Marqueteiro de Lula diz que busca por cliques prejudica debate e vê Janones como ‘sensacionalista’


Em entrevista ao Estadão, Sidônio Palmeira afirma que ‘arminha’ de Bolsonaro, motosserra de Milei e fake news estão ‘derrotando a política’, mas evita criticar aliado de campanha que divulgou mentiras contra Bolsonaro

Por Samuel Lima
Atualização:
Foto: Arquivo pessoal/Sidônio Palmeira
Entrevista comSidônio Palmeiramarqueteiro

O publicitário Sidônio Palmeira, 65 anos, marqueteiro de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais do ano passado, está em uma cruzada contra os memes. Avesso a redes sociais, o baiano tem afirmado que esse tipo de conteúdo esvazia o debate político.

“O mais grave é no Congresso. Cada vez mais as pessoas estão lá para fazer memes e brincadeiras com agressões. Isso é muito ruim para a sociedade como um todo, para a conscientização, para a formação política e também para as leis que vão ser aprovadas”, afirma em entrevista ao Estadão. “O que eu levanto é o seguinte: que se use a criatividade, mas sem o debate ficar raso.”

Apesar da crítica, Palmeira admite que o deputado André Janones (Avante -MG), a quem classifica como “sensacionalista”, contribuiu para a eleição do presidente Lula. O deputado abusou de memes e fake news como estratégia para promover o petista nas redes sociais, método que o marqueteiro diz condenar.

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O publicitário Sidônio Palmeira, marqueteiro de Lula na campanha presidencial de 2022. Foto: Arquivo Pessoal/Sidônio Palmeira Foto: Arquivo pessoal/Sidônio Palmeira

“A mentira não leva a lugar nenhum e não acho que isso seja correto”, disse o publicitário. Uma das peças de desinformação compartilhadas por Janones nas eleições de 2022 dizia que Bolsonaro daria o Ministério da Previdência para o ex-presidente Fernando Collor, que confiscou poupanças na década de 1990, caso eleito.

Nascido em Vitória da Conquista e formado em engenharia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), o marqueteiro militou no movimento estudantil e atuou pela primeira vez em uma campanha eleitoral para a ex-prefeita de Salvador e hoje deputada federal Lídice da Mata (PSB-BA). Venceu quatro eleições para o governo da Bahia, com os petistas Jaques Wagner (2006 e 2010) e Rui Costa (2014 e 2018), atual ministro-chefe da Casa Civil. É um dos sócios da empresa Leiaute e mora em Salvador.

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Palmeira conta que prepara um livro sobre a campanha de Lula, que julga ter sido a mais importante da história brasileira. Recentemente, o sócio dele, Raul Rabelo, atuou diretamente na campanha derrotada do peronista Sergio Massa na Argentina, com um grupo de publicitários ligados a Sidônio. A disputa no país vizinho foi marcada por memes e até o uso de Inteligência Artificial.

Leia a entrevista.

O senhor diz que o meme está derrotando o debate política. Por que?

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Você tem visto no Congresso que, em vez de ter uma discussão política sobre determinados temas, fazem um meme para ganhar repercussão. Os políticos buscam cliques e nada melhor do que um meme. No Dia Internacional da Mulher, quando se poderia discutir a luta pelos direitos das mulheres, o que passou foi um meme de um deputado (Nikolas Ferreira, do PL-MG) que colocou uma peruca na cabeça. No caso da Argentina, o meme foi uma motosserra. Na eleição aqui do Brasil, no ano passado, o meme era fazer uma ‘arminha’ com o dedo. Isso termina simplificando, deixando muito raso o debate político. E o mais grave é no Congresso. Cada vez mais as pessoas estão lá para fazer memes e brincadeiras com agressões. Isso é muito ruim para a sociedade como um todo, para a conscientização, para a formação política e também para as leis que vão ser aprovadas.

O que pode substituir a linguagem do meme?

A questão é comunicar as coisas de forma mais criativa e simples. O que eu levanto é o seguinte: que se use a criatividade, mas sem o debate ficar raso. Passar uma mensagem com conteúdo político num tempo bem curtinho, sem ficar uma coisa enfadonha ou usar mentiras. A fake news é muito mais interessante do que a verdade, porque a verdade é uma mera constatação da realidade, enquanto que com a mentira se pode desenvolver a imaginação. O problema da mentira é a ética, o sofrimento que ela causa, o ódio que ela gera. E as fake news são alimentadas pelos algoritmos. A primeira coisa para enfrentá-las é a regulação, que não é uma censura à liberdade de expressão.

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O problema da mentira é a ética, o sofrimento que ela causa, o ódio que ela gera

O governo sucumbiu a pressão das big techs e desistiu do projeto de lei das fake news. Qual a consequência disso?

Não acompanhei lá e não sei exatamente porque o governo tomou essa atitude. O que eu posso afirmar é que é importante ter uma votação sobre isso e tomar medidas sérias sobre as fake news e a regulamentação das redes sociais. Não é perder a liberdade de expressão, pelo contrário, é fortalecer aquilo que é correto e verdadeiro.

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Na campanha de Lula contra Bolsonaro uma parte da esquerda aplaudiu a atuação de Janones. Como o senhor avalia?

Ele tem uma característica de ir mais para o embate, de uma forma mais sensacionalista que acaba chamando mais a atenção das pessoas. Não tenho dúvida que isso contribui. Olha só: estou falando mais da coisa sensacionalista, do embate político, do enfrentamento, que é algo importante no debate. Isso está longe e não tem nada a ver com fake news. A campanha foi propositiva. O Janones tem o estilo dele, de defender as ideias no jeito dele, de polemizar e de enfrentar o adversário, e contribuiu da sua forma.

Janones divulgou informações que não condiziam com a verdade, como a de que Fernando Collor seria ministro de Bolsonaro...

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Eu não defendo fake news. A mentira não leva a lugar nenhum e não acho que isso seja correto. Não sei exatamente como ele falou, se ele achava que era isso e depois não era. Aí tem que ver com ele. Não sou eu que vou fazer a análise.

André Janones (Avante-MG) abriu mão de campanha presidencial para apoiar Lula. Foto: Marcelo Chello/Estadão 

A esquerda tem condições de equilibrar a disputa com a direita nas redes?

Acho que estamos perdendo, mas em alguns momentos durante a campanha (de Lula em 2022) a gente bateu (os demais candidatos) nessa área. É preciso ter também as pessoas, porque eles têm militantes de rede, digamos assim, com o hábito de trabalhar nas redes sociais.

Como foi a atuação do grupo de publicitários brasileiros contra o Milei na Argentina?

A atuação deles não foi contra o Milei, é bom ressaltar isso. Eles foram lá ajudar na campanha do Massa. Tem a disputa política e também o lado propositivo. A primeira coisa a se fazer numa campanha é trabalhar o candidato, valorizar e mostrar as coisas positivas, além de mostrar o que tem de ruim no adversário.

Por que marqueteiros brasileiros?

O Brasil tem uma experiência grande no marketing eleitoral. O Brasil tem vários profissionais e exporta tecnologia. Eles quiseram um reforço nesse sentido. O Milei também poderia ter buscado, é natural.

A campanha de Lula contra Bolsonaro em 2022 trouxe algum ensinamento para lá?

Acho que a campanha na Argentina foi mais parecida com a do Brasil em 2018. O Bolsonaro era desconhecido, como agora era o Milei, e o (Fernando) Haddad enfrentava. O Bolsonaro tem uma característica similar ao Milei, talvez também tenha sido por isso (que importaram marqueteiros do Brasil), de conhecer a experiência, guardando claro as devidas proporções.

Pode resumir como foi a campanha?

Acho que a estratégia lá foi correta, identificando o principal adversário como Milei, polarizando com ele, e a Patrícia (Bullrich) caiu com a gravidade. A gente estava trabalhando para ir para o segundo turno, mas era uma situação difícil. Os três estavam equilibrados. Agora, termina sendo uma campanha de rejeição. O Massa pega um governo com rejeição de 70% e inflação de 140%, sendo o ministro da Economia. O outro é uma loucura. Defende venda de órgãos, acabar com ministérios, a economia sem interferência nenhuma do Estado, armar a população, derrubar o prédio do Banco Central...

O candidato ultradireitista Javier Milei na Argentina com uma motosserra. Foto: Natacha Pisarenko/AP

Lula está conseguindo deixar uma marca no seu terceiro governo?

Acho que sim. A primeira marca de Lula é retomar todos os programas sociais, o que fez em pouco tempo. Os ministérios da Mulher, da Cultura, dos Povos Originários, o Bolsa Família com R$ 150 para crianças de até seis anos, o Desenrola Brasil ele conseguiu efetivar e foi impressionante. Na política externa também tem ido bem, assim como nessa guerra, com resgate de brasileiros na Faixa de Gaza.

Por que o senhor recusou ser ministro da Secretaria de Comunicação (Secom)?

Não sou governo, não tenho a característica. Sou um homem de criação, de planejamento. É isso.

Qual sua avaliação sobre a comunicação do governo?

O governo tem muito e precisa chegar mais na ponta. É difícil falar das coisas sem estar ali dentro.

O senhor fará campanha em 2024?

Não sei, mas acho que não vou fazer campanha para prefeito. Faz algum tempo que não faço aqui em Salvador.

O publicitário Sidônio Palmeira, 65 anos, marqueteiro de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais do ano passado, está em uma cruzada contra os memes. Avesso a redes sociais, o baiano tem afirmado que esse tipo de conteúdo esvazia o debate político.

“O mais grave é no Congresso. Cada vez mais as pessoas estão lá para fazer memes e brincadeiras com agressões. Isso é muito ruim para a sociedade como um todo, para a conscientização, para a formação política e também para as leis que vão ser aprovadas”, afirma em entrevista ao Estadão. “O que eu levanto é o seguinte: que se use a criatividade, mas sem o debate ficar raso.”

Apesar da crítica, Palmeira admite que o deputado André Janones (Avante -MG), a quem classifica como “sensacionalista”, contribuiu para a eleição do presidente Lula. O deputado abusou de memes e fake news como estratégia para promover o petista nas redes sociais, método que o marqueteiro diz condenar.

O publicitário Sidônio Palmeira, marqueteiro de Lula na campanha presidencial de 2022. Foto: Arquivo Pessoal/Sidônio Palmeira Foto: Arquivo pessoal/Sidônio Palmeira

“A mentira não leva a lugar nenhum e não acho que isso seja correto”, disse o publicitário. Uma das peças de desinformação compartilhadas por Janones nas eleições de 2022 dizia que Bolsonaro daria o Ministério da Previdência para o ex-presidente Fernando Collor, que confiscou poupanças na década de 1990, caso eleito.

Nascido em Vitória da Conquista e formado em engenharia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), o marqueteiro militou no movimento estudantil e atuou pela primeira vez em uma campanha eleitoral para a ex-prefeita de Salvador e hoje deputada federal Lídice da Mata (PSB-BA). Venceu quatro eleições para o governo da Bahia, com os petistas Jaques Wagner (2006 e 2010) e Rui Costa (2014 e 2018), atual ministro-chefe da Casa Civil. É um dos sócios da empresa Leiaute e mora em Salvador.

Palmeira conta que prepara um livro sobre a campanha de Lula, que julga ter sido a mais importante da história brasileira. Recentemente, o sócio dele, Raul Rabelo, atuou diretamente na campanha derrotada do peronista Sergio Massa na Argentina, com um grupo de publicitários ligados a Sidônio. A disputa no país vizinho foi marcada por memes e até o uso de Inteligência Artificial.

Leia a entrevista.

O senhor diz que o meme está derrotando o debate política. Por que?

Você tem visto no Congresso que, em vez de ter uma discussão política sobre determinados temas, fazem um meme para ganhar repercussão. Os políticos buscam cliques e nada melhor do que um meme. No Dia Internacional da Mulher, quando se poderia discutir a luta pelos direitos das mulheres, o que passou foi um meme de um deputado (Nikolas Ferreira, do PL-MG) que colocou uma peruca na cabeça. No caso da Argentina, o meme foi uma motosserra. Na eleição aqui do Brasil, no ano passado, o meme era fazer uma ‘arminha’ com o dedo. Isso termina simplificando, deixando muito raso o debate político. E o mais grave é no Congresso. Cada vez mais as pessoas estão lá para fazer memes e brincadeiras com agressões. Isso é muito ruim para a sociedade como um todo, para a conscientização, para a formação política e também para as leis que vão ser aprovadas.

O que pode substituir a linguagem do meme?

A questão é comunicar as coisas de forma mais criativa e simples. O que eu levanto é o seguinte: que se use a criatividade, mas sem o debate ficar raso. Passar uma mensagem com conteúdo político num tempo bem curtinho, sem ficar uma coisa enfadonha ou usar mentiras. A fake news é muito mais interessante do que a verdade, porque a verdade é uma mera constatação da realidade, enquanto que com a mentira se pode desenvolver a imaginação. O problema da mentira é a ética, o sofrimento que ela causa, o ódio que ela gera. E as fake news são alimentadas pelos algoritmos. A primeira coisa para enfrentá-las é a regulação, que não é uma censura à liberdade de expressão.

O problema da mentira é a ética, o sofrimento que ela causa, o ódio que ela gera

O governo sucumbiu a pressão das big techs e desistiu do projeto de lei das fake news. Qual a consequência disso?

Não acompanhei lá e não sei exatamente porque o governo tomou essa atitude. O que eu posso afirmar é que é importante ter uma votação sobre isso e tomar medidas sérias sobre as fake news e a regulamentação das redes sociais. Não é perder a liberdade de expressão, pelo contrário, é fortalecer aquilo que é correto e verdadeiro.

Na campanha de Lula contra Bolsonaro uma parte da esquerda aplaudiu a atuação de Janones. Como o senhor avalia?

Ele tem uma característica de ir mais para o embate, de uma forma mais sensacionalista que acaba chamando mais a atenção das pessoas. Não tenho dúvida que isso contribui. Olha só: estou falando mais da coisa sensacionalista, do embate político, do enfrentamento, que é algo importante no debate. Isso está longe e não tem nada a ver com fake news. A campanha foi propositiva. O Janones tem o estilo dele, de defender as ideias no jeito dele, de polemizar e de enfrentar o adversário, e contribuiu da sua forma.

Janones divulgou informações que não condiziam com a verdade, como a de que Fernando Collor seria ministro de Bolsonaro...

Eu não defendo fake news. A mentira não leva a lugar nenhum e não acho que isso seja correto. Não sei exatamente como ele falou, se ele achava que era isso e depois não era. Aí tem que ver com ele. Não sou eu que vou fazer a análise.

André Janones (Avante-MG) abriu mão de campanha presidencial para apoiar Lula. Foto: Marcelo Chello/Estadão 

A esquerda tem condições de equilibrar a disputa com a direita nas redes?

Acho que estamos perdendo, mas em alguns momentos durante a campanha (de Lula em 2022) a gente bateu (os demais candidatos) nessa área. É preciso ter também as pessoas, porque eles têm militantes de rede, digamos assim, com o hábito de trabalhar nas redes sociais.

Como foi a atuação do grupo de publicitários brasileiros contra o Milei na Argentina?

A atuação deles não foi contra o Milei, é bom ressaltar isso. Eles foram lá ajudar na campanha do Massa. Tem a disputa política e também o lado propositivo. A primeira coisa a se fazer numa campanha é trabalhar o candidato, valorizar e mostrar as coisas positivas, além de mostrar o que tem de ruim no adversário.

Por que marqueteiros brasileiros?

O Brasil tem uma experiência grande no marketing eleitoral. O Brasil tem vários profissionais e exporta tecnologia. Eles quiseram um reforço nesse sentido. O Milei também poderia ter buscado, é natural.

A campanha de Lula contra Bolsonaro em 2022 trouxe algum ensinamento para lá?

Acho que a campanha na Argentina foi mais parecida com a do Brasil em 2018. O Bolsonaro era desconhecido, como agora era o Milei, e o (Fernando) Haddad enfrentava. O Bolsonaro tem uma característica similar ao Milei, talvez também tenha sido por isso (que importaram marqueteiros do Brasil), de conhecer a experiência, guardando claro as devidas proporções.

Pode resumir como foi a campanha?

Acho que a estratégia lá foi correta, identificando o principal adversário como Milei, polarizando com ele, e a Patrícia (Bullrich) caiu com a gravidade. A gente estava trabalhando para ir para o segundo turno, mas era uma situação difícil. Os três estavam equilibrados. Agora, termina sendo uma campanha de rejeição. O Massa pega um governo com rejeição de 70% e inflação de 140%, sendo o ministro da Economia. O outro é uma loucura. Defende venda de órgãos, acabar com ministérios, a economia sem interferência nenhuma do Estado, armar a população, derrubar o prédio do Banco Central...

O candidato ultradireitista Javier Milei na Argentina com uma motosserra. Foto: Natacha Pisarenko/AP

Lula está conseguindo deixar uma marca no seu terceiro governo?

Acho que sim. A primeira marca de Lula é retomar todos os programas sociais, o que fez em pouco tempo. Os ministérios da Mulher, da Cultura, dos Povos Originários, o Bolsa Família com R$ 150 para crianças de até seis anos, o Desenrola Brasil ele conseguiu efetivar e foi impressionante. Na política externa também tem ido bem, assim como nessa guerra, com resgate de brasileiros na Faixa de Gaza.

Por que o senhor recusou ser ministro da Secretaria de Comunicação (Secom)?

Não sou governo, não tenho a característica. Sou um homem de criação, de planejamento. É isso.

Qual sua avaliação sobre a comunicação do governo?

O governo tem muito e precisa chegar mais na ponta. É difícil falar das coisas sem estar ali dentro.

O senhor fará campanha em 2024?

Não sei, mas acho que não vou fazer campanha para prefeito. Faz algum tempo que não faço aqui em Salvador.

O publicitário Sidônio Palmeira, 65 anos, marqueteiro de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais do ano passado, está em uma cruzada contra os memes. Avesso a redes sociais, o baiano tem afirmado que esse tipo de conteúdo esvazia o debate político.

“O mais grave é no Congresso. Cada vez mais as pessoas estão lá para fazer memes e brincadeiras com agressões. Isso é muito ruim para a sociedade como um todo, para a conscientização, para a formação política e também para as leis que vão ser aprovadas”, afirma em entrevista ao Estadão. “O que eu levanto é o seguinte: que se use a criatividade, mas sem o debate ficar raso.”

Apesar da crítica, Palmeira admite que o deputado André Janones (Avante -MG), a quem classifica como “sensacionalista”, contribuiu para a eleição do presidente Lula. O deputado abusou de memes e fake news como estratégia para promover o petista nas redes sociais, método que o marqueteiro diz condenar.

O publicitário Sidônio Palmeira, marqueteiro de Lula na campanha presidencial de 2022. Foto: Arquivo Pessoal/Sidônio Palmeira Foto: Arquivo pessoal/Sidônio Palmeira

“A mentira não leva a lugar nenhum e não acho que isso seja correto”, disse o publicitário. Uma das peças de desinformação compartilhadas por Janones nas eleições de 2022 dizia que Bolsonaro daria o Ministério da Previdência para o ex-presidente Fernando Collor, que confiscou poupanças na década de 1990, caso eleito.

Nascido em Vitória da Conquista e formado em engenharia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), o marqueteiro militou no movimento estudantil e atuou pela primeira vez em uma campanha eleitoral para a ex-prefeita de Salvador e hoje deputada federal Lídice da Mata (PSB-BA). Venceu quatro eleições para o governo da Bahia, com os petistas Jaques Wagner (2006 e 2010) e Rui Costa (2014 e 2018), atual ministro-chefe da Casa Civil. É um dos sócios da empresa Leiaute e mora em Salvador.

Palmeira conta que prepara um livro sobre a campanha de Lula, que julga ter sido a mais importante da história brasileira. Recentemente, o sócio dele, Raul Rabelo, atuou diretamente na campanha derrotada do peronista Sergio Massa na Argentina, com um grupo de publicitários ligados a Sidônio. A disputa no país vizinho foi marcada por memes e até o uso de Inteligência Artificial.

Leia a entrevista.

O senhor diz que o meme está derrotando o debate política. Por que?

Você tem visto no Congresso que, em vez de ter uma discussão política sobre determinados temas, fazem um meme para ganhar repercussão. Os políticos buscam cliques e nada melhor do que um meme. No Dia Internacional da Mulher, quando se poderia discutir a luta pelos direitos das mulheres, o que passou foi um meme de um deputado (Nikolas Ferreira, do PL-MG) que colocou uma peruca na cabeça. No caso da Argentina, o meme foi uma motosserra. Na eleição aqui do Brasil, no ano passado, o meme era fazer uma ‘arminha’ com o dedo. Isso termina simplificando, deixando muito raso o debate político. E o mais grave é no Congresso. Cada vez mais as pessoas estão lá para fazer memes e brincadeiras com agressões. Isso é muito ruim para a sociedade como um todo, para a conscientização, para a formação política e também para as leis que vão ser aprovadas.

O que pode substituir a linguagem do meme?

A questão é comunicar as coisas de forma mais criativa e simples. O que eu levanto é o seguinte: que se use a criatividade, mas sem o debate ficar raso. Passar uma mensagem com conteúdo político num tempo bem curtinho, sem ficar uma coisa enfadonha ou usar mentiras. A fake news é muito mais interessante do que a verdade, porque a verdade é uma mera constatação da realidade, enquanto que com a mentira se pode desenvolver a imaginação. O problema da mentira é a ética, o sofrimento que ela causa, o ódio que ela gera. E as fake news são alimentadas pelos algoritmos. A primeira coisa para enfrentá-las é a regulação, que não é uma censura à liberdade de expressão.

O problema da mentira é a ética, o sofrimento que ela causa, o ódio que ela gera

O governo sucumbiu a pressão das big techs e desistiu do projeto de lei das fake news. Qual a consequência disso?

Não acompanhei lá e não sei exatamente porque o governo tomou essa atitude. O que eu posso afirmar é que é importante ter uma votação sobre isso e tomar medidas sérias sobre as fake news e a regulamentação das redes sociais. Não é perder a liberdade de expressão, pelo contrário, é fortalecer aquilo que é correto e verdadeiro.

Na campanha de Lula contra Bolsonaro uma parte da esquerda aplaudiu a atuação de Janones. Como o senhor avalia?

Ele tem uma característica de ir mais para o embate, de uma forma mais sensacionalista que acaba chamando mais a atenção das pessoas. Não tenho dúvida que isso contribui. Olha só: estou falando mais da coisa sensacionalista, do embate político, do enfrentamento, que é algo importante no debate. Isso está longe e não tem nada a ver com fake news. A campanha foi propositiva. O Janones tem o estilo dele, de defender as ideias no jeito dele, de polemizar e de enfrentar o adversário, e contribuiu da sua forma.

Janones divulgou informações que não condiziam com a verdade, como a de que Fernando Collor seria ministro de Bolsonaro...

Eu não defendo fake news. A mentira não leva a lugar nenhum e não acho que isso seja correto. Não sei exatamente como ele falou, se ele achava que era isso e depois não era. Aí tem que ver com ele. Não sou eu que vou fazer a análise.

André Janones (Avante-MG) abriu mão de campanha presidencial para apoiar Lula. Foto: Marcelo Chello/Estadão 

A esquerda tem condições de equilibrar a disputa com a direita nas redes?

Acho que estamos perdendo, mas em alguns momentos durante a campanha (de Lula em 2022) a gente bateu (os demais candidatos) nessa área. É preciso ter também as pessoas, porque eles têm militantes de rede, digamos assim, com o hábito de trabalhar nas redes sociais.

Como foi a atuação do grupo de publicitários brasileiros contra o Milei na Argentina?

A atuação deles não foi contra o Milei, é bom ressaltar isso. Eles foram lá ajudar na campanha do Massa. Tem a disputa política e também o lado propositivo. A primeira coisa a se fazer numa campanha é trabalhar o candidato, valorizar e mostrar as coisas positivas, além de mostrar o que tem de ruim no adversário.

Por que marqueteiros brasileiros?

O Brasil tem uma experiência grande no marketing eleitoral. O Brasil tem vários profissionais e exporta tecnologia. Eles quiseram um reforço nesse sentido. O Milei também poderia ter buscado, é natural.

A campanha de Lula contra Bolsonaro em 2022 trouxe algum ensinamento para lá?

Acho que a campanha na Argentina foi mais parecida com a do Brasil em 2018. O Bolsonaro era desconhecido, como agora era o Milei, e o (Fernando) Haddad enfrentava. O Bolsonaro tem uma característica similar ao Milei, talvez também tenha sido por isso (que importaram marqueteiros do Brasil), de conhecer a experiência, guardando claro as devidas proporções.

Pode resumir como foi a campanha?

Acho que a estratégia lá foi correta, identificando o principal adversário como Milei, polarizando com ele, e a Patrícia (Bullrich) caiu com a gravidade. A gente estava trabalhando para ir para o segundo turno, mas era uma situação difícil. Os três estavam equilibrados. Agora, termina sendo uma campanha de rejeição. O Massa pega um governo com rejeição de 70% e inflação de 140%, sendo o ministro da Economia. O outro é uma loucura. Defende venda de órgãos, acabar com ministérios, a economia sem interferência nenhuma do Estado, armar a população, derrubar o prédio do Banco Central...

O candidato ultradireitista Javier Milei na Argentina com uma motosserra. Foto: Natacha Pisarenko/AP

Lula está conseguindo deixar uma marca no seu terceiro governo?

Acho que sim. A primeira marca de Lula é retomar todos os programas sociais, o que fez em pouco tempo. Os ministérios da Mulher, da Cultura, dos Povos Originários, o Bolsa Família com R$ 150 para crianças de até seis anos, o Desenrola Brasil ele conseguiu efetivar e foi impressionante. Na política externa também tem ido bem, assim como nessa guerra, com resgate de brasileiros na Faixa de Gaza.

Por que o senhor recusou ser ministro da Secretaria de Comunicação (Secom)?

Não sou governo, não tenho a característica. Sou um homem de criação, de planejamento. É isso.

Qual sua avaliação sobre a comunicação do governo?

O governo tem muito e precisa chegar mais na ponta. É difícil falar das coisas sem estar ali dentro.

O senhor fará campanha em 2024?

Não sei, mas acho que não vou fazer campanha para prefeito. Faz algum tempo que não faço aqui em Salvador.

O publicitário Sidônio Palmeira, 65 anos, marqueteiro de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais do ano passado, está em uma cruzada contra os memes. Avesso a redes sociais, o baiano tem afirmado que esse tipo de conteúdo esvazia o debate político.

“O mais grave é no Congresso. Cada vez mais as pessoas estão lá para fazer memes e brincadeiras com agressões. Isso é muito ruim para a sociedade como um todo, para a conscientização, para a formação política e também para as leis que vão ser aprovadas”, afirma em entrevista ao Estadão. “O que eu levanto é o seguinte: que se use a criatividade, mas sem o debate ficar raso.”

Apesar da crítica, Palmeira admite que o deputado André Janones (Avante -MG), a quem classifica como “sensacionalista”, contribuiu para a eleição do presidente Lula. O deputado abusou de memes e fake news como estratégia para promover o petista nas redes sociais, método que o marqueteiro diz condenar.

O publicitário Sidônio Palmeira, marqueteiro de Lula na campanha presidencial de 2022. Foto: Arquivo Pessoal/Sidônio Palmeira Foto: Arquivo pessoal/Sidônio Palmeira

“A mentira não leva a lugar nenhum e não acho que isso seja correto”, disse o publicitário. Uma das peças de desinformação compartilhadas por Janones nas eleições de 2022 dizia que Bolsonaro daria o Ministério da Previdência para o ex-presidente Fernando Collor, que confiscou poupanças na década de 1990, caso eleito.

Nascido em Vitória da Conquista e formado em engenharia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), o marqueteiro militou no movimento estudantil e atuou pela primeira vez em uma campanha eleitoral para a ex-prefeita de Salvador e hoje deputada federal Lídice da Mata (PSB-BA). Venceu quatro eleições para o governo da Bahia, com os petistas Jaques Wagner (2006 e 2010) e Rui Costa (2014 e 2018), atual ministro-chefe da Casa Civil. É um dos sócios da empresa Leiaute e mora em Salvador.

Palmeira conta que prepara um livro sobre a campanha de Lula, que julga ter sido a mais importante da história brasileira. Recentemente, o sócio dele, Raul Rabelo, atuou diretamente na campanha derrotada do peronista Sergio Massa na Argentina, com um grupo de publicitários ligados a Sidônio. A disputa no país vizinho foi marcada por memes e até o uso de Inteligência Artificial.

Leia a entrevista.

O senhor diz que o meme está derrotando o debate política. Por que?

Você tem visto no Congresso que, em vez de ter uma discussão política sobre determinados temas, fazem um meme para ganhar repercussão. Os políticos buscam cliques e nada melhor do que um meme. No Dia Internacional da Mulher, quando se poderia discutir a luta pelos direitos das mulheres, o que passou foi um meme de um deputado (Nikolas Ferreira, do PL-MG) que colocou uma peruca na cabeça. No caso da Argentina, o meme foi uma motosserra. Na eleição aqui do Brasil, no ano passado, o meme era fazer uma ‘arminha’ com o dedo. Isso termina simplificando, deixando muito raso o debate político. E o mais grave é no Congresso. Cada vez mais as pessoas estão lá para fazer memes e brincadeiras com agressões. Isso é muito ruim para a sociedade como um todo, para a conscientização, para a formação política e também para as leis que vão ser aprovadas.

O que pode substituir a linguagem do meme?

A questão é comunicar as coisas de forma mais criativa e simples. O que eu levanto é o seguinte: que se use a criatividade, mas sem o debate ficar raso. Passar uma mensagem com conteúdo político num tempo bem curtinho, sem ficar uma coisa enfadonha ou usar mentiras. A fake news é muito mais interessante do que a verdade, porque a verdade é uma mera constatação da realidade, enquanto que com a mentira se pode desenvolver a imaginação. O problema da mentira é a ética, o sofrimento que ela causa, o ódio que ela gera. E as fake news são alimentadas pelos algoritmos. A primeira coisa para enfrentá-las é a regulação, que não é uma censura à liberdade de expressão.

O problema da mentira é a ética, o sofrimento que ela causa, o ódio que ela gera

O governo sucumbiu a pressão das big techs e desistiu do projeto de lei das fake news. Qual a consequência disso?

Não acompanhei lá e não sei exatamente porque o governo tomou essa atitude. O que eu posso afirmar é que é importante ter uma votação sobre isso e tomar medidas sérias sobre as fake news e a regulamentação das redes sociais. Não é perder a liberdade de expressão, pelo contrário, é fortalecer aquilo que é correto e verdadeiro.

Na campanha de Lula contra Bolsonaro uma parte da esquerda aplaudiu a atuação de Janones. Como o senhor avalia?

Ele tem uma característica de ir mais para o embate, de uma forma mais sensacionalista que acaba chamando mais a atenção das pessoas. Não tenho dúvida que isso contribui. Olha só: estou falando mais da coisa sensacionalista, do embate político, do enfrentamento, que é algo importante no debate. Isso está longe e não tem nada a ver com fake news. A campanha foi propositiva. O Janones tem o estilo dele, de defender as ideias no jeito dele, de polemizar e de enfrentar o adversário, e contribuiu da sua forma.

Janones divulgou informações que não condiziam com a verdade, como a de que Fernando Collor seria ministro de Bolsonaro...

Eu não defendo fake news. A mentira não leva a lugar nenhum e não acho que isso seja correto. Não sei exatamente como ele falou, se ele achava que era isso e depois não era. Aí tem que ver com ele. Não sou eu que vou fazer a análise.

André Janones (Avante-MG) abriu mão de campanha presidencial para apoiar Lula. Foto: Marcelo Chello/Estadão 

A esquerda tem condições de equilibrar a disputa com a direita nas redes?

Acho que estamos perdendo, mas em alguns momentos durante a campanha (de Lula em 2022) a gente bateu (os demais candidatos) nessa área. É preciso ter também as pessoas, porque eles têm militantes de rede, digamos assim, com o hábito de trabalhar nas redes sociais.

Como foi a atuação do grupo de publicitários brasileiros contra o Milei na Argentina?

A atuação deles não foi contra o Milei, é bom ressaltar isso. Eles foram lá ajudar na campanha do Massa. Tem a disputa política e também o lado propositivo. A primeira coisa a se fazer numa campanha é trabalhar o candidato, valorizar e mostrar as coisas positivas, além de mostrar o que tem de ruim no adversário.

Por que marqueteiros brasileiros?

O Brasil tem uma experiência grande no marketing eleitoral. O Brasil tem vários profissionais e exporta tecnologia. Eles quiseram um reforço nesse sentido. O Milei também poderia ter buscado, é natural.

A campanha de Lula contra Bolsonaro em 2022 trouxe algum ensinamento para lá?

Acho que a campanha na Argentina foi mais parecida com a do Brasil em 2018. O Bolsonaro era desconhecido, como agora era o Milei, e o (Fernando) Haddad enfrentava. O Bolsonaro tem uma característica similar ao Milei, talvez também tenha sido por isso (que importaram marqueteiros do Brasil), de conhecer a experiência, guardando claro as devidas proporções.

Pode resumir como foi a campanha?

Acho que a estratégia lá foi correta, identificando o principal adversário como Milei, polarizando com ele, e a Patrícia (Bullrich) caiu com a gravidade. A gente estava trabalhando para ir para o segundo turno, mas era uma situação difícil. Os três estavam equilibrados. Agora, termina sendo uma campanha de rejeição. O Massa pega um governo com rejeição de 70% e inflação de 140%, sendo o ministro da Economia. O outro é uma loucura. Defende venda de órgãos, acabar com ministérios, a economia sem interferência nenhuma do Estado, armar a população, derrubar o prédio do Banco Central...

O candidato ultradireitista Javier Milei na Argentina com uma motosserra. Foto: Natacha Pisarenko/AP

Lula está conseguindo deixar uma marca no seu terceiro governo?

Acho que sim. A primeira marca de Lula é retomar todos os programas sociais, o que fez em pouco tempo. Os ministérios da Mulher, da Cultura, dos Povos Originários, o Bolsa Família com R$ 150 para crianças de até seis anos, o Desenrola Brasil ele conseguiu efetivar e foi impressionante. Na política externa também tem ido bem, assim como nessa guerra, com resgate de brasileiros na Faixa de Gaza.

Por que o senhor recusou ser ministro da Secretaria de Comunicação (Secom)?

Não sou governo, não tenho a característica. Sou um homem de criação, de planejamento. É isso.

Qual sua avaliação sobre a comunicação do governo?

O governo tem muito e precisa chegar mais na ponta. É difícil falar das coisas sem estar ali dentro.

O senhor fará campanha em 2024?

Não sei, mas acho que não vou fazer campanha para prefeito. Faz algum tempo que não faço aqui em Salvador.

Entrevista por Samuel Lima

Jornalista natural de Porto Alegre (RS), graduado pela PUCRS, e repórter de Política do Estadão em São Paulo desde 2023. Antes, fez parte do 30º Curso Estado de Jornalismo e atuou no Estadão Verifica, núcleo de checagem de fatos do jornal, e como colaborador do Projeto Comprova.

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