Aos fatos, como eles são

Opinião|Política brasileira está paralisada pelo medo de Jair Bolsonaro poder vencer uma eleição


Vida política está como um carro com motor que faz muito barulho, mas não sai do lugar

Por J.R. Guzzo
Atualização:

Mais cedo ou mais tarde, para o bem de todos e a felicidade geral da nação, a vida política brasileira precisará sair do ponto morto em que está hoje e fazer uma tentativa de andar para frente. Do jeito que está a coisa, não adianta nada ficar todo mundo querendo pisar no acelerador. O motor faz muito barulho, mas o carro não sai do lugar - e o lugar onde ele está é ruim. Como pode estar bem uma democracia em que o presidente da República chama o povo para a rua, e não vai ninguém? Pior: só vai tanque de guerra, polícia e os picaretas que vivem em palanque de governo.

Para complicar, o político que o governo descreve como a maior ameaça para a democracia que jamais apareceu neste País enche a rua, mais uma vez, com o seu próprio comício. Como se explica uma coisa dessas? Deveria ser o contrário. A praça de Lula (e do ministro Alexandre de Moraes) teria de estar dura de gente para defender a democracia que foi exibida naquele palanque. A praça de Jair Bolsonaro, que segundo as classes pró-governo quer impor uma ditadura, teria de estar vazia.

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Como pode haver um regime democrático no Brasil se o povo faz o oposto do que os especialistas em democracia esperam que ele faça? Eleição, nesse caso, vira perigo de morte: os eleitores podem escolher os governantes antidemocráticos, e aí o que se vai fazer? A Venezuela, por exemplo, tem uma reposta pronta para isso: proíbe que os candidatos “errados” disputem a eleição, e se mesmo assim o povo escolher algum indesejável, o STF lá deles diz que foi o governo quem ganhou, com “ata” ou sem “ata”. Quem quer ver os números da votação é “golpista”.

Ato na Avenida Paulista com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro pede o impeachment do ministro Alexandre Moraes Foto: Tiago Queiroz/Estadão

É um caminho, sem dúvida. Pode ser um pouco “desagradável”, como diz o presidente Lula – mas resolve, e ele mesmo, mais muita gente boa, achava até outro dia que a Venezuela tinha democracia “até demais”. Mesmo agora, depois do roubo da eleição, acha que que não há uma ditadura por lá. É só “um rolo”, diz ele, e por conta dessa avaliação não há nada de realmente errado com a Venezuela, levando-se em conta que tudo o que está enrolado sempre pode se desenrolar um dia.

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Se esta opção não for disponível para Lula, o Supremo e quem mais acredita neles, é possível pensar em outras – a começar pela possibilidade de se fazer eleições livres, com urnas que produzam as “atas” escritas tão desejadas por Lula na Venezuela e com o entendimento que o candidato mais votado vai para o governo. Caso o eleitorado escolha o pior de todos, nada de pânico. Se ele fizer um governo ruim, é só eleger um nome que seja o seu oposto na próxima eleição. Se ele fizer um governo bom, então talvez não fosse tão ruim assim.

Esta e qualquer outra solução para desatar a trava atual da política tem de se fundamentar num acordo coerente entre a maioria dos responsáveis pela condução da vida pública brasileira; ou faz sentido, ou nem sai do lugar. O norte deste acordo, como acontece nas democracias sérias, é a decisão de voltar à racionalidade. A ideia mais prática, aí, é ter o máximo de consenso em relação ao que não deve ser feito. Se não tem lógica, não se faz. O resultado mais provável é que o Brasil vai economizar um monte do tempo que está perdendo hoje com crenças irracionais.

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Não é lógico, por exemplo, dizer que todos os cidadãos que discordam do governo, da conduta do STF e das “pautas” que ambos defendem são “bolsonaristas”. Não faz nexo, da mesma forma, dividir a população brasileira em duas classes de pessoas – os bons, que acreditam estar no “campo progressista”, e os que são réus do crime de “bolsonarismo” e, nessa condição, não têm direito de desfrutar a proteção da lei. Também é incompreensível sustentar que as urnas eletrônicas são um objeto mágico e, portanto, não podem receber nenhum tipo de aperfeiçoamento.

É difícil sair do lugar quando dezenas de milhões de brasileiros são excluídos da cidadania por “golpismo” e “bolsonarismo”, sendo que jamais lhes passou pela cabeça defender golpe nenhum – e nem gostar de Bolsonaro. Não faz sentido achar que um projeto de anistia para crimes não cometidos, e sobretudo não provados, como o de “golpe de Estado” e o de “abolição violenta do Estado de Direito”, seja um “ato antidemocrático” e “fascista” - só porque pode eventualmente, beneficiar Bolsonaro.

Mais que tudo, há a evidência de que enquanto Jair Bolsonaro continuar a ser tratado como o problema mais importante que já apareceu na vida política do Brasil, o carro não pega – é óbvio que ele continuará sendo apenas um problema sem solução. Lula, a esquerda, os comunicadores e outros tantos poderiam ter contribuído para o Brasil passar à fase seguinte se deixassem Bolsonaro para trás. Mas fizeram contrário. Não passam um dia sem dizer que ele vai acabar com o País – e aí o ex-presidente continua sendo o centro de tudo, mesmo porque pelo menos metade da população não acredita que ele vai acabar com nada.

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Bolsonaro só vai sair de cena se disputar uma eleição efetivamente limpa – não eleição tipo Maduro – e perder. O que paralisa a política do Brasil de hoje não são os vícios e as virtudes do ex-presidente. É o medo de que ele ganhe. Porque não se considera, nunca, que Bolsonaro possa disputar a eleição presidencial e perder? Quer dizer, então, que ele já ganhou? Não há democracia de verdade com esse tipo de neura. Se o maior risco do regime é a vitória do candidato preferido pela maioria dos eleitores, nada vai funcionar.

Mais cedo ou mais tarde, para o bem de todos e a felicidade geral da nação, a vida política brasileira precisará sair do ponto morto em que está hoje e fazer uma tentativa de andar para frente. Do jeito que está a coisa, não adianta nada ficar todo mundo querendo pisar no acelerador. O motor faz muito barulho, mas o carro não sai do lugar - e o lugar onde ele está é ruim. Como pode estar bem uma democracia em que o presidente da República chama o povo para a rua, e não vai ninguém? Pior: só vai tanque de guerra, polícia e os picaretas que vivem em palanque de governo.

Para complicar, o político que o governo descreve como a maior ameaça para a democracia que jamais apareceu neste País enche a rua, mais uma vez, com o seu próprio comício. Como se explica uma coisa dessas? Deveria ser o contrário. A praça de Lula (e do ministro Alexandre de Moraes) teria de estar dura de gente para defender a democracia que foi exibida naquele palanque. A praça de Jair Bolsonaro, que segundo as classes pró-governo quer impor uma ditadura, teria de estar vazia.

Como pode haver um regime democrático no Brasil se o povo faz o oposto do que os especialistas em democracia esperam que ele faça? Eleição, nesse caso, vira perigo de morte: os eleitores podem escolher os governantes antidemocráticos, e aí o que se vai fazer? A Venezuela, por exemplo, tem uma reposta pronta para isso: proíbe que os candidatos “errados” disputem a eleição, e se mesmo assim o povo escolher algum indesejável, o STF lá deles diz que foi o governo quem ganhou, com “ata” ou sem “ata”. Quem quer ver os números da votação é “golpista”.

Ato na Avenida Paulista com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro pede o impeachment do ministro Alexandre Moraes Foto: Tiago Queiroz/Estadão

É um caminho, sem dúvida. Pode ser um pouco “desagradável”, como diz o presidente Lula – mas resolve, e ele mesmo, mais muita gente boa, achava até outro dia que a Venezuela tinha democracia “até demais”. Mesmo agora, depois do roubo da eleição, acha que que não há uma ditadura por lá. É só “um rolo”, diz ele, e por conta dessa avaliação não há nada de realmente errado com a Venezuela, levando-se em conta que tudo o que está enrolado sempre pode se desenrolar um dia.

Se esta opção não for disponível para Lula, o Supremo e quem mais acredita neles, é possível pensar em outras – a começar pela possibilidade de se fazer eleições livres, com urnas que produzam as “atas” escritas tão desejadas por Lula na Venezuela e com o entendimento que o candidato mais votado vai para o governo. Caso o eleitorado escolha o pior de todos, nada de pânico. Se ele fizer um governo ruim, é só eleger um nome que seja o seu oposto na próxima eleição. Se ele fizer um governo bom, então talvez não fosse tão ruim assim.

Esta e qualquer outra solução para desatar a trava atual da política tem de se fundamentar num acordo coerente entre a maioria dos responsáveis pela condução da vida pública brasileira; ou faz sentido, ou nem sai do lugar. O norte deste acordo, como acontece nas democracias sérias, é a decisão de voltar à racionalidade. A ideia mais prática, aí, é ter o máximo de consenso em relação ao que não deve ser feito. Se não tem lógica, não se faz. O resultado mais provável é que o Brasil vai economizar um monte do tempo que está perdendo hoje com crenças irracionais.

Não é lógico, por exemplo, dizer que todos os cidadãos que discordam do governo, da conduta do STF e das “pautas” que ambos defendem são “bolsonaristas”. Não faz nexo, da mesma forma, dividir a população brasileira em duas classes de pessoas – os bons, que acreditam estar no “campo progressista”, e os que são réus do crime de “bolsonarismo” e, nessa condição, não têm direito de desfrutar a proteção da lei. Também é incompreensível sustentar que as urnas eletrônicas são um objeto mágico e, portanto, não podem receber nenhum tipo de aperfeiçoamento.

É difícil sair do lugar quando dezenas de milhões de brasileiros são excluídos da cidadania por “golpismo” e “bolsonarismo”, sendo que jamais lhes passou pela cabeça defender golpe nenhum – e nem gostar de Bolsonaro. Não faz sentido achar que um projeto de anistia para crimes não cometidos, e sobretudo não provados, como o de “golpe de Estado” e o de “abolição violenta do Estado de Direito”, seja um “ato antidemocrático” e “fascista” - só porque pode eventualmente, beneficiar Bolsonaro.

Mais que tudo, há a evidência de que enquanto Jair Bolsonaro continuar a ser tratado como o problema mais importante que já apareceu na vida política do Brasil, o carro não pega – é óbvio que ele continuará sendo apenas um problema sem solução. Lula, a esquerda, os comunicadores e outros tantos poderiam ter contribuído para o Brasil passar à fase seguinte se deixassem Bolsonaro para trás. Mas fizeram contrário. Não passam um dia sem dizer que ele vai acabar com o País – e aí o ex-presidente continua sendo o centro de tudo, mesmo porque pelo menos metade da população não acredita que ele vai acabar com nada.

Bolsonaro só vai sair de cena se disputar uma eleição efetivamente limpa – não eleição tipo Maduro – e perder. O que paralisa a política do Brasil de hoje não são os vícios e as virtudes do ex-presidente. É o medo de que ele ganhe. Porque não se considera, nunca, que Bolsonaro possa disputar a eleição presidencial e perder? Quer dizer, então, que ele já ganhou? Não há democracia de verdade com esse tipo de neura. Se o maior risco do regime é a vitória do candidato preferido pela maioria dos eleitores, nada vai funcionar.

Mais cedo ou mais tarde, para o bem de todos e a felicidade geral da nação, a vida política brasileira precisará sair do ponto morto em que está hoje e fazer uma tentativa de andar para frente. Do jeito que está a coisa, não adianta nada ficar todo mundo querendo pisar no acelerador. O motor faz muito barulho, mas o carro não sai do lugar - e o lugar onde ele está é ruim. Como pode estar bem uma democracia em que o presidente da República chama o povo para a rua, e não vai ninguém? Pior: só vai tanque de guerra, polícia e os picaretas que vivem em palanque de governo.

Para complicar, o político que o governo descreve como a maior ameaça para a democracia que jamais apareceu neste País enche a rua, mais uma vez, com o seu próprio comício. Como se explica uma coisa dessas? Deveria ser o contrário. A praça de Lula (e do ministro Alexandre de Moraes) teria de estar dura de gente para defender a democracia que foi exibida naquele palanque. A praça de Jair Bolsonaro, que segundo as classes pró-governo quer impor uma ditadura, teria de estar vazia.

Como pode haver um regime democrático no Brasil se o povo faz o oposto do que os especialistas em democracia esperam que ele faça? Eleição, nesse caso, vira perigo de morte: os eleitores podem escolher os governantes antidemocráticos, e aí o que se vai fazer? A Venezuela, por exemplo, tem uma reposta pronta para isso: proíbe que os candidatos “errados” disputem a eleição, e se mesmo assim o povo escolher algum indesejável, o STF lá deles diz que foi o governo quem ganhou, com “ata” ou sem “ata”. Quem quer ver os números da votação é “golpista”.

Ato na Avenida Paulista com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro pede o impeachment do ministro Alexandre Moraes Foto: Tiago Queiroz/Estadão

É um caminho, sem dúvida. Pode ser um pouco “desagradável”, como diz o presidente Lula – mas resolve, e ele mesmo, mais muita gente boa, achava até outro dia que a Venezuela tinha democracia “até demais”. Mesmo agora, depois do roubo da eleição, acha que que não há uma ditadura por lá. É só “um rolo”, diz ele, e por conta dessa avaliação não há nada de realmente errado com a Venezuela, levando-se em conta que tudo o que está enrolado sempre pode se desenrolar um dia.

Se esta opção não for disponível para Lula, o Supremo e quem mais acredita neles, é possível pensar em outras – a começar pela possibilidade de se fazer eleições livres, com urnas que produzam as “atas” escritas tão desejadas por Lula na Venezuela e com o entendimento que o candidato mais votado vai para o governo. Caso o eleitorado escolha o pior de todos, nada de pânico. Se ele fizer um governo ruim, é só eleger um nome que seja o seu oposto na próxima eleição. Se ele fizer um governo bom, então talvez não fosse tão ruim assim.

Esta e qualquer outra solução para desatar a trava atual da política tem de se fundamentar num acordo coerente entre a maioria dos responsáveis pela condução da vida pública brasileira; ou faz sentido, ou nem sai do lugar. O norte deste acordo, como acontece nas democracias sérias, é a decisão de voltar à racionalidade. A ideia mais prática, aí, é ter o máximo de consenso em relação ao que não deve ser feito. Se não tem lógica, não se faz. O resultado mais provável é que o Brasil vai economizar um monte do tempo que está perdendo hoje com crenças irracionais.

Não é lógico, por exemplo, dizer que todos os cidadãos que discordam do governo, da conduta do STF e das “pautas” que ambos defendem são “bolsonaristas”. Não faz nexo, da mesma forma, dividir a população brasileira em duas classes de pessoas – os bons, que acreditam estar no “campo progressista”, e os que são réus do crime de “bolsonarismo” e, nessa condição, não têm direito de desfrutar a proteção da lei. Também é incompreensível sustentar que as urnas eletrônicas são um objeto mágico e, portanto, não podem receber nenhum tipo de aperfeiçoamento.

É difícil sair do lugar quando dezenas de milhões de brasileiros são excluídos da cidadania por “golpismo” e “bolsonarismo”, sendo que jamais lhes passou pela cabeça defender golpe nenhum – e nem gostar de Bolsonaro. Não faz sentido achar que um projeto de anistia para crimes não cometidos, e sobretudo não provados, como o de “golpe de Estado” e o de “abolição violenta do Estado de Direito”, seja um “ato antidemocrático” e “fascista” - só porque pode eventualmente, beneficiar Bolsonaro.

Mais que tudo, há a evidência de que enquanto Jair Bolsonaro continuar a ser tratado como o problema mais importante que já apareceu na vida política do Brasil, o carro não pega – é óbvio que ele continuará sendo apenas um problema sem solução. Lula, a esquerda, os comunicadores e outros tantos poderiam ter contribuído para o Brasil passar à fase seguinte se deixassem Bolsonaro para trás. Mas fizeram contrário. Não passam um dia sem dizer que ele vai acabar com o País – e aí o ex-presidente continua sendo o centro de tudo, mesmo porque pelo menos metade da população não acredita que ele vai acabar com nada.

Bolsonaro só vai sair de cena se disputar uma eleição efetivamente limpa – não eleição tipo Maduro – e perder. O que paralisa a política do Brasil de hoje não são os vícios e as virtudes do ex-presidente. É o medo de que ele ganhe. Porque não se considera, nunca, que Bolsonaro possa disputar a eleição presidencial e perder? Quer dizer, então, que ele já ganhou? Não há democracia de verdade com esse tipo de neura. Se o maior risco do regime é a vitória do candidato preferido pela maioria dos eleitores, nada vai funcionar.

Mais cedo ou mais tarde, para o bem de todos e a felicidade geral da nação, a vida política brasileira precisará sair do ponto morto em que está hoje e fazer uma tentativa de andar para frente. Do jeito que está a coisa, não adianta nada ficar todo mundo querendo pisar no acelerador. O motor faz muito barulho, mas o carro não sai do lugar - e o lugar onde ele está é ruim. Como pode estar bem uma democracia em que o presidente da República chama o povo para a rua, e não vai ninguém? Pior: só vai tanque de guerra, polícia e os picaretas que vivem em palanque de governo.

Para complicar, o político que o governo descreve como a maior ameaça para a democracia que jamais apareceu neste País enche a rua, mais uma vez, com o seu próprio comício. Como se explica uma coisa dessas? Deveria ser o contrário. A praça de Lula (e do ministro Alexandre de Moraes) teria de estar dura de gente para defender a democracia que foi exibida naquele palanque. A praça de Jair Bolsonaro, que segundo as classes pró-governo quer impor uma ditadura, teria de estar vazia.

Como pode haver um regime democrático no Brasil se o povo faz o oposto do que os especialistas em democracia esperam que ele faça? Eleição, nesse caso, vira perigo de morte: os eleitores podem escolher os governantes antidemocráticos, e aí o que se vai fazer? A Venezuela, por exemplo, tem uma reposta pronta para isso: proíbe que os candidatos “errados” disputem a eleição, e se mesmo assim o povo escolher algum indesejável, o STF lá deles diz que foi o governo quem ganhou, com “ata” ou sem “ata”. Quem quer ver os números da votação é “golpista”.

Ato na Avenida Paulista com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro pede o impeachment do ministro Alexandre Moraes Foto: Tiago Queiroz/Estadão

É um caminho, sem dúvida. Pode ser um pouco “desagradável”, como diz o presidente Lula – mas resolve, e ele mesmo, mais muita gente boa, achava até outro dia que a Venezuela tinha democracia “até demais”. Mesmo agora, depois do roubo da eleição, acha que que não há uma ditadura por lá. É só “um rolo”, diz ele, e por conta dessa avaliação não há nada de realmente errado com a Venezuela, levando-se em conta que tudo o que está enrolado sempre pode se desenrolar um dia.

Se esta opção não for disponível para Lula, o Supremo e quem mais acredita neles, é possível pensar em outras – a começar pela possibilidade de se fazer eleições livres, com urnas que produzam as “atas” escritas tão desejadas por Lula na Venezuela e com o entendimento que o candidato mais votado vai para o governo. Caso o eleitorado escolha o pior de todos, nada de pânico. Se ele fizer um governo ruim, é só eleger um nome que seja o seu oposto na próxima eleição. Se ele fizer um governo bom, então talvez não fosse tão ruim assim.

Esta e qualquer outra solução para desatar a trava atual da política tem de se fundamentar num acordo coerente entre a maioria dos responsáveis pela condução da vida pública brasileira; ou faz sentido, ou nem sai do lugar. O norte deste acordo, como acontece nas democracias sérias, é a decisão de voltar à racionalidade. A ideia mais prática, aí, é ter o máximo de consenso em relação ao que não deve ser feito. Se não tem lógica, não se faz. O resultado mais provável é que o Brasil vai economizar um monte do tempo que está perdendo hoje com crenças irracionais.

Não é lógico, por exemplo, dizer que todos os cidadãos que discordam do governo, da conduta do STF e das “pautas” que ambos defendem são “bolsonaristas”. Não faz nexo, da mesma forma, dividir a população brasileira em duas classes de pessoas – os bons, que acreditam estar no “campo progressista”, e os que são réus do crime de “bolsonarismo” e, nessa condição, não têm direito de desfrutar a proteção da lei. Também é incompreensível sustentar que as urnas eletrônicas são um objeto mágico e, portanto, não podem receber nenhum tipo de aperfeiçoamento.

É difícil sair do lugar quando dezenas de milhões de brasileiros são excluídos da cidadania por “golpismo” e “bolsonarismo”, sendo que jamais lhes passou pela cabeça defender golpe nenhum – e nem gostar de Bolsonaro. Não faz sentido achar que um projeto de anistia para crimes não cometidos, e sobretudo não provados, como o de “golpe de Estado” e o de “abolição violenta do Estado de Direito”, seja um “ato antidemocrático” e “fascista” - só porque pode eventualmente, beneficiar Bolsonaro.

Mais que tudo, há a evidência de que enquanto Jair Bolsonaro continuar a ser tratado como o problema mais importante que já apareceu na vida política do Brasil, o carro não pega – é óbvio que ele continuará sendo apenas um problema sem solução. Lula, a esquerda, os comunicadores e outros tantos poderiam ter contribuído para o Brasil passar à fase seguinte se deixassem Bolsonaro para trás. Mas fizeram contrário. Não passam um dia sem dizer que ele vai acabar com o País – e aí o ex-presidente continua sendo o centro de tudo, mesmo porque pelo menos metade da população não acredita que ele vai acabar com nada.

Bolsonaro só vai sair de cena se disputar uma eleição efetivamente limpa – não eleição tipo Maduro – e perder. O que paralisa a política do Brasil de hoje não são os vícios e as virtudes do ex-presidente. É o medo de que ele ganhe. Porque não se considera, nunca, que Bolsonaro possa disputar a eleição presidencial e perder? Quer dizer, então, que ele já ganhou? Não há democracia de verdade com esse tipo de neura. Se o maior risco do regime é a vitória do candidato preferido pela maioria dos eleitores, nada vai funcionar.

Mais cedo ou mais tarde, para o bem de todos e a felicidade geral da nação, a vida política brasileira precisará sair do ponto morto em que está hoje e fazer uma tentativa de andar para frente. Do jeito que está a coisa, não adianta nada ficar todo mundo querendo pisar no acelerador. O motor faz muito barulho, mas o carro não sai do lugar - e o lugar onde ele está é ruim. Como pode estar bem uma democracia em que o presidente da República chama o povo para a rua, e não vai ninguém? Pior: só vai tanque de guerra, polícia e os picaretas que vivem em palanque de governo.

Para complicar, o político que o governo descreve como a maior ameaça para a democracia que jamais apareceu neste País enche a rua, mais uma vez, com o seu próprio comício. Como se explica uma coisa dessas? Deveria ser o contrário. A praça de Lula (e do ministro Alexandre de Moraes) teria de estar dura de gente para defender a democracia que foi exibida naquele palanque. A praça de Jair Bolsonaro, que segundo as classes pró-governo quer impor uma ditadura, teria de estar vazia.

Como pode haver um regime democrático no Brasil se o povo faz o oposto do que os especialistas em democracia esperam que ele faça? Eleição, nesse caso, vira perigo de morte: os eleitores podem escolher os governantes antidemocráticos, e aí o que se vai fazer? A Venezuela, por exemplo, tem uma reposta pronta para isso: proíbe que os candidatos “errados” disputem a eleição, e se mesmo assim o povo escolher algum indesejável, o STF lá deles diz que foi o governo quem ganhou, com “ata” ou sem “ata”. Quem quer ver os números da votação é “golpista”.

Ato na Avenida Paulista com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro pede o impeachment do ministro Alexandre Moraes Foto: Tiago Queiroz/Estadão

É um caminho, sem dúvida. Pode ser um pouco “desagradável”, como diz o presidente Lula – mas resolve, e ele mesmo, mais muita gente boa, achava até outro dia que a Venezuela tinha democracia “até demais”. Mesmo agora, depois do roubo da eleição, acha que que não há uma ditadura por lá. É só “um rolo”, diz ele, e por conta dessa avaliação não há nada de realmente errado com a Venezuela, levando-se em conta que tudo o que está enrolado sempre pode se desenrolar um dia.

Se esta opção não for disponível para Lula, o Supremo e quem mais acredita neles, é possível pensar em outras – a começar pela possibilidade de se fazer eleições livres, com urnas que produzam as “atas” escritas tão desejadas por Lula na Venezuela e com o entendimento que o candidato mais votado vai para o governo. Caso o eleitorado escolha o pior de todos, nada de pânico. Se ele fizer um governo ruim, é só eleger um nome que seja o seu oposto na próxima eleição. Se ele fizer um governo bom, então talvez não fosse tão ruim assim.

Esta e qualquer outra solução para desatar a trava atual da política tem de se fundamentar num acordo coerente entre a maioria dos responsáveis pela condução da vida pública brasileira; ou faz sentido, ou nem sai do lugar. O norte deste acordo, como acontece nas democracias sérias, é a decisão de voltar à racionalidade. A ideia mais prática, aí, é ter o máximo de consenso em relação ao que não deve ser feito. Se não tem lógica, não se faz. O resultado mais provável é que o Brasil vai economizar um monte do tempo que está perdendo hoje com crenças irracionais.

Não é lógico, por exemplo, dizer que todos os cidadãos que discordam do governo, da conduta do STF e das “pautas” que ambos defendem são “bolsonaristas”. Não faz nexo, da mesma forma, dividir a população brasileira em duas classes de pessoas – os bons, que acreditam estar no “campo progressista”, e os que são réus do crime de “bolsonarismo” e, nessa condição, não têm direito de desfrutar a proteção da lei. Também é incompreensível sustentar que as urnas eletrônicas são um objeto mágico e, portanto, não podem receber nenhum tipo de aperfeiçoamento.

É difícil sair do lugar quando dezenas de milhões de brasileiros são excluídos da cidadania por “golpismo” e “bolsonarismo”, sendo que jamais lhes passou pela cabeça defender golpe nenhum – e nem gostar de Bolsonaro. Não faz sentido achar que um projeto de anistia para crimes não cometidos, e sobretudo não provados, como o de “golpe de Estado” e o de “abolição violenta do Estado de Direito”, seja um “ato antidemocrático” e “fascista” - só porque pode eventualmente, beneficiar Bolsonaro.

Mais que tudo, há a evidência de que enquanto Jair Bolsonaro continuar a ser tratado como o problema mais importante que já apareceu na vida política do Brasil, o carro não pega – é óbvio que ele continuará sendo apenas um problema sem solução. Lula, a esquerda, os comunicadores e outros tantos poderiam ter contribuído para o Brasil passar à fase seguinte se deixassem Bolsonaro para trás. Mas fizeram contrário. Não passam um dia sem dizer que ele vai acabar com o País – e aí o ex-presidente continua sendo o centro de tudo, mesmo porque pelo menos metade da população não acredita que ele vai acabar com nada.

Bolsonaro só vai sair de cena se disputar uma eleição efetivamente limpa – não eleição tipo Maduro – e perder. O que paralisa a política do Brasil de hoje não são os vícios e as virtudes do ex-presidente. É o medo de que ele ganhe. Porque não se considera, nunca, que Bolsonaro possa disputar a eleição presidencial e perder? Quer dizer, então, que ele já ganhou? Não há democracia de verdade com esse tipo de neura. Se o maior risco do regime é a vitória do candidato preferido pela maioria dos eleitores, nada vai funcionar.

Opinião por J.R. Guzzo

Jornalista escreve semanalmente sobre o cenário político e econômico do País

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