BRASÍLIA - O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes mandou soltar o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nesta sexta-feira, 3. Com a decisão, Cid vai ter que cumprir as mesmas medidas cautelares impostas na primeira vez em que foi liberado da prisão, em setembro do ano passado.
Cid foi preso pela segunda vez no final de março, após a revista Veja divulgar áudios em que ele afirmou ter sido pressionado a confirmar uma “narrativa pronta” na delação premiada que concedeu à Polícia Federal (PF). Segundo o ex-ajudante de ordens da Presidência, os policiais queriam que ele falasse coisas que ele não sabia e que não ocorreram. “Não adianta, você pode falar o que você quiser. Eles (Polícia Federal) não aceitavam e discutiam que a minha versão não era verdadeira, que não podia ser assim, que eu estava mentindo”, disse, em um dos áudios.
Moraes, que também foi atacado nos áudios por Cid, argumentou nesta sexta-feira que o ex-ajudante de ordens reafirmou em depoimento a “total higidez” do acordo de delação premiada e negou ter sido coagido. O tenente-coronel disse, nas gravações divulgadas pela Veja, que o ministro “é a lei” e já tem a sentença dos investigados por tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
Segundo o advogado de Cid, Cezar Bittencourt, Mauro Cid admitiu que “pisou na bola”. “Nós já tivemos uma conversa de cara. Ele [Mauro Cid] mesmo [disse]: ‘Pisei na bola’. É lógico que pisou, né?! É um sujeito inteligente. Outra coisa: o celular é o mundo, um universo, ninguém controla. Então, se você não se controlar... Com certeza ele agora não vai cometer o mesmo erro”, relatou Bitencourt.
O advogado diz que os áudios vazaram após o militar desabafar para um amigo. Ele não confirmou, contudo, quem seria essa pessoa. “Cid não sabe quem é. Ele tem três ou quatro amigos mais próximos, da carreira dele. E algum deles, um ou outro desse aí, ligou para um ou outro, que também tem seus amigos, e chegou onde não deveria chegar”, relatou.
As medidas cautelares que o tenente-coronel do Exército terá que obedecer são as mesmas que foram determinadas por Moraes quando Cid ganhou a liberdade provisória em setembro. Cid estava preso desde maio do ano passado, por envolvimento no caso das fraudes nos cartões de vacina contra a covid-19. Quatro meses depois, ele foi solto por Moraes a partir da homologação da colaboração premiada.
Mauro Cid já está na residência dele, no Setor Militar Urbano (SMU), em Brasília. Ele terá que usar tornozeleira eletrônica e está proibido de sair da residência dele a partir das 18 horas e nos finais de semana. Nos outros momentos, poderá circular pela capital do país. Ele não teve o direito de dirigir suspenso. Moraes ainda determinou que o tenente-coronel deve se apresentar à Justiça todas as segundas-feiras e proibiu o uso de redes sociais.
O ministro do STF não impediu que o ex-ajudante de ordens frequente unidades militares. Mas ele não poderá encontrar outros investigados em casos que envolvem Bolsonaro, que também incluem alvos que estão nos quadros das Forças Armadas.
A saída de Cid do País foi vetada por Moraes e o passaporte dele ficará retido com a Justiça. Outros documentos suspensos pelo ministro da Corte foram os certificados de posse de arma de fogo e de registro de caçador, atirador e colecionador (CAC).
Na decisão desta sexta, o magistrado informou que, caso o ex-ajudante de ordens descumpra alguma das medidas cautelares, ele voltará a ser preso preventivamente.
Delação de Cid está de pé e pode prejudicar situação jurídica de Bolsonaro
Moraes também manteve o acordo de delação premiada na decisão desta sexta-feira. As revelações do tenente-coronel podem tornar a situação jurídica de Bolsonaro ainda mais conturbada.
Como ajudante de ordens, Mauro Cid teve acesso livre ao Palácio do Planalto e esteve ao lado de Bolsonaro em entrevistas, lives, reuniões e em salas de cirurgias, sendo o braço-direito e secretário particular do ex-presidente nos quatro anos do governo passado.
Foi a partir da delação do tenente-coronel que a PF deflagrou a Operação Tempus Veritatis, em fevereiro. Os policiais investigam uma suposta tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito após as eleições de 2022.
A operação mirou Bolsonaro, ex-ministros e militares de alta patente e foi realizada após Cid dizer que o ex-presidente se reuniu com os comandantes da Forças Armadas para discutir uma forma de impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em outros depoimentos, o militar forneceu informações para os investigadores sobre outros casos que Bolsonaro também é uma figura central, como a venda ilegal das joias sauditas, a fraude nos cartões de vacina no sistema do Ministério da Saúde e o funcionamento do “gabinete do ódio”.