Lula endossa debate sobre mandato fixo para ministros do STF e reforça elogios a Zanin


Presidente diz que assunto será discutido ’proximamente’ e cita programa de governo do PT em 2018 que previa a mudança e diz que seu advogado é ‘uma revelação extraordinária no campo jurídico’

Por Ana Luiza Antunes e Isabella Alonso Panho
Atualização:

ESPECIAIS PARA O ESTADÃO – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta terça-feira, 21, que pretende discutir uma mudança na Constituição para determinar um período de mandato para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Hoje, para ser indicado pelo presidente e aprovado pelo Senado, um ministro do STF precisa ter mais de 35 e menos de 70 anos de idade, notável saber jurídico e reputação ilibada. A aposentadoria compulsória se dá aos 75 anos.

Em debate no Congresso e no Executivo, a adoção de mandato para os magistrados é vista com reticências por juristas e ex-integrantes da Corte máxima do País. O temor é que isso gere maior rotatividade e acentue a politização no tribunal.

Em entrevista à TV 247, Lula foi questionado sobre o tema e citou proposta do então candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, em 2018. “Em 2018, no programa de governo do Haddad, estava a discussão de um mandado para o ministro da Suprema Corte. Eu não sei se na época era um mandato de 15 anos em que você poderia entrar e ficar 15 anos ou você poderia entrar a partir de uma idade e terminar aos 75. Eu acho que é um assunto que vamos discutir proximamente”, disse o presidente.

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O programa de governo de Haddad falava na época em “debater com o Poder Judiciário a necessária instituição de tempo de mandatos para os membros do STF e das Cortes Superiores de Justiça”. O texto, disponível no site do partido, não menciona a duração desse mandato.

Nos bastidores, Zanin é apontado como um dos favoritos ao Supremo Foto: Dida Sampaio/Estadão - 25/09/2019

Na Câmara dos Deputados já foram apresentadas ao menos dez propostas de emenda à Constituição sobre o assunto – dentre elas, uma de Flávio Dino, em 2009, quando era filiado ao PCdoB e outra por Eduardo Cunha, em 2014, à época do antigo PMDB. No Senado há três propostas arquivadas e duas em trâmite, de autoria dos senadores Angelo Coronel (PSD-BA) e Plínio Valério (PSDB-AM).

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Este ano, Lula poderá indicar dois ministros para o STF com as aposentadorias compulsórias de Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, que deixarão o Supremo em maio e outubro respectivamente, quando completarão 75 anos.

A declaração de Lula nesta terça-feira foi feita em meio às especulações sobre a indicação de Cristiano Zanin, seu advogado, que ganhou notoriedade nos processos relacionados à Operação Lava Jato. Lula reforçou elogios e enfatizou que o advogado foi “uma revelação extraordinária no campo jurídico”.

“Cristiano Zanin foi a grande revelação jurídica nesses últimos anos. Ele foi muito criticado (...) eu tinha consciência de que o meu processo era jurídico e por isso eu queria o Zanin. Ele nunca tomou uma decisão que não fosse conversar comigo. Ele terminou sendo uma revelação extraordinária”, declarou.

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Lula tem sido cobrado, especialmente por movimentos sociais, para indicar uma mulher para assumir a cadeira do ministro Ricardo Lewandowski. Movimentos de mulheres e entidades jurídicas apelam para que o presidente opte por uma mulher e diversifique a composição da Corte. Lula afirmou que trata-se de uma discussão “sem lógica” e reforçou que a validação da escolha será feita pelo Senado.

“Essa discussão que está sendo feita não tem sentido (...) Eu não vou indicar o ministro para ser meu amigo (...) quero alguém que seja competente do ponto de vista jurídico e que faça a constituição ser respeitada”, comentou.

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“Eu não sei quem eu vou indicar, não tenho compromisso oficial com ninguém. No dia que tiver que tomar uma decisão, vou tomar sozinho e mandar o nome para o Senado. Eu vou indicar uma pessoa que eu acho que possa ser útil para o Brasil”, citou.

A decisão, conforme pontua, será realizada da mesma maneira para indicação do Procurador-geral da República, que não feita a partir da lista tríplice. “A única coisa que eu tenho certeza é que não vou escolher mais lista tríplice, e o Ministério Público Federal tem que saber que eu não vou escolher por irresponsabilidade da força-tarefa do Paraná”, pontuou em referência à Lava Jato. Segundo o presidente, a operação prejudicou a imagem e quase “destruiu” a seriedade do MPF. “Eles jogaram fora uma coisa que só eu tinha feito, escolher a lista tríplice.”

A escolha para o mandato à frente da PGR é feita, desde 2001, pela Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR). Os três nomes mais votados pelo Ministério Público são enviados ao presidente da República para decidir quem irá assumir o órgão por dois anos. O presidente não é obrigado a seguir lista de eleitos da categoria.

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Durante seu mandato, o presidente Jair Bolsonaro ignorou a lista tríplice ao indicar Augusto Aras para o cargo. O mandato de Aras termina em setembro deste ano, e Lula ressaltou que não possui nenhum nome em vista. “Não vou indicar ninguém que seja meu amigo. Não quero indicar ninguém para fazer benefício para mim”, disse.

Mandatos no STF

Os ministros do STF aposentados Carlos Velloso e Marco Aurélio Mello têm visões divergentes sobre o impacto de um eventual mandato para os membros da Corte. Por um lado, na perspectiva de Mello, a mudança “implica introduzir no Supremo a política”. Além de desaprovar a medida e não acreditar que as propostas de emenda possam ser aprovadas, o ministro aponta uma reação às decisões da Corte. “O Supremo deve estar incomodando muito, e é bom que ele incomode. O Supremo deve atuar como vem atuando, com equidistância e independência.”

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Por outro lado, Velloso classifica como “razoável” a ideia de mandato para os ministros. Ele cita como exemplo o Tribunal Constitucional Alemão, cujo mandato de seus magistrados é de doze anos. “O Supremo Tribunal Federal faz controle difuso (decisões que também podem ser proferidas por qualquer juiz ou tribunal), o que exige um conhecimento de jurisprudência que se tem com algum tempo de trabalho”, disse. “Sempre achei razoável a ideia de mandato para o ministro do STF. Não seria um mandato essencialmente político, como têm os parlamentares.”

Para o ministro, é essencial que não se abra mão dos requisitos já previstos na lei (reputação ilibada e notório saber jurídico) e da indicação feita pelo presidente da república, sem a possibilidade de recondução. Velloso dá outro exemplo de direito comparado - a Corte Constitucional Italiana permitia a recondução de ministros. “E a experiência conduziu a própria Corte a reivindicar a proibição da recondução.”

Recondução

A PEC do senador Angelo Coronel (PSD/BA) permite a medida, criticada por Maria Paula Dallari Bucci, professora do departamento de Direito do Estado da USP e doutora pela mesma instituição.

“Reformar a Justiça para introduzir variáveis que vão aumentar a partidarização, que vão aumentar o incentivo para um ministro decidir dessa ou daquela maneira, por ele já estar de olho na recondução seria um retrocesso para a Justiça brasileira”, afirma a docente. Ela alerta para a necessidade de que a discussão sobre o mandato dos ministros do Supremo seja feita com cautela, para evitar “uma politização e uma partidarização muito indesejadas no funcionamento do tribunal”.

“Temos que interpretar o gesto do presidente como um gesto de abertura democrática. Ele tem uma posição de sinalizar boa vontade e diálogo com o Congresso”, explica Bucci. Para ela, “o Brasil não deve ceder a esse tipo de impulso”.

Propostas na Câmara e no Senado

No Congresso, já foram apresentadas pelo menos 15 propostas de emenda à Constituição (PEC) para fixar um mandato para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF)

  • Câmara dos Deputados

Na Câmara, foram dez PECs, todas arquivadas. Uma delas, de autoria de Eduardo Cunha, previa mandatos de oito anos para ministros da Corte; outra, apresentada por Flávio Dino (hoje ministro da Justiça), falava em 11 anos

  • Senado

Das cinco propostas apresentadas na Casa, três foram arquivadas. Duas tiveram parecer favorável da CCJ em dezembro de 2022 e aguardam designação de novo relator

  • Critérios

Atualmente, para ser indicado pelo presidente da República e aprovado em sabatina no Senado, é preciso que o indicado para o Supremo tenha mais de 35 anos e menos de 70 anos de idade, notável saber jurídico e reputação ilibada. A aposentadoria compulsória ocorre aos 75 anos

  • Discussão

Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que pretende discutir uma mudança na Constituição para determinar um período de mandato para integrantes do Supremo

  • Indicações

Este ano, Lula poderá indicar dois ministros para o Supremo, com as aposentadorias compulsórias de Ricardo Lewandowski e de Rosa Weber, atual presidente do tribunal. Eles deixarão a Corte em maio e em outubro, respectivamente

ESPECIAIS PARA O ESTADÃO – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta terça-feira, 21, que pretende discutir uma mudança na Constituição para determinar um período de mandato para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Hoje, para ser indicado pelo presidente e aprovado pelo Senado, um ministro do STF precisa ter mais de 35 e menos de 70 anos de idade, notável saber jurídico e reputação ilibada. A aposentadoria compulsória se dá aos 75 anos.

Em debate no Congresso e no Executivo, a adoção de mandato para os magistrados é vista com reticências por juristas e ex-integrantes da Corte máxima do País. O temor é que isso gere maior rotatividade e acentue a politização no tribunal.

Em entrevista à TV 247, Lula foi questionado sobre o tema e citou proposta do então candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, em 2018. “Em 2018, no programa de governo do Haddad, estava a discussão de um mandado para o ministro da Suprema Corte. Eu não sei se na época era um mandato de 15 anos em que você poderia entrar e ficar 15 anos ou você poderia entrar a partir de uma idade e terminar aos 75. Eu acho que é um assunto que vamos discutir proximamente”, disse o presidente.

O programa de governo de Haddad falava na época em “debater com o Poder Judiciário a necessária instituição de tempo de mandatos para os membros do STF e das Cortes Superiores de Justiça”. O texto, disponível no site do partido, não menciona a duração desse mandato.

Nos bastidores, Zanin é apontado como um dos favoritos ao Supremo Foto: Dida Sampaio/Estadão - 25/09/2019

Na Câmara dos Deputados já foram apresentadas ao menos dez propostas de emenda à Constituição sobre o assunto – dentre elas, uma de Flávio Dino, em 2009, quando era filiado ao PCdoB e outra por Eduardo Cunha, em 2014, à época do antigo PMDB. No Senado há três propostas arquivadas e duas em trâmite, de autoria dos senadores Angelo Coronel (PSD-BA) e Plínio Valério (PSDB-AM).

Este ano, Lula poderá indicar dois ministros para o STF com as aposentadorias compulsórias de Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, que deixarão o Supremo em maio e outubro respectivamente, quando completarão 75 anos.

A declaração de Lula nesta terça-feira foi feita em meio às especulações sobre a indicação de Cristiano Zanin, seu advogado, que ganhou notoriedade nos processos relacionados à Operação Lava Jato. Lula reforçou elogios e enfatizou que o advogado foi “uma revelação extraordinária no campo jurídico”.

“Cristiano Zanin foi a grande revelação jurídica nesses últimos anos. Ele foi muito criticado (...) eu tinha consciência de que o meu processo era jurídico e por isso eu queria o Zanin. Ele nunca tomou uma decisão que não fosse conversar comigo. Ele terminou sendo uma revelação extraordinária”, declarou.

Lula tem sido cobrado, especialmente por movimentos sociais, para indicar uma mulher para assumir a cadeira do ministro Ricardo Lewandowski. Movimentos de mulheres e entidades jurídicas apelam para que o presidente opte por uma mulher e diversifique a composição da Corte. Lula afirmou que trata-se de uma discussão “sem lógica” e reforçou que a validação da escolha será feita pelo Senado.

“Essa discussão que está sendo feita não tem sentido (...) Eu não vou indicar o ministro para ser meu amigo (...) quero alguém que seja competente do ponto de vista jurídico e que faça a constituição ser respeitada”, comentou.

“Eu não sei quem eu vou indicar, não tenho compromisso oficial com ninguém. No dia que tiver que tomar uma decisão, vou tomar sozinho e mandar o nome para o Senado. Eu vou indicar uma pessoa que eu acho que possa ser útil para o Brasil”, citou.

A decisão, conforme pontua, será realizada da mesma maneira para indicação do Procurador-geral da República, que não feita a partir da lista tríplice. “A única coisa que eu tenho certeza é que não vou escolher mais lista tríplice, e o Ministério Público Federal tem que saber que eu não vou escolher por irresponsabilidade da força-tarefa do Paraná”, pontuou em referência à Lava Jato. Segundo o presidente, a operação prejudicou a imagem e quase “destruiu” a seriedade do MPF. “Eles jogaram fora uma coisa que só eu tinha feito, escolher a lista tríplice.”

A escolha para o mandato à frente da PGR é feita, desde 2001, pela Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR). Os três nomes mais votados pelo Ministério Público são enviados ao presidente da República para decidir quem irá assumir o órgão por dois anos. O presidente não é obrigado a seguir lista de eleitos da categoria.

Durante seu mandato, o presidente Jair Bolsonaro ignorou a lista tríplice ao indicar Augusto Aras para o cargo. O mandato de Aras termina em setembro deste ano, e Lula ressaltou que não possui nenhum nome em vista. “Não vou indicar ninguém que seja meu amigo. Não quero indicar ninguém para fazer benefício para mim”, disse.

Mandatos no STF

Os ministros do STF aposentados Carlos Velloso e Marco Aurélio Mello têm visões divergentes sobre o impacto de um eventual mandato para os membros da Corte. Por um lado, na perspectiva de Mello, a mudança “implica introduzir no Supremo a política”. Além de desaprovar a medida e não acreditar que as propostas de emenda possam ser aprovadas, o ministro aponta uma reação às decisões da Corte. “O Supremo deve estar incomodando muito, e é bom que ele incomode. O Supremo deve atuar como vem atuando, com equidistância e independência.”

Por outro lado, Velloso classifica como “razoável” a ideia de mandato para os ministros. Ele cita como exemplo o Tribunal Constitucional Alemão, cujo mandato de seus magistrados é de doze anos. “O Supremo Tribunal Federal faz controle difuso (decisões que também podem ser proferidas por qualquer juiz ou tribunal), o que exige um conhecimento de jurisprudência que se tem com algum tempo de trabalho”, disse. “Sempre achei razoável a ideia de mandato para o ministro do STF. Não seria um mandato essencialmente político, como têm os parlamentares.”

Para o ministro, é essencial que não se abra mão dos requisitos já previstos na lei (reputação ilibada e notório saber jurídico) e da indicação feita pelo presidente da república, sem a possibilidade de recondução. Velloso dá outro exemplo de direito comparado - a Corte Constitucional Italiana permitia a recondução de ministros. “E a experiência conduziu a própria Corte a reivindicar a proibição da recondução.”

Recondução

A PEC do senador Angelo Coronel (PSD/BA) permite a medida, criticada por Maria Paula Dallari Bucci, professora do departamento de Direito do Estado da USP e doutora pela mesma instituição.

“Reformar a Justiça para introduzir variáveis que vão aumentar a partidarização, que vão aumentar o incentivo para um ministro decidir dessa ou daquela maneira, por ele já estar de olho na recondução seria um retrocesso para a Justiça brasileira”, afirma a docente. Ela alerta para a necessidade de que a discussão sobre o mandato dos ministros do Supremo seja feita com cautela, para evitar “uma politização e uma partidarização muito indesejadas no funcionamento do tribunal”.

“Temos que interpretar o gesto do presidente como um gesto de abertura democrática. Ele tem uma posição de sinalizar boa vontade e diálogo com o Congresso”, explica Bucci. Para ela, “o Brasil não deve ceder a esse tipo de impulso”.

Propostas na Câmara e no Senado

No Congresso, já foram apresentadas pelo menos 15 propostas de emenda à Constituição (PEC) para fixar um mandato para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF)

  • Câmara dos Deputados

Na Câmara, foram dez PECs, todas arquivadas. Uma delas, de autoria de Eduardo Cunha, previa mandatos de oito anos para ministros da Corte; outra, apresentada por Flávio Dino (hoje ministro da Justiça), falava em 11 anos

  • Senado

Das cinco propostas apresentadas na Casa, três foram arquivadas. Duas tiveram parecer favorável da CCJ em dezembro de 2022 e aguardam designação de novo relator

  • Critérios

Atualmente, para ser indicado pelo presidente da República e aprovado em sabatina no Senado, é preciso que o indicado para o Supremo tenha mais de 35 anos e menos de 70 anos de idade, notável saber jurídico e reputação ilibada. A aposentadoria compulsória ocorre aos 75 anos

  • Discussão

Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que pretende discutir uma mudança na Constituição para determinar um período de mandato para integrantes do Supremo

  • Indicações

Este ano, Lula poderá indicar dois ministros para o Supremo, com as aposentadorias compulsórias de Ricardo Lewandowski e de Rosa Weber, atual presidente do tribunal. Eles deixarão a Corte em maio e em outubro, respectivamente

ESPECIAIS PARA O ESTADÃO – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta terça-feira, 21, que pretende discutir uma mudança na Constituição para determinar um período de mandato para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Hoje, para ser indicado pelo presidente e aprovado pelo Senado, um ministro do STF precisa ter mais de 35 e menos de 70 anos de idade, notável saber jurídico e reputação ilibada. A aposentadoria compulsória se dá aos 75 anos.

Em debate no Congresso e no Executivo, a adoção de mandato para os magistrados é vista com reticências por juristas e ex-integrantes da Corte máxima do País. O temor é que isso gere maior rotatividade e acentue a politização no tribunal.

Em entrevista à TV 247, Lula foi questionado sobre o tema e citou proposta do então candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, em 2018. “Em 2018, no programa de governo do Haddad, estava a discussão de um mandado para o ministro da Suprema Corte. Eu não sei se na época era um mandato de 15 anos em que você poderia entrar e ficar 15 anos ou você poderia entrar a partir de uma idade e terminar aos 75. Eu acho que é um assunto que vamos discutir proximamente”, disse o presidente.

O programa de governo de Haddad falava na época em “debater com o Poder Judiciário a necessária instituição de tempo de mandatos para os membros do STF e das Cortes Superiores de Justiça”. O texto, disponível no site do partido, não menciona a duração desse mandato.

Nos bastidores, Zanin é apontado como um dos favoritos ao Supremo Foto: Dida Sampaio/Estadão - 25/09/2019

Na Câmara dos Deputados já foram apresentadas ao menos dez propostas de emenda à Constituição sobre o assunto – dentre elas, uma de Flávio Dino, em 2009, quando era filiado ao PCdoB e outra por Eduardo Cunha, em 2014, à época do antigo PMDB. No Senado há três propostas arquivadas e duas em trâmite, de autoria dos senadores Angelo Coronel (PSD-BA) e Plínio Valério (PSDB-AM).

Este ano, Lula poderá indicar dois ministros para o STF com as aposentadorias compulsórias de Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, que deixarão o Supremo em maio e outubro respectivamente, quando completarão 75 anos.

A declaração de Lula nesta terça-feira foi feita em meio às especulações sobre a indicação de Cristiano Zanin, seu advogado, que ganhou notoriedade nos processos relacionados à Operação Lava Jato. Lula reforçou elogios e enfatizou que o advogado foi “uma revelação extraordinária no campo jurídico”.

“Cristiano Zanin foi a grande revelação jurídica nesses últimos anos. Ele foi muito criticado (...) eu tinha consciência de que o meu processo era jurídico e por isso eu queria o Zanin. Ele nunca tomou uma decisão que não fosse conversar comigo. Ele terminou sendo uma revelação extraordinária”, declarou.

Lula tem sido cobrado, especialmente por movimentos sociais, para indicar uma mulher para assumir a cadeira do ministro Ricardo Lewandowski. Movimentos de mulheres e entidades jurídicas apelam para que o presidente opte por uma mulher e diversifique a composição da Corte. Lula afirmou que trata-se de uma discussão “sem lógica” e reforçou que a validação da escolha será feita pelo Senado.

“Essa discussão que está sendo feita não tem sentido (...) Eu não vou indicar o ministro para ser meu amigo (...) quero alguém que seja competente do ponto de vista jurídico e que faça a constituição ser respeitada”, comentou.

“Eu não sei quem eu vou indicar, não tenho compromisso oficial com ninguém. No dia que tiver que tomar uma decisão, vou tomar sozinho e mandar o nome para o Senado. Eu vou indicar uma pessoa que eu acho que possa ser útil para o Brasil”, citou.

A decisão, conforme pontua, será realizada da mesma maneira para indicação do Procurador-geral da República, que não feita a partir da lista tríplice. “A única coisa que eu tenho certeza é que não vou escolher mais lista tríplice, e o Ministério Público Federal tem que saber que eu não vou escolher por irresponsabilidade da força-tarefa do Paraná”, pontuou em referência à Lava Jato. Segundo o presidente, a operação prejudicou a imagem e quase “destruiu” a seriedade do MPF. “Eles jogaram fora uma coisa que só eu tinha feito, escolher a lista tríplice.”

A escolha para o mandato à frente da PGR é feita, desde 2001, pela Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR). Os três nomes mais votados pelo Ministério Público são enviados ao presidente da República para decidir quem irá assumir o órgão por dois anos. O presidente não é obrigado a seguir lista de eleitos da categoria.

Durante seu mandato, o presidente Jair Bolsonaro ignorou a lista tríplice ao indicar Augusto Aras para o cargo. O mandato de Aras termina em setembro deste ano, e Lula ressaltou que não possui nenhum nome em vista. “Não vou indicar ninguém que seja meu amigo. Não quero indicar ninguém para fazer benefício para mim”, disse.

Mandatos no STF

Os ministros do STF aposentados Carlos Velloso e Marco Aurélio Mello têm visões divergentes sobre o impacto de um eventual mandato para os membros da Corte. Por um lado, na perspectiva de Mello, a mudança “implica introduzir no Supremo a política”. Além de desaprovar a medida e não acreditar que as propostas de emenda possam ser aprovadas, o ministro aponta uma reação às decisões da Corte. “O Supremo deve estar incomodando muito, e é bom que ele incomode. O Supremo deve atuar como vem atuando, com equidistância e independência.”

Por outro lado, Velloso classifica como “razoável” a ideia de mandato para os ministros. Ele cita como exemplo o Tribunal Constitucional Alemão, cujo mandato de seus magistrados é de doze anos. “O Supremo Tribunal Federal faz controle difuso (decisões que também podem ser proferidas por qualquer juiz ou tribunal), o que exige um conhecimento de jurisprudência que se tem com algum tempo de trabalho”, disse. “Sempre achei razoável a ideia de mandato para o ministro do STF. Não seria um mandato essencialmente político, como têm os parlamentares.”

Para o ministro, é essencial que não se abra mão dos requisitos já previstos na lei (reputação ilibada e notório saber jurídico) e da indicação feita pelo presidente da república, sem a possibilidade de recondução. Velloso dá outro exemplo de direito comparado - a Corte Constitucional Italiana permitia a recondução de ministros. “E a experiência conduziu a própria Corte a reivindicar a proibição da recondução.”

Recondução

A PEC do senador Angelo Coronel (PSD/BA) permite a medida, criticada por Maria Paula Dallari Bucci, professora do departamento de Direito do Estado da USP e doutora pela mesma instituição.

“Reformar a Justiça para introduzir variáveis que vão aumentar a partidarização, que vão aumentar o incentivo para um ministro decidir dessa ou daquela maneira, por ele já estar de olho na recondução seria um retrocesso para a Justiça brasileira”, afirma a docente. Ela alerta para a necessidade de que a discussão sobre o mandato dos ministros do Supremo seja feita com cautela, para evitar “uma politização e uma partidarização muito indesejadas no funcionamento do tribunal”.

“Temos que interpretar o gesto do presidente como um gesto de abertura democrática. Ele tem uma posição de sinalizar boa vontade e diálogo com o Congresso”, explica Bucci. Para ela, “o Brasil não deve ceder a esse tipo de impulso”.

Propostas na Câmara e no Senado

No Congresso, já foram apresentadas pelo menos 15 propostas de emenda à Constituição (PEC) para fixar um mandato para ministros do Supremo Tribunal Federal (STF)

  • Câmara dos Deputados

Na Câmara, foram dez PECs, todas arquivadas. Uma delas, de autoria de Eduardo Cunha, previa mandatos de oito anos para ministros da Corte; outra, apresentada por Flávio Dino (hoje ministro da Justiça), falava em 11 anos

  • Senado

Das cinco propostas apresentadas na Casa, três foram arquivadas. Duas tiveram parecer favorável da CCJ em dezembro de 2022 e aguardam designação de novo relator

  • Critérios

Atualmente, para ser indicado pelo presidente da República e aprovado em sabatina no Senado, é preciso que o indicado para o Supremo tenha mais de 35 anos e menos de 70 anos de idade, notável saber jurídico e reputação ilibada. A aposentadoria compulsória ocorre aos 75 anos

  • Discussão

Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que pretende discutir uma mudança na Constituição para determinar um período de mandato para integrantes do Supremo

  • Indicações

Este ano, Lula poderá indicar dois ministros para o Supremo, com as aposentadorias compulsórias de Ricardo Lewandowski e de Rosa Weber, atual presidente do tribunal. Eles deixarão a Corte em maio e em outubro, respectivamente

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