Labirintos da Política

Opinião|General Heleno sempre esteve ao lado de Bolsonaro, da campanha ao último dia de governo


Na CPMI, ele dirá que nunca ouviu falar em golpe em 1.460 dias sendo unha e carne do ex-presidente

Por Monica Gugliano
Atualização:

Você tem dinheiro?

Não, mas eu tenho a internet.

Lá pelos idos de 2016, com o diálogo acima, o general reformado Augusto Heleno Ribeiro Pereira queria saber se Jair Bolsonaro – que naquele momento dividia um prato com ele na franquia de restaurantes Camarada Camarão, num shopping da Barra da Tijuca (RJ) – teria recursos financeiros para enfrentar a campanha eleitoral à Presidência da República que se avizinhava em 2018. Aparentemente, pelo que respondeu ao general, dinheiro, não tinha. Mas já azeitava a máquina da internet, as fake news e o gabinete do ódio que instalou no Palácio do Planalto após a sua posse.

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Quase sete anos depois dessa conversa com o então deputado Jair Bolsonaro, o general Augusto Heleno Ribeiro Pereira, detentor da Medalha Marechal Hermes, concedida aos militares que se formam em primeiro lugar nas três escolas (Aman, EsAO e ECEME), deve comparecer ao plenário da CPMI do 8 de janeiro do Congresso Nacional, para ser sabatinado nesta terça-feira, 26. O general foi um dos articuladores da campanha e responsável por aparar arestas entre o “rebelde” ex-capitão e os militares. Na véspera da votação em outubro de 2018, as Forças Armadas tinham praticamente aderido em massa à candidatura bolsonarista.

Ex-presidente Jair Bolsonaro e o então ministro do GSI, Augusto Heleno; auxiliar estava sempre ao lado do chefe ao longo do governo Foto: Marcos Corrêa/PR/Divulgação

Heleno – que me contou o episódio durante uma entrevista no começo do governo de Bolsonaro – foi um dos militares mais promissores de sua geração. Diziam que, sem dúvida, seria Comandante do Exército. Passou por praticamente todas as etapas que seus colegas, alçados ao topo da carreira, percorreram. Mas, já na reserva e ao lado de Bolsonaro, viu-se envolvido em episódios que supostamente só lhe trouxeram encrencas e, por fim, devem levá-lo ao dia de hoje, quando deverá estar na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) no Congresso Nacional, onde deverá responder se participou ou não das tramas para, em pleno século XXI, tentar dar um golpe na maior democracia da América Latina.

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Heleno avisou a interlocutores que não será silêncio que o plenário ouvirá dele. Assim como não foi na CPI dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa do DF. Já disse que rebaterá as acusações e dirá que, se algo aconteceu, se alguém falou em golpe, não foi ele ou alguém que ele conheça. De qualquer maneira, seus advogados garantiram o direito de ficar em silêncio durante o depoimento. Sempre vale prevenir. Ficamos combinados assim.

Pode, entretanto, soar estranho. Se considerarmos que cada um tem uma forma de exercer o poder, a de Heleno é característica por ocupar todos os espaços do território disponíveis e mais aqueles que ainda possam ser conquistados sem trégua. E, a não ser que nunca, ninguém, tenha pronunciado a palavra “golpe”, dificilmente ele não a ouviria.

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Durante os 1.460 dias em que foi ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Heleno esteve praticamente sempre ao lado de Bolsonaro, inclusive nas viagens. E é raro que isso aconteça na história do departamento. Seus antecessores não acompanhavam o chefe dessa forma. Pode-se sempre dizer que Bolsonaro, vítima de um atentado a faca que quase o matou antes de sua eleição, se sentia mais protegido com a presença do chefe do GSI. Sabe-se lá se o senhor de cabelos alvos lhe passava mais segurança que os agentes em plena forma, bem preparados e armados que o cercavam. Quem pode saber? Existia ainda a possibilidade de Heleno gostar de estar por perto do chefe diuturnamente. Nesse caso, ele, Heleno, se sentia mais seguro do que deixando a proteção por conta de seus subordinados.

Certa vez, em uma das viagens, a polícia espanhola encontrou cocaína a bordo do avião reserva da Presidência, numa parada técnica, em Madri. Heleno disse que não sabia como a droga tinha aparecido lá e que nada tinha a ver com isso. Está certo. Afinal, não lhe cabia cuidar da segurança da aeronave que transportaria o presidente da República, caso algo acontecesse com o avião principal. Se, em vez de drogas, levassem armas, bombas, granadas, problema de quem fosse no avião. O presidente da República – a quem Heleno deveria proteger – não estaria lá.

Em outra ocasião, um ano após a posse, o Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou que poderia apreender o celular do presidente da República. Já naquele tempo, Bolsonaro, segundo informações da época, tramava intervir na Corte, com base no artigo 142 da Constituição. É o mesmo usado na suposta minuta de golpe encontrada agora pela Polícia Federal na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres. Heleno ficou indignado com tamanha ousadia dos ministros e foi direto ao ponto. Divulgou uma nota em que definia o gesto do STF como “inconcebível” e diz que teria “consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional”. Ele nunca disse quais seriam.

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Diálogo entre general Heleno e Jair Bolsonaro se iniciou ainda antes da campanha presidencial, cresceu durante a disputa e garantiu um cargo de ministro do Gabinete de Segurança Institucional ao militar com a posse do presidente Foto: Evaristo Sá / AFP

Nas reuniões palacianas, (no Planalto e no Alvorada) era quase certo ver a figura de Heleno por lá. O tema era transportes, Heleno estava lá. O tema era saúde – ainda mais em tempos de pandemia da covid-19 – Heleno estava lá. Era infraestrutura, educação, economia, também. Entende-se. O chefe do GSI, primordialmente, é o chefe da segurança do presidente, do vice e dos seus familiares e era também o chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Em todas as reuniões com militares, é só buscar as fotos – Heleno era presença indefectível. Mas não lhe pergunte o que acontecia lá. Quando Bolsonaro, derrotado por Lula, se recolheu no Alvorada, Heleno era um dos poucos frequentadores da residência oficial. Segundo as informações que estariam na delação premiada de Mauro Cid, foi lá onde se traçaram as linhas gerais do documento que seria a base da tentativa de golpe. Heleno tampouco alguma vez viu esse papel ou ouviu falar sobre outro possível atentado à democracia.

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Na suposta reunião descrita por Cid com a presença dos três comandantes militares, Heleno, segundo diz, também não estava. E mais: “Nunca ouvi do presidente ou de ninguém alguma afirmação sobre jogar fora das quatro linhas da Constituição”. Seguindo a comparação que sempre foi usada pelo governo anterior, ele sempre esteve dentro do campo, em posição regular. Resta somente saber se os parlamentares vão lembrar que o viram nessa posição de centroavante e aceitarão a versão de um dos principais conselheiros do ex-presidente.

Você tem dinheiro?

Não, mas eu tenho a internet.

Lá pelos idos de 2016, com o diálogo acima, o general reformado Augusto Heleno Ribeiro Pereira queria saber se Jair Bolsonaro – que naquele momento dividia um prato com ele na franquia de restaurantes Camarada Camarão, num shopping da Barra da Tijuca (RJ) – teria recursos financeiros para enfrentar a campanha eleitoral à Presidência da República que se avizinhava em 2018. Aparentemente, pelo que respondeu ao general, dinheiro, não tinha. Mas já azeitava a máquina da internet, as fake news e o gabinete do ódio que instalou no Palácio do Planalto após a sua posse.

Quase sete anos depois dessa conversa com o então deputado Jair Bolsonaro, o general Augusto Heleno Ribeiro Pereira, detentor da Medalha Marechal Hermes, concedida aos militares que se formam em primeiro lugar nas três escolas (Aman, EsAO e ECEME), deve comparecer ao plenário da CPMI do 8 de janeiro do Congresso Nacional, para ser sabatinado nesta terça-feira, 26. O general foi um dos articuladores da campanha e responsável por aparar arestas entre o “rebelde” ex-capitão e os militares. Na véspera da votação em outubro de 2018, as Forças Armadas tinham praticamente aderido em massa à candidatura bolsonarista.

Ex-presidente Jair Bolsonaro e o então ministro do GSI, Augusto Heleno; auxiliar estava sempre ao lado do chefe ao longo do governo Foto: Marcos Corrêa/PR/Divulgação

Heleno – que me contou o episódio durante uma entrevista no começo do governo de Bolsonaro – foi um dos militares mais promissores de sua geração. Diziam que, sem dúvida, seria Comandante do Exército. Passou por praticamente todas as etapas que seus colegas, alçados ao topo da carreira, percorreram. Mas, já na reserva e ao lado de Bolsonaro, viu-se envolvido em episódios que supostamente só lhe trouxeram encrencas e, por fim, devem levá-lo ao dia de hoje, quando deverá estar na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) no Congresso Nacional, onde deverá responder se participou ou não das tramas para, em pleno século XXI, tentar dar um golpe na maior democracia da América Latina.

Heleno avisou a interlocutores que não será silêncio que o plenário ouvirá dele. Assim como não foi na CPI dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa do DF. Já disse que rebaterá as acusações e dirá que, se algo aconteceu, se alguém falou em golpe, não foi ele ou alguém que ele conheça. De qualquer maneira, seus advogados garantiram o direito de ficar em silêncio durante o depoimento. Sempre vale prevenir. Ficamos combinados assim.

Pode, entretanto, soar estranho. Se considerarmos que cada um tem uma forma de exercer o poder, a de Heleno é característica por ocupar todos os espaços do território disponíveis e mais aqueles que ainda possam ser conquistados sem trégua. E, a não ser que nunca, ninguém, tenha pronunciado a palavra “golpe”, dificilmente ele não a ouviria.

Durante os 1.460 dias em que foi ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Heleno esteve praticamente sempre ao lado de Bolsonaro, inclusive nas viagens. E é raro que isso aconteça na história do departamento. Seus antecessores não acompanhavam o chefe dessa forma. Pode-se sempre dizer que Bolsonaro, vítima de um atentado a faca que quase o matou antes de sua eleição, se sentia mais protegido com a presença do chefe do GSI. Sabe-se lá se o senhor de cabelos alvos lhe passava mais segurança que os agentes em plena forma, bem preparados e armados que o cercavam. Quem pode saber? Existia ainda a possibilidade de Heleno gostar de estar por perto do chefe diuturnamente. Nesse caso, ele, Heleno, se sentia mais seguro do que deixando a proteção por conta de seus subordinados.

Certa vez, em uma das viagens, a polícia espanhola encontrou cocaína a bordo do avião reserva da Presidência, numa parada técnica, em Madri. Heleno disse que não sabia como a droga tinha aparecido lá e que nada tinha a ver com isso. Está certo. Afinal, não lhe cabia cuidar da segurança da aeronave que transportaria o presidente da República, caso algo acontecesse com o avião principal. Se, em vez de drogas, levassem armas, bombas, granadas, problema de quem fosse no avião. O presidente da República – a quem Heleno deveria proteger – não estaria lá.

Em outra ocasião, um ano após a posse, o Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou que poderia apreender o celular do presidente da República. Já naquele tempo, Bolsonaro, segundo informações da época, tramava intervir na Corte, com base no artigo 142 da Constituição. É o mesmo usado na suposta minuta de golpe encontrada agora pela Polícia Federal na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres. Heleno ficou indignado com tamanha ousadia dos ministros e foi direto ao ponto. Divulgou uma nota em que definia o gesto do STF como “inconcebível” e diz que teria “consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional”. Ele nunca disse quais seriam.

Diálogo entre general Heleno e Jair Bolsonaro se iniciou ainda antes da campanha presidencial, cresceu durante a disputa e garantiu um cargo de ministro do Gabinete de Segurança Institucional ao militar com a posse do presidente Foto: Evaristo Sá / AFP

Nas reuniões palacianas, (no Planalto e no Alvorada) era quase certo ver a figura de Heleno por lá. O tema era transportes, Heleno estava lá. O tema era saúde – ainda mais em tempos de pandemia da covid-19 – Heleno estava lá. Era infraestrutura, educação, economia, também. Entende-se. O chefe do GSI, primordialmente, é o chefe da segurança do presidente, do vice e dos seus familiares e era também o chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Em todas as reuniões com militares, é só buscar as fotos – Heleno era presença indefectível. Mas não lhe pergunte o que acontecia lá. Quando Bolsonaro, derrotado por Lula, se recolheu no Alvorada, Heleno era um dos poucos frequentadores da residência oficial. Segundo as informações que estariam na delação premiada de Mauro Cid, foi lá onde se traçaram as linhas gerais do documento que seria a base da tentativa de golpe. Heleno tampouco alguma vez viu esse papel ou ouviu falar sobre outro possível atentado à democracia.

Na suposta reunião descrita por Cid com a presença dos três comandantes militares, Heleno, segundo diz, também não estava. E mais: “Nunca ouvi do presidente ou de ninguém alguma afirmação sobre jogar fora das quatro linhas da Constituição”. Seguindo a comparação que sempre foi usada pelo governo anterior, ele sempre esteve dentro do campo, em posição regular. Resta somente saber se os parlamentares vão lembrar que o viram nessa posição de centroavante e aceitarão a versão de um dos principais conselheiros do ex-presidente.

Você tem dinheiro?

Não, mas eu tenho a internet.

Lá pelos idos de 2016, com o diálogo acima, o general reformado Augusto Heleno Ribeiro Pereira queria saber se Jair Bolsonaro – que naquele momento dividia um prato com ele na franquia de restaurantes Camarada Camarão, num shopping da Barra da Tijuca (RJ) – teria recursos financeiros para enfrentar a campanha eleitoral à Presidência da República que se avizinhava em 2018. Aparentemente, pelo que respondeu ao general, dinheiro, não tinha. Mas já azeitava a máquina da internet, as fake news e o gabinete do ódio que instalou no Palácio do Planalto após a sua posse.

Quase sete anos depois dessa conversa com o então deputado Jair Bolsonaro, o general Augusto Heleno Ribeiro Pereira, detentor da Medalha Marechal Hermes, concedida aos militares que se formam em primeiro lugar nas três escolas (Aman, EsAO e ECEME), deve comparecer ao plenário da CPMI do 8 de janeiro do Congresso Nacional, para ser sabatinado nesta terça-feira, 26. O general foi um dos articuladores da campanha e responsável por aparar arestas entre o “rebelde” ex-capitão e os militares. Na véspera da votação em outubro de 2018, as Forças Armadas tinham praticamente aderido em massa à candidatura bolsonarista.

Ex-presidente Jair Bolsonaro e o então ministro do GSI, Augusto Heleno; auxiliar estava sempre ao lado do chefe ao longo do governo Foto: Marcos Corrêa/PR/Divulgação

Heleno – que me contou o episódio durante uma entrevista no começo do governo de Bolsonaro – foi um dos militares mais promissores de sua geração. Diziam que, sem dúvida, seria Comandante do Exército. Passou por praticamente todas as etapas que seus colegas, alçados ao topo da carreira, percorreram. Mas, já na reserva e ao lado de Bolsonaro, viu-se envolvido em episódios que supostamente só lhe trouxeram encrencas e, por fim, devem levá-lo ao dia de hoje, quando deverá estar na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) no Congresso Nacional, onde deverá responder se participou ou não das tramas para, em pleno século XXI, tentar dar um golpe na maior democracia da América Latina.

Heleno avisou a interlocutores que não será silêncio que o plenário ouvirá dele. Assim como não foi na CPI dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa do DF. Já disse que rebaterá as acusações e dirá que, se algo aconteceu, se alguém falou em golpe, não foi ele ou alguém que ele conheça. De qualquer maneira, seus advogados garantiram o direito de ficar em silêncio durante o depoimento. Sempre vale prevenir. Ficamos combinados assim.

Pode, entretanto, soar estranho. Se considerarmos que cada um tem uma forma de exercer o poder, a de Heleno é característica por ocupar todos os espaços do território disponíveis e mais aqueles que ainda possam ser conquistados sem trégua. E, a não ser que nunca, ninguém, tenha pronunciado a palavra “golpe”, dificilmente ele não a ouviria.

Durante os 1.460 dias em que foi ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Heleno esteve praticamente sempre ao lado de Bolsonaro, inclusive nas viagens. E é raro que isso aconteça na história do departamento. Seus antecessores não acompanhavam o chefe dessa forma. Pode-se sempre dizer que Bolsonaro, vítima de um atentado a faca que quase o matou antes de sua eleição, se sentia mais protegido com a presença do chefe do GSI. Sabe-se lá se o senhor de cabelos alvos lhe passava mais segurança que os agentes em plena forma, bem preparados e armados que o cercavam. Quem pode saber? Existia ainda a possibilidade de Heleno gostar de estar por perto do chefe diuturnamente. Nesse caso, ele, Heleno, se sentia mais seguro do que deixando a proteção por conta de seus subordinados.

Certa vez, em uma das viagens, a polícia espanhola encontrou cocaína a bordo do avião reserva da Presidência, numa parada técnica, em Madri. Heleno disse que não sabia como a droga tinha aparecido lá e que nada tinha a ver com isso. Está certo. Afinal, não lhe cabia cuidar da segurança da aeronave que transportaria o presidente da República, caso algo acontecesse com o avião principal. Se, em vez de drogas, levassem armas, bombas, granadas, problema de quem fosse no avião. O presidente da República – a quem Heleno deveria proteger – não estaria lá.

Em outra ocasião, um ano após a posse, o Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou que poderia apreender o celular do presidente da República. Já naquele tempo, Bolsonaro, segundo informações da época, tramava intervir na Corte, com base no artigo 142 da Constituição. É o mesmo usado na suposta minuta de golpe encontrada agora pela Polícia Federal na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres. Heleno ficou indignado com tamanha ousadia dos ministros e foi direto ao ponto. Divulgou uma nota em que definia o gesto do STF como “inconcebível” e diz que teria “consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional”. Ele nunca disse quais seriam.

Diálogo entre general Heleno e Jair Bolsonaro se iniciou ainda antes da campanha presidencial, cresceu durante a disputa e garantiu um cargo de ministro do Gabinete de Segurança Institucional ao militar com a posse do presidente Foto: Evaristo Sá / AFP

Nas reuniões palacianas, (no Planalto e no Alvorada) era quase certo ver a figura de Heleno por lá. O tema era transportes, Heleno estava lá. O tema era saúde – ainda mais em tempos de pandemia da covid-19 – Heleno estava lá. Era infraestrutura, educação, economia, também. Entende-se. O chefe do GSI, primordialmente, é o chefe da segurança do presidente, do vice e dos seus familiares e era também o chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Em todas as reuniões com militares, é só buscar as fotos – Heleno era presença indefectível. Mas não lhe pergunte o que acontecia lá. Quando Bolsonaro, derrotado por Lula, se recolheu no Alvorada, Heleno era um dos poucos frequentadores da residência oficial. Segundo as informações que estariam na delação premiada de Mauro Cid, foi lá onde se traçaram as linhas gerais do documento que seria a base da tentativa de golpe. Heleno tampouco alguma vez viu esse papel ou ouviu falar sobre outro possível atentado à democracia.

Na suposta reunião descrita por Cid com a presença dos três comandantes militares, Heleno, segundo diz, também não estava. E mais: “Nunca ouvi do presidente ou de ninguém alguma afirmação sobre jogar fora das quatro linhas da Constituição”. Seguindo a comparação que sempre foi usada pelo governo anterior, ele sempre esteve dentro do campo, em posição regular. Resta somente saber se os parlamentares vão lembrar que o viram nessa posição de centroavante e aceitarão a versão de um dos principais conselheiros do ex-presidente.

Opinião por Monica Gugliano

É repórter de Política do Estadão. Escreve às terças-feiras

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