BRASÍLIA – Um dos “kids pretos” investigados pela Polícia Federal (PF) defendeu em sua tese de doutorado, apresentada neste ano, que a União invista mais recursos nas Forças Especiais do Exército, como forma de aumentar o poder de dissuasão do Estado. De acordo com o relatório da PF, o tenente-coronel de infantaria Rodrigo Bezerra de Azevedo usava o codinome “Brasil” no grupo “Copa 2022″, criado no aplicativo Signal, para tramar os assassinatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O advogado Jeffrey Chiquini, que defende o militar, disse ao Estadão que seu cliente é inocente, não participou de tentativa de golpe e o que existe é uma “grande armação política de se criar uma narrativa de golpe para perseguir opositores”. Ele afirmou ainda que o tenente-coronel não é a pessoa que utiliza o codinome “Brasil” no Signal porque no dia 15 de dezembro, quando os integrantes do grupo estariam posicionados em Brasília para assassinar Moraes de acordo com a PF, o militar estava em Goiânia comemorando aniversário com sua família.
Chiquini disse ainda que Rodrigo Azevedo não foi intimado para prestar depoimento, mas que não exercerá o direito ao silêncio quando for chamado. Ele informou que não pediu a liberdade do tenente-coronel pois ainda não teve acesso a todos os elementos do processo. O advogado, no entanto, não se posicionou sobre a tese de doutorado do militar até a publicação desta reportagem.
Em 2022, Rodrigo Azevedo atuava no Comando de Operações Especiais do Exército (Copesp), grupo sediado em Goiânia (GO) e cujos integrantes são conhecidos como “kids pretos”. O tenente-coronel foi identificado pela Polícia Federal por causa do número de telefone da operadora TIM, registrado em seu nome. De acordo com a PF, ele é um militar com perfil técnico. Ele é lotado no Batalhão de Ações e Comandos (BAC) do Copesp.
A tese de doutorado de Rodrigo Azevedo se chama “As operações especiais e a dissuasão: reflexões na perspectiva da defesa”. Foi apresentada – e aprovada – em 13 de setembro deste ano na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme). Graças ao trabalho, o militar conquistou o título de “doutor em Ciências Militares”. O orientador dele foi o atual presidente da Eceme, o coronel Eduardo Migon.
Nesta quinta-feira, 21, a PF indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), os ex-ministros Braga Netto e Augusto Heleno e mais 34 pessoas por tentativa de golpe de Estado. A lista inclui vários militares do topo da hierarquia das Forças, como os generais Estevam Cals Teophilo Gaspar de Oliveira e Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e o ex–comandante da Marinha, o almirante Almir Garnier. O deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) e o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, também foram indiciados.
No fim de 2022, Rodrigo Azevedo mandou uma mensagem para um grupo de WhatsApp do qual ele fazia parte, dizendo-se frustrado com a falta de apoio das Forças ao movimento golpista. Ao contrário dos outros integrantes do grupo “Copa 2022″, ele não foi indiciado pela PF nesta quinta-feira, porque a corporação ainda precisa ouvi-lo. No relatório sobre o caso, a PF pede a quebra de sigilo do militar e operações de busca e apreensão contra ele, além de sua prisão preventiva.
A tese de doutorado de Rodrigo Bezerra de Azevedo está disponível na Biblioteca Digital do Exército. Na pesquisa, o militar usou tanto a realização de grupos focais e entrevistas com especialistas quanto a revisão bibliográfica da literatura sobre o tema. No estudo, ele conclui que a existência de forças de operações especiais devidamente capacitadas poderiam aumentar a percepção do poder de dissuasão do Brasil em face de adversários.
Para atingir essa finalidade, argumenta ele, o País deveria desenvolver uma doutrina de comunicação estratégica para as operações especiais; criar um arcabouço jurídico para o uso das operações especiais em tempos de paz; integrar as operações especiais na estratégia geral do Estado; e aumentar o investimento e o orçamento das forças de operações especiais.
Intercâmbio com outros países
No trabalho, Rodrigo Azevedo defende ainda a realização de intercâmbios com unidades de operações especiais dos Estados Unidos e de outros países.
“Para que as Op Esp incrementem o poder dissuasório é certo que elas precisam ser capazes de atuar em profundidade, possuírem elevado nível de treinamento e materiais de alta tecnologia, que permitam seus reduzidos efetivos obterem a superioridade relativa em ações diretas”, diz um trecho do trabalho.
Na tese, o oficial recomenda reforço no orçamento destinado a assegurar “desenvolvimento pleno da Capacidade Militar de Defesa Operações Especiais.