BRASÍLIA - O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o Congresso Nacional fizeram um acordo para tirar dinheiro da educação, da segurança pública, da cultura, do saneamento básico e de outras áreas para destinar mais R$ 2,7 bilhões em emendas de comissão para o Ministério da Saúde neste ano, sob forte influência do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e dos líderes do Congresso. O corte fará com que o Ministério da Educação fique sem nenhum dinheiro de emenda de comissão neste ano.
As emendas de comissão, recursos indicados por cada colegiado da Câmara e do Senado, herdaram parte do espólio do orçamento secreto, esquema revelado pelo Estadão que foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Não há transparência sobre os verdadeiros padrinhos dos recursos e nem critérios sobre a definição das localidades atendidas.
O Congresso aprovou nesta quarta-feira, 29, um projeto que muda a destinação das emendas de comissão, tirando dinheiro de alguns colegiados e repassando para outros. Quase todos os recursos (99%) vão ser destinados para o Ministério da Saúde, mas serão controlados pelos parlamentares.
A Saúde é uma das pastas usadas pelo governo para atender os congressistas e irrigar municípios em período eleitoral. Diferente de outras transferências, as emendas passam por cima de critérios técnicos e sanitários na definição das localidades atendidas. Além disso, o dinheiro da saúde é repassado de forma mais rápida e chega a ser pago 24 horas depois de reservado no Orçamento.
Nos bastidores, a destinação das emendas de comissão é comandada pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sob influência também do presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). Eles rateiam os recursos entre as bancadas representadas no Congresso, que por sua vez fazem a divisão interna entre os parlamentares. Tudo sem transparência sobre os verdadeiros padrinhos do dinheiro, desviando da decisão do Supremo.
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Educação fica sem dinheiro de emendas de comissão
Emendas indicadas por comissões ligadas à educação, à agricultura e à cultura, entre outras, perderam dinheiro, enquanto a saúde ganhou. Neste ano, são R$ 15 bilhões reservados no Orçamento para as emendas de comissão. A Comissão da Saúde da Câmara é a campeã, com R$ 4,5 bilhões. O colegiado é comandado pelo PT, mas a destinação do dinheiro tem forte influência de Lira e dos líderes da Casa. Com o projeto, haverá mais R$ 2,7 bilhões para o colegiado e para as comissões ligadas ao Ministério da Saúde no Senado.
A educação perdeu R$ 199 milhões, incluindo dinheiro para institutos federais, hospitais de ensino e ônibus escolares, para as emendas da saúde. Com esse corte, o Ministério da Educação vai ficar sem nenhum recurso de emenda de comissão neste ano. A segurança, por sua vez, perdeu R$ 405 milhões que estavam reservados para prevenção e combate à criminalidade. “Temos um balcão de negócio. O governo Lula está pagando a peso de ouro. Infelizmente o orçamento secreto continua. Até as paredes sabem”, disse a deputada Adriana Ventura (Novo-SP), protestando contra o projeto.
O Ministério das Mulheres estava prestes a perder R$ 144,5 milhões, o equivalente a 30% de todo o orçamento da pasta, e ficar sem nenhum dinheiro de emenda de comissão. No plenário, porém, houve um acordo para recompor essa verba e diminuir o recurso total que iria para a Saúde. “A gente fala muito de fake news, mas fake news para mim é gente que diz que defende a mulher e não coloca dinheiro”, disse a Soraya Santos (PL-RJ), ao criticar a manobra inicial.
Houve acordo entre o governo e os líderes do Congresso para a aprovação do projeto. O Legislativo manteve um veto de Lula que obrigava o governo a obedecer um calendário de pagamentos de emendas antes da eleição nas áreas de saúde e assistência social em 2024. Os parlamentares concordaram em manter o veto, em troca da garantia do governo de que vai honrar esses pagamentos a tempo do período eleitoral.
“Não tem nada de calada da noite aqui. O que estamos votando aqui foi decidido por este Congresso. Este projeto está fazendo o remanejamento de recursos previstos no Orçamento e remanejando para a saúde pública. Esses recursos são do Congresso Nacional, decididos pelo Congresso Nacional, pertencentes à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal”, afirmou o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP).
O Congresso rejeitou uma alteração que destinava os recursos do projeto para o Rio Grande do Sul, que vive uma catástrofe climática devido às chuvas. Aliados de Lira saíram em defesa do presidente da Câmara e da liberação do dinheiro durante a reunião da Comissão Mista de Orçamentos (CMO). “O nosso presidente não precisa de defesa, ele foi inocentado pela própria Justiça”, disse o deputado Carlos Henrique Gaguim (União-TO), defendendo Lira das acusações de corrupção envolvendo o deputado e a destinação de emendas. “De fato, quando eu olho a destinação, vejo que saúde é algo essencial”, disse o deputado Domingos Sávio (PL-MG), outro defensor do presidente da Casa.