BRASÍLIA - Juízes federais acionaram o Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que barrou o pagamento de quase R$ 1 bilhão em penduricalhos aos magistrados.
O mandado de segurança (MS) foi protocolado nessa quarta-feira, 21, pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). O processo foi distribuído para a relatoria do ministro do STF Dias Toffoli, que determinou a manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre o caso.
O pagamento retroativo do chamado Adicional por Tempo de Serviço (ATS) foi suspenso em abril deste ano por decisão do ministro do TCU Jorge Oliveira, conforme revelou o Estadão. O penduricalho permitiria que magistrados que ingressaram na carreira na década de 90 embolsassem até R$ 2 milhões.
O retroativo havia sido autorizado pelo Conselho da Justiça Federal (CJF). A regalia foi extinta em 2006. O pagamento foi, inicialmente, referendado pelo corregedor nacional de Justiça (CNJ), Luis Felipe Salomão. O magistrado, no entanto, voltou atrás e cancelou, por caráter temporário, o penduricalho.
“Fábrica de penduricalhos”
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se queixou a diversos ministros sobre a primeira decisão de Salomão que manteve o pagamento do penduricalho.
Lula chegou a pedir pessoalmente ao ministro do STF Alexandre de Moraes e ao presidente do TCU, Bruno Dantas, para tratar o caso com urgência, segundo apurou o Estadão. Moraes é próximo a Salomão e, inclusive, defende o seu nome para a próxima vaga de ministro da Suprema Corte.
Por sua vez, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), disse a interlocutores que “não há esforço fiscal que aguente essa fábrica de penduricalhos do Judiciário”.
Ministro Fernando Haddad, segundo interlocutores
Crise institucional
A Ajufe não poupou adjetivos no mandado de segurança. A associação afirmou que a decisão do TCU foi “completamente descabida” e “invasiva”, e acusou o tribunal de “violar a independência do Poder Judiciário”.
Os juízes apontam também que a decisão gerou uma “grave crise institucional” instalada entre o TCU e a cúpula de controle administrativo e financeiro do Judiciário. “Admitir que o TCU suspenda as decisões da cúpula de controle administrativo e financeiro do Poder Judiciário representa a abertura de um flanco a pressões sobre os membros da magistratura”, assinalou.
A argumentação foi tratada como piada na Corte de contas. “O TCU fiscaliza o Presidente da República, a Câmara, o Senado, a PGR e o STF. Mas na cabeça dos gênios, não fiscaliza o CNJ”, ironizou um ministro.
A Ajufe argumenta que o tribunal de contas não tem competência para exercer controle sobre os atos do Conselho da Justiça Federal.
“Observa-se que o que se busca com a presente impetração é ver anulado o acórdão proferido pelo TCU, em que a Corte de Contas, incorrendo em ilegalidade e abuso de poder, suspendeu os efeitos de decisão proferida pelo CJF, que havia reconhecido o restabelecimento do ATS aos magistrados federais que já haviam incorporado referida parcela ao seu patrimônio jurídico. Ao assim proceder, o TCU extrapolou seus limites de atuação, invadindo competência constitucional exclusiva do CNJ e violando o direito líquido e certo dos magistrados federais de integrar uma Justiça Federal independente”, explicou a Ajufe.
O TCU determinou a suspensão do benefício após auditores da Corte apontarem riscos “irreversíveis” aos cofres públicos no pagamento do penduricalho e recomendarem a suspensão imediata.
Em nota, a Ajufe sustentou que não pediu a retomada dos pagamentos, mas questiona a legitimidade do TCU para atuar no tema. “A Associação dos Juízes Federais do Brasil vem a público esclarecer que, no uso legítimo de seu direito constitucional, ingressou com Mandado de Segurança no Supremo Tribunal Federal com o propósito exclusivo de obter pronunciamento acerca dos limites de competência do Tribunal de Contas da União”. Segundo a entidade, cabe ao STF decidir sobre as competências da atuação da Corte de Contas.
“Ainda que se admitisse ao TCU o controle da atuação financeira do Poder Judiciário, esse controle se restringe aos aspectos contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial. Contudo, não está na alçada da Corte de Contas a atribuição de se colocar em posição de ascendência sobre o CJF e CNJ, e muito menos em relação ao STF, não competindo a ela, portanto, deliberar sobre o mérito de legalidade ou constitucionalidade das decisões administrativas proferidas por esses órgãos”, diz a nota da entidade.
A Ajufe insiste que a decisão original do Conselho da Justiça Federal autorizando os pagamento respeita “todos os limites orçamentários, legais e constitucionais”.