BRASÍLIA — O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai para o Ceará nesta sexta-feira, 5, na tentativa de reconciliar um PT local dividido, repleto de conflitos e incertezas num ano de eleições municipais. A sigla ainda não definiu quem será o candidato à prefeitura de Fortaleza. Ao mesmo tempo, em outras cidades, líderes e figuras históricas cogitam abandonar a sigla ou até já saíram.
A divisão acontece sobretudo em razão da estratégia adotada pelo partido em 2023 de incorporar ex-integrantes do PDT que optaram por sair do partido, após uma grande briga entre a família Família Gomes, dos ex-govenadores Ciro Gomes (PDT) e Cid Gomes (PSB).
Nesse processo de assimilação, o diretório estadual do PT articula para que os ex-pedetistas possam pleitear prefeituras no Ceará. Esse trabalho com os petistas neófitos contraria posição firmadas por diretórios municipais e militantes mais à esquerda.
Lula estará em um dos principais centros da confusão no PT cearense, a cidade de Iguatu, para acompanhar as obras da Transnordestina. Lá, terá a oportunidade de conversar com petistas sobre o impasse na capital cearense, já que há a expectativa para que haja uma definição do candidato à prefeitura de Fortaleza neste domingo, 7.
Diante da disputa entre cinco pré-candidatos (Evandro Leitão, Luizianne Lins, Larissa Gaspar, Guilherme Sampaio e Artur Bruno), o PT decidiu pela escolha dos filiados. Militantes petistas poderão votar em sete chapas que elegerão 200 delegados do partido. Esse grupo que escolherá o indicado da sigla à prefeitura de Fortaleza, no dia 21 de abril.
A porcentagem dos votos que cada chapa receber indicará a proporção que cada grupo terá entre os 200 delegados.
A principal contenda está entre dois nomes: o presidente da Assembleia Legislativa do Ceará, Evandro Leitão, e a deputada federal Luizianne Lins.
Luizianne é uma petista histórica, já foi prefeita de Fortaleza por duas vezes, tem o apoio das bases mais à esquerda do PT no Ceará, mas não tem o favoritismo. Evandro migrou do PDT para o PT no final do ano passado, mas tem o apoio de todas as maiores lideranças petistas no Estado.
Luizianne diz que há “interferências diversas” no PT contra a pré-candidatura dela e até ventila a possibilidade de sair, dependendo do resultado no domingo.
“Vamos estar de olho domingo no processo eleitoral. Tivemos interferência concretas, das mais diversas”, afirmou a deputada, em entrevista ao jornal cearense O Povo.
A depender desse processo, adicionou Luizianne, ela poderá procurar outro partido. “A gente sempre tem que ter esperança que a gente vai preservar o partido de todas essas questões. E por isso estou mantendo a candidatura. Tudo vai depender de como vai se dar o processo”, disse.
Das sete chapas, quatro manifestaram apoio a Evandro — entre elas uma que é comandada pelo líder do governo na Câmara dos Deputados, José Guimarães (PT-CE).
O ministro da Educação e principal figura política no Estado, Camilo Santana, também apoia Evandro nos bastidores. Todos os demais candidatos são apoiados por apenas uma chapa.
Evandro disse ao Estadão que o PT tem “tradição democrática” e por isso o grupo se manterá unido. Ele também sinaliza alinhamento a Camilo.
“Acredito que o projeto político do qual faço parte, liderado pelo presidente Lula, pelo ministro Camilo Santana e pelo governador Elmano de Freitas, pode replicar em Fortaleza uma gestão construída pelo diálogo”, afirmou. “Estou muito honrado e feliz pela receptividade dos filiados e filiadas do PT nos encontros.”
Essa é uma das contendas que Lula terá que ajudar a resolver, enquanto ele visita as obras da ferrovia Transnordestina, em Iguatu, na manhã desta sexta-feira. Será sua segunda ida para o Ceará apenas em 2024.
Houve polêmica na primeira ida, em janeiro. Luizianne não foi ao palco com Lula porque disse ter sido barrada em um episódio passado. Ela classificou o tratamento como “violência política”.
Já em Iguatu a situação é ainda mais crítica. O diretório do PT no Ceará filiou Ilo Neto, filho do deputado estadual Agenor Neto (MDB), e deverá indicá-lo à prefeitura da cidade. O diretório municipal já tinha um nome definido e publicou uma nota de repúdio.
Neste texto, o diretório do PT em Iguatu chama Ilo Neto de “bolsonarista” e reitera o apoio à candidatura a José de Sá Vilarouca, que já estava consolidado. Em protesto, Vilarouca optou por desfiliar-se do PT e migrou para o PSB, do senador Cid Gomes (CE).
“Sá sempre esteve em defesa do presidente Lula. Agora o deputado oligarca quer impor a filiação e candidatura do filho pelo PT, causando revolta e indignação dos filiados e militantes”, escreveu o presidente do diretório municipal, Claudemir Brito da Silva, na nota. “Esse acordo não incluiu o povo de Iguatu.”
Contra a vontade do PT em Reriutaba, o PT do Ceará filiou Osvaldo Neto, ex-pedetista, para lançá-lo à prefeitura. Antes, o diretório municipal optou, por unanimidade, apoiar o atual prefeito, Pedro Humberto (PSB).
“A gente se sente traído. Não tivemos a oportunidade de nos defender”, afirmou Clerton Furtado, presidente do diretório do PT em Reriutaba, em live no Instagram nesta quinta-feira. Ele gravou uma transmissão com Deodato Ramalho, superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no Ceará, um petista histórico.
“A gente vê toda essa militância atropelada por essas novas pessoas, que não estão vendo a qualidade partidária, mas a quantidade. Pessoas oportunistas querendo vir para o partido, apenas para pleitear a imagem ao lado de Lula e Elmano”, queixou-se Deodato nessa live.
Como mostrou o Estadão, o PT tem cenário favorável rumo às eleições municipais no Ceará. O partido se aproveitou de uma grande briga no PDT, principal partido no Estado, para incorporar em sua sigla pedetistas revoltos que optaram por abandonar o barco.
Em Fortaleza, os petistas deverão enfrentar uma das eleições municipais mais disputadas em uma capital brasileira neste ano.
O atual prefeito José Sarto (PDT) tentará a reeleição, enquanto a oposição à direita vem com três nomes, com dois aliados mais próximos do ex-presidente Jair Bolsonaro entre eles: Capitão Wagner (União), André Fernandes (PL) e Eduardo Girão (Novo).