As relações entre o Poder Civil e o poder Militar

Dallagnol diverge de procuradores da Lava Jato sobre escândalo das joias que atinge Bolsonaro


Enquanto antigos integrantes da força-tarefa em Curitiba e em Brasília veem fortes indícios de crime, o deputado federal Deltan Dallagnol prefere lembrar de presentes de Lula e Dilma Rousseff

Por Marcelo Godoy
Atualização: Correção:

A descoberta que Jair Bolsonaro e a equipe do almirante Bento Albuquerque tentaram fazer passar pela alfândega uma muamba de R$ 16 milhões e, depois, se apropriar das joias das arábias, mobilizando uma força-tarefa que incluiu até o chefe da Receita Federal para pôr as mãos no tesouro que pertence ao Estado brasileiro, dividiu ex-integrantes da força-tarefa da Lava Jato e do Ministério Público Federal (MPF), opondo o agora deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) aos seus antigos colegas.

A Polícia Federal descobriu que o segundo pacote das joias sauditas, de paradeiro até então desconhecido, foi listado como acervo privado do ex-presidente Jair Bolsonaro Foto: Reprodução/TV GLOBO

Vladimir Aras, Monique Cheker e Bruno Calabrich destacaram em suas manifestações a apreensão das joias, o comportamento exemplar dos funcionários da alfândega e enxergaram indícios de crimes cometidos pelo ex-presidente, pelo almirante e por Julio Cesar Vieira Gomes, então chefe da Receita. Enquanto os três colocaram toda a ênfase nas condutas reveladas pelos jornalistas Adriana Fernandes e André Borges, do Estadão, Dallagnol resolveu atacar o que chamou de oportunismo da esquerda no caso.

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A manifestação do agora deputado destoa das opiniões dos colegas sobre o escândalo que ameaça mandar Bolsonaro para a cadeia. Após o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) defender que as joias tinham caráter personalíssimo, daí porque foram parar nas gavetas do pai, Monique Cheker escreveu em sua conta no Twitter no dia 9 de março: “Essa situação jurídica intermediária não existe. Ou é privado e a pessoa tem de pagar a tributação ou é público, com imunidade, e não pode ficar em posse privada”.

No mesmo dia, ela publicou: “Quem importa um bem sem pagar a tributação devida, já fora da zona primária, deve ter o bem apreendido pela Polícia ou Receita Federal, além de ser processado por descaminho. Essa é a lei. Não há segunda chance.” Traduzindo: para Monique, a única tarefa do procurador do caso será definir a tipificação, pois crime houve. Se era presente particular tinha de pagar imposto. Neste caso, o crime é o descaminho, com pena de 1 a 4 anos de cadeia. Se era presente de Estado, o crime é peculato, com pena de 2 a 12 anos.

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No dia 6 de março, o procurador Bruno Calabrich, outro veterano da Lava Jato, escreveu: “Peculato, descaminho e lavagem de dinheiro: está correto o enquadramento dado pelo ministro Flávio Dino. Fatos graves e que precisam ser investigados. Atribuição do MPF e competência da Justiça Federal em São Paulo, onde foi feita a apreensão”. Dois dias depois, voltou ao tema: “Favor entregar dois troféus ao auditor da Receita Federal (o primeiro por motivos óbvios e o segundo caso ele perca o primeiro)”.

Calabrich comentava então o vídeo que mostrava o momento em que o enviado de Jair Bolsonaro – o sargento Jairo Moreira da Silva – tentava se apossar das joias das arábias, em Guarulhos, a apenas três dias do fim do governo. Como demonstraram os repórteres do Estadão, naquele momento a Receita já havia decretado o perdimento dos bens, portanto o tesouro era propriedade do Estado Brasileiro.

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Já o procurador-regional da República Vladimir Aras, que foi secretário de cooperação internacional do MPF, de 2013 a 2017, comentou a postura de ex-chefe da Receita, que em parceria com o gabinete de Bolsonaro tentou ajudar o presidente a se apoderar das joias. “SOLICITO ATENDER. Foi educado...”, escreveu Aras. Por fim, diante das justificativas de Bolsonaro de que os diamantes eram parte de seu acervo privado, Monique Cheker voltou à carga. “Patrimonialismo. Confusão entre bens públicos e privados. Os livros e manuais sobre corrupção tratam disso de forma bem clara.”

As opiniões dos três não são únicas no MPF. A coluna ouviu dois subprocuradores-gerais da República – que pediram reserva –sobre os delitos supostamente cometidos por Bolsonaro e seus camaradas. Eles listam o descaminho ou peculato no caso do segundo pacote, aquele com presentes de R$ 400 mil que estão com o ex-presidente. Sobre as jóias para madame Bolsonaro, o crime seria tentado. No caso das investidas para se liberar a muamba de R$ 16 milhões retida pela Receita, pode-se estar diante do abuso de poder do artigo 33 da lei 13.869, que diz sobre a carteirada: “Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de fazer ou não fazer, sem expresso amparo legal”. A pena é de 6 meses a 2 anos de cadeia.

Também haveria advocacia administrativa dos que promoveram interesses privados do presidente na administração pública e o peculato pelo uso do combustível do avião da FAB que levou o sargento Jairo, designado pelo tenente-coronel Mauro César Cid – esse vai ganhar música no Fantástico – até Guarulhos para nova carteirada. E tudo sem esquecer, na área cível, a improbidade administrativa pelo uso do avião. Bolsonaro arriscaria penas que, somadas, podem ir de 5 a 25 anos de prisão. Não se trataria de bagatela, mas de condutas graves – praticadas com dolo intenso por quem devia dar exemplo aos brasileiros, o primeiro mandatário do País – que não podem ser tratadas em um acordo de não persecução penal.

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Já Dallagnol abordou o caso de outra perspectiva. Hoje deputado federal, ele preferiu pôr sua ênfase, em artigo na Gazeta do Povo, nas investigações sobre os presentes recebidos por Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, caso arquivado em 2020, e mostrar cautela sobre Bolsonaro. “A quem pertencem as joias dadas ao ex-presidente Bolsonaro pelo regime da Arábia Saudita? Houve ou não houve sua indevida apropriação? Ocorreu um crime de sonegação de tributos no ingresso das joias no Brasil? Aconteceu algum outro crime na tentativa de reaver as joias retidas pela Receita Federal?” E conclui: “Sempre que houver a comprovação de crimes, devem ser punidos, seja quem for o criminoso e sua cor partidária”.

Deltan Dallagnol durante sua exposição no plenário da Câmara dos Deputados. Foto: André Dusek/Estadão

Dallagnol tem razão em tudo o que escreve. É notável, porém, a diferença entre o procurador do passado e o deputado do presente. Em 2011, ele quis prender Lula em flagrante por peculato por um crucifixo que se provou pertencer ao petista. Agora constata o que chama de “gritaria seletiva da esquerda” ou “punitivismo seletivo” e demonstra uma nova face: a de garantista. A descoberta de que é preciso prudência no processo penal em nome da Justiça deve ser comemorada. E nada mais alvissareiro do que personagens como Dallagnol reconhecerem a importância do devido processo legal. Este é uma conquista da civilização. Ainda assim, é impossível desprezar a diferença entre o que o deputado e seus antigos colegas enfatizam.

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Plutarco se deliciaria com as vidas paralelas dos ilustres varões do Ministério Público. Talvez se inspirasse na comparação entre Sólon e Publícola para tratar do doutor Dallagnol e de seus colegas. O historiador grego disse que a ideia de criar questores para guardar o tesouro público veio a Publícola do desejo de deixar aos cônsules honestos tempo necessário para se ocuparem dos negócios importantes e de tirar dos desonestos a possibilidade de cometerem injustiças ainda maiores, já que seriam ao mesmo tempo senhores dos negócios públicos e do Erário. Eis que o combate à corrupção é preocupação antiga.

Plutarco também afirmou que o romano “odiou mais os tiranos que Sólon”. “Se alguém aspirasse à tirania, este conduzia ao tribunal o culpado preso em flagrante, ao passo que aquele permitia que fosse morto antes de ser julgado”. Pode-se dizer que Dallagnol sempre rejeitou essa espécie de jacobinismo avant la lettre de Publícola, que faria a delícia do Robespierre. No discurso Sobre o Julgamento do Rei, de 1792, o francês escreveu: “Os povos não julgam como as cortes judiciais; não proferem sentenças, eles lançam o raio; não condenam os reis, eles o mergulham no nada; e essa justiça é tão boa quanto a dos tribunais”.

O Dallagnol da Lava Jato preferia Sólon e a prisão em flagrante. E aparentava odiar mais os corruptos do que os tiranos. Já o deputado parece que vai pedir uma carteira ao grupo Prerrogativas ao sugerir que as joias de R$ 16 milhões devem ter o mesmo julgamento dos 74 presentes perdidos por Lula, cujos valores somavam R$ 199,4 mil. Ao rebater os que procuraram sua opinião sobre o caso do candidato por ele apoiado à Presidência, o doutor repetiu a reação do bolsonarismo vulgar ao minimizar os malfeitos do Jair: “E o PT?”

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Ele concluiu: “É, portanto, uma hipocrisia que petistas defensores e aliados de Lula fechem os olhos para os desvios comprovados, praticados por Lula, para atacar fatos ainda não completamente esclarecidos que, na pior das hipóteses, são igualmente repreensíveis, relacionados a Bolsonaro”. Nessa briga, todos parecem crer que seu pano passa melhor por ser mais limpo. Deviam saber que a lei não é um instrumento a serviço de conveniências partidárias e pessoais. Já a ênfase da opinião do deputado, diversa dos demais procuradores, tem explicação: uns permaneceram onde sempre estiveram, fiscalizando o cumprimento da lei; já o doutor Dallagnol mudou de lado: agora, é só mais um político a ser fiscalizado.

A descoberta que Jair Bolsonaro e a equipe do almirante Bento Albuquerque tentaram fazer passar pela alfândega uma muamba de R$ 16 milhões e, depois, se apropriar das joias das arábias, mobilizando uma força-tarefa que incluiu até o chefe da Receita Federal para pôr as mãos no tesouro que pertence ao Estado brasileiro, dividiu ex-integrantes da força-tarefa da Lava Jato e do Ministério Público Federal (MPF), opondo o agora deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) aos seus antigos colegas.

A Polícia Federal descobriu que o segundo pacote das joias sauditas, de paradeiro até então desconhecido, foi listado como acervo privado do ex-presidente Jair Bolsonaro Foto: Reprodução/TV GLOBO

Vladimir Aras, Monique Cheker e Bruno Calabrich destacaram em suas manifestações a apreensão das joias, o comportamento exemplar dos funcionários da alfândega e enxergaram indícios de crimes cometidos pelo ex-presidente, pelo almirante e por Julio Cesar Vieira Gomes, então chefe da Receita. Enquanto os três colocaram toda a ênfase nas condutas reveladas pelos jornalistas Adriana Fernandes e André Borges, do Estadão, Dallagnol resolveu atacar o que chamou de oportunismo da esquerda no caso.

A manifestação do agora deputado destoa das opiniões dos colegas sobre o escândalo que ameaça mandar Bolsonaro para a cadeia. Após o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) defender que as joias tinham caráter personalíssimo, daí porque foram parar nas gavetas do pai, Monique Cheker escreveu em sua conta no Twitter no dia 9 de março: “Essa situação jurídica intermediária não existe. Ou é privado e a pessoa tem de pagar a tributação ou é público, com imunidade, e não pode ficar em posse privada”.

No mesmo dia, ela publicou: “Quem importa um bem sem pagar a tributação devida, já fora da zona primária, deve ter o bem apreendido pela Polícia ou Receita Federal, além de ser processado por descaminho. Essa é a lei. Não há segunda chance.” Traduzindo: para Monique, a única tarefa do procurador do caso será definir a tipificação, pois crime houve. Se era presente particular tinha de pagar imposto. Neste caso, o crime é o descaminho, com pena de 1 a 4 anos de cadeia. Se era presente de Estado, o crime é peculato, com pena de 2 a 12 anos.

No dia 6 de março, o procurador Bruno Calabrich, outro veterano da Lava Jato, escreveu: “Peculato, descaminho e lavagem de dinheiro: está correto o enquadramento dado pelo ministro Flávio Dino. Fatos graves e que precisam ser investigados. Atribuição do MPF e competência da Justiça Federal em São Paulo, onde foi feita a apreensão”. Dois dias depois, voltou ao tema: “Favor entregar dois troféus ao auditor da Receita Federal (o primeiro por motivos óbvios e o segundo caso ele perca o primeiro)”.

Calabrich comentava então o vídeo que mostrava o momento em que o enviado de Jair Bolsonaro – o sargento Jairo Moreira da Silva – tentava se apossar das joias das arábias, em Guarulhos, a apenas três dias do fim do governo. Como demonstraram os repórteres do Estadão, naquele momento a Receita já havia decretado o perdimento dos bens, portanto o tesouro era propriedade do Estado Brasileiro.

Já o procurador-regional da República Vladimir Aras, que foi secretário de cooperação internacional do MPF, de 2013 a 2017, comentou a postura de ex-chefe da Receita, que em parceria com o gabinete de Bolsonaro tentou ajudar o presidente a se apoderar das joias. “SOLICITO ATENDER. Foi educado...”, escreveu Aras. Por fim, diante das justificativas de Bolsonaro de que os diamantes eram parte de seu acervo privado, Monique Cheker voltou à carga. “Patrimonialismo. Confusão entre bens públicos e privados. Os livros e manuais sobre corrupção tratam disso de forma bem clara.”

As opiniões dos três não são únicas no MPF. A coluna ouviu dois subprocuradores-gerais da República – que pediram reserva –sobre os delitos supostamente cometidos por Bolsonaro e seus camaradas. Eles listam o descaminho ou peculato no caso do segundo pacote, aquele com presentes de R$ 400 mil que estão com o ex-presidente. Sobre as jóias para madame Bolsonaro, o crime seria tentado. No caso das investidas para se liberar a muamba de R$ 16 milhões retida pela Receita, pode-se estar diante do abuso de poder do artigo 33 da lei 13.869, que diz sobre a carteirada: “Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de fazer ou não fazer, sem expresso amparo legal”. A pena é de 6 meses a 2 anos de cadeia.

Também haveria advocacia administrativa dos que promoveram interesses privados do presidente na administração pública e o peculato pelo uso do combustível do avião da FAB que levou o sargento Jairo, designado pelo tenente-coronel Mauro César Cid – esse vai ganhar música no Fantástico – até Guarulhos para nova carteirada. E tudo sem esquecer, na área cível, a improbidade administrativa pelo uso do avião. Bolsonaro arriscaria penas que, somadas, podem ir de 5 a 25 anos de prisão. Não se trataria de bagatela, mas de condutas graves – praticadas com dolo intenso por quem devia dar exemplo aos brasileiros, o primeiro mandatário do País – que não podem ser tratadas em um acordo de não persecução penal.

Já Dallagnol abordou o caso de outra perspectiva. Hoje deputado federal, ele preferiu pôr sua ênfase, em artigo na Gazeta do Povo, nas investigações sobre os presentes recebidos por Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, caso arquivado em 2020, e mostrar cautela sobre Bolsonaro. “A quem pertencem as joias dadas ao ex-presidente Bolsonaro pelo regime da Arábia Saudita? Houve ou não houve sua indevida apropriação? Ocorreu um crime de sonegação de tributos no ingresso das joias no Brasil? Aconteceu algum outro crime na tentativa de reaver as joias retidas pela Receita Federal?” E conclui: “Sempre que houver a comprovação de crimes, devem ser punidos, seja quem for o criminoso e sua cor partidária”.

Deltan Dallagnol durante sua exposição no plenário da Câmara dos Deputados. Foto: André Dusek/Estadão

Dallagnol tem razão em tudo o que escreve. É notável, porém, a diferença entre o procurador do passado e o deputado do presente. Em 2011, ele quis prender Lula em flagrante por peculato por um crucifixo que se provou pertencer ao petista. Agora constata o que chama de “gritaria seletiva da esquerda” ou “punitivismo seletivo” e demonstra uma nova face: a de garantista. A descoberta de que é preciso prudência no processo penal em nome da Justiça deve ser comemorada. E nada mais alvissareiro do que personagens como Dallagnol reconhecerem a importância do devido processo legal. Este é uma conquista da civilização. Ainda assim, é impossível desprezar a diferença entre o que o deputado e seus antigos colegas enfatizam.

Plutarco se deliciaria com as vidas paralelas dos ilustres varões do Ministério Público. Talvez se inspirasse na comparação entre Sólon e Publícola para tratar do doutor Dallagnol e de seus colegas. O historiador grego disse que a ideia de criar questores para guardar o tesouro público veio a Publícola do desejo de deixar aos cônsules honestos tempo necessário para se ocuparem dos negócios importantes e de tirar dos desonestos a possibilidade de cometerem injustiças ainda maiores, já que seriam ao mesmo tempo senhores dos negócios públicos e do Erário. Eis que o combate à corrupção é preocupação antiga.

Plutarco também afirmou que o romano “odiou mais os tiranos que Sólon”. “Se alguém aspirasse à tirania, este conduzia ao tribunal o culpado preso em flagrante, ao passo que aquele permitia que fosse morto antes de ser julgado”. Pode-se dizer que Dallagnol sempre rejeitou essa espécie de jacobinismo avant la lettre de Publícola, que faria a delícia do Robespierre. No discurso Sobre o Julgamento do Rei, de 1792, o francês escreveu: “Os povos não julgam como as cortes judiciais; não proferem sentenças, eles lançam o raio; não condenam os reis, eles o mergulham no nada; e essa justiça é tão boa quanto a dos tribunais”.

O Dallagnol da Lava Jato preferia Sólon e a prisão em flagrante. E aparentava odiar mais os corruptos do que os tiranos. Já o deputado parece que vai pedir uma carteira ao grupo Prerrogativas ao sugerir que as joias de R$ 16 milhões devem ter o mesmo julgamento dos 74 presentes perdidos por Lula, cujos valores somavam R$ 199,4 mil. Ao rebater os que procuraram sua opinião sobre o caso do candidato por ele apoiado à Presidência, o doutor repetiu a reação do bolsonarismo vulgar ao minimizar os malfeitos do Jair: “E o PT?”

Ele concluiu: “É, portanto, uma hipocrisia que petistas defensores e aliados de Lula fechem os olhos para os desvios comprovados, praticados por Lula, para atacar fatos ainda não completamente esclarecidos que, na pior das hipóteses, são igualmente repreensíveis, relacionados a Bolsonaro”. Nessa briga, todos parecem crer que seu pano passa melhor por ser mais limpo. Deviam saber que a lei não é um instrumento a serviço de conveniências partidárias e pessoais. Já a ênfase da opinião do deputado, diversa dos demais procuradores, tem explicação: uns permaneceram onde sempre estiveram, fiscalizando o cumprimento da lei; já o doutor Dallagnol mudou de lado: agora, é só mais um político a ser fiscalizado.

A descoberta que Jair Bolsonaro e a equipe do almirante Bento Albuquerque tentaram fazer passar pela alfândega uma muamba de R$ 16 milhões e, depois, se apropriar das joias das arábias, mobilizando uma força-tarefa que incluiu até o chefe da Receita Federal para pôr as mãos no tesouro que pertence ao Estado brasileiro, dividiu ex-integrantes da força-tarefa da Lava Jato e do Ministério Público Federal (MPF), opondo o agora deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) aos seus antigos colegas.

A Polícia Federal descobriu que o segundo pacote das joias sauditas, de paradeiro até então desconhecido, foi listado como acervo privado do ex-presidente Jair Bolsonaro Foto: Reprodução/TV GLOBO

Vladimir Aras, Monique Cheker e Bruno Calabrich destacaram em suas manifestações a apreensão das joias, o comportamento exemplar dos funcionários da alfândega e enxergaram indícios de crimes cometidos pelo ex-presidente, pelo almirante e por Julio Cesar Vieira Gomes, então chefe da Receita. Enquanto os três colocaram toda a ênfase nas condutas reveladas pelos jornalistas Adriana Fernandes e André Borges, do Estadão, Dallagnol resolveu atacar o que chamou de oportunismo da esquerda no caso.

A manifestação do agora deputado destoa das opiniões dos colegas sobre o escândalo que ameaça mandar Bolsonaro para a cadeia. Após o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) defender que as joias tinham caráter personalíssimo, daí porque foram parar nas gavetas do pai, Monique Cheker escreveu em sua conta no Twitter no dia 9 de março: “Essa situação jurídica intermediária não existe. Ou é privado e a pessoa tem de pagar a tributação ou é público, com imunidade, e não pode ficar em posse privada”.

No mesmo dia, ela publicou: “Quem importa um bem sem pagar a tributação devida, já fora da zona primária, deve ter o bem apreendido pela Polícia ou Receita Federal, além de ser processado por descaminho. Essa é a lei. Não há segunda chance.” Traduzindo: para Monique, a única tarefa do procurador do caso será definir a tipificação, pois crime houve. Se era presente particular tinha de pagar imposto. Neste caso, o crime é o descaminho, com pena de 1 a 4 anos de cadeia. Se era presente de Estado, o crime é peculato, com pena de 2 a 12 anos.

No dia 6 de março, o procurador Bruno Calabrich, outro veterano da Lava Jato, escreveu: “Peculato, descaminho e lavagem de dinheiro: está correto o enquadramento dado pelo ministro Flávio Dino. Fatos graves e que precisam ser investigados. Atribuição do MPF e competência da Justiça Federal em São Paulo, onde foi feita a apreensão”. Dois dias depois, voltou ao tema: “Favor entregar dois troféus ao auditor da Receita Federal (o primeiro por motivos óbvios e o segundo caso ele perca o primeiro)”.

Calabrich comentava então o vídeo que mostrava o momento em que o enviado de Jair Bolsonaro – o sargento Jairo Moreira da Silva – tentava se apossar das joias das arábias, em Guarulhos, a apenas três dias do fim do governo. Como demonstraram os repórteres do Estadão, naquele momento a Receita já havia decretado o perdimento dos bens, portanto o tesouro era propriedade do Estado Brasileiro.

Já o procurador-regional da República Vladimir Aras, que foi secretário de cooperação internacional do MPF, de 2013 a 2017, comentou a postura de ex-chefe da Receita, que em parceria com o gabinete de Bolsonaro tentou ajudar o presidente a se apoderar das joias. “SOLICITO ATENDER. Foi educado...”, escreveu Aras. Por fim, diante das justificativas de Bolsonaro de que os diamantes eram parte de seu acervo privado, Monique Cheker voltou à carga. “Patrimonialismo. Confusão entre bens públicos e privados. Os livros e manuais sobre corrupção tratam disso de forma bem clara.”

As opiniões dos três não são únicas no MPF. A coluna ouviu dois subprocuradores-gerais da República – que pediram reserva –sobre os delitos supostamente cometidos por Bolsonaro e seus camaradas. Eles listam o descaminho ou peculato no caso do segundo pacote, aquele com presentes de R$ 400 mil que estão com o ex-presidente. Sobre as jóias para madame Bolsonaro, o crime seria tentado. No caso das investidas para se liberar a muamba de R$ 16 milhões retida pela Receita, pode-se estar diante do abuso de poder do artigo 33 da lei 13.869, que diz sobre a carteirada: “Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de fazer ou não fazer, sem expresso amparo legal”. A pena é de 6 meses a 2 anos de cadeia.

Também haveria advocacia administrativa dos que promoveram interesses privados do presidente na administração pública e o peculato pelo uso do combustível do avião da FAB que levou o sargento Jairo, designado pelo tenente-coronel Mauro César Cid – esse vai ganhar música no Fantástico – até Guarulhos para nova carteirada. E tudo sem esquecer, na área cível, a improbidade administrativa pelo uso do avião. Bolsonaro arriscaria penas que, somadas, podem ir de 5 a 25 anos de prisão. Não se trataria de bagatela, mas de condutas graves – praticadas com dolo intenso por quem devia dar exemplo aos brasileiros, o primeiro mandatário do País – que não podem ser tratadas em um acordo de não persecução penal.

Já Dallagnol abordou o caso de outra perspectiva. Hoje deputado federal, ele preferiu pôr sua ênfase, em artigo na Gazeta do Povo, nas investigações sobre os presentes recebidos por Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, caso arquivado em 2020, e mostrar cautela sobre Bolsonaro. “A quem pertencem as joias dadas ao ex-presidente Bolsonaro pelo regime da Arábia Saudita? Houve ou não houve sua indevida apropriação? Ocorreu um crime de sonegação de tributos no ingresso das joias no Brasil? Aconteceu algum outro crime na tentativa de reaver as joias retidas pela Receita Federal?” E conclui: “Sempre que houver a comprovação de crimes, devem ser punidos, seja quem for o criminoso e sua cor partidária”.

Deltan Dallagnol durante sua exposição no plenário da Câmara dos Deputados. Foto: André Dusek/Estadão

Dallagnol tem razão em tudo o que escreve. É notável, porém, a diferença entre o procurador do passado e o deputado do presente. Em 2011, ele quis prender Lula em flagrante por peculato por um crucifixo que se provou pertencer ao petista. Agora constata o que chama de “gritaria seletiva da esquerda” ou “punitivismo seletivo” e demonstra uma nova face: a de garantista. A descoberta de que é preciso prudência no processo penal em nome da Justiça deve ser comemorada. E nada mais alvissareiro do que personagens como Dallagnol reconhecerem a importância do devido processo legal. Este é uma conquista da civilização. Ainda assim, é impossível desprezar a diferença entre o que o deputado e seus antigos colegas enfatizam.

Plutarco se deliciaria com as vidas paralelas dos ilustres varões do Ministério Público. Talvez se inspirasse na comparação entre Sólon e Publícola para tratar do doutor Dallagnol e de seus colegas. O historiador grego disse que a ideia de criar questores para guardar o tesouro público veio a Publícola do desejo de deixar aos cônsules honestos tempo necessário para se ocuparem dos negócios importantes e de tirar dos desonestos a possibilidade de cometerem injustiças ainda maiores, já que seriam ao mesmo tempo senhores dos negócios públicos e do Erário. Eis que o combate à corrupção é preocupação antiga.

Plutarco também afirmou que o romano “odiou mais os tiranos que Sólon”. “Se alguém aspirasse à tirania, este conduzia ao tribunal o culpado preso em flagrante, ao passo que aquele permitia que fosse morto antes de ser julgado”. Pode-se dizer que Dallagnol sempre rejeitou essa espécie de jacobinismo avant la lettre de Publícola, que faria a delícia do Robespierre. No discurso Sobre o Julgamento do Rei, de 1792, o francês escreveu: “Os povos não julgam como as cortes judiciais; não proferem sentenças, eles lançam o raio; não condenam os reis, eles o mergulham no nada; e essa justiça é tão boa quanto a dos tribunais”.

O Dallagnol da Lava Jato preferia Sólon e a prisão em flagrante. E aparentava odiar mais os corruptos do que os tiranos. Já o deputado parece que vai pedir uma carteira ao grupo Prerrogativas ao sugerir que as joias de R$ 16 milhões devem ter o mesmo julgamento dos 74 presentes perdidos por Lula, cujos valores somavam R$ 199,4 mil. Ao rebater os que procuraram sua opinião sobre o caso do candidato por ele apoiado à Presidência, o doutor repetiu a reação do bolsonarismo vulgar ao minimizar os malfeitos do Jair: “E o PT?”

Ele concluiu: “É, portanto, uma hipocrisia que petistas defensores e aliados de Lula fechem os olhos para os desvios comprovados, praticados por Lula, para atacar fatos ainda não completamente esclarecidos que, na pior das hipóteses, são igualmente repreensíveis, relacionados a Bolsonaro”. Nessa briga, todos parecem crer que seu pano passa melhor por ser mais limpo. Deviam saber que a lei não é um instrumento a serviço de conveniências partidárias e pessoais. Já a ênfase da opinião do deputado, diversa dos demais procuradores, tem explicação: uns permaneceram onde sempre estiveram, fiscalizando o cumprimento da lei; já o doutor Dallagnol mudou de lado: agora, é só mais um político a ser fiscalizado.

A descoberta que Jair Bolsonaro e a equipe do almirante Bento Albuquerque tentaram fazer passar pela alfândega uma muamba de R$ 16 milhões e, depois, se apropriar das joias das arábias, mobilizando uma força-tarefa que incluiu até o chefe da Receita Federal para pôr as mãos no tesouro que pertence ao Estado brasileiro, dividiu ex-integrantes da força-tarefa da Lava Jato e do Ministério Público Federal (MPF), opondo o agora deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) aos seus antigos colegas.

A Polícia Federal descobriu que o segundo pacote das joias sauditas, de paradeiro até então desconhecido, foi listado como acervo privado do ex-presidente Jair Bolsonaro Foto: Reprodução/TV GLOBO

Vladimir Aras, Monique Cheker e Bruno Calabrich destacaram em suas manifestações a apreensão das joias, o comportamento exemplar dos funcionários da alfândega e enxergaram indícios de crimes cometidos pelo ex-presidente, pelo almirante e por Julio Cesar Vieira Gomes, então chefe da Receita. Enquanto os três colocaram toda a ênfase nas condutas reveladas pelos jornalistas Adriana Fernandes e André Borges, do Estadão, Dallagnol resolveu atacar o que chamou de oportunismo da esquerda no caso.

A manifestação do agora deputado destoa das opiniões dos colegas sobre o escândalo que ameaça mandar Bolsonaro para a cadeia. Após o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) defender que as joias tinham caráter personalíssimo, daí porque foram parar nas gavetas do pai, Monique Cheker escreveu em sua conta no Twitter no dia 9 de março: “Essa situação jurídica intermediária não existe. Ou é privado e a pessoa tem de pagar a tributação ou é público, com imunidade, e não pode ficar em posse privada”.

No mesmo dia, ela publicou: “Quem importa um bem sem pagar a tributação devida, já fora da zona primária, deve ter o bem apreendido pela Polícia ou Receita Federal, além de ser processado por descaminho. Essa é a lei. Não há segunda chance.” Traduzindo: para Monique, a única tarefa do procurador do caso será definir a tipificação, pois crime houve. Se era presente particular tinha de pagar imposto. Neste caso, o crime é o descaminho, com pena de 1 a 4 anos de cadeia. Se era presente de Estado, o crime é peculato, com pena de 2 a 12 anos.

No dia 6 de março, o procurador Bruno Calabrich, outro veterano da Lava Jato, escreveu: “Peculato, descaminho e lavagem de dinheiro: está correto o enquadramento dado pelo ministro Flávio Dino. Fatos graves e que precisam ser investigados. Atribuição do MPF e competência da Justiça Federal em São Paulo, onde foi feita a apreensão”. Dois dias depois, voltou ao tema: “Favor entregar dois troféus ao auditor da Receita Federal (o primeiro por motivos óbvios e o segundo caso ele perca o primeiro)”.

Calabrich comentava então o vídeo que mostrava o momento em que o enviado de Jair Bolsonaro – o sargento Jairo Moreira da Silva – tentava se apossar das joias das arábias, em Guarulhos, a apenas três dias do fim do governo. Como demonstraram os repórteres do Estadão, naquele momento a Receita já havia decretado o perdimento dos bens, portanto o tesouro era propriedade do Estado Brasileiro.

Já o procurador-regional da República Vladimir Aras, que foi secretário de cooperação internacional do MPF, de 2013 a 2017, comentou a postura de ex-chefe da Receita, que em parceria com o gabinete de Bolsonaro tentou ajudar o presidente a se apoderar das joias. “SOLICITO ATENDER. Foi educado...”, escreveu Aras. Por fim, diante das justificativas de Bolsonaro de que os diamantes eram parte de seu acervo privado, Monique Cheker voltou à carga. “Patrimonialismo. Confusão entre bens públicos e privados. Os livros e manuais sobre corrupção tratam disso de forma bem clara.”

As opiniões dos três não são únicas no MPF. A coluna ouviu dois subprocuradores-gerais da República – que pediram reserva –sobre os delitos supostamente cometidos por Bolsonaro e seus camaradas. Eles listam o descaminho ou peculato no caso do segundo pacote, aquele com presentes de R$ 400 mil que estão com o ex-presidente. Sobre as jóias para madame Bolsonaro, o crime seria tentado. No caso das investidas para se liberar a muamba de R$ 16 milhões retida pela Receita, pode-se estar diante do abuso de poder do artigo 33 da lei 13.869, que diz sobre a carteirada: “Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de fazer ou não fazer, sem expresso amparo legal”. A pena é de 6 meses a 2 anos de cadeia.

Também haveria advocacia administrativa dos que promoveram interesses privados do presidente na administração pública e o peculato pelo uso do combustível do avião da FAB que levou o sargento Jairo, designado pelo tenente-coronel Mauro César Cid – esse vai ganhar música no Fantástico – até Guarulhos para nova carteirada. E tudo sem esquecer, na área cível, a improbidade administrativa pelo uso do avião. Bolsonaro arriscaria penas que, somadas, podem ir de 5 a 25 anos de prisão. Não se trataria de bagatela, mas de condutas graves – praticadas com dolo intenso por quem devia dar exemplo aos brasileiros, o primeiro mandatário do País – que não podem ser tratadas em um acordo de não persecução penal.

Já Dallagnol abordou o caso de outra perspectiva. Hoje deputado federal, ele preferiu pôr sua ênfase, em artigo na Gazeta do Povo, nas investigações sobre os presentes recebidos por Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, caso arquivado em 2020, e mostrar cautela sobre Bolsonaro. “A quem pertencem as joias dadas ao ex-presidente Bolsonaro pelo regime da Arábia Saudita? Houve ou não houve sua indevida apropriação? Ocorreu um crime de sonegação de tributos no ingresso das joias no Brasil? Aconteceu algum outro crime na tentativa de reaver as joias retidas pela Receita Federal?” E conclui: “Sempre que houver a comprovação de crimes, devem ser punidos, seja quem for o criminoso e sua cor partidária”.

Deltan Dallagnol durante sua exposição no plenário da Câmara dos Deputados. Foto: André Dusek/Estadão

Dallagnol tem razão em tudo o que escreve. É notável, porém, a diferença entre o procurador do passado e o deputado do presente. Em 2011, ele quis prender Lula em flagrante por peculato por um crucifixo que se provou pertencer ao petista. Agora constata o que chama de “gritaria seletiva da esquerda” ou “punitivismo seletivo” e demonstra uma nova face: a de garantista. A descoberta de que é preciso prudência no processo penal em nome da Justiça deve ser comemorada. E nada mais alvissareiro do que personagens como Dallagnol reconhecerem a importância do devido processo legal. Este é uma conquista da civilização. Ainda assim, é impossível desprezar a diferença entre o que o deputado e seus antigos colegas enfatizam.

Plutarco se deliciaria com as vidas paralelas dos ilustres varões do Ministério Público. Talvez se inspirasse na comparação entre Sólon e Publícola para tratar do doutor Dallagnol e de seus colegas. O historiador grego disse que a ideia de criar questores para guardar o tesouro público veio a Publícola do desejo de deixar aos cônsules honestos tempo necessário para se ocuparem dos negócios importantes e de tirar dos desonestos a possibilidade de cometerem injustiças ainda maiores, já que seriam ao mesmo tempo senhores dos negócios públicos e do Erário. Eis que o combate à corrupção é preocupação antiga.

Plutarco também afirmou que o romano “odiou mais os tiranos que Sólon”. “Se alguém aspirasse à tirania, este conduzia ao tribunal o culpado preso em flagrante, ao passo que aquele permitia que fosse morto antes de ser julgado”. Pode-se dizer que Dallagnol sempre rejeitou essa espécie de jacobinismo avant la lettre de Publícola, que faria a delícia do Robespierre. No discurso Sobre o Julgamento do Rei, de 1792, o francês escreveu: “Os povos não julgam como as cortes judiciais; não proferem sentenças, eles lançam o raio; não condenam os reis, eles o mergulham no nada; e essa justiça é tão boa quanto a dos tribunais”.

O Dallagnol da Lava Jato preferia Sólon e a prisão em flagrante. E aparentava odiar mais os corruptos do que os tiranos. Já o deputado parece que vai pedir uma carteira ao grupo Prerrogativas ao sugerir que as joias de R$ 16 milhões devem ter o mesmo julgamento dos 74 presentes perdidos por Lula, cujos valores somavam R$ 199,4 mil. Ao rebater os que procuraram sua opinião sobre o caso do candidato por ele apoiado à Presidência, o doutor repetiu a reação do bolsonarismo vulgar ao minimizar os malfeitos do Jair: “E o PT?”

Ele concluiu: “É, portanto, uma hipocrisia que petistas defensores e aliados de Lula fechem os olhos para os desvios comprovados, praticados por Lula, para atacar fatos ainda não completamente esclarecidos que, na pior das hipóteses, são igualmente repreensíveis, relacionados a Bolsonaro”. Nessa briga, todos parecem crer que seu pano passa melhor por ser mais limpo. Deviam saber que a lei não é um instrumento a serviço de conveniências partidárias e pessoais. Já a ênfase da opinião do deputado, diversa dos demais procuradores, tem explicação: uns permaneceram onde sempre estiveram, fiscalizando o cumprimento da lei; já o doutor Dallagnol mudou de lado: agora, é só mais um político a ser fiscalizado.

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