aumenta a chance de se obter o melhor resultado possível diante das circunstâncias, inclusive em períodos de alta volatilidade e incerteza.

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