BRASÍLIA e SÃO PAULO - O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros 11 aliados foram indiciados nesta quinta-feira, 4, pelo caso da venda ilegal de joias da Presidência da República. Entre os nomes apontados pela PF estão assessores próximos do ex-presidente e do ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque e o ex-ajudante de ordens da Presidência tenente-coronel Mauro Cid, além do advogado pessoal de Bolsonaro, Fabio Wajngarten.
O ex-presidente foi indiciado pelos supostos crimes de peculato, associação criminosa e lavagem de dinheiro.
Os indiciamentos ocorrem no bojo da Operação Lucas 12:2, que teve a primeira fase deflagrada em agosto do ano passado e vasculhou endereços ligados ao advogado Frederick Wassef e ao general Mauro César Lourena Cid, pai de Mauro Cid. A operação apontou indícios de que Bolsonaro, seu ex-ajudante de ordens e outros dois assessores “atuaram para desviar presentes de alto valor recebidos em razão do cargo pelo ex-presidente para posteriormente serem vendidos no exterior”.
O Estadão busca contato com a defesa dos investigados.
Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior
Ex-ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque foi indiciado pelos crimes de peculato e associação criminosa. Foi na mochila de um dos seus assessores que a Receita Federal do Aeroporto de Guarulhos apreendeu um kit entregue pelo governo saudita que continha joias com colar, anel, relógio e um par de brincos de diamantes. A apreensão foi revelada pelo Estadão.
Almirante de esquadra da Marinha, Bento Albuquerque chefiou o Ministério de Minas e Energia do início do governo Bolsonaro até maio de 2022, quando foi substituído por Adolfo Sachsida.
José Roberto Bueno Junior
Oficial-general da Marinha, José Roberto Bueno Júnior era o chefe do gabinete de Bento Albuquerque no Ministério de Minas e Energia. Ele foi indiciado por peculato, lavagem de dinheiro e associação criminosa.
Julio Cesar Vieira Gomes
Chefe da Polícia Federal durante a apreensão das joias no Aeroporto de Guarulhos, Julio Cesar Vieira Gomes foi indiciado pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e crime funcional de advocacia administrativa perante a administração fazendária.
O Estadão revelou que ele exerceu pressão contra servidores da Receita para eles liberarem as joias detidas na alfândega de Guarulhos. Julio Cesar pressionou os funcionários por meio de mensagens de texto enviadas por aplicativos como WhatsApp, gravou áudios, fez telefonemas e encaminhou e-mails sobre o assunto.
Marcelo da Silva Vieira
Capitão de corveta da reserva, Marcelo da Silva Vieira era chefe do setor de documentação histórica da presidência, no Rio. Ele era o responsável por classificar os itens recebidos pelo presidente, indicando se deveriam ficar com Bolsonaro ou entrar para o acervo da União.
Durante a investigação da venda ilegal de joias, Vieira declarou à PF que participou de uma ligação com Bolsonaro e o então ajudante de ordens da Presidência, o tenente-coronel Mauro Cid, em dezembro do ano passado, cujo tema foi a liberação dos itens em Guarulhos. O capitão de corveta afirmou ter se negado a assinar um documento que seria utilizado para convencer a Receita Federal a entregar o conjunto.
Mauro Cesar Barbosa Cid
Ex-ajudante de ordens da Presidência, Mauro César Barbosa Cid foi indiciado por peculato, lavagem de dinheiro e associação criminosa. Em setembro do ano passado, ele firmou delação premiada com a Polícia Federal e o Supremo Tribunal Federal (STF) e forneceu informações que implicam Bolsonaro neste e em outros casos, como a tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022 e a fraude nos cartões de vacinação contra a covid-19.
Como ajudante de ordens, Mauro Cid teve acesso livre ao Palácio do Planalto e esteve ao lado do Bolsonaro em entrevistas, lives, reuniões e em salas de cirurgias, sendo o braço-direito e secretário particular de Bolsonaro nos quatro anos do governo passado. As memórias dele e os acessos que teve tornam a delação um problema para o ex-chefe do Executivo.
Na delação premiada, Cid disse aos investigadores que entregou ao ex-presidente uma parte do dinheiro proveniente do esquema ilegal de venda de joias no exterior. O tenente-coronel também admitiu à PF que participou ativamente da venda de dois relógios, um da marca Rolex e outro da Patek Phillipe. Bolsonaro, então, teria recebido em mãos US$ 68 mil de forma parcelada, com um repasse nos Estados Unidos e outro no Brasil.
Frederick Wassef
Advogado pessoal do ex-presidente, Frederick Wassef foi indiciado por lavagem de dinheiro e associação criminosa. Durante as investigações de um suposto esquema de “rachadinha” no gabinete do senador Flávio Bolsonaro (PL), Wassef defendeu os dois e escondeu na casa dele o assessor Fabrício Queiroz.
Segundo as investigações, Wassef recomprou, nos Estados Unidos, o Rolex recebido de presente por Bolsonaro e vendido por Lourena Cid para poder entregar o item ao Tribunal de Contas da União (TCU). O advogado teve de pagar um valor maior do que aquele obtido na venda.
Em nota, Wassef afirmou que Bolsonaro e Mauro Cid não pediram que ele comprasse o Rolex. Segundo o advogado, a compra do item foi feita com recursos próprios para fazer a devolução à Polícia Federal.
“Entreguei espontaneamente à Polícia Federal todos os documentos que provam isto. Nem eu e nem os demais advogados do ex-presidente tivemos acesso ao relatório final, o que choca a todos, o vazamento à imprensa de peças processuais que estão em segredo de justiça. Estou passando por tudo isto apenas por exercer advocacia em defesa de Jair Bolsonaro”, afirmou Wassef.
Fabio Wajngarten
Advogado da família Bolsonaro e ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Fabio Wajngarten foi indiciado por lavagem de dinheiro e associação criminosa.
A PF apurou que Wajngarten participou da operação de resgate do Rolex vendido por Mauro Cid nos Estados Unidos, o que é negado pelo ex-secretário de Comunicação. Após o Estadão revelar que joias recebidas pelo ex-presidente haviam sido omitidas da Receita Federal, Fábio e Cid discutem em mensagens capturadas pela PF sobre uma forma de “se antecipar” de uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que, posteriormente, determinou que Bolsonaro deveria devolver o relógio.
Em sua conta no X (antigo Twitter), Wajngarten afirmou que não violou a lei e seu indiciamento é abusivo. “O meu indiciamento pela Polícia Federal se baseia na seguinte afronta legal: advogado, fui indiciado porque no exercício de minhas prerrogativas, defendi um cliente, sendo que em toda a investigação não há qualquer prova contra mim. Sendo específico: fui indiciado pela razão bizarra de ter cumprido a Lei!”, escreveu.
Marcos André dos Santos Soeiro
Ex-assessor do ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque, Marcos André dos Santos Soeiro foi indiciado por peculato e associação criminosa. Foi ele que assinou o “termo de retenção de bens” na alfândega da Receita no Aeroporto de Guarulhos.
Osmar Crivelatti
Ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, Osmar Crivellati foi indiciado por lavagem de dinheiro e associação criminosa. Ele é segundo-tenente do Exército ele era um subordinado de Mauro Cid.
Atualmente, Crivellati é um dos assessores pessoais de Bolsonaro e integra a cota de servidores que ex-presidentes têm direito, cujos gastos são custeados pela própria Presidência da República com recursos públicos.
Segundo as investigações, ele atuou para recuperar e devolver um kit de joias de ouro branco e diamantes que foi destinado ao acervo privado de Bolsonaro.
Mauro César Lourena Cid
General do Exército, Mauro César Lourena Cid é pai de Mauro Cid e foi indiciado por lavagem de dinheiro e associação criminosa. Segundo a delação do ex-ajudante de ordens, o dinheiro da comercialização ilegal das joias no Exterior foi depositado na conta do militar.
A polícia também considerou que o general auxiliou o grupo na negociação das peças da Presidência da República. Uma das provas contra o militar foi uma foto de uma escultura, que ia ser vendida ilegalmente, onde o reflexo dele aparece.
Marcelo Costa Câmara
Coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Marcelo Costa Câmara foi indiciado por lavagem de dinheiro. Ele também está sendo investigado pela tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022 e o aparelhamento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para espionar ministros do STF e adversários políticos do governo anterior.
Quando estava prestes a deixar o Planalto, Bolsonaro fez uma procuração em cartório em que reconhecia a Marcelo Câmara a competência de cuidar do acervo de presentes que ganhou durante os quatro anos de gestão. A PF suspeita que esse despacho tenha sido assinado pelo ex-presidente já na tentativa de se eximir das complicações decorrentes de se apropriar indevidamente de objetos de valor da Presidência.