‘Lula não precisa de uma agenda de esquerda, mas de pragmatismo para governar’, diz governador do ES


Renato Casagrande (PSB) afirma que presidente deve focar na agenda econômica e que governo precisa de unidade para passar a mensagem de compromisso com o equilíbrio das contas públicas

Por Mariana Carneiro
Foto: Tiago Queiroz
Entrevista comRenato Casagrandegovernador do Espírito Santo

BRASÍLIA - Governador do Espírito Santo pela terceira vez, Renato Casagrande (PSB) defende que os políticos de esquerda devem buscar o ajuste fiscal como forma de obter “resultados efetivos” na administração pública. O tema é espinhoso para partidos como o dele e para o PT do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hoje às voltas com cobranças para entregar um maior equilíbrio nas contas do governo.

“Frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem, para um setor da sociedade, que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal”, afirma Casagrande.

Nesta entrevista ao Estadão, o governador, que integra a base aliada do presidente, diz que Lula deve apostar no ajuste como forma de reconquistar aliados que já estiveram no lado dele contra adversários à direita. Ele também defende que Lula insista na aproximação com segmentos da sociedade mais conservadores, cada vez mais representativos no Congresso e na política. Casagrande prevê que a onda conservadora deverá prosseguir tanto nas eleições municipais deste ano quanto em 2026.

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“Lula não precisa de uma agenda de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Não tem que levar para o Congresso Nacional nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar”, afirma.

O governador administra um Estado pequeno mas que lançou nomes ao cenário federal identificados com a defesa da responsabilidade fiscal, como o ex-governador Paulo Hartung, hoje na iniciativa privada, e a ex-secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, hoje executiva do Santander.

O governador Renato Casagrande (PSB) Foto: Tiago Queiroz
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Na avaliação dele, o ajuste pode e deve ser feito também pelo lado das despesas.

“O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um”, disse. “São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda”.

A seguir, trechos da entrevista:

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Economistas como Arminio Fraga, que declararam apoio a Lula na eleição, apontam críticas e decepção com a condução da política fiscal do governo. O presidente perdeu apoio desses eleitores?

Precisamos entender que o ambiente para governar neste momento é mais complexo. O presidente Lula está dialogando com um Congresso de perfil muito mais conservador, então, há um choque permanente. Outra questão que é importante registrar é o debate ideológico, que é muito superficial, sem entrar em conteúdo, e que é um debate presente na sociedade. Com isso, o presidente não conquista e não consegue as vitórias que desejava para avançar, por exemplo, em medidas para ampliar receitas ou reduzir despesas, e as metas estabelecidas pelo Ministério da Fazenda têm dificuldades no Congresso Nacional.

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Mas existe uma crise de confiança.

Efetivamente, a impressão que passa do governo é que em alguns momentos não tem uma preocupação com a busca do equilíbrio fiscal. Sabemos que o ministro Fernando Haddad está focado nisso, mas frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem para um setor da sociedade que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal.

Já desistiram do Lula ou ainda esperam para ver o que o governo vai entregar?

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Esperam para ver o que o Haddad consegue entregar e como vai ser esse alinhamento do governo. Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia. A economia tem crescido razoavelmente bem, mas se a gente ajustar o passo do discurso e da prática, a gente pode crescer mais. Até porque não sabemos ainda como vai ser o processo eleitoral em 2026. Tem um bom tempo até lá e as pessoas acreditam que o governo pode ajustar e aperfeiçoar esses passos.

Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia

Renato Casagrande

Essa divisão no governo pode indicar um isolamento do ministro Haddad na agenda fiscal?

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Acredito que não. O presidente Lula tem avalizado e estado quase todas as vezes com o ministro Haddad. É mesmo o presidente fazer essa coordenação interna. Ele busca fazer, mas os problemas vão se multiplicando pelo ambiente político, pelas dificuldades no Congresso, pela sociedade mais anárquica no debate político. Governar hoje é lidar com muito mais variáveis do que no passado.

O sr. vê o Haddad com força neste governo?

Sim, ele é um ministro forte e respeitado. Faz uma boa interlocução. Lógico que tem que tratar de temas às vezes antipáticos, porque quem quer colocar receita para dentro do caixa muitas vezes esbarra em interesses legítimos de setores. Por isso, a coordenação de governo tem que ser para que todos se esforcem, seja para aumentar a receita, seja para diminuir ou controlar a despesa.

O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um. Eu sou de um partido de centro-esquerda aqui no Espírito Santo e temos 12 anos de nota A de gestão fiscal, temos a maior capacidade de investimento em infraestrutura do Brasil, temos fundo soberano.

Esse compromisso em transformar a boa gestão em resultado para as pessoas mais mais vulneráveis deve ser o nosso objetivo sempre. Tem gente que quer economizar só para economizar, sem se preocupar com o retorno. Esse tipo de gestor tem uma visão distorcida de um Brasil que é desigual. Nós queremos a boa gestão para distribuir renda, em parceria com o setor privado.

Existe a leitura que os políticos de esquerda não concordam com a agenda de ajuste fiscal. Dá voto defender responsabilidade fiscal?

Quando fui governador pela primeira vez, de 2011 a 2014, nós levamos o Estado a ser nota A na gestão fiscal. Hoje, temos capacidade de investimento diferenciada. Enquanto o Brasil investe 7% da sua receita corrente em infraestrutura, eu invisto 20%. São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda.

Renato Casagrande faz defesa firme do equilíbrio fiscal e aponta que isso não deveria ser um assunto apenas da direita Foto: Giovanni Pagotto/Governo ES

Essa divisão que o senhor descreveu dentro do governo sobre os que são contra e a favor do ajuste fiscal reflete uma divisão dentro do PT?

Pode ser que isso seja uma parte do que acontece dentro do governo, mas mesmo que haja, dentro dos partidos, esse debate, isso tudo tem que ser feito no sentido de buscar um equilíbrio para que a gente possa, ano após ano, caminhar em direção a esse equilíbrio.

O governo Lula está sendo cobrado por fazer o ajuste fiscal apenas pelo lado da receita e não pela revisão e redução de despesas. É possível fazer isso? Por que a dificuldade em avançar na redução de despesas?

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito. Lógico que pelo lado da receita também, aperfeiçoar a máquina arrecadatória, buscar justiça nos incentivos que são dados para que a gente tenha equilíbrio nas concessões de incentivos fiscais. É perfeitamente possível fazer isso. Mas o que consome hoje os recursos do Brasil são os juros altos para financiar a dívida. Por isso que você precisa ter um ajuste de receita e de despesa ao mesmo tempo, fazer as duas coisas, olhando as despesas correntes e de pessoal, para que a gente tenha um caminhar em direção ao controle e dar sinais claros de confiança para os juros poderem continuar caindo.

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito

Renato Casagrande

O Banco Central teve um comportamento seguro e conservador na política monetária, mas o Brasil dando exemplos de aumento de receita e também de controle de despesas, tanto no discurso quanto na prática, a gente pode reduzir os juros com maior velocidade. É um ciclo que se realimenta.

O senhor vê chances de o governo Lula dar uma guinada à esquerda, abandonar de vez a agenda do ajuste fiscal ou enfraquecê-la?

Nenhuma chance. A sociedade brasileira neste momento é mais conservadora. O presidente Lula é respeitado no campo da centro-esquerda. Nós sabemos que ele precisa buscar alianças em grupos que não têm simpatia pelo trabalho desenvolvido pela liderança dele, que não têm identidade (com ele). O que eu espero que ele faça é que ele busque politicamente estabelecer pontes de contatos com segmentos que hoje têm menos identidade com a sua atuação.

Como?

Estabelecendo contatos e criando canais de diálogo. Está claro, por exemplo, que é preciso estabelecer contatos e criar políticas públicas para o mundo cristão evangélico, para o mundo do agronegócio. Se bem que o agronegócio já tem muitas ações, é bom que a gente reconheça isso. Na área de segurança pública, o governo pode ser mais mais audacioso e demonstrar mais ação e preocupação. São setores e áreas temáticas em que o governo precisa ampliar a sua atuação para ganhar apoio na sociedade e diminuir as suas dificuldades no Congresso.

Se o governo não fizer isso fica arriscada uma eventual reeleição em 2026?

Está cedo ainda para falar da eleição de 2026, mas a eleição de 2022 já foi muito disputada. Foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026. Não sabemos como o movimento bolsonarista se comportará, se haverá uma candidatura ou mais de uma. Se os partidos de centro-direita não alinhados ao bolsonarismo terão candidaturas ou não. É cedo para fazer essa avaliação, mas é bom que a gente reconheça sempre que o presidente Lula é um grande líder popular.

(A eleição de 2022) foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026

Renato Casagrande

Como o senhor avalia a aproximação do governador Tarcísio de Freitas com o setor privado com vistas a 2026?

O governador de São Paulo é naturalmente candidato a presidente da República, pelo tamanho e pela importância do Estado. E quem não tem hoje um alinhamento com o presidente Lula e não tem identidade com a condução dele busca alternativas. A alternativa Bolsonaro neste momento está fora de cogitação. Então, o governador de São Paulo vira um polo de atração de quem está insatisfeito. Tanto dos que já são contra, independente do resultado do governo, quanto daqueles que apostaram no presidente mas não estão satisfeitos.

O senhor fez uma projeção de ampliação dos partidos conservadores.

Para o Parlamento. Pelo tamanho dos partidos e pelo resultado dos partidos, a tendência é a gente continuar com um Congresso mais conservador. Na eleição municipal também, as possibilidades dos partidos mais conservadores são maiores do que dos partidos progressistas.

Isso pode suscitar uma reforma ministerial por parte do presidente Lula, fazendo com que partidos como o PSB percam espaço para ceder a conservadores?

O presidente já abriu espaço para os partidos conservadores. União Brasil, PP, MDB já fazem parte do governo. É uma necessidade desses partidos estarem alinhados com o governo e do governo buscar um ajuste de posição para que os partidos de fato tenham resultado efetivo nas votações do Congresso.

Como faz isso?

O Parlamento conquistou uma autonomia e uma independência muito grande. Os governos se enfraqueceram desde a época do impeachment da presidente Dilma e depois a dificuldade que o presidente Michel Temer teve no governo. Depois o presidente Bolsonaro delegou a política para alguns partidos no Congresso Nacional. Então, o enfraquecimento da articulação política fez com que o Congresso avançasse sobre o Orçamento.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política, parlamentares que sustentam o governo e que estão enfrentando desgastes para apoiar a matéria do governo, serem prestigiados com a presença dos membros do governo. Hoje, independente da sua posição no Congresso, os parlamentares têm a execução de suas emendas individuais e de bancada.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política

Renato Casagrande

Então, a ação e a interferência e o resultado da articulação política têm uma força menor do que tinham no passado. É mais difícil esse controle sobre o Parlamento hoje. E como uma parte da sociedade que milita em campos diversos exerce um certo patrulhamento sobre a posição dos parlamentares, a rede social influencia muito o posicionamento de cada parlamentar no Congresso, torna o controle ou a condução, a liderança do governo junto ao Parlamento, mais difícil.

Neste cenário no Congresso, é possível ao presidente impor a sua agenda?

O Lula não precisa de uma agenda de esquerda, não tem um assunto que haja necessidade de o presidente Lula colocar em votação que possa ser caracterizado como um assunto de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Compreendendo que os resultados da articulação política vão ser mais difíceis. Não tem que levar para o Congresso nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar.

Pode haver algum tipo de contaminação da pauta econômica pela polarização política?

Acho que não. O que pode haver são grupos que não queiram que algumas matérias andem. Mas o mais importante para o governo e para o Brasil agora é votar a reforma tributária. Eu não acredito que vá ter uma barreira nessa votação, é mais uma organização do Congresso. Mas as dificuldades são inerentes à complexidade da articulação política. Veja agora, por exemplo, a votação da ‘taxação das blusinhas’. Houve uma polarização, com diferenças dentro e fora do governo. Bolsonaro a princípio anunciou o apoio, Lula era contra, e as coisas foram mudando. Então, isso mostrou que todos os assuntos acabam se transformando num debate político. Quando as lideranças desses polos políticos se posicionam começa a ter uma disputa dentro do Congresso. Isso não tem como a gente prever, a gente tem que ir administrando.

Outros temas da área econômica podem cair nessa armadilha da polarização política? Por exemplo, a renegociação da dívida dos Estados.

Tudo o que é favorável aos Estados pode ter alguma má vontade mas não terá polarização. O que pode ter uma polarização é a volta de um tributo, reonerar algumas atividades, como é o caso da desoneração, ou aumento de tributo, como foi o caso das blusinhas. Isso vira disputa. Mas quando você dá um benefício que tenha critérios, mesmo que favoreça Estados bolsonaristas ou não bolsonaristas, pode ter alguma dificuldade mas não uma polarização.

BRASÍLIA - Governador do Espírito Santo pela terceira vez, Renato Casagrande (PSB) defende que os políticos de esquerda devem buscar o ajuste fiscal como forma de obter “resultados efetivos” na administração pública. O tema é espinhoso para partidos como o dele e para o PT do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hoje às voltas com cobranças para entregar um maior equilíbrio nas contas do governo.

“Frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem, para um setor da sociedade, que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal”, afirma Casagrande.

Nesta entrevista ao Estadão, o governador, que integra a base aliada do presidente, diz que Lula deve apostar no ajuste como forma de reconquistar aliados que já estiveram no lado dele contra adversários à direita. Ele também defende que Lula insista na aproximação com segmentos da sociedade mais conservadores, cada vez mais representativos no Congresso e na política. Casagrande prevê que a onda conservadora deverá prosseguir tanto nas eleições municipais deste ano quanto em 2026.

“Lula não precisa de uma agenda de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Não tem que levar para o Congresso Nacional nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar”, afirma.

O governador administra um Estado pequeno mas que lançou nomes ao cenário federal identificados com a defesa da responsabilidade fiscal, como o ex-governador Paulo Hartung, hoje na iniciativa privada, e a ex-secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, hoje executiva do Santander.

O governador Renato Casagrande (PSB) Foto: Tiago Queiroz

Na avaliação dele, o ajuste pode e deve ser feito também pelo lado das despesas.

“O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um”, disse. “São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda”.

A seguir, trechos da entrevista:

Economistas como Arminio Fraga, que declararam apoio a Lula na eleição, apontam críticas e decepção com a condução da política fiscal do governo. O presidente perdeu apoio desses eleitores?

Precisamos entender que o ambiente para governar neste momento é mais complexo. O presidente Lula está dialogando com um Congresso de perfil muito mais conservador, então, há um choque permanente. Outra questão que é importante registrar é o debate ideológico, que é muito superficial, sem entrar em conteúdo, e que é um debate presente na sociedade. Com isso, o presidente não conquista e não consegue as vitórias que desejava para avançar, por exemplo, em medidas para ampliar receitas ou reduzir despesas, e as metas estabelecidas pelo Ministério da Fazenda têm dificuldades no Congresso Nacional.

Mas existe uma crise de confiança.

Efetivamente, a impressão que passa do governo é que em alguns momentos não tem uma preocupação com a busca do equilíbrio fiscal. Sabemos que o ministro Fernando Haddad está focado nisso, mas frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem para um setor da sociedade que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal.

Já desistiram do Lula ou ainda esperam para ver o que o governo vai entregar?

Esperam para ver o que o Haddad consegue entregar e como vai ser esse alinhamento do governo. Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia. A economia tem crescido razoavelmente bem, mas se a gente ajustar o passo do discurso e da prática, a gente pode crescer mais. Até porque não sabemos ainda como vai ser o processo eleitoral em 2026. Tem um bom tempo até lá e as pessoas acreditam que o governo pode ajustar e aperfeiçoar esses passos.

Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia

Renato Casagrande

Essa divisão no governo pode indicar um isolamento do ministro Haddad na agenda fiscal?

Acredito que não. O presidente Lula tem avalizado e estado quase todas as vezes com o ministro Haddad. É mesmo o presidente fazer essa coordenação interna. Ele busca fazer, mas os problemas vão se multiplicando pelo ambiente político, pelas dificuldades no Congresso, pela sociedade mais anárquica no debate político. Governar hoje é lidar com muito mais variáveis do que no passado.

O sr. vê o Haddad com força neste governo?

Sim, ele é um ministro forte e respeitado. Faz uma boa interlocução. Lógico que tem que tratar de temas às vezes antipáticos, porque quem quer colocar receita para dentro do caixa muitas vezes esbarra em interesses legítimos de setores. Por isso, a coordenação de governo tem que ser para que todos se esforcem, seja para aumentar a receita, seja para diminuir ou controlar a despesa.

O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um. Eu sou de um partido de centro-esquerda aqui no Espírito Santo e temos 12 anos de nota A de gestão fiscal, temos a maior capacidade de investimento em infraestrutura do Brasil, temos fundo soberano.

Esse compromisso em transformar a boa gestão em resultado para as pessoas mais mais vulneráveis deve ser o nosso objetivo sempre. Tem gente que quer economizar só para economizar, sem se preocupar com o retorno. Esse tipo de gestor tem uma visão distorcida de um Brasil que é desigual. Nós queremos a boa gestão para distribuir renda, em parceria com o setor privado.

Existe a leitura que os políticos de esquerda não concordam com a agenda de ajuste fiscal. Dá voto defender responsabilidade fiscal?

Quando fui governador pela primeira vez, de 2011 a 2014, nós levamos o Estado a ser nota A na gestão fiscal. Hoje, temos capacidade de investimento diferenciada. Enquanto o Brasil investe 7% da sua receita corrente em infraestrutura, eu invisto 20%. São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda.

Renato Casagrande faz defesa firme do equilíbrio fiscal e aponta que isso não deveria ser um assunto apenas da direita Foto: Giovanni Pagotto/Governo ES

Essa divisão que o senhor descreveu dentro do governo sobre os que são contra e a favor do ajuste fiscal reflete uma divisão dentro do PT?

Pode ser que isso seja uma parte do que acontece dentro do governo, mas mesmo que haja, dentro dos partidos, esse debate, isso tudo tem que ser feito no sentido de buscar um equilíbrio para que a gente possa, ano após ano, caminhar em direção a esse equilíbrio.

O governo Lula está sendo cobrado por fazer o ajuste fiscal apenas pelo lado da receita e não pela revisão e redução de despesas. É possível fazer isso? Por que a dificuldade em avançar na redução de despesas?

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito. Lógico que pelo lado da receita também, aperfeiçoar a máquina arrecadatória, buscar justiça nos incentivos que são dados para que a gente tenha equilíbrio nas concessões de incentivos fiscais. É perfeitamente possível fazer isso. Mas o que consome hoje os recursos do Brasil são os juros altos para financiar a dívida. Por isso que você precisa ter um ajuste de receita e de despesa ao mesmo tempo, fazer as duas coisas, olhando as despesas correntes e de pessoal, para que a gente tenha um caminhar em direção ao controle e dar sinais claros de confiança para os juros poderem continuar caindo.

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito

Renato Casagrande

O Banco Central teve um comportamento seguro e conservador na política monetária, mas o Brasil dando exemplos de aumento de receita e também de controle de despesas, tanto no discurso quanto na prática, a gente pode reduzir os juros com maior velocidade. É um ciclo que se realimenta.

O senhor vê chances de o governo Lula dar uma guinada à esquerda, abandonar de vez a agenda do ajuste fiscal ou enfraquecê-la?

Nenhuma chance. A sociedade brasileira neste momento é mais conservadora. O presidente Lula é respeitado no campo da centro-esquerda. Nós sabemos que ele precisa buscar alianças em grupos que não têm simpatia pelo trabalho desenvolvido pela liderança dele, que não têm identidade (com ele). O que eu espero que ele faça é que ele busque politicamente estabelecer pontes de contatos com segmentos que hoje têm menos identidade com a sua atuação.

Como?

Estabelecendo contatos e criando canais de diálogo. Está claro, por exemplo, que é preciso estabelecer contatos e criar políticas públicas para o mundo cristão evangélico, para o mundo do agronegócio. Se bem que o agronegócio já tem muitas ações, é bom que a gente reconheça isso. Na área de segurança pública, o governo pode ser mais mais audacioso e demonstrar mais ação e preocupação. São setores e áreas temáticas em que o governo precisa ampliar a sua atuação para ganhar apoio na sociedade e diminuir as suas dificuldades no Congresso.

Se o governo não fizer isso fica arriscada uma eventual reeleição em 2026?

Está cedo ainda para falar da eleição de 2026, mas a eleição de 2022 já foi muito disputada. Foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026. Não sabemos como o movimento bolsonarista se comportará, se haverá uma candidatura ou mais de uma. Se os partidos de centro-direita não alinhados ao bolsonarismo terão candidaturas ou não. É cedo para fazer essa avaliação, mas é bom que a gente reconheça sempre que o presidente Lula é um grande líder popular.

(A eleição de 2022) foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026

Renato Casagrande

Como o senhor avalia a aproximação do governador Tarcísio de Freitas com o setor privado com vistas a 2026?

O governador de São Paulo é naturalmente candidato a presidente da República, pelo tamanho e pela importância do Estado. E quem não tem hoje um alinhamento com o presidente Lula e não tem identidade com a condução dele busca alternativas. A alternativa Bolsonaro neste momento está fora de cogitação. Então, o governador de São Paulo vira um polo de atração de quem está insatisfeito. Tanto dos que já são contra, independente do resultado do governo, quanto daqueles que apostaram no presidente mas não estão satisfeitos.

O senhor fez uma projeção de ampliação dos partidos conservadores.

Para o Parlamento. Pelo tamanho dos partidos e pelo resultado dos partidos, a tendência é a gente continuar com um Congresso mais conservador. Na eleição municipal também, as possibilidades dos partidos mais conservadores são maiores do que dos partidos progressistas.

Isso pode suscitar uma reforma ministerial por parte do presidente Lula, fazendo com que partidos como o PSB percam espaço para ceder a conservadores?

O presidente já abriu espaço para os partidos conservadores. União Brasil, PP, MDB já fazem parte do governo. É uma necessidade desses partidos estarem alinhados com o governo e do governo buscar um ajuste de posição para que os partidos de fato tenham resultado efetivo nas votações do Congresso.

Como faz isso?

O Parlamento conquistou uma autonomia e uma independência muito grande. Os governos se enfraqueceram desde a época do impeachment da presidente Dilma e depois a dificuldade que o presidente Michel Temer teve no governo. Depois o presidente Bolsonaro delegou a política para alguns partidos no Congresso Nacional. Então, o enfraquecimento da articulação política fez com que o Congresso avançasse sobre o Orçamento.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política, parlamentares que sustentam o governo e que estão enfrentando desgastes para apoiar a matéria do governo, serem prestigiados com a presença dos membros do governo. Hoje, independente da sua posição no Congresso, os parlamentares têm a execução de suas emendas individuais e de bancada.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política

Renato Casagrande

Então, a ação e a interferência e o resultado da articulação política têm uma força menor do que tinham no passado. É mais difícil esse controle sobre o Parlamento hoje. E como uma parte da sociedade que milita em campos diversos exerce um certo patrulhamento sobre a posição dos parlamentares, a rede social influencia muito o posicionamento de cada parlamentar no Congresso, torna o controle ou a condução, a liderança do governo junto ao Parlamento, mais difícil.

Neste cenário no Congresso, é possível ao presidente impor a sua agenda?

O Lula não precisa de uma agenda de esquerda, não tem um assunto que haja necessidade de o presidente Lula colocar em votação que possa ser caracterizado como um assunto de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Compreendendo que os resultados da articulação política vão ser mais difíceis. Não tem que levar para o Congresso nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar.

Pode haver algum tipo de contaminação da pauta econômica pela polarização política?

Acho que não. O que pode haver são grupos que não queiram que algumas matérias andem. Mas o mais importante para o governo e para o Brasil agora é votar a reforma tributária. Eu não acredito que vá ter uma barreira nessa votação, é mais uma organização do Congresso. Mas as dificuldades são inerentes à complexidade da articulação política. Veja agora, por exemplo, a votação da ‘taxação das blusinhas’. Houve uma polarização, com diferenças dentro e fora do governo. Bolsonaro a princípio anunciou o apoio, Lula era contra, e as coisas foram mudando. Então, isso mostrou que todos os assuntos acabam se transformando num debate político. Quando as lideranças desses polos políticos se posicionam começa a ter uma disputa dentro do Congresso. Isso não tem como a gente prever, a gente tem que ir administrando.

Outros temas da área econômica podem cair nessa armadilha da polarização política? Por exemplo, a renegociação da dívida dos Estados.

Tudo o que é favorável aos Estados pode ter alguma má vontade mas não terá polarização. O que pode ter uma polarização é a volta de um tributo, reonerar algumas atividades, como é o caso da desoneração, ou aumento de tributo, como foi o caso das blusinhas. Isso vira disputa. Mas quando você dá um benefício que tenha critérios, mesmo que favoreça Estados bolsonaristas ou não bolsonaristas, pode ter alguma dificuldade mas não uma polarização.

BRASÍLIA - Governador do Espírito Santo pela terceira vez, Renato Casagrande (PSB) defende que os políticos de esquerda devem buscar o ajuste fiscal como forma de obter “resultados efetivos” na administração pública. O tema é espinhoso para partidos como o dele e para o PT do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hoje às voltas com cobranças para entregar um maior equilíbrio nas contas do governo.

“Frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem, para um setor da sociedade, que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal”, afirma Casagrande.

Nesta entrevista ao Estadão, o governador, que integra a base aliada do presidente, diz que Lula deve apostar no ajuste como forma de reconquistar aliados que já estiveram no lado dele contra adversários à direita. Ele também defende que Lula insista na aproximação com segmentos da sociedade mais conservadores, cada vez mais representativos no Congresso e na política. Casagrande prevê que a onda conservadora deverá prosseguir tanto nas eleições municipais deste ano quanto em 2026.

“Lula não precisa de uma agenda de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Não tem que levar para o Congresso Nacional nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar”, afirma.

O governador administra um Estado pequeno mas que lançou nomes ao cenário federal identificados com a defesa da responsabilidade fiscal, como o ex-governador Paulo Hartung, hoje na iniciativa privada, e a ex-secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, hoje executiva do Santander.

O governador Renato Casagrande (PSB) Foto: Tiago Queiroz

Na avaliação dele, o ajuste pode e deve ser feito também pelo lado das despesas.

“O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um”, disse. “São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda”.

A seguir, trechos da entrevista:

Economistas como Arminio Fraga, que declararam apoio a Lula na eleição, apontam críticas e decepção com a condução da política fiscal do governo. O presidente perdeu apoio desses eleitores?

Precisamos entender que o ambiente para governar neste momento é mais complexo. O presidente Lula está dialogando com um Congresso de perfil muito mais conservador, então, há um choque permanente. Outra questão que é importante registrar é o debate ideológico, que é muito superficial, sem entrar em conteúdo, e que é um debate presente na sociedade. Com isso, o presidente não conquista e não consegue as vitórias que desejava para avançar, por exemplo, em medidas para ampliar receitas ou reduzir despesas, e as metas estabelecidas pelo Ministério da Fazenda têm dificuldades no Congresso Nacional.

Mas existe uma crise de confiança.

Efetivamente, a impressão que passa do governo é que em alguns momentos não tem uma preocupação com a busca do equilíbrio fiscal. Sabemos que o ministro Fernando Haddad está focado nisso, mas frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem para um setor da sociedade que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal.

Já desistiram do Lula ou ainda esperam para ver o que o governo vai entregar?

Esperam para ver o que o Haddad consegue entregar e como vai ser esse alinhamento do governo. Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia. A economia tem crescido razoavelmente bem, mas se a gente ajustar o passo do discurso e da prática, a gente pode crescer mais. Até porque não sabemos ainda como vai ser o processo eleitoral em 2026. Tem um bom tempo até lá e as pessoas acreditam que o governo pode ajustar e aperfeiçoar esses passos.

Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia

Renato Casagrande

Essa divisão no governo pode indicar um isolamento do ministro Haddad na agenda fiscal?

Acredito que não. O presidente Lula tem avalizado e estado quase todas as vezes com o ministro Haddad. É mesmo o presidente fazer essa coordenação interna. Ele busca fazer, mas os problemas vão se multiplicando pelo ambiente político, pelas dificuldades no Congresso, pela sociedade mais anárquica no debate político. Governar hoje é lidar com muito mais variáveis do que no passado.

O sr. vê o Haddad com força neste governo?

Sim, ele é um ministro forte e respeitado. Faz uma boa interlocução. Lógico que tem que tratar de temas às vezes antipáticos, porque quem quer colocar receita para dentro do caixa muitas vezes esbarra em interesses legítimos de setores. Por isso, a coordenação de governo tem que ser para que todos se esforcem, seja para aumentar a receita, seja para diminuir ou controlar a despesa.

O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um. Eu sou de um partido de centro-esquerda aqui no Espírito Santo e temos 12 anos de nota A de gestão fiscal, temos a maior capacidade de investimento em infraestrutura do Brasil, temos fundo soberano.

Esse compromisso em transformar a boa gestão em resultado para as pessoas mais mais vulneráveis deve ser o nosso objetivo sempre. Tem gente que quer economizar só para economizar, sem se preocupar com o retorno. Esse tipo de gestor tem uma visão distorcida de um Brasil que é desigual. Nós queremos a boa gestão para distribuir renda, em parceria com o setor privado.

Existe a leitura que os políticos de esquerda não concordam com a agenda de ajuste fiscal. Dá voto defender responsabilidade fiscal?

Quando fui governador pela primeira vez, de 2011 a 2014, nós levamos o Estado a ser nota A na gestão fiscal. Hoje, temos capacidade de investimento diferenciada. Enquanto o Brasil investe 7% da sua receita corrente em infraestrutura, eu invisto 20%. São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda.

Renato Casagrande faz defesa firme do equilíbrio fiscal e aponta que isso não deveria ser um assunto apenas da direita Foto: Giovanni Pagotto/Governo ES

Essa divisão que o senhor descreveu dentro do governo sobre os que são contra e a favor do ajuste fiscal reflete uma divisão dentro do PT?

Pode ser que isso seja uma parte do que acontece dentro do governo, mas mesmo que haja, dentro dos partidos, esse debate, isso tudo tem que ser feito no sentido de buscar um equilíbrio para que a gente possa, ano após ano, caminhar em direção a esse equilíbrio.

O governo Lula está sendo cobrado por fazer o ajuste fiscal apenas pelo lado da receita e não pela revisão e redução de despesas. É possível fazer isso? Por que a dificuldade em avançar na redução de despesas?

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito. Lógico que pelo lado da receita também, aperfeiçoar a máquina arrecadatória, buscar justiça nos incentivos que são dados para que a gente tenha equilíbrio nas concessões de incentivos fiscais. É perfeitamente possível fazer isso. Mas o que consome hoje os recursos do Brasil são os juros altos para financiar a dívida. Por isso que você precisa ter um ajuste de receita e de despesa ao mesmo tempo, fazer as duas coisas, olhando as despesas correntes e de pessoal, para que a gente tenha um caminhar em direção ao controle e dar sinais claros de confiança para os juros poderem continuar caindo.

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito

Renato Casagrande

O Banco Central teve um comportamento seguro e conservador na política monetária, mas o Brasil dando exemplos de aumento de receita e também de controle de despesas, tanto no discurso quanto na prática, a gente pode reduzir os juros com maior velocidade. É um ciclo que se realimenta.

O senhor vê chances de o governo Lula dar uma guinada à esquerda, abandonar de vez a agenda do ajuste fiscal ou enfraquecê-la?

Nenhuma chance. A sociedade brasileira neste momento é mais conservadora. O presidente Lula é respeitado no campo da centro-esquerda. Nós sabemos que ele precisa buscar alianças em grupos que não têm simpatia pelo trabalho desenvolvido pela liderança dele, que não têm identidade (com ele). O que eu espero que ele faça é que ele busque politicamente estabelecer pontes de contatos com segmentos que hoje têm menos identidade com a sua atuação.

Como?

Estabelecendo contatos e criando canais de diálogo. Está claro, por exemplo, que é preciso estabelecer contatos e criar políticas públicas para o mundo cristão evangélico, para o mundo do agronegócio. Se bem que o agronegócio já tem muitas ações, é bom que a gente reconheça isso. Na área de segurança pública, o governo pode ser mais mais audacioso e demonstrar mais ação e preocupação. São setores e áreas temáticas em que o governo precisa ampliar a sua atuação para ganhar apoio na sociedade e diminuir as suas dificuldades no Congresso.

Se o governo não fizer isso fica arriscada uma eventual reeleição em 2026?

Está cedo ainda para falar da eleição de 2026, mas a eleição de 2022 já foi muito disputada. Foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026. Não sabemos como o movimento bolsonarista se comportará, se haverá uma candidatura ou mais de uma. Se os partidos de centro-direita não alinhados ao bolsonarismo terão candidaturas ou não. É cedo para fazer essa avaliação, mas é bom que a gente reconheça sempre que o presidente Lula é um grande líder popular.

(A eleição de 2022) foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026

Renato Casagrande

Como o senhor avalia a aproximação do governador Tarcísio de Freitas com o setor privado com vistas a 2026?

O governador de São Paulo é naturalmente candidato a presidente da República, pelo tamanho e pela importância do Estado. E quem não tem hoje um alinhamento com o presidente Lula e não tem identidade com a condução dele busca alternativas. A alternativa Bolsonaro neste momento está fora de cogitação. Então, o governador de São Paulo vira um polo de atração de quem está insatisfeito. Tanto dos que já são contra, independente do resultado do governo, quanto daqueles que apostaram no presidente mas não estão satisfeitos.

O senhor fez uma projeção de ampliação dos partidos conservadores.

Para o Parlamento. Pelo tamanho dos partidos e pelo resultado dos partidos, a tendência é a gente continuar com um Congresso mais conservador. Na eleição municipal também, as possibilidades dos partidos mais conservadores são maiores do que dos partidos progressistas.

Isso pode suscitar uma reforma ministerial por parte do presidente Lula, fazendo com que partidos como o PSB percam espaço para ceder a conservadores?

O presidente já abriu espaço para os partidos conservadores. União Brasil, PP, MDB já fazem parte do governo. É uma necessidade desses partidos estarem alinhados com o governo e do governo buscar um ajuste de posição para que os partidos de fato tenham resultado efetivo nas votações do Congresso.

Como faz isso?

O Parlamento conquistou uma autonomia e uma independência muito grande. Os governos se enfraqueceram desde a época do impeachment da presidente Dilma e depois a dificuldade que o presidente Michel Temer teve no governo. Depois o presidente Bolsonaro delegou a política para alguns partidos no Congresso Nacional. Então, o enfraquecimento da articulação política fez com que o Congresso avançasse sobre o Orçamento.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política, parlamentares que sustentam o governo e que estão enfrentando desgastes para apoiar a matéria do governo, serem prestigiados com a presença dos membros do governo. Hoje, independente da sua posição no Congresso, os parlamentares têm a execução de suas emendas individuais e de bancada.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política

Renato Casagrande

Então, a ação e a interferência e o resultado da articulação política têm uma força menor do que tinham no passado. É mais difícil esse controle sobre o Parlamento hoje. E como uma parte da sociedade que milita em campos diversos exerce um certo patrulhamento sobre a posição dos parlamentares, a rede social influencia muito o posicionamento de cada parlamentar no Congresso, torna o controle ou a condução, a liderança do governo junto ao Parlamento, mais difícil.

Neste cenário no Congresso, é possível ao presidente impor a sua agenda?

O Lula não precisa de uma agenda de esquerda, não tem um assunto que haja necessidade de o presidente Lula colocar em votação que possa ser caracterizado como um assunto de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Compreendendo que os resultados da articulação política vão ser mais difíceis. Não tem que levar para o Congresso nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar.

Pode haver algum tipo de contaminação da pauta econômica pela polarização política?

Acho que não. O que pode haver são grupos que não queiram que algumas matérias andem. Mas o mais importante para o governo e para o Brasil agora é votar a reforma tributária. Eu não acredito que vá ter uma barreira nessa votação, é mais uma organização do Congresso. Mas as dificuldades são inerentes à complexidade da articulação política. Veja agora, por exemplo, a votação da ‘taxação das blusinhas’. Houve uma polarização, com diferenças dentro e fora do governo. Bolsonaro a princípio anunciou o apoio, Lula era contra, e as coisas foram mudando. Então, isso mostrou que todos os assuntos acabam se transformando num debate político. Quando as lideranças desses polos políticos se posicionam começa a ter uma disputa dentro do Congresso. Isso não tem como a gente prever, a gente tem que ir administrando.

Outros temas da área econômica podem cair nessa armadilha da polarização política? Por exemplo, a renegociação da dívida dos Estados.

Tudo o que é favorável aos Estados pode ter alguma má vontade mas não terá polarização. O que pode ter uma polarização é a volta de um tributo, reonerar algumas atividades, como é o caso da desoneração, ou aumento de tributo, como foi o caso das blusinhas. Isso vira disputa. Mas quando você dá um benefício que tenha critérios, mesmo que favoreça Estados bolsonaristas ou não bolsonaristas, pode ter alguma dificuldade mas não uma polarização.

BRASÍLIA - Governador do Espírito Santo pela terceira vez, Renato Casagrande (PSB) defende que os políticos de esquerda devem buscar o ajuste fiscal como forma de obter “resultados efetivos” na administração pública. O tema é espinhoso para partidos como o dele e para o PT do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hoje às voltas com cobranças para entregar um maior equilíbrio nas contas do governo.

“Frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem, para um setor da sociedade, que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal”, afirma Casagrande.

Nesta entrevista ao Estadão, o governador, que integra a base aliada do presidente, diz que Lula deve apostar no ajuste como forma de reconquistar aliados que já estiveram no lado dele contra adversários à direita. Ele também defende que Lula insista na aproximação com segmentos da sociedade mais conservadores, cada vez mais representativos no Congresso e na política. Casagrande prevê que a onda conservadora deverá prosseguir tanto nas eleições municipais deste ano quanto em 2026.

“Lula não precisa de uma agenda de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Não tem que levar para o Congresso Nacional nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar”, afirma.

O governador administra um Estado pequeno mas que lançou nomes ao cenário federal identificados com a defesa da responsabilidade fiscal, como o ex-governador Paulo Hartung, hoje na iniciativa privada, e a ex-secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, hoje executiva do Santander.

O governador Renato Casagrande (PSB) Foto: Tiago Queiroz

Na avaliação dele, o ajuste pode e deve ser feito também pelo lado das despesas.

“O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um”, disse. “São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda”.

A seguir, trechos da entrevista:

Economistas como Arminio Fraga, que declararam apoio a Lula na eleição, apontam críticas e decepção com a condução da política fiscal do governo. O presidente perdeu apoio desses eleitores?

Precisamos entender que o ambiente para governar neste momento é mais complexo. O presidente Lula está dialogando com um Congresso de perfil muito mais conservador, então, há um choque permanente. Outra questão que é importante registrar é o debate ideológico, que é muito superficial, sem entrar em conteúdo, e que é um debate presente na sociedade. Com isso, o presidente não conquista e não consegue as vitórias que desejava para avançar, por exemplo, em medidas para ampliar receitas ou reduzir despesas, e as metas estabelecidas pelo Ministério da Fazenda têm dificuldades no Congresso Nacional.

Mas existe uma crise de confiança.

Efetivamente, a impressão que passa do governo é que em alguns momentos não tem uma preocupação com a busca do equilíbrio fiscal. Sabemos que o ministro Fernando Haddad está focado nisso, mas frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem para um setor da sociedade que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal.

Já desistiram do Lula ou ainda esperam para ver o que o governo vai entregar?

Esperam para ver o que o Haddad consegue entregar e como vai ser esse alinhamento do governo. Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia. A economia tem crescido razoavelmente bem, mas se a gente ajustar o passo do discurso e da prática, a gente pode crescer mais. Até porque não sabemos ainda como vai ser o processo eleitoral em 2026. Tem um bom tempo até lá e as pessoas acreditam que o governo pode ajustar e aperfeiçoar esses passos.

Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia

Renato Casagrande

Essa divisão no governo pode indicar um isolamento do ministro Haddad na agenda fiscal?

Acredito que não. O presidente Lula tem avalizado e estado quase todas as vezes com o ministro Haddad. É mesmo o presidente fazer essa coordenação interna. Ele busca fazer, mas os problemas vão se multiplicando pelo ambiente político, pelas dificuldades no Congresso, pela sociedade mais anárquica no debate político. Governar hoje é lidar com muito mais variáveis do que no passado.

O sr. vê o Haddad com força neste governo?

Sim, ele é um ministro forte e respeitado. Faz uma boa interlocução. Lógico que tem que tratar de temas às vezes antipáticos, porque quem quer colocar receita para dentro do caixa muitas vezes esbarra em interesses legítimos de setores. Por isso, a coordenação de governo tem que ser para que todos se esforcem, seja para aumentar a receita, seja para diminuir ou controlar a despesa.

O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um. Eu sou de um partido de centro-esquerda aqui no Espírito Santo e temos 12 anos de nota A de gestão fiscal, temos a maior capacidade de investimento em infraestrutura do Brasil, temos fundo soberano.

Esse compromisso em transformar a boa gestão em resultado para as pessoas mais mais vulneráveis deve ser o nosso objetivo sempre. Tem gente que quer economizar só para economizar, sem se preocupar com o retorno. Esse tipo de gestor tem uma visão distorcida de um Brasil que é desigual. Nós queremos a boa gestão para distribuir renda, em parceria com o setor privado.

Existe a leitura que os políticos de esquerda não concordam com a agenda de ajuste fiscal. Dá voto defender responsabilidade fiscal?

Quando fui governador pela primeira vez, de 2011 a 2014, nós levamos o Estado a ser nota A na gestão fiscal. Hoje, temos capacidade de investimento diferenciada. Enquanto o Brasil investe 7% da sua receita corrente em infraestrutura, eu invisto 20%. São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda.

Renato Casagrande faz defesa firme do equilíbrio fiscal e aponta que isso não deveria ser um assunto apenas da direita Foto: Giovanni Pagotto/Governo ES

Essa divisão que o senhor descreveu dentro do governo sobre os que são contra e a favor do ajuste fiscal reflete uma divisão dentro do PT?

Pode ser que isso seja uma parte do que acontece dentro do governo, mas mesmo que haja, dentro dos partidos, esse debate, isso tudo tem que ser feito no sentido de buscar um equilíbrio para que a gente possa, ano após ano, caminhar em direção a esse equilíbrio.

O governo Lula está sendo cobrado por fazer o ajuste fiscal apenas pelo lado da receita e não pela revisão e redução de despesas. É possível fazer isso? Por que a dificuldade em avançar na redução de despesas?

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito. Lógico que pelo lado da receita também, aperfeiçoar a máquina arrecadatória, buscar justiça nos incentivos que são dados para que a gente tenha equilíbrio nas concessões de incentivos fiscais. É perfeitamente possível fazer isso. Mas o que consome hoje os recursos do Brasil são os juros altos para financiar a dívida. Por isso que você precisa ter um ajuste de receita e de despesa ao mesmo tempo, fazer as duas coisas, olhando as despesas correntes e de pessoal, para que a gente tenha um caminhar em direção ao controle e dar sinais claros de confiança para os juros poderem continuar caindo.

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito

Renato Casagrande

O Banco Central teve um comportamento seguro e conservador na política monetária, mas o Brasil dando exemplos de aumento de receita e também de controle de despesas, tanto no discurso quanto na prática, a gente pode reduzir os juros com maior velocidade. É um ciclo que se realimenta.

O senhor vê chances de o governo Lula dar uma guinada à esquerda, abandonar de vez a agenda do ajuste fiscal ou enfraquecê-la?

Nenhuma chance. A sociedade brasileira neste momento é mais conservadora. O presidente Lula é respeitado no campo da centro-esquerda. Nós sabemos que ele precisa buscar alianças em grupos que não têm simpatia pelo trabalho desenvolvido pela liderança dele, que não têm identidade (com ele). O que eu espero que ele faça é que ele busque politicamente estabelecer pontes de contatos com segmentos que hoje têm menos identidade com a sua atuação.

Como?

Estabelecendo contatos e criando canais de diálogo. Está claro, por exemplo, que é preciso estabelecer contatos e criar políticas públicas para o mundo cristão evangélico, para o mundo do agronegócio. Se bem que o agronegócio já tem muitas ações, é bom que a gente reconheça isso. Na área de segurança pública, o governo pode ser mais mais audacioso e demonstrar mais ação e preocupação. São setores e áreas temáticas em que o governo precisa ampliar a sua atuação para ganhar apoio na sociedade e diminuir as suas dificuldades no Congresso.

Se o governo não fizer isso fica arriscada uma eventual reeleição em 2026?

Está cedo ainda para falar da eleição de 2026, mas a eleição de 2022 já foi muito disputada. Foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026. Não sabemos como o movimento bolsonarista se comportará, se haverá uma candidatura ou mais de uma. Se os partidos de centro-direita não alinhados ao bolsonarismo terão candidaturas ou não. É cedo para fazer essa avaliação, mas é bom que a gente reconheça sempre que o presidente Lula é um grande líder popular.

(A eleição de 2022) foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026

Renato Casagrande

Como o senhor avalia a aproximação do governador Tarcísio de Freitas com o setor privado com vistas a 2026?

O governador de São Paulo é naturalmente candidato a presidente da República, pelo tamanho e pela importância do Estado. E quem não tem hoje um alinhamento com o presidente Lula e não tem identidade com a condução dele busca alternativas. A alternativa Bolsonaro neste momento está fora de cogitação. Então, o governador de São Paulo vira um polo de atração de quem está insatisfeito. Tanto dos que já são contra, independente do resultado do governo, quanto daqueles que apostaram no presidente mas não estão satisfeitos.

O senhor fez uma projeção de ampliação dos partidos conservadores.

Para o Parlamento. Pelo tamanho dos partidos e pelo resultado dos partidos, a tendência é a gente continuar com um Congresso mais conservador. Na eleição municipal também, as possibilidades dos partidos mais conservadores são maiores do que dos partidos progressistas.

Isso pode suscitar uma reforma ministerial por parte do presidente Lula, fazendo com que partidos como o PSB percam espaço para ceder a conservadores?

O presidente já abriu espaço para os partidos conservadores. União Brasil, PP, MDB já fazem parte do governo. É uma necessidade desses partidos estarem alinhados com o governo e do governo buscar um ajuste de posição para que os partidos de fato tenham resultado efetivo nas votações do Congresso.

Como faz isso?

O Parlamento conquistou uma autonomia e uma independência muito grande. Os governos se enfraqueceram desde a época do impeachment da presidente Dilma e depois a dificuldade que o presidente Michel Temer teve no governo. Depois o presidente Bolsonaro delegou a política para alguns partidos no Congresso Nacional. Então, o enfraquecimento da articulação política fez com que o Congresso avançasse sobre o Orçamento.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política, parlamentares que sustentam o governo e que estão enfrentando desgastes para apoiar a matéria do governo, serem prestigiados com a presença dos membros do governo. Hoje, independente da sua posição no Congresso, os parlamentares têm a execução de suas emendas individuais e de bancada.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política

Renato Casagrande

Então, a ação e a interferência e o resultado da articulação política têm uma força menor do que tinham no passado. É mais difícil esse controle sobre o Parlamento hoje. E como uma parte da sociedade que milita em campos diversos exerce um certo patrulhamento sobre a posição dos parlamentares, a rede social influencia muito o posicionamento de cada parlamentar no Congresso, torna o controle ou a condução, a liderança do governo junto ao Parlamento, mais difícil.

Neste cenário no Congresso, é possível ao presidente impor a sua agenda?

O Lula não precisa de uma agenda de esquerda, não tem um assunto que haja necessidade de o presidente Lula colocar em votação que possa ser caracterizado como um assunto de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Compreendendo que os resultados da articulação política vão ser mais difíceis. Não tem que levar para o Congresso nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar.

Pode haver algum tipo de contaminação da pauta econômica pela polarização política?

Acho que não. O que pode haver são grupos que não queiram que algumas matérias andem. Mas o mais importante para o governo e para o Brasil agora é votar a reforma tributária. Eu não acredito que vá ter uma barreira nessa votação, é mais uma organização do Congresso. Mas as dificuldades são inerentes à complexidade da articulação política. Veja agora, por exemplo, a votação da ‘taxação das blusinhas’. Houve uma polarização, com diferenças dentro e fora do governo. Bolsonaro a princípio anunciou o apoio, Lula era contra, e as coisas foram mudando. Então, isso mostrou que todos os assuntos acabam se transformando num debate político. Quando as lideranças desses polos políticos se posicionam começa a ter uma disputa dentro do Congresso. Isso não tem como a gente prever, a gente tem que ir administrando.

Outros temas da área econômica podem cair nessa armadilha da polarização política? Por exemplo, a renegociação da dívida dos Estados.

Tudo o que é favorável aos Estados pode ter alguma má vontade mas não terá polarização. O que pode ter uma polarização é a volta de um tributo, reonerar algumas atividades, como é o caso da desoneração, ou aumento de tributo, como foi o caso das blusinhas. Isso vira disputa. Mas quando você dá um benefício que tenha critérios, mesmo que favoreça Estados bolsonaristas ou não bolsonaristas, pode ter alguma dificuldade mas não uma polarização.

BRASÍLIA - Governador do Espírito Santo pela terceira vez, Renato Casagrande (PSB) defende que os políticos de esquerda devem buscar o ajuste fiscal como forma de obter “resultados efetivos” na administração pública. O tema é espinhoso para partidos como o dele e para o PT do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hoje às voltas com cobranças para entregar um maior equilíbrio nas contas do governo.

“Frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem, para um setor da sociedade, que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal”, afirma Casagrande.

Nesta entrevista ao Estadão, o governador, que integra a base aliada do presidente, diz que Lula deve apostar no ajuste como forma de reconquistar aliados que já estiveram no lado dele contra adversários à direita. Ele também defende que Lula insista na aproximação com segmentos da sociedade mais conservadores, cada vez mais representativos no Congresso e na política. Casagrande prevê que a onda conservadora deverá prosseguir tanto nas eleições municipais deste ano quanto em 2026.

“Lula não precisa de uma agenda de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Não tem que levar para o Congresso Nacional nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar”, afirma.

O governador administra um Estado pequeno mas que lançou nomes ao cenário federal identificados com a defesa da responsabilidade fiscal, como o ex-governador Paulo Hartung, hoje na iniciativa privada, e a ex-secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, hoje executiva do Santander.

O governador Renato Casagrande (PSB) Foto: Tiago Queiroz

Na avaliação dele, o ajuste pode e deve ser feito também pelo lado das despesas.

“O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um”, disse. “São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda”.

A seguir, trechos da entrevista:

Economistas como Arminio Fraga, que declararam apoio a Lula na eleição, apontam críticas e decepção com a condução da política fiscal do governo. O presidente perdeu apoio desses eleitores?

Precisamos entender que o ambiente para governar neste momento é mais complexo. O presidente Lula está dialogando com um Congresso de perfil muito mais conservador, então, há um choque permanente. Outra questão que é importante registrar é o debate ideológico, que é muito superficial, sem entrar em conteúdo, e que é um debate presente na sociedade. Com isso, o presidente não conquista e não consegue as vitórias que desejava para avançar, por exemplo, em medidas para ampliar receitas ou reduzir despesas, e as metas estabelecidas pelo Ministério da Fazenda têm dificuldades no Congresso Nacional.

Mas existe uma crise de confiança.

Efetivamente, a impressão que passa do governo é que em alguns momentos não tem uma preocupação com a busca do equilíbrio fiscal. Sabemos que o ministro Fernando Haddad está focado nisso, mas frequentemente há especulação de que existe uma disputa interna no governo entre quem quer gastar mais e quem não quer gastar. Este é um sinal ruim, que demonstra que não tem uma unidade de ação do governo. E isso passa uma mensagem para um setor da sociedade que não há preocupação com as contas públicas e com a busca do equilíbrio nas contas públicas. Sinto que isso tem afastado pessoas que estiveram com o presidente Lula do apoio ao governo federal.

Já desistiram do Lula ou ainda esperam para ver o que o governo vai entregar?

Esperam para ver o que o Haddad consegue entregar e como vai ser esse alinhamento do governo. Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia. A economia tem crescido razoavelmente bem, mas se a gente ajustar o passo do discurso e da prática, a gente pode crescer mais. Até porque não sabemos ainda como vai ser o processo eleitoral em 2026. Tem um bom tempo até lá e as pessoas acreditam que o governo pode ajustar e aperfeiçoar esses passos.

Minha avaliação é que o governo precisa se alinhar no discurso e na prática de busca permanente do equilíbrio fiscal para que isso seja um instrumento para que a gente tenha uma velocidade maior na redução das taxas de juros e um crescimento maior da economia

Renato Casagrande

Essa divisão no governo pode indicar um isolamento do ministro Haddad na agenda fiscal?

Acredito que não. O presidente Lula tem avalizado e estado quase todas as vezes com o ministro Haddad. É mesmo o presidente fazer essa coordenação interna. Ele busca fazer, mas os problemas vão se multiplicando pelo ambiente político, pelas dificuldades no Congresso, pela sociedade mais anárquica no debate político. Governar hoje é lidar com muito mais variáveis do que no passado.

O sr. vê o Haddad com força neste governo?

Sim, ele é um ministro forte e respeitado. Faz uma boa interlocução. Lógico que tem que tratar de temas às vezes antipáticos, porque quem quer colocar receita para dentro do caixa muitas vezes esbarra em interesses legítimos de setores. Por isso, a coordenação de governo tem que ser para que todos se esforcem, seja para aumentar a receita, seja para diminuir ou controlar a despesa.

O controle de despesas é fundamental. Buscar o equilíbrio das contas não é uma tarefa de um presidente ou de um governo de esquerda ou de direita, mas de qualquer um. Eu sou de um partido de centro-esquerda aqui no Espírito Santo e temos 12 anos de nota A de gestão fiscal, temos a maior capacidade de investimento em infraestrutura do Brasil, temos fundo soberano.

Esse compromisso em transformar a boa gestão em resultado para as pessoas mais mais vulneráveis deve ser o nosso objetivo sempre. Tem gente que quer economizar só para economizar, sem se preocupar com o retorno. Esse tipo de gestor tem uma visão distorcida de um Brasil que é desigual. Nós queremos a boa gestão para distribuir renda, em parceria com o setor privado.

Existe a leitura que os políticos de esquerda não concordam com a agenda de ajuste fiscal. Dá voto defender responsabilidade fiscal?

Quando fui governador pela primeira vez, de 2011 a 2014, nós levamos o Estado a ser nota A na gestão fiscal. Hoje, temos capacidade de investimento diferenciada. Enquanto o Brasil investe 7% da sua receita corrente em infraestrutura, eu invisto 20%. São resultados objetivos, efetivos. A partir da hora que você conquista esse equilíbrio, você transforma isso em resultado político. Os partidos progressistas precisam enfrentar esse debate, não pode ser essa a marca dos partidos de esquerda.

Renato Casagrande faz defesa firme do equilíbrio fiscal e aponta que isso não deveria ser um assunto apenas da direita Foto: Giovanni Pagotto/Governo ES

Essa divisão que o senhor descreveu dentro do governo sobre os que são contra e a favor do ajuste fiscal reflete uma divisão dentro do PT?

Pode ser que isso seja uma parte do que acontece dentro do governo, mas mesmo que haja, dentro dos partidos, esse debate, isso tudo tem que ser feito no sentido de buscar um equilíbrio para que a gente possa, ano após ano, caminhar em direção a esse equilíbrio.

O governo Lula está sendo cobrado por fazer o ajuste fiscal apenas pelo lado da receita e não pela revisão e redução de despesas. É possível fazer isso? Por que a dificuldade em avançar na redução de despesas?

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito. Lógico que pelo lado da receita também, aperfeiçoar a máquina arrecadatória, buscar justiça nos incentivos que são dados para que a gente tenha equilíbrio nas concessões de incentivos fiscais. É perfeitamente possível fazer isso. Mas o que consome hoje os recursos do Brasil são os juros altos para financiar a dívida. Por isso que você precisa ter um ajuste de receita e de despesa ao mesmo tempo, fazer as duas coisas, olhando as despesas correntes e de pessoal, para que a gente tenha um caminhar em direção ao controle e dar sinais claros de confiança para os juros poderem continuar caindo.

É possível fazer ajuste pelo lado da despesa e tem que ser feito

Renato Casagrande

O Banco Central teve um comportamento seguro e conservador na política monetária, mas o Brasil dando exemplos de aumento de receita e também de controle de despesas, tanto no discurso quanto na prática, a gente pode reduzir os juros com maior velocidade. É um ciclo que se realimenta.

O senhor vê chances de o governo Lula dar uma guinada à esquerda, abandonar de vez a agenda do ajuste fiscal ou enfraquecê-la?

Nenhuma chance. A sociedade brasileira neste momento é mais conservadora. O presidente Lula é respeitado no campo da centro-esquerda. Nós sabemos que ele precisa buscar alianças em grupos que não têm simpatia pelo trabalho desenvolvido pela liderança dele, que não têm identidade (com ele). O que eu espero que ele faça é que ele busque politicamente estabelecer pontes de contatos com segmentos que hoje têm menos identidade com a sua atuação.

Como?

Estabelecendo contatos e criando canais de diálogo. Está claro, por exemplo, que é preciso estabelecer contatos e criar políticas públicas para o mundo cristão evangélico, para o mundo do agronegócio. Se bem que o agronegócio já tem muitas ações, é bom que a gente reconheça isso. Na área de segurança pública, o governo pode ser mais mais audacioso e demonstrar mais ação e preocupação. São setores e áreas temáticas em que o governo precisa ampliar a sua atuação para ganhar apoio na sociedade e diminuir as suas dificuldades no Congresso.

Se o governo não fizer isso fica arriscada uma eventual reeleição em 2026?

Está cedo ainda para falar da eleição de 2026, mas a eleição de 2022 já foi muito disputada. Foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026. Não sabemos como o movimento bolsonarista se comportará, se haverá uma candidatura ou mais de uma. Se os partidos de centro-direita não alinhados ao bolsonarismo terão candidaturas ou não. É cedo para fazer essa avaliação, mas é bom que a gente reconheça sempre que o presidente Lula é um grande líder popular.

(A eleição de 2022) foi uma eleição empatada praticamente, da qual saiu um Congresso conservador. E tudo aponta que o próximo Congresso eleito em 2026 também será conservador. Ou seja, não terá eleição fácil para ninguém em 2026

Renato Casagrande

Como o senhor avalia a aproximação do governador Tarcísio de Freitas com o setor privado com vistas a 2026?

O governador de São Paulo é naturalmente candidato a presidente da República, pelo tamanho e pela importância do Estado. E quem não tem hoje um alinhamento com o presidente Lula e não tem identidade com a condução dele busca alternativas. A alternativa Bolsonaro neste momento está fora de cogitação. Então, o governador de São Paulo vira um polo de atração de quem está insatisfeito. Tanto dos que já são contra, independente do resultado do governo, quanto daqueles que apostaram no presidente mas não estão satisfeitos.

O senhor fez uma projeção de ampliação dos partidos conservadores.

Para o Parlamento. Pelo tamanho dos partidos e pelo resultado dos partidos, a tendência é a gente continuar com um Congresso mais conservador. Na eleição municipal também, as possibilidades dos partidos mais conservadores são maiores do que dos partidos progressistas.

Isso pode suscitar uma reforma ministerial por parte do presidente Lula, fazendo com que partidos como o PSB percam espaço para ceder a conservadores?

O presidente já abriu espaço para os partidos conservadores. União Brasil, PP, MDB já fazem parte do governo. É uma necessidade desses partidos estarem alinhados com o governo e do governo buscar um ajuste de posição para que os partidos de fato tenham resultado efetivo nas votações do Congresso.

Como faz isso?

O Parlamento conquistou uma autonomia e uma independência muito grande. Os governos se enfraqueceram desde a época do impeachment da presidente Dilma e depois a dificuldade que o presidente Michel Temer teve no governo. Depois o presidente Bolsonaro delegou a política para alguns partidos no Congresso Nacional. Então, o enfraquecimento da articulação política fez com que o Congresso avançasse sobre o Orçamento.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política, parlamentares que sustentam o governo e que estão enfrentando desgastes para apoiar a matéria do governo, serem prestigiados com a presença dos membros do governo. Hoje, independente da sua posição no Congresso, os parlamentares têm a execução de suas emendas individuais e de bancada.

Hoje, você não tem no governo um controle na execução do Orçamento. Sempre houve, e isso é da legitimidade da política

Renato Casagrande

Então, a ação e a interferência e o resultado da articulação política têm uma força menor do que tinham no passado. É mais difícil esse controle sobre o Parlamento hoje. E como uma parte da sociedade que milita em campos diversos exerce um certo patrulhamento sobre a posição dos parlamentares, a rede social influencia muito o posicionamento de cada parlamentar no Congresso, torna o controle ou a condução, a liderança do governo junto ao Parlamento, mais difícil.

Neste cenário no Congresso, é possível ao presidente impor a sua agenda?

O Lula não precisa de uma agenda de esquerda, não tem um assunto que haja necessidade de o presidente Lula colocar em votação que possa ser caracterizado como um assunto de esquerda. Tributação de grandes fortunas? Poderia ser um tema, mas não vai entrar. O presidente tem que ir conduzindo no dia a dia, focando na agenda econômica e nas necessidades do governo, compreendendo que esta é a realidade agora e que será a realidade daqui para frente. Compreendendo que os resultados da articulação política vão ser mais difíceis. Não tem que levar para o Congresso nenhum debate que possa fortalecer posições ideológicas. Agora é a necessidade do pragmatismo do ato de governar.

Pode haver algum tipo de contaminação da pauta econômica pela polarização política?

Acho que não. O que pode haver são grupos que não queiram que algumas matérias andem. Mas o mais importante para o governo e para o Brasil agora é votar a reforma tributária. Eu não acredito que vá ter uma barreira nessa votação, é mais uma organização do Congresso. Mas as dificuldades são inerentes à complexidade da articulação política. Veja agora, por exemplo, a votação da ‘taxação das blusinhas’. Houve uma polarização, com diferenças dentro e fora do governo. Bolsonaro a princípio anunciou o apoio, Lula era contra, e as coisas foram mudando. Então, isso mostrou que todos os assuntos acabam se transformando num debate político. Quando as lideranças desses polos políticos se posicionam começa a ter uma disputa dentro do Congresso. Isso não tem como a gente prever, a gente tem que ir administrando.

Outros temas da área econômica podem cair nessa armadilha da polarização política? Por exemplo, a renegociação da dívida dos Estados.

Tudo o que é favorável aos Estados pode ter alguma má vontade mas não terá polarização. O que pode ter uma polarização é a volta de um tributo, reonerar algumas atividades, como é o caso da desoneração, ou aumento de tributo, como foi o caso das blusinhas. Isso vira disputa. Mas quando você dá um benefício que tenha critérios, mesmo que favoreça Estados bolsonaristas ou não bolsonaristas, pode ter alguma dificuldade mas não uma polarização.

Entrevista por Mariana Carneiro

Repórter especial de Economia em Brasília. Foi editora da Coluna do Estadão. Graduada em comunicação social pela PUC-Rio, com MBA em mercado financeiro pela B3 e especialização em análise de conjuntura econômica pela UFRJ. Foi correspondente na Argentina (2015) pela Folha de S.Paulo e também trabalhou em O Globo, TV Globo, JB e Jornal do Commercio.

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