A escolha do subprocurador Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República consolida o que há algum tempo começou a ser percebido no mundo político e entre os eleitores de Jair Bolsonaro: o presidente da República deu um cavalo de pau em sua principal bandeira de campanha, a do combate à corrupção.
Essa mudança de rumos pode explicar também os atritos do presidente com o ministro da Justiça, Sérgio Moro, levado ao governo por causa de sua fama de justiceiro e de inimigo da corrupção. E, também, as interferências de Bolsonaro na Polícia Federal, na Receita e no Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que por intermédio da Medida Provisória 893/2019 foi transferido do Ministério da Economia para o Banco Central.
O meio político, cansado de quase todo dia ver um de seus integrantes alvo de ação do Ministério Público, gostou da escolha de Aras. Com isso, se o novo procurador não tiver o voto de todo mundo quando o Senado se reunir para deliberar sobre a indicação dele, chegará perto da unanimidade.
Já parte dos eleitores de Bolsonaro, como se sabe, repudiou a escolha. A ponto de o presidente usar sua live semanal no Facebook, há cerca de dez dias, para pedir paciência e compreensão aos eleitores. Porque, segundo Bolsonaro, não basta na chefia do Ministério Público alguém que apenas combata a corrupção. É preciso ter sensibilidade também em outros setores. E numa cena poucas vezes vista antes, a de Bolsonaro na defensiva, o presidente recorreu a uma expressão bíblica: “Atire a primeira pedra quem não teve nenhum pecado. Eu tive que escolher alguém.”
Já o escolhido, aquele pelo qual uma parte dos eleitores ameaçou apedrejar Bolsonaro, disse em suas andanças pelo Senado, onde tem passado boa parte de seu tempo atrás de votos, que não atacará só a corrupção. Prometeu trabalhar também pelo destravamento da economia. Em outras palavras, em vez de propor o embargo de uma obra onde forem encontradas irregularidades, ou o fechamento de uma empresa suspeita, tentará um acordo para que as coisas possam andar. O relator da indicação de Aras no Senado, Eduardo Braga (AM), gostou do que ouviu. Disse que os senadores não querem o ativismo político no Ministério Público.
O que teria levado Bolsonaro a mudar tão radicalmente entre a eleição e agora? Muitos especulam que ele estaria agindo para proteger o filho, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que sem autorização judicial foi investigado por um consórcio entre o Coaf, a Receita e o Ministério Público. Tal ação só parou por ordem do presidente do STF, ministro Dias Toffoli.
É possível que essa seja uma das razões. Mas não é só essa.
Bobo é quem pensa que Bolsonaro é bobo.
A queda dele pela família é incontestável. Mas o presidente, que foi deputado por 28 anos, que assistiu de uma posição privilegiada aos impeachments de Fernando Collor e de Dilma Rousseff, sabe que nenhum governo se sustenta só numa frente de combate à corrupção. É preciso fazer a economia andar e com isso gerar empregos.
Se a economia anda, se os empregos formais aparecem, o Tesouro arrecada mais impostos e a Previdência melhora suas contas, pois cresce o número de contribuintes. Ao mesmo tempo, pode sobrar algum dinheiro para o governo fazer grandes obras de infraestrutura. O que ajuda a gerar mais empregos. Paralisar tais obras por qualquer irregularidade, corrupção também, é perder emprego. A Lava Jato fez um limpa na corrupção, virou até uma seita seguida pelos lavajatistas. Mas comeu 500 mil empregos e acabou com um bom número de empresas conhecidas mundialmente. Dilma Rousseff não caiu pela corrupção do PT. Caiu porque destroçou a economia.