Quando o marechal alemão Wilhelm Keitel chegou em 9 de maio de 1945 para assinar em Berlim a rendição alemã, como exigido pelos russos, viu a bandeira francesa hasteada ao lado dos estandartes dos outros vencedores. O militar deixou escapar: “Só me faltava essa”. Keitel estivera na assinatura da rendição francesa em 1940 e não se conteve diante da cena. Essa deve ter sido a reação de Jair Bolsonaro ao olhar as redes sociais domingo à noite. Ali era possível ver desafetos, como os deputados federais Alexandre Frota e Joice Hasselmann, comemorando a derrota do presidente diante de seus milhares de seguidores nas redes sociais.
Com eles faziam coro antigos apoiadores do presidente, como o humorista Danilo Gentili, com seus 17 milhões de seguidores no Twitter. Não foram apenas empresários, banqueiros, advogados que votavam no PSDB que foram alienados pela postura agressiva de Bolsonaro. Ela também conseguiu unir contra o capitão diversos influenciadores digitais, como Felipe Neto (15,3 milhões de seguidores no Twitter), que no passado estiveram ao lado do derrotado nas manifestações pelo impeachment de Dilma Rousseff, em 2016.
Felipe Neto chegou a ser importunado por bolsonaristas em casa, que tentaram fabricar contra ele uma acusação falsa de pedofilia, mesmo expediente usado contra Danilo Gentili. Muito mais do que um aprendizado da esquerda ou do PT para enfrentar a artilharia digital dos Bolsonaro, quem construiu o muro que se mostrou decisivo para a campanha de Lula contra o presidente foi o próprio bolsonarismo com sua virulência e sua capacidade para se indispor com possíveis aliados.
Outro caso é o deputado federal André Janones (Avante-MG, 711 mil seguidores no Twitter). Em São Paulo, seu partido ganhou a adesão do deputado estadual Campos Machado, uma antiga liderança do PTB desalojado da sigla por Roberto Jefferson, o aliado que Bolsonaro conservou até que os tiros nos agentes federais o obrigaram a chamá-lo de bandido. Amigo de Alckmin, Machado não conseguiu se reeleger, mas seu colega de partido se tornou peça fundamental, uma espécie de band-aid encontrado pelo PT para contra-atacar o presidente nas redes sociais, um teatro de operações dominado pelo bolsonarismo em 2018.
Essa foi a solução encontrada pelo petismo: buscar influencers, esses novos militantes dos partidos digitais, para recrutá-los como os soldados que lhe faltava nessa guerra. E, assim, a estratégia bolsonarista de atordoamento nas redes sociais não conseguiu evitar que temas desconfortáveis ao presidente tomassem conta do debate público, como o vídeo das meninas venezuelanas, os planos de Paulo Guedes para desatrelar o aumento do salário-mínimo da inflação e o episódio envolvendo o ex-deputado Jefferson. Todos colocaram Bolsonaro na defensiva, o que pode ter sido fatal em uma eleição decidida por uma vantagem de pouco mais de 2 milhões de votos.
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Na noite de sábado, até mesmo o general Eduardo Villas Bôas voltou a tuitar. Mais uma vez na véspera de um evento decisivo, ele tentava virar votos a favor de Bolsonaro. Disse que esperava de um governo da oposição o desmonte de estruturas produtivas, a volta do desemprego compensado por programas sociais demagógicos e a submissão ao globalismo, com a perda da identidade nacional, além da contaminação ideológica do ensino, do uso da mentira, da disfunção das instituições e do desrespeito à Constituição.
Não se sabe o que o general acha do Auxílio Brasil e dos gastos do governo Bolsonaro às vésperas da eleição. Não se sabe ainda o que o general acha da afirmação feita pelo general Leônidas Pires Gonçalves de que Bolsonaro era mentiroso ou a opinião do ex-comandante do Exército sobre os atritos entre Bolsonaro, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). Também não disse palavra sobre medidas contrárias à Constituição adotadas por Bolsonaro, muitas delas derrubadas pelo STF, como os ataques à autonomia universitária, ou a tentativa de se mudar a composição da Corte, como a feita durante a Reforma da Previdência, quando o governo tentou retirar da Carta Magna o limite de idade para os ministros.
Enfim, o resultado das urnas eletrônicas mostrou ao general, que tem 917 mil seguidores no Twitter, que é mais fácil influenciar o julgamento de 11 magistrados do que o de milhões de eleitores. Símbolo da volta dos militares à política ao tuitar contra a impunidade na véspera do julgamento do habeas corpus de Lula, no STF, em 2018, a nova entrada em cena de Villas Bôas caiu no vazio. Sua publicação teve o mesmo número de compartilhamentos de uma das muitas feitas por Janones no mesmo dia. O bolsonarismo começava a lamentar a derrota que se avizinhava. O lulismo comemorava a vitória sobre o adversário.
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