Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Presidencialismo de coalizão e a falácia populista


Por Redação

André Borges, Professor do Instituto de Ciência Política (IPOL), Universidade de Brasília

Adrián Albala, Professor do Instituto de Ciência Política (IPOL), Universidade de Brasília

Eleito em 2018 com um discurso antissistema e apoiado na defesa dos valores tradicionais, Jair Bolsonaro vem seguindo à risca a cartilha do típico populista latino-americano. Assim como Hugo Chávez, Alberto Fujimori e Fernando Collor, prometeu combater a corrupção e enfrentar a classe política tradicional. Até a recente decisão de negociar com os partidos do Centrão, Bolsonaro havia optado por não negociar a formação de uma base de apoio no Congresso. Imitando o venezuelano Hugo Chávez, montou um gabinete repleto de militares. A decisão de não formar uma coalizão de governo durante os primeiros 18 meses de governo, segundo o presidente e seus apoiadores, se justificaria em razão da conexão direta entre corrupção e presidencialismo de coalizão. De acordo com os defensores da assim chamada "nova política", todos os casos de corrupção ocorridos em governos anteriores estariam relacionados à barganha político-partidária em torno da nomeação de ministros: o mal chamado "toma lá, dá cá". Entretanto, o exame superficial das evidências comparativas é suficiente para desmontar tal teoria e demonstrar a sua verdadeira essência: o ímpeto autoritário contra as instituições e contra a democracia representativa

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Se verdadeiro o argumento bolsonarista, deveríamos observar uma relação direta entre governos de coalizão e corrupção. No que diz respeito aos casos presidencialistas latino-americanos,  pelos menos, não encontramos evidências consistentes com essa previsão. Chile e Uruguai, países onde os presidentes costumam negociar boa parte dos ministérios com os partidos (ou facções partidárias no caso uruguaio), figuram entre os dois menos corruptos de toda América Latina segundo os dados de 2019 da Transparência Internacional. Por outro lado, Peru e Equador, onde governos de coalizão são bem menos comuns e os presidentes costumam montar gabinetes repletos de tecnocratas, figuram na 17ª e 20ª posição no ranking da Transparência Internacional. A Venezuela de Maduro, por sua vez, onde negociações com partidos são desnecessárias para governar e o presidente possui ampla autonomia para nomear seus ministros, aparece na última posição, mantendo-se consistentemente como um dos países mais corruptos do mundo.

Da mesma forma, a formação de governos de coalizão não é um monopólio da América Latina. A maioria dos países de Europa são governados por coalizões há décadas, sem que a barganha para a formação de tais coalizões tenha produzido um incremento da corrupção. Pelo contrário, países como Suécia, Finlândia, Bélgica ou Holanda que costumam ser governados quase que exclusivamente por coalizões, despontam, ano após ano, nas primeiras colocações no ranking da Transparência Internacional, estando portanto entre os menos corruptos do mundo.  Dessa forma, é preciso salientar, então, que na grande maioria dos casos, a negociação de pastas ministeriais ("toma lá") em troca de apoio parlamentar ("dá cá"), costuma se realizar em bases a acordos programáticos para a realização de determinadas políticas públicas.

De fato, na Europa continental, os países com maior índice de corrupção são, precisamente, os que não costumam formar coalizões e/ou são dirigidos por líderes de cunho populista, como a Hungria de Orban.

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Possivelmente, os incentivos à corrupção que foram identificados no caso brasileiro têm menos relação com o presidencialismo de coalizão per se, e mais com a elevada fragmentação e baixa consistência ideológica das coalizões, além dos incentivos perversos gerados pelo sistema de financiamento de campanha. Isso não quer dizer, entretanto, que não seja possível formar coalizões com base em acordos programáticos, e é provável que Bolsonaro tivesse condição de fazê-lo, dado que boa parte do Congresso eleito em 2018 tem se mostrado favorável à agenda econômica do governo.

Em realidade, presidentes populistas minoritários preferem, via de regra, governar de forma unilateral porque a alternativa cooperativa de formar uma coalizão e dividir o poder com diferentes partidos é incompatível com o projeto antidemocrático que constitui a essência do populismo. A estratégia nesse caso, passa por apostar em um apoio circunstancial, porém incerto, às propostas apresentadas.

Quando se encontram em situação de fragilidade,  - como é o caso do presidente Bolsonaro, hoje acossado por uma série de investigações que o atingem diretamente e a seus familiares - os populistas não tem outra alternativa senão negociar com a mesma "velha política". Ademais, combater a corrupção não interessa ao populismo, porque tais esforços implicam em fortalecer as mesmas instituições de controle que representam entraves ao projeto de centralização autoritária levado a cabo por líderes como Orban, Chávez e Putin. Infelizmente, porém,  a nova fase do bolsonarismo não implica em um enfraquecimento do falacioso discurso contra os partidos e a política partidária. Ao que tudo indica, o ex-ministro e ex-juiz, e agora candidato presidencial, Sérgio Moro, pretende seguir o mesmo caminho, no embalo da cada vez mais escancarada politização da operação Lava Jato.  Da mesma maneira, qualquer candidatura personalista ou apartidaria parece condenada a repetir essa situação.

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André Borges, Professor do Instituto de Ciência Política (IPOL), Universidade de Brasília

Adrián Albala, Professor do Instituto de Ciência Política (IPOL), Universidade de Brasília

Eleito em 2018 com um discurso antissistema e apoiado na defesa dos valores tradicionais, Jair Bolsonaro vem seguindo à risca a cartilha do típico populista latino-americano. Assim como Hugo Chávez, Alberto Fujimori e Fernando Collor, prometeu combater a corrupção e enfrentar a classe política tradicional. Até a recente decisão de negociar com os partidos do Centrão, Bolsonaro havia optado por não negociar a formação de uma base de apoio no Congresso. Imitando o venezuelano Hugo Chávez, montou um gabinete repleto de militares. A decisão de não formar uma coalizão de governo durante os primeiros 18 meses de governo, segundo o presidente e seus apoiadores, se justificaria em razão da conexão direta entre corrupção e presidencialismo de coalizão. De acordo com os defensores da assim chamada "nova política", todos os casos de corrupção ocorridos em governos anteriores estariam relacionados à barganha político-partidária em torno da nomeação de ministros: o mal chamado "toma lá, dá cá". Entretanto, o exame superficial das evidências comparativas é suficiente para desmontar tal teoria e demonstrar a sua verdadeira essência: o ímpeto autoritário contra as instituições e contra a democracia representativa

Se verdadeiro o argumento bolsonarista, deveríamos observar uma relação direta entre governos de coalizão e corrupção. No que diz respeito aos casos presidencialistas latino-americanos,  pelos menos, não encontramos evidências consistentes com essa previsão. Chile e Uruguai, países onde os presidentes costumam negociar boa parte dos ministérios com os partidos (ou facções partidárias no caso uruguaio), figuram entre os dois menos corruptos de toda América Latina segundo os dados de 2019 da Transparência Internacional. Por outro lado, Peru e Equador, onde governos de coalizão são bem menos comuns e os presidentes costumam montar gabinetes repletos de tecnocratas, figuram na 17ª e 20ª posição no ranking da Transparência Internacional. A Venezuela de Maduro, por sua vez, onde negociações com partidos são desnecessárias para governar e o presidente possui ampla autonomia para nomear seus ministros, aparece na última posição, mantendo-se consistentemente como um dos países mais corruptos do mundo.

Da mesma forma, a formação de governos de coalizão não é um monopólio da América Latina. A maioria dos países de Europa são governados por coalizões há décadas, sem que a barganha para a formação de tais coalizões tenha produzido um incremento da corrupção. Pelo contrário, países como Suécia, Finlândia, Bélgica ou Holanda que costumam ser governados quase que exclusivamente por coalizões, despontam, ano após ano, nas primeiras colocações no ranking da Transparência Internacional, estando portanto entre os menos corruptos do mundo.  Dessa forma, é preciso salientar, então, que na grande maioria dos casos, a negociação de pastas ministeriais ("toma lá") em troca de apoio parlamentar ("dá cá"), costuma se realizar em bases a acordos programáticos para a realização de determinadas políticas públicas.

De fato, na Europa continental, os países com maior índice de corrupção são, precisamente, os que não costumam formar coalizões e/ou são dirigidos por líderes de cunho populista, como a Hungria de Orban.

Possivelmente, os incentivos à corrupção que foram identificados no caso brasileiro têm menos relação com o presidencialismo de coalizão per se, e mais com a elevada fragmentação e baixa consistência ideológica das coalizões, além dos incentivos perversos gerados pelo sistema de financiamento de campanha. Isso não quer dizer, entretanto, que não seja possível formar coalizões com base em acordos programáticos, e é provável que Bolsonaro tivesse condição de fazê-lo, dado que boa parte do Congresso eleito em 2018 tem se mostrado favorável à agenda econômica do governo.

Em realidade, presidentes populistas minoritários preferem, via de regra, governar de forma unilateral porque a alternativa cooperativa de formar uma coalizão e dividir o poder com diferentes partidos é incompatível com o projeto antidemocrático que constitui a essência do populismo. A estratégia nesse caso, passa por apostar em um apoio circunstancial, porém incerto, às propostas apresentadas.

Quando se encontram em situação de fragilidade,  - como é o caso do presidente Bolsonaro, hoje acossado por uma série de investigações que o atingem diretamente e a seus familiares - os populistas não tem outra alternativa senão negociar com a mesma "velha política". Ademais, combater a corrupção não interessa ao populismo, porque tais esforços implicam em fortalecer as mesmas instituições de controle que representam entraves ao projeto de centralização autoritária levado a cabo por líderes como Orban, Chávez e Putin. Infelizmente, porém,  a nova fase do bolsonarismo não implica em um enfraquecimento do falacioso discurso contra os partidos e a política partidária. Ao que tudo indica, o ex-ministro e ex-juiz, e agora candidato presidencial, Sérgio Moro, pretende seguir o mesmo caminho, no embalo da cada vez mais escancarada politização da operação Lava Jato.  Da mesma maneira, qualquer candidatura personalista ou apartidaria parece condenada a repetir essa situação.

André Borges, Professor do Instituto de Ciência Política (IPOL), Universidade de Brasília

Adrián Albala, Professor do Instituto de Ciência Política (IPOL), Universidade de Brasília

Eleito em 2018 com um discurso antissistema e apoiado na defesa dos valores tradicionais, Jair Bolsonaro vem seguindo à risca a cartilha do típico populista latino-americano. Assim como Hugo Chávez, Alberto Fujimori e Fernando Collor, prometeu combater a corrupção e enfrentar a classe política tradicional. Até a recente decisão de negociar com os partidos do Centrão, Bolsonaro havia optado por não negociar a formação de uma base de apoio no Congresso. Imitando o venezuelano Hugo Chávez, montou um gabinete repleto de militares. A decisão de não formar uma coalizão de governo durante os primeiros 18 meses de governo, segundo o presidente e seus apoiadores, se justificaria em razão da conexão direta entre corrupção e presidencialismo de coalizão. De acordo com os defensores da assim chamada "nova política", todos os casos de corrupção ocorridos em governos anteriores estariam relacionados à barganha político-partidária em torno da nomeação de ministros: o mal chamado "toma lá, dá cá". Entretanto, o exame superficial das evidências comparativas é suficiente para desmontar tal teoria e demonstrar a sua verdadeira essência: o ímpeto autoritário contra as instituições e contra a democracia representativa

Se verdadeiro o argumento bolsonarista, deveríamos observar uma relação direta entre governos de coalizão e corrupção. No que diz respeito aos casos presidencialistas latino-americanos,  pelos menos, não encontramos evidências consistentes com essa previsão. Chile e Uruguai, países onde os presidentes costumam negociar boa parte dos ministérios com os partidos (ou facções partidárias no caso uruguaio), figuram entre os dois menos corruptos de toda América Latina segundo os dados de 2019 da Transparência Internacional. Por outro lado, Peru e Equador, onde governos de coalizão são bem menos comuns e os presidentes costumam montar gabinetes repletos de tecnocratas, figuram na 17ª e 20ª posição no ranking da Transparência Internacional. A Venezuela de Maduro, por sua vez, onde negociações com partidos são desnecessárias para governar e o presidente possui ampla autonomia para nomear seus ministros, aparece na última posição, mantendo-se consistentemente como um dos países mais corruptos do mundo.

Da mesma forma, a formação de governos de coalizão não é um monopólio da América Latina. A maioria dos países de Europa são governados por coalizões há décadas, sem que a barganha para a formação de tais coalizões tenha produzido um incremento da corrupção. Pelo contrário, países como Suécia, Finlândia, Bélgica ou Holanda que costumam ser governados quase que exclusivamente por coalizões, despontam, ano após ano, nas primeiras colocações no ranking da Transparência Internacional, estando portanto entre os menos corruptos do mundo.  Dessa forma, é preciso salientar, então, que na grande maioria dos casos, a negociação de pastas ministeriais ("toma lá") em troca de apoio parlamentar ("dá cá"), costuma se realizar em bases a acordos programáticos para a realização de determinadas políticas públicas.

De fato, na Europa continental, os países com maior índice de corrupção são, precisamente, os que não costumam formar coalizões e/ou são dirigidos por líderes de cunho populista, como a Hungria de Orban.

Possivelmente, os incentivos à corrupção que foram identificados no caso brasileiro têm menos relação com o presidencialismo de coalizão per se, e mais com a elevada fragmentação e baixa consistência ideológica das coalizões, além dos incentivos perversos gerados pelo sistema de financiamento de campanha. Isso não quer dizer, entretanto, que não seja possível formar coalizões com base em acordos programáticos, e é provável que Bolsonaro tivesse condição de fazê-lo, dado que boa parte do Congresso eleito em 2018 tem se mostrado favorável à agenda econômica do governo.

Em realidade, presidentes populistas minoritários preferem, via de regra, governar de forma unilateral porque a alternativa cooperativa de formar uma coalizão e dividir o poder com diferentes partidos é incompatível com o projeto antidemocrático que constitui a essência do populismo. A estratégia nesse caso, passa por apostar em um apoio circunstancial, porém incerto, às propostas apresentadas.

Quando se encontram em situação de fragilidade,  - como é o caso do presidente Bolsonaro, hoje acossado por uma série de investigações que o atingem diretamente e a seus familiares - os populistas não tem outra alternativa senão negociar com a mesma "velha política". Ademais, combater a corrupção não interessa ao populismo, porque tais esforços implicam em fortalecer as mesmas instituições de controle que representam entraves ao projeto de centralização autoritária levado a cabo por líderes como Orban, Chávez e Putin. Infelizmente, porém,  a nova fase do bolsonarismo não implica em um enfraquecimento do falacioso discurso contra os partidos e a política partidária. Ao que tudo indica, o ex-ministro e ex-juiz, e agora candidato presidencial, Sérgio Moro, pretende seguir o mesmo caminho, no embalo da cada vez mais escancarada politização da operação Lava Jato.  Da mesma maneira, qualquer candidatura personalista ou apartidaria parece condenada a repetir essa situação.

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