BRASÍLIA - O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), quer recompor o orçamento secreto, esquema de compra de votos criado no governo de Jair Bolsonaro e revelado pelo Estadão, distribuindo recursos por meio de outra rubrica em 2024: as emendas da Mesa Diretora da Casa, presidida por ele.
A estratégia dribla decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que declarou o orçamento secreto inconstitucional, e dá uma nova cara ao mecanismo para capturar nacos do Orçamento e distribuir o dinheiro entre aliados sem critérios técnicos e transparência.
A proposta, porém, não é apoiada por alguns integrantes da Mesa e líderes partidários, que não querem ficar nas mãos de Lira na hora de enviar recursos para suas bases eleitorais.
Todos os anos, o Congresso aprova emendas por meio das comissões da Câmara e do Senado. Os parlamentares querem aumentar o volume desses recursos e impor o pagamento dessas emendas ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano que vem, após o fim do orçamento secreto.
A Mesa Diretora da Câmara, presidida por Lira e composta por 11 deputados, é uma das comissões da Casa e, portanto, pode apresentar emendas ao Orçamento. As indicações da Mesa devem, porém, se restringir a questões administrativas e legislativas do Congresso. No ano passado, o colegiado apresentou emendas para garantir recursos no Orçamento para o aumento de salário dos deputados.
O que Arthur Lira quer em 2024 é aumentar o escopo e os valores das emendas da comissão da Mesa, ampliando as indicações para obras e envio de recursos a municípios em ano de eleições municipais. O parlamentar estará no último ano como presidente da Câmara e tenta emplacar um aliado na sucessão.
Ele ainda não definiu um valor total das emendas que pretende distribuir nem as fontes dos repasses. Quem definirá os limites para atender o presidente da Câmara é o relator-geral do Orçamento, deputado Luiz Carlos Motta (PL-SP), indicado pelo próprio Lira.
Estratégia de Lira é confirmada por integrantes da Mesa Diretora da Câmara
Desde dezembro de 2022, quando o STF declarou o orçamento secreto inconstitucional, o Congresso e o governo Bolsonaro e depois Lula deram um jeito para recuperar o mecanismo por meio de outros tipos de emendas, mas que, na essência, mantêm o mesmo modelo de negociação. Apesar de ter criticado o esquema na campanha eleitoral, Lula manteve o orçamento secreto.
A estratégia de Lira foi confirmada por integrantes da Mesa Diretora da Câmara ao Estadão. Procurado pela reportagem, o presidente da Casa não quis comentar. “Isso está sendo discutido muito entre o presidente da Casa e o governo. É uma conversa”, afirmou o deputado Luciano Bivar (União-PE), primeiro secretário da Mesa. “É uma inovação. É muito bom porque é da Mesa”, disse o deputado Júlio Cesar (PSD-PI), terceiro secretário da comissão, apoiando a iniciativa.
A proposta de Lira de usar a emenda da Mesa para distribuir entre os aliados não é apoiada por todos os integrantes da cúpula da Câmara, que não querem dar poder excessivo ao presidente da Casa e depender dele para emplacar emendas ao Orçamento no ano que vem, conforme o Estadão apurou.
O primeiro vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (Republicanos-SP), se movimenta para suceder Arthur Lira, que tem outro candidato de preferência, o deputado Elmar Nascimento (União-BA). Marcos Pereira disse à reportagem que nunca ouviu falar em aumentar as emendas da Mesa.
A estratégia também opôs Lira e o relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Danilo Forte (União-CE). O parlamentar propôs a criação de outro tipo de emenda para resgatar o orçamento secreto: a emenda de liderança, que seria carimbada com o código RP-5. A ideia foi rejeitada pelo presidente da Câmara, pois daria poder para os líderes partidários sem o presidente da Casa como centralizador.