Antissemitas geniais


A Orquestra de Câmara de Israel surpreendeu ao anunciar que vai executar "Siegfried", de Wagner, em Bayreuth. Como se sabe, o antissemita Wagner era o compositor favorito de Hitler, razão pela qual é proscrito em Israel. A decisão de uma orquestra israelense de tocá-lo, e justamente em Bayreuth, símbolo wagneriano amado pelo líder do Terceiro Reich, é, portanto, histórica.

"Sei que parte da visão de mundo de Wagner e a relação de Bayreuth com o regime nazista não podem ser justificadas nem apagadas", disse Roberto Pasternostro, diretor musical da orquestra, à revista Der Spiegel. "Ainda assim, estou convencido de que é possível abordar o significado musical de Wagner em uma nova e sofisticada forma para a geração que amadurece, sem ignorar o fardo ou a responsabilidade histórica."

Apesar da tentativa de Pasternostro de racionalizar o caso, a notícia foi muito mal digerida em Israel, diz a Spiegel. Muitos judeus consideram a obra de Wagner como uma espécie de trilha sonora do genocídio.

De fato, Wagner (1813-1883) manifestou explicitamente suas opiniões negativas sobre os judeus, sobretudo no ensaio "O Judaísmo na Música", em que atacava de todas as formas a influência judaica na cultura alemã. "O judaísmo é a consciência diabólica da nossa moderna civilização", escreveu.

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Hitler, por sua vez, nunca escondeu a importância de Wagner para sua concepção de mundo. O líder nazista afirmou ter visto 30 ou 40 vezes a ópera "Tristão e Isolda" em seus anos de Viena (1909 a 1913), conforme o relato de William Shirer e Joachin Fest. Hitler viu também dezenas de vezes a ópera Rienzi, sobre um herói que lidera uma rebelião e posteriormente, vítima da incompreensão de seu tempo, acaba imolado pelo populacho. Para Frederik Spotts, estudioso da relação de Hitler com a arte, foi numa das sessões de Rienzi que Hitler anteviu o futuro de sua própria revolução - e orou.

Nada disso, porém, torna Wagner o precursor do nazismo, como seus detratores querem fazer crer. Seu pensamento racista não pode ser visto como excepcional no século 19, em que a "ciência racial" era aceita e louvada nos salões da inteligência europeia. Além disso, seu antissemitismo deve ser analisado no contexto de uma Europa geralmente antipática aos judeus - o próprio termo "antissemitismo" foi usado pela primeira vez em 1873, na Alemanha, para qualificar a rotineira aversão aos judeus. Partidos políticos no mundo germânico defendiam abertamente o antissemitismo, sem que isso causasse especial repulsa.

Ademais, é curioso que somente Wagner seja proscrito em Israel, enquanto a obra de Carl Orff, que compôs "Carmina Burana" em 1937 sob endosso dos líderes nazistas, é executada livremente por lá. É fato que Orff não era antissemita empedernido como Wagner, mas outros gigantes da arte eram hostis aos judeus e nem por isso são malvistos pelos israelenses. Um bom exemplo é o escrito russo Fiódor Dostoiévski. O autor de "Irmãos Karamázovi" e "Crime e Castigo" não fazia caso de seu antissemitismo - os personagens judeus de seus romances são invariavelmente retratados como calhordas. Também neste caso, Dostoiévski não estava sozinho. Outros proeminentes escritores russos, como Pushkin, Chekhov e Pasternak, eram antissemitas.

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Não se tem notícia de que Israel tenha proscrito esses formidáveis autores, assim como não proibiu Hegel, o filósofo alemão cujo maior legado é o método dialético e que teve influência decisiva em Marx. Pois Hegel, acerca dos judeus, disse que o "estado abjeto" em que eles se encontravam nada mais era do que "a conseqüência de seu destino original" - e a única saída para isso era, dialeticamente, o fim do povo judeu (não a eliminação física, claro, mas sua conversão). Kant, um dos pais da filosofia moderna, também defendia a "eutanásia" do judaísmo, assim como Schopenhauer.

Como se vê, a lista de antissemitas geniais entre os séculos 18 e 19 é extensa. Wagner, porém, que morreu antes de Hitler nascer e que não era mais hostil aos judeus do que a maioria de seus contemporâneos, é um dos poucos protagonistas da cultura ocidental vinculados ao pensamento antissemita daquela época a ainda pagar por isso em Israel - o que, em termos racionais, é muito difícil entender.

"Sei que parte da visão de mundo de Wagner e a relação de Bayreuth com o regime nazista não podem ser justificadas nem apagadas", disse Roberto Pasternostro, diretor musical da orquestra, à revista Der Spiegel. "Ainda assim, estou convencido de que é possível abordar o significado musical de Wagner em uma nova e sofisticada forma para a geração que amadurece, sem ignorar o fardo ou a responsabilidade histórica."

Apesar da tentativa de Pasternostro de racionalizar o caso, a notícia foi muito mal digerida em Israel, diz a Spiegel. Muitos judeus consideram a obra de Wagner como uma espécie de trilha sonora do genocídio.

De fato, Wagner (1813-1883) manifestou explicitamente suas opiniões negativas sobre os judeus, sobretudo no ensaio "O Judaísmo na Música", em que atacava de todas as formas a influência judaica na cultura alemã. "O judaísmo é a consciência diabólica da nossa moderna civilização", escreveu.

Hitler, por sua vez, nunca escondeu a importância de Wagner para sua concepção de mundo. O líder nazista afirmou ter visto 30 ou 40 vezes a ópera "Tristão e Isolda" em seus anos de Viena (1909 a 1913), conforme o relato de William Shirer e Joachin Fest. Hitler viu também dezenas de vezes a ópera Rienzi, sobre um herói que lidera uma rebelião e posteriormente, vítima da incompreensão de seu tempo, acaba imolado pelo populacho. Para Frederik Spotts, estudioso da relação de Hitler com a arte, foi numa das sessões de Rienzi que Hitler anteviu o futuro de sua própria revolução - e orou.

Nada disso, porém, torna Wagner o precursor do nazismo, como seus detratores querem fazer crer. Seu pensamento racista não pode ser visto como excepcional no século 19, em que a "ciência racial" era aceita e louvada nos salões da inteligência europeia. Além disso, seu antissemitismo deve ser analisado no contexto de uma Europa geralmente antipática aos judeus - o próprio termo "antissemitismo" foi usado pela primeira vez em 1873, na Alemanha, para qualificar a rotineira aversão aos judeus. Partidos políticos no mundo germânico defendiam abertamente o antissemitismo, sem que isso causasse especial repulsa.

Ademais, é curioso que somente Wagner seja proscrito em Israel, enquanto a obra de Carl Orff, que compôs "Carmina Burana" em 1937 sob endosso dos líderes nazistas, é executada livremente por lá. É fato que Orff não era antissemita empedernido como Wagner, mas outros gigantes da arte eram hostis aos judeus e nem por isso são malvistos pelos israelenses. Um bom exemplo é o escrito russo Fiódor Dostoiévski. O autor de "Irmãos Karamázovi" e "Crime e Castigo" não fazia caso de seu antissemitismo - os personagens judeus de seus romances são invariavelmente retratados como calhordas. Também neste caso, Dostoiévski não estava sozinho. Outros proeminentes escritores russos, como Pushkin, Chekhov e Pasternak, eram antissemitas.

Não se tem notícia de que Israel tenha proscrito esses formidáveis autores, assim como não proibiu Hegel, o filósofo alemão cujo maior legado é o método dialético e que teve influência decisiva em Marx. Pois Hegel, acerca dos judeus, disse que o "estado abjeto" em que eles se encontravam nada mais era do que "a conseqüência de seu destino original" - e a única saída para isso era, dialeticamente, o fim do povo judeu (não a eliminação física, claro, mas sua conversão). Kant, um dos pais da filosofia moderna, também defendia a "eutanásia" do judaísmo, assim como Schopenhauer.

Como se vê, a lista de antissemitas geniais entre os séculos 18 e 19 é extensa. Wagner, porém, que morreu antes de Hitler nascer e que não era mais hostil aos judeus do que a maioria de seus contemporâneos, é um dos poucos protagonistas da cultura ocidental vinculados ao pensamento antissemita daquela época a ainda pagar por isso em Israel - o que, em termos racionais, é muito difícil entender.

"Sei que parte da visão de mundo de Wagner e a relação de Bayreuth com o regime nazista não podem ser justificadas nem apagadas", disse Roberto Pasternostro, diretor musical da orquestra, à revista Der Spiegel. "Ainda assim, estou convencido de que é possível abordar o significado musical de Wagner em uma nova e sofisticada forma para a geração que amadurece, sem ignorar o fardo ou a responsabilidade histórica."

Apesar da tentativa de Pasternostro de racionalizar o caso, a notícia foi muito mal digerida em Israel, diz a Spiegel. Muitos judeus consideram a obra de Wagner como uma espécie de trilha sonora do genocídio.

De fato, Wagner (1813-1883) manifestou explicitamente suas opiniões negativas sobre os judeus, sobretudo no ensaio "O Judaísmo na Música", em que atacava de todas as formas a influência judaica na cultura alemã. "O judaísmo é a consciência diabólica da nossa moderna civilização", escreveu.

Hitler, por sua vez, nunca escondeu a importância de Wagner para sua concepção de mundo. O líder nazista afirmou ter visto 30 ou 40 vezes a ópera "Tristão e Isolda" em seus anos de Viena (1909 a 1913), conforme o relato de William Shirer e Joachin Fest. Hitler viu também dezenas de vezes a ópera Rienzi, sobre um herói que lidera uma rebelião e posteriormente, vítima da incompreensão de seu tempo, acaba imolado pelo populacho. Para Frederik Spotts, estudioso da relação de Hitler com a arte, foi numa das sessões de Rienzi que Hitler anteviu o futuro de sua própria revolução - e orou.

Nada disso, porém, torna Wagner o precursor do nazismo, como seus detratores querem fazer crer. Seu pensamento racista não pode ser visto como excepcional no século 19, em que a "ciência racial" era aceita e louvada nos salões da inteligência europeia. Além disso, seu antissemitismo deve ser analisado no contexto de uma Europa geralmente antipática aos judeus - o próprio termo "antissemitismo" foi usado pela primeira vez em 1873, na Alemanha, para qualificar a rotineira aversão aos judeus. Partidos políticos no mundo germânico defendiam abertamente o antissemitismo, sem que isso causasse especial repulsa.

Ademais, é curioso que somente Wagner seja proscrito em Israel, enquanto a obra de Carl Orff, que compôs "Carmina Burana" em 1937 sob endosso dos líderes nazistas, é executada livremente por lá. É fato que Orff não era antissemita empedernido como Wagner, mas outros gigantes da arte eram hostis aos judeus e nem por isso são malvistos pelos israelenses. Um bom exemplo é o escrito russo Fiódor Dostoiévski. O autor de "Irmãos Karamázovi" e "Crime e Castigo" não fazia caso de seu antissemitismo - os personagens judeus de seus romances são invariavelmente retratados como calhordas. Também neste caso, Dostoiévski não estava sozinho. Outros proeminentes escritores russos, como Pushkin, Chekhov e Pasternak, eram antissemitas.

Não se tem notícia de que Israel tenha proscrito esses formidáveis autores, assim como não proibiu Hegel, o filósofo alemão cujo maior legado é o método dialético e que teve influência decisiva em Marx. Pois Hegel, acerca dos judeus, disse que o "estado abjeto" em que eles se encontravam nada mais era do que "a conseqüência de seu destino original" - e a única saída para isso era, dialeticamente, o fim do povo judeu (não a eliminação física, claro, mas sua conversão). Kant, um dos pais da filosofia moderna, também defendia a "eutanásia" do judaísmo, assim como Schopenhauer.

Como se vê, a lista de antissemitas geniais entre os séculos 18 e 19 é extensa. Wagner, porém, que morreu antes de Hitler nascer e que não era mais hostil aos judeus do que a maioria de seus contemporâneos, é um dos poucos protagonistas da cultura ocidental vinculados ao pensamento antissemita daquela época a ainda pagar por isso em Israel - o que, em termos racionais, é muito difícil entender.

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