O presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, que parece viver uma paixão tórrida com os microfones, o som da sua própria voz e a celebração das virtudes que imagina ter, virou o mais ativo orador político do Brasil. Não poderia ser assim. Como juiz, ele tem a obrigação de ser juiz – e um juiz não pode passar o tempo todo falando como um animador de auditório na defesa das suas ideias, convicções e interesses. Como o público que lhe paga o salário pode esperar que seja imparcial nas suas sentenças, se está todo dia dizendo que é contra isso e a favor daquilo? Mas aí é que está: no Brasil de hoje o comando da discussão política não está no Congresso Nacional, que foi eleito pelo povo brasileiro, nem entre os governantes que os eleitores puseram nos cargos executivos, mas no STF – que não tem o voto de ninguém. É uma degeneração.
A última homilia do ministro Luís Roberto Barroso mostra, mais uma vez, o quanto o STF afundou na sua própria anomalia. Eles não percebem mais que o respeito pela instituição só pode ser conquistado como consequência dos seus atos, da sua seriedade e da sua isenção. Acham outra coisa: o Supremo só será um grande tribunal se as suas “lideranças” ficarem fazendo elogios a si mesmas. Barroso, em seu discurso mais recente, disse que “o STF fez muito bem ao Brasil” e enumerou as dádivas que nos foram fornecidas por Suas Excelências. Quem teria de falar disso não é ele, e sim os supostos beneficiários das bondades do STF - mas pelos padrões de conduta vigentes hoje neste país a auto louvação é não apenas aceita como aplaudida. Ficamos sabendo, assim, que o STF nos salvou de uma ditadura, venceu o “golpe de estado” do 8 de janeiro, impediu que a Covid destruísse o Brasil etc. etc. Tudo bem: quem quiser acreditar nisso tem o direito de acreditar. O que não está certo é dizer que quem critica o STF são os “bolsonaristas”, e que os “ataques” ao tribunal só acontecem porque suas decisões causam desagrado a certas pessoas.
É falso. Os que criticam as ações do STF incluem muito mais gente que os “bolsonaristas” – basta verificar, com um mínimo de serenidade, quem são os autores das críticas. Mais que isso, o que se condena no STF não é o teor jurídico das decisões; ninguém ignora o fato de que uma sentença judicial sempre agrada o vencedor e desagrada o perdedor. O problema, e aí o presidente do STF não dá um pio, é que as mulheres de ministros advogam em causas julgadas pelos maridos. Cidadãos estão sendo condenados a até 17 anos de cadeia por terem participado de um quebra-quebra em Brasília – e por terem supostamente praticado, ao mesmo tempo, os crimes de “golpe de estado” e de “abolição violenta do estado de direito”. Um cidadão tem um bate-boca com um dos ministros no Aeroporto de Roma e se vê levado a julgamento no supremo tribunal de justiça do país, no arrastão judicial dos “atos antidemocráticos”. A empresa J&F é dispensada de pagar os 10 bilhões de reais que devia ao Tesouro Nacional, em cumprimento ao acordo que fez para escapar de cinco ações penais por corrupção ativa. As provas materiais de corrupção contra a Odebrecht são declaradas como “imprestáveis” e destruídas.
Nada disso ter alguma coisa a ver com “defesa da democracia”, ou com máscara para Covid, ou com “extrema direita” e outras assombrações. Está errado porque é contra a lei. E é por isso, na verdade, que o presidente do STF age todos os dias como chefe de facção política. Não está interessado em Constituição, processo legal e seu dever como juiz. Como ele mesmo diz, quer “fazer História”.