No topo da lista de desestatizações prometidas pelo governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, a Sabesp deve passar por um processo de venda de ativos similar ao modelo ocorrido com a Eletrobras, em que o Estado perde o controle acionário da empresa. Segundo a secretária de Infraestrutura, Meio Ambiente e Logística de São Paulo, Natália Resende, uma proposta estudada pela nova administração é manter menor participação na companhia em um desenho que daria ao governo a palavra final sobre investimentos prioritários da empresa.
A modelagem, segundo ela, permite que municípios que não possuem abastecimento de água e esgoto não sejam preteridos no futuro. Natália também defende que a desestatização não acarreta no aumento da tarifa. “O que atrai o privado é o projeto como um todo. O que a gente está pensando aqui é como melhorar o serviço, com uma tarifa mais módica e atingindo esses locais”, disse ao Estadão.
Natália minimizou críticas de que a agenda ambiental paulista estaria suprimida ao ser inclusa sob o mesmo guarda-chuva de áreas relacionadas a obras públicas, por exemplo. A nova “supersecretaria” englobou a maior companhia de São Paulo, a Sabesp, que distribui água e esgoto, bem como a Emae, de energia, a Cetesb, que fiscaliza e emite licenças ambientais, o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) e o Departamento de Estradas e Rodagem (DER).
Ela também afirmou que a nova pasta vai contar com um núcleo de compliance e outro de sustentabilidade e mudanças climáticas que devem funcionar de forma transversal nos projetos. A secretária também argumentou que a nova administração encontrou irregularidades na contratação de funcionários da administração direta na indireta que já foram comunicadas ao Tribunal de Contas.
Como aconteceu a fusão da secretaria de Transporte e Logística com a de Infraestrutura e Meio Ambiente e quais são as prioridades da nova pasta?
Hoje temos quatro subsecretarias ligadas por um núcleo de sustentabilidade (e mudanças climáticas) e um de compliance: meio ambiente; recursos hídricos e saneamento básico; energia e mineração; e logística e transporte. A secretaria executiva é transversal. A subsecretaria de Logística (por exemplo) vai focar em uma parte mais estruturante. A nossa matriz origem-destino está desatualizada e ela considera muito o modo rodoviário. A gente quer trazer para ela o ferroviário e o hidroviário e estudar onde é que tem carga, demanda e oferta para conseguir fazer parcerias, por exemplo, para as balsas, que têm uma estrutura precária.
Antes não existia compliance na pasta?
O que tinha era uma espécie de controle interno de recepção e encaminhamento de demanda de órgãos de controle. A gente quer fazer um programa robusto de compliance, porque é importante tanto para dentro, para a gente ter uma supervisão dos projetos em conformidade com a normatização, quanto para fora, porque isso passa uma mensagem muito importante para investidor. O que acontece em órgãos públicos, muitas vezes, é que as informações ficam muito nas pessoas e as informações têm que ser institucionais.
Há uma preocupação com controle de gastos e superfaturamento?
Essa parte do compliance envolve tudo, envolve gasto público, orçamento, acompanhamento constante das ações, dos dispêndios e é por isso também que é importante transparência. A gente vai ter um acompanhamento semanal dessas ações, desses projetos. A minha ideia é que esse núcleo tenha um check list de projetos estratégicos para monitoramento, supervisão e gestão de riscos.
A reforma administrativa proposta pelo governador afeta a secretaria?
Essa reforma vai ser muito importante. Quando a gente chegou, viu uma estrutura muito precária da administração direta e algumas irregularidades também, que isso a gente já vem conversando com o Tribunal de Contas, de funcionários de administração indireta de empresas vinculadas prestando serviço aqui. Ganhando mais, porque a administração indireta paga mais do que a direta. Então isso é uma coisa que a gente vai regularizar. E é importante valorização de quadros técnicos com bagagem e experiência.
No centro da discussão sobre parcerias e desestatização está a Sabesp. Hoje o governo avalia qual modelo para a empresa?
Nos 100 primeiros dias a ideia é fazer contratação dos estudos. A gente tem o feeling da Eletrobras por tudo que a gente acompanhou, com a peculiaridade que é o saneamento no Brasil. A particularidade do setor de águas começa até em questão de competência. Para ter o ganho do valor que a gente quer antecipar de investimento, a gente vai conversar com os municípios, porque eles têm os contratos de programas que é um grande ativo da Sabesp.
O que pode ser importado do modelo Eletrobras?
(A Sabesp) Já tem uma grande parte que está listado em bolsa. O pessoal fala assim: se é privatização, o Estado vai sair completamente. E não é isso. O que a gente pode fazer é diluir essas ações na lógica da Eletrobras, ou seja, aumentar a quantidade de ações do privado, mas permanecer com o que a gente chama do golden share, por exemplo, que significa: em decisões estratégicas o Estado permanece com poder de voto.
Mesmo perdendo o controle acionário?
Perde o controle acionário mas permanece com o poder de veto, digamos, em relação a assuntos estratégicos. Exemplo é a questão dos investimentos em locais em que ainda não chegou o saneamento. Então isso é um assunto estratégico para o Estado que muitas vezes o privado vai olhar e falar ‘onde que para mim é mais rentável fazer o investimento’, mas para o Estado todo local é importante.
Isso vai atrair o privado, se ele não vai ter a palavra final?
O que atrai o privado é o projeto como um todo. A empresa tem muito valor. Às vezes o pessoal foca muito no ativo na empresa e esquece do que é mais importante, que é o serviço. O que a gente está pensando aqui é como melhorar o serviço, com uma tarifa mais módica e atingindo esses locais.
Como o Estado pode garantir a redução no preço da tarifa sem o controle acionário?
Fazendo a modelagem. A gente está falando aqui da prorrogação dos contratos, por exemplo, da Sabesp; de aumentar e antecipar investimento. Quando você aumenta o prazo, você consegue também abaixar a tarifa. Consegue fazer essa essa junção aqui de questões regulatórias para ter esse objetivo final.
Como o cidadão ganha com a desestatização?
(Há um) Ganho de antecipação de investimento da universalização. A gente vai gerar um valor de outorga e pode carimbar de certa forma para fazer projetos indiretos, que podem ser relacionados à drenagem e à despoluição. Cada município tem sua especificidade. É conversar com os prefeitos e mostrar por que que a desestatização pode ser boa para o estado de São Paulo e para o município. Quando a gente faz isso, se precisar eventualmente de alguma aprovação, fica mais fácil.
E qual o ganho para o Estado com a venda da Emae? A empresa tem um valor robusto?
Ela tem um valor bom seja pela potencialidade, porque hoje ela não atinge o potencial que poderia, seja pelos contratos que ela tem. Ela tem muitos imóveis. Então isso tudo vai agregando. Vou olhar o valor hoje, mais de R$ 2 bilhões, mas eu acho que ela vale até mais porque tem essas coisas que às vezes o mercado nem enxerga. E é isso que a gente quer mostrar.
A secretaria de Logística e Transporte sofria um interesse político grande, principalmente o DER. Como vai blindar a pasta destas pressões?
A gente formou uma diretoria muito técnica no DER. O coronel Sergio Codelo é coronel da reserva, e engenheiro. Tem muita experiência. É uma pessoa de confiança do Tarcísio. Muito técnico, tem método, é organizado. A gente formou ali um corpo para valorizar o técnico.
A sra. citou a transversabilidade da sustentabilidade. Quais os projetos nessa área? A despoluição do Rio Tietê é prioridade?
A gente vai fortalecer o protagonismo dela como um todo, tanto na biodiversidade, fiscalização, conservação e restauração ecológica. Quando a gente fala do nosso plano de logística, por exemplo, na secretaria a gente já tem um trabalho desenvolvido de zoneamento ecológico econômico. Quando o pessoal fala que o Meio Ambiente vai ser enfraquecido, de forma alguma. É o contrário. Agora em fevereiro a gente vai lançar um comitê integrado do Tietê, para diagnosticar e fazer um plano conjunto de ações. A primeira chave do sucesso é fazer as coisas integradas. A gente vai fazer um plano de trabalho até considerando a outorga que pode eventualmente usar para despoluição no âmbito da desestatização.
O processo de licenciamento ambiental muda com a inclusão do Meio Ambiente no guarda-chuva de Infraestrutura e Logística?
Toda obra de infraestrutura, seja em concessão, seja obra pública, sempre vai olhar a condicionante ambiental. A Cetesb tem a independência dela pela lei das estatais e a gente sempre vai respeitar muito seu papel. O que é a gente consegue na Cetesb é ter desburocratização e desburocratização não quer dizer facilitação, não é isso. É o que a gente pode aprimorar dos processos hoje para conseguir prestar um serviço melhor, para ter o tempo razoável que a sociedade pede.