Iniciativas populares travam no Congresso e 159 esperam por votação


Assegurado na Constituição, direito é praticamente ignorado pela Câmara e pelo Senado; maioria das propostas é arquivada

Por Adriana Ferraz

O direito popular de apresentar ao Congresso projetos de lei, emendas ao orçamento e realização de audiências públicas, entre outras matérias, é assegurado pela Constituição, mas praticamente ignorado pela Câmara dos Deputados e Senado Federal. Desde 2001, cidadãos brasileiros ou entidades da sociedade civil apresentaram 1.443 sugestões legislativas, das quais 159 seguem em tramitação e apenas quatro foram transformadas em lei.

Congresso Federal recebe sugestões populares pela internet, mas não dá andamento ao maior conjunto delas Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Apesar de arquivar a maioria das propostas de iniciativa popular, tanto a Câmara como o Senado incentivam a participação no processo legislativo por meio de sugestões. Das 373 recebidas pelo Senado de 2003 pra cá, 30% ou 113 ainda tramitam, mas só 39 delas foram transformadas em projetos formais de lei ou de emenda à Constituição. No caso da Câmara, o porcentual só chega a 7%, com 75 matérias em condições de serem apreciadas.

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A última iniciativa amparada pela sociedade que alcançou projeção nacional empacou após ser totalmente desfigurada pela Câmara dos Deputados. Proposto em 2016 pelo Ministério Público Federal ainda sob o impacto da Operação Lava Jato, o projeto que ficou conhecido como “Dez medidas contra a corrupção” chegou a receber 2 milhões de assinaturas, mas ainda aguarda nova votação da Casa após ser modificada pelo Senado.

Em março, após ficar quatro anos parado, o PL 3855/2019 foi distribuído para análise da Comissão de Desenvolvimento Econômico, mas a reportagem não identificou nenhuma movimentação desde então.

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Demandas

Segundo o sociólogo Uvanderson Silva, coordenador do grupo Democracia e Cidadania Ativa, da Fundação Tide Setubal, embora as iniciativas populares estejam previstas na Constituição de 1988, parece evidente que esse não é o caminho mais eficaz para estreitar a relação social com o Estado. “O cotidiano dos trabalhos na Câmara e no Senado é pouco permeável às demandas e os desafios da participação popular e da sociedade civil para além do período eleitoral”, afirma.

Uma das propostas ainda em tramitação no Senado ultrapassou 253 mil apoios somente pelo site da Casa – total que supera em mais de 1100% o mínimo de 20 mil declarações favoráveis para o tema ser avaliado pela Mesa Diretora. Transformada em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), a sugestão protocolada por uma moradora do Rio pede o fim do auxílio moradia pago hoje a juízes, senadores e deputados federais, estaduais ou distritais.

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Apesar de assinada por 28 senadores nos últimos três anos, a PEC segue à espera de um relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania desde dezembro de 2019. Já outra proposta bastante popular, com mais de 134 mil apoios, feita por um morador de São Paulo com o objetivo de revogar a Lei Rouanet, foi barrada mediante parecer contrário da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa.

“O Legislativo ainda permanece como um espaço privilegiado da classe política profissional. Mas com a revolução tecnológica dos últimos anos, a participação massiva da população em processos deliberativos deixou de ser um desafio técnico e se tornou mais uma questão de vontade política de inovar e aprofundar o processo democrático, diz Silva.

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Rito

A aprovação das quatro leis originadas na sociedade desde 1988 foi resultado de processos longos e burocráticos. Com a digitalização dos processos, é possível hoje enviar sugestões pela internet. No Senado, elas ficam abertas por quatro meses ou até que se alcance os 20 mil apoios exigidos. Neste caso, o tema segue para análise da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), onde as ideias são debatidas pelos senadores e recebem um parecer. Caso contrário, o tema é descartado.

Aprovação da Lei da Ficha Limpa só foi possível pela mobilização popular realizada em torno do projeto de lei Foto: Marcio Fernandes/Estadão
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Na Câmara, as sugestões de iniciativa popular são encaminhadas diretamente à Comissão de Legislação Participativa (CLP), também de forma online. Se acatadas, passam a tramitar como proposição de autoria desse colegiado e, assim como no Senado, podem ser encampadas por um ou mais parlamentares.

Para que um projeto de lei tramite automaticamente, ou seja, sem análise prévia de deputados ou senadores, é preciso que ele seja proposto por pelo menos 1% do eleitorado nacional, distribuído ao menos em cinco estados. De acordo com a projeção atuais, isso quer dizer cerca de 1,5 milhão de pessoas. As quatro legislações com essa origem receberam cada uma mais de 1 milhão de assinaturas.

Para a coordenadora executiva do Pacto pela Democracia, Flávia Pellegrino, a ausência popular no exercício legislativo vai além da apresentação de propostas de lei.

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“O baixo número de iniciativas populares é um sintoma da falta de centralidade da participação social, mas, ao meu ver, é pouco significativo perto do fechamento da Casa do Povo ao próprio povo. Basta observarmos o atual debate sobre as comissões mistas. Em nenhum momento os interlocutores desse debate miram um componente fundamental: essa comissões são ou devem ser um grande espaço de participação e incidência da sociedade civil”, alerta Flávia.

O direito popular de apresentar ao Congresso projetos de lei, emendas ao orçamento e realização de audiências públicas, entre outras matérias, é assegurado pela Constituição, mas praticamente ignorado pela Câmara dos Deputados e Senado Federal. Desde 2001, cidadãos brasileiros ou entidades da sociedade civil apresentaram 1.443 sugestões legislativas, das quais 159 seguem em tramitação e apenas quatro foram transformadas em lei.

Congresso Federal recebe sugestões populares pela internet, mas não dá andamento ao maior conjunto delas Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Apesar de arquivar a maioria das propostas de iniciativa popular, tanto a Câmara como o Senado incentivam a participação no processo legislativo por meio de sugestões. Das 373 recebidas pelo Senado de 2003 pra cá, 30% ou 113 ainda tramitam, mas só 39 delas foram transformadas em projetos formais de lei ou de emenda à Constituição. No caso da Câmara, o porcentual só chega a 7%, com 75 matérias em condições de serem apreciadas.

A última iniciativa amparada pela sociedade que alcançou projeção nacional empacou após ser totalmente desfigurada pela Câmara dos Deputados. Proposto em 2016 pelo Ministério Público Federal ainda sob o impacto da Operação Lava Jato, o projeto que ficou conhecido como “Dez medidas contra a corrupção” chegou a receber 2 milhões de assinaturas, mas ainda aguarda nova votação da Casa após ser modificada pelo Senado.

Em março, após ficar quatro anos parado, o PL 3855/2019 foi distribuído para análise da Comissão de Desenvolvimento Econômico, mas a reportagem não identificou nenhuma movimentação desde então.

Demandas

Segundo o sociólogo Uvanderson Silva, coordenador do grupo Democracia e Cidadania Ativa, da Fundação Tide Setubal, embora as iniciativas populares estejam previstas na Constituição de 1988, parece evidente que esse não é o caminho mais eficaz para estreitar a relação social com o Estado. “O cotidiano dos trabalhos na Câmara e no Senado é pouco permeável às demandas e os desafios da participação popular e da sociedade civil para além do período eleitoral”, afirma.

Uma das propostas ainda em tramitação no Senado ultrapassou 253 mil apoios somente pelo site da Casa – total que supera em mais de 1100% o mínimo de 20 mil declarações favoráveis para o tema ser avaliado pela Mesa Diretora. Transformada em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), a sugestão protocolada por uma moradora do Rio pede o fim do auxílio moradia pago hoje a juízes, senadores e deputados federais, estaduais ou distritais.

Apesar de assinada por 28 senadores nos últimos três anos, a PEC segue à espera de um relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania desde dezembro de 2019. Já outra proposta bastante popular, com mais de 134 mil apoios, feita por um morador de São Paulo com o objetivo de revogar a Lei Rouanet, foi barrada mediante parecer contrário da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa.

“O Legislativo ainda permanece como um espaço privilegiado da classe política profissional. Mas com a revolução tecnológica dos últimos anos, a participação massiva da população em processos deliberativos deixou de ser um desafio técnico e se tornou mais uma questão de vontade política de inovar e aprofundar o processo democrático, diz Silva.

Rito

A aprovação das quatro leis originadas na sociedade desde 1988 foi resultado de processos longos e burocráticos. Com a digitalização dos processos, é possível hoje enviar sugestões pela internet. No Senado, elas ficam abertas por quatro meses ou até que se alcance os 20 mil apoios exigidos. Neste caso, o tema segue para análise da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), onde as ideias são debatidas pelos senadores e recebem um parecer. Caso contrário, o tema é descartado.

Aprovação da Lei da Ficha Limpa só foi possível pela mobilização popular realizada em torno do projeto de lei Foto: Marcio Fernandes/Estadão

Na Câmara, as sugestões de iniciativa popular são encaminhadas diretamente à Comissão de Legislação Participativa (CLP), também de forma online. Se acatadas, passam a tramitar como proposição de autoria desse colegiado e, assim como no Senado, podem ser encampadas por um ou mais parlamentares.

Para que um projeto de lei tramite automaticamente, ou seja, sem análise prévia de deputados ou senadores, é preciso que ele seja proposto por pelo menos 1% do eleitorado nacional, distribuído ao menos em cinco estados. De acordo com a projeção atuais, isso quer dizer cerca de 1,5 milhão de pessoas. As quatro legislações com essa origem receberam cada uma mais de 1 milhão de assinaturas.

Para a coordenadora executiva do Pacto pela Democracia, Flávia Pellegrino, a ausência popular no exercício legislativo vai além da apresentação de propostas de lei.

“O baixo número de iniciativas populares é um sintoma da falta de centralidade da participação social, mas, ao meu ver, é pouco significativo perto do fechamento da Casa do Povo ao próprio povo. Basta observarmos o atual debate sobre as comissões mistas. Em nenhum momento os interlocutores desse debate miram um componente fundamental: essa comissões são ou devem ser um grande espaço de participação e incidência da sociedade civil”, alerta Flávia.

O direito popular de apresentar ao Congresso projetos de lei, emendas ao orçamento e realização de audiências públicas, entre outras matérias, é assegurado pela Constituição, mas praticamente ignorado pela Câmara dos Deputados e Senado Federal. Desde 2001, cidadãos brasileiros ou entidades da sociedade civil apresentaram 1.443 sugestões legislativas, das quais 159 seguem em tramitação e apenas quatro foram transformadas em lei.

Congresso Federal recebe sugestões populares pela internet, mas não dá andamento ao maior conjunto delas Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Apesar de arquivar a maioria das propostas de iniciativa popular, tanto a Câmara como o Senado incentivam a participação no processo legislativo por meio de sugestões. Das 373 recebidas pelo Senado de 2003 pra cá, 30% ou 113 ainda tramitam, mas só 39 delas foram transformadas em projetos formais de lei ou de emenda à Constituição. No caso da Câmara, o porcentual só chega a 7%, com 75 matérias em condições de serem apreciadas.

A última iniciativa amparada pela sociedade que alcançou projeção nacional empacou após ser totalmente desfigurada pela Câmara dos Deputados. Proposto em 2016 pelo Ministério Público Federal ainda sob o impacto da Operação Lava Jato, o projeto que ficou conhecido como “Dez medidas contra a corrupção” chegou a receber 2 milhões de assinaturas, mas ainda aguarda nova votação da Casa após ser modificada pelo Senado.

Em março, após ficar quatro anos parado, o PL 3855/2019 foi distribuído para análise da Comissão de Desenvolvimento Econômico, mas a reportagem não identificou nenhuma movimentação desde então.

Demandas

Segundo o sociólogo Uvanderson Silva, coordenador do grupo Democracia e Cidadania Ativa, da Fundação Tide Setubal, embora as iniciativas populares estejam previstas na Constituição de 1988, parece evidente que esse não é o caminho mais eficaz para estreitar a relação social com o Estado. “O cotidiano dos trabalhos na Câmara e no Senado é pouco permeável às demandas e os desafios da participação popular e da sociedade civil para além do período eleitoral”, afirma.

Uma das propostas ainda em tramitação no Senado ultrapassou 253 mil apoios somente pelo site da Casa – total que supera em mais de 1100% o mínimo de 20 mil declarações favoráveis para o tema ser avaliado pela Mesa Diretora. Transformada em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), a sugestão protocolada por uma moradora do Rio pede o fim do auxílio moradia pago hoje a juízes, senadores e deputados federais, estaduais ou distritais.

Apesar de assinada por 28 senadores nos últimos três anos, a PEC segue à espera de um relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania desde dezembro de 2019. Já outra proposta bastante popular, com mais de 134 mil apoios, feita por um morador de São Paulo com o objetivo de revogar a Lei Rouanet, foi barrada mediante parecer contrário da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa.

“O Legislativo ainda permanece como um espaço privilegiado da classe política profissional. Mas com a revolução tecnológica dos últimos anos, a participação massiva da população em processos deliberativos deixou de ser um desafio técnico e se tornou mais uma questão de vontade política de inovar e aprofundar o processo democrático, diz Silva.

Rito

A aprovação das quatro leis originadas na sociedade desde 1988 foi resultado de processos longos e burocráticos. Com a digitalização dos processos, é possível hoje enviar sugestões pela internet. No Senado, elas ficam abertas por quatro meses ou até que se alcance os 20 mil apoios exigidos. Neste caso, o tema segue para análise da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), onde as ideias são debatidas pelos senadores e recebem um parecer. Caso contrário, o tema é descartado.

Aprovação da Lei da Ficha Limpa só foi possível pela mobilização popular realizada em torno do projeto de lei Foto: Marcio Fernandes/Estadão

Na Câmara, as sugestões de iniciativa popular são encaminhadas diretamente à Comissão de Legislação Participativa (CLP), também de forma online. Se acatadas, passam a tramitar como proposição de autoria desse colegiado e, assim como no Senado, podem ser encampadas por um ou mais parlamentares.

Para que um projeto de lei tramite automaticamente, ou seja, sem análise prévia de deputados ou senadores, é preciso que ele seja proposto por pelo menos 1% do eleitorado nacional, distribuído ao menos em cinco estados. De acordo com a projeção atuais, isso quer dizer cerca de 1,5 milhão de pessoas. As quatro legislações com essa origem receberam cada uma mais de 1 milhão de assinaturas.

Para a coordenadora executiva do Pacto pela Democracia, Flávia Pellegrino, a ausência popular no exercício legislativo vai além da apresentação de propostas de lei.

“O baixo número de iniciativas populares é um sintoma da falta de centralidade da participação social, mas, ao meu ver, é pouco significativo perto do fechamento da Casa do Povo ao próprio povo. Basta observarmos o atual debate sobre as comissões mistas. Em nenhum momento os interlocutores desse debate miram um componente fundamental: essa comissões são ou devem ser um grande espaço de participação e incidência da sociedade civil”, alerta Flávia.

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