BRASÍLIA - O governo dos Estados Unidos quer que o Brasil dê explicações claras sobre sua proximidade com o discurso da Rússia em relação à invasão à Ucrânia. Diante do silêncio da diplomacia brasileira após o chanceler russo Sergei Lavrov declarar em visita ao Itamaraty que Brasil e Rússia compartilham de posições semelhantes, a gestão Joe Biden espera que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva explicite seu lado no conflito armado, uma vez que a maioria da comunidade internacional condenou a ocupação do território ucraniano pelos russos.
O governo Biden quer ouvir as explicações do Brasil nos próximos dias e não descarta contatos com o chanceler Mauro Vieira e o ex-chanceler e assessor especial de Lula, o embaixador Celso Amorim. Autoridades americanas desfiam adjetivos para explicar o sentimento em relação aos recentes movimentos da diplomacia brasileira comandada por Lula: decepcionados, preocupados, surpreendidos, são algumas das palavras usadas. Mesmo assim, continuam repetindo que acreditam ter no presidente brasileiro um aliado e que ele e a administração democrata de Biden têm muitos valores em comum.
Integrantes do governo dos EUA acompanharam de perto a visita do chanceler russo a Brasília. Tomaram cuidado em ouvir a declaração pública que Lavrov deu no Itamaraty na versão original em russo. Os norte-americanos sabem que, como diplomata experiente, o chanceler da Rússia escolhe as palavras que usa com uma intenção definida. Por isso, ao ouvir a versão russa do discurso, autoridades dos EUA perceberam que ele usou uma expressão que une duas palavras para qualificar a posição de Brasil e Rússia em relação aos fatos recentes. A expressão não tem similar nem em inglês nem em português e carrega a ideia de um som semelhante que é emitido por duas partes diferentes.
Na versão traduzida pelos americanos, a expressão usada por Lavrov foi de “alinhamento”. Ou seja, o chanceler russo declarou que Brasil e Rússia estavam alinhados sobre os fatos recentes do cenário mundial. Mais ainda, que os dois países compartilham a mesma percepção sobre a “genesis” da guerra com a Ucrânia. Na versão do governo russo, a invasão foi apenas uma ação defensiva de um País, narrativa contestada pela maioria das nações que condenaram a ocupação da Ucrânia. Segundo integrantes da administração Biden, a “genesis” da guerra é apenas uma: a Rússia invadiu a Ucrânia e este último País é a vítima.
Para o governo de Washignton, as seguidas declarações do presidente Lula, que chegou até a declarar que os EUA estavam estimulando a guerra entre Rússia e Ucrânia, mostram que o brasileiro não cometeu apenas um deslize. Como fez seguidas declarações, norte-americanos buscam uma explicação para a motivação de Lula e preferem atribuir as recentes falas à intenção de um presidente de agradar sua base interna, principalmente a ala mais radical do PT que gosta de se mostrar anti-americana.
Na avaliação dos EUA, ao insistir em adotar postura condescendente em relação à Rússia, o governo petista inviabiliza o que tem pregado para a comunidade internacional: que o Brasil pode ser um interlocutor para acordo de paz com a Ucrânia. Os recentes movimentos do presidente Lula, avaliam, não são de um País que se apresenta como imparcial para atuar como negociador. Se, de fato, estivesse disposto a negociar com as duas nações, o governo brasileiro deveria, por exemplo, convidar o chancelar ucraniano para vir a Brasília, como foi feito com o chanceler Lavrov.
Em relação a aproximação da gestão Lula com a China, os norte-americanos entendem que é normal o Brasil querer manter diálogo com o importante parceiro comercial, como o próprio EUA procura fazer. Mas essa proximidade deve ser feita com cautela já que o País não é uma democracia.