ENVIADO ESPECIAL A PEQUIM - O Brasil não vai vender mais empresas estatais, disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva à rede de televisão estatal chinesa CCTV. O petista esteve em Pequim nesta sexta-feira, 14, e se reuniu com o presidente chinês, Xi Jinping, para a assinatura de acordos bilaterais.
“Não queremos ser vendedor nem só de commodities ou vendedor de empresa estatal”, afirmou Lula, segundo transcrição da conversa liberada pelo governo brasileiro. “O que o Brasil quer propor à China é que nós precisamos construir uma centena de coisas novas. Que passa por rodovia, por ferrovia, por portos, aeroportos, que passa por novas indústrias, que passa por empresas de químicas, que passa por investimentos novos.” É o que Lula vem chamando de “reindustrialização” do Brasil.
No início do mês, o governo Lula já retirou oficialmente os Correios, a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) e outras cinco empresas da lista do Programa Nacional de Desestatização (PND). As estatais haviam sido incluídas nos programas federais de desestatização pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
O Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) também foi alterado. Na mesma ação, o governo revogou as chances de venda dos armazéns e imóveis sob domínio da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), da Empresa Brasileira de Administração de Petróleo e Gás Natural S.A. - Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA) e da Telecomunicações Brasileiras S.A. (Telebras).
Lula defendeu na conversa com a imprensa chinesa, como já havia dito em outras ocasiões durante a viagem ao país asiático, que é preciso avançar na relação do Brasil com a China, não apenas na questão econômica e na questão comercial, mas em temas como ciência e tecnologia, convênios entre as universidades e na transição energética. “Nós precisamos estabelecer uma política em que a China se transforme em parceiro de investimentos no Brasil.”
Dólar
Na conversa, o petista também voltou a defender transações comerciais entre países sem passar pelo dólar, a busca de uma solução para a guerra da Ucrânia e a criação de uma nova forma de governança mundial, em que países como China, Brasil e México tenham mais voz.
Sobre reformas em organismos multilaterais, que Lula já havia defendido na viagem durante discurso na posse de Dilma Rousseff no Novo Banco de Desenvolvimento, o petista afirmou que é preciso dar mais representatividade ao Conselho de Segurança das Nações Unidas. “Eu acho que tem que ter países da América do Sul, América Latina, países da África. Não é possível que o continente africano, com cinquenta e quatro países, não possa ter representante.”
“Se você não tiver um Conselho de Segurança da ONU com autoridade de decidir e os países signatários cumprirem, a gente não vai resolver o problema climático no mundo”, afirmou Lula à TV chinesa.
Viagem do presidente Lula à China
“A única coisa que eu quero é o seguinte: é preciso criar uma nova forma de governança mundial”, disse Lula. “A China tem que ser levada em conta. O Brasil tem que ser levado em conta. Um país como a Nigéria, como o Egito, como México, tem que ser levado em conta. A Índia tem que ser levada em conta.” Na medida em que esses países vão crescendo e se desenvolvendo, “obviamente começam a assustar aqueles que se sentiam o dono do mundo”, comentou o presidente.
Sobre a guerra na Ucrânia, o presidente brasileiro disse estar “obcecado” em conversar com as pessoas pelo mundo para encontrar um jeito de alcançar a paz. Ele defendeu que países parem de fornecer armas para o conflito e que busquem uma solução de paz.
Jornais
A visita do presidente à China ganhou destaque na imprensa chinesa, tanto na televisão quanto nos jornais impressos. Declarações de Lula sobre o fortalecimento do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, em inglês), que segundo ele pode libertar os países emergentes das “amarras” do financiamento tradicional com organismos multilaterais, viraram a manchete do jornal China Daily, o maior diário em inglês no país asiático.
Neste sábado, o China Daily traz em sua capa declarações do presidente Xi Jinping de que as relações de Pequim com o Brasil “são uma prioridade diplomática” e que os dois países vão contribuir para a paz regional e mundial, além de procurarem fortalecer a parceria estratégica, que é de longo prazo.
Segundo o jornal chinês, Xi Jinping ressaltou ainda nas conversas com Lula que, além de Brasil e China serem os maiores países emergentes de seus hemisférios, partilham de vários interesses comuns.
A visita de Lula, recepcionado ontem por Xi Jinping no Grande Palácio do Povo, em Pequim, foi mostrada várias vezes na CCTV, a rede estatal chinesa, com imagens da cerimônia de boas-vindas e das reuniões entre os dois presidentes.
Em 2024, China e Brasil comemoram 50 anos de relações diplomáticas, estabelecidas em 1974. Em suas conversas com Lula, Xi Jinping falou da necessidade de reforçar a cooperação em áreas como agricultura, energia, infraestrutura, aeroespacial, além de novos ramos, como economia verde, economia digital e energia limpa, segundo a imprensa chinesa.