Labirintos da Política

Opinião|Guerra política é entrave para enfrentamento oficial à tragédia das chuvas no Rio Grande do Sul


Representantes do governo federal, Estado e prefeitura de Porto Alegre mostram incapacidade de lidar com estragos e drama causados pelas enchentes

Por Monica Gugliano

A família de Dourado, o pequeno canarinho, teve, como todas as demais que vivem em mais da metade do Rio Grande do Sul, que sair às pressas do prédio onde morava. Dourado ficou. Recebeu uma cota extra de alimentos. Afinal, aquela torrente de águas que desabava do céu, imaginava-se, duraria dois ou três dias. Mas, não foi isso que aconteceu. A família de Dourado começou a ficar preocupada.

Os dias passavam e Dourado continuava sozinho. Até que Adriana, a dona, convenceu o filho de que deveriam buscá-lo. Era isso ou ele morreria. Num dia de manhã, debaixo de chuva, saíram para resgatar Dourado. Quando chegaram ao prédio havia quase um metro e meio de água na entrada. Eles não teriam como entrar. Foi quando apareceu um pequeno barco com dois rapazes. Adriana e o filho Nicolás lhes pediram ajuda.

Autoridades públicas demonstram incapacidade de lidar com a tragédia, enquanto voluntariado trabalha Foto: WILTON JUNIOR/ ESTADÃO
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Os dois cidadãos rapidamente concordaram e foi montada uma pequena operação de salvamento para Dourado. Quando saiu de casa, estava em um canto da jaulinha, todo acinzentado. Em nada lembrava o passarinho amarelo que fora. Mas estava vivo, junto com sua família, e iria para a casa de Alfredo, onde Adriana estava abrigada. No dia seguinte, ressuscitou. Estava novamente amarelinho, pulando, provavelmente grato pela vida que lhe haviam devolvido.

O Brasil inteiro deu um exemplo de comovente solidariedade para com os gaúchos. Quantas vidas não foram salvas graças a essa empatia? Não fosse todo esse esforço humanitário da sociedade, provável que a catástrofe tivesse sido pior, se é que isso é possível. E por quê? Simples. Pois oculta pela água pútrida, se trava uma briga política fratricida entre quem mais pode perder ou ganhar alguma coisa nesse profundo cenário de adversidade e desolação. Uma energia que poderia ser gasta em ajudar desabrigados, desalojados e desamparados.

E aí começam as baixarias ou as frases completamente non sense. Bem disposto e exibindo saúde na campanha, o ex-vice-presidente e senador general Hamilton Mourão parece ter envelhecido muito nesse ano e sete meses de mandato. Ao ser perguntado por que não havia comparecido para ajudar seu Estado, respondeu: “quantos homens de 70 anos estão aí no meio d”água?”.

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A criação do Ministério Extraordinário de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, entregue ao ministro da Comunicação Social, Paulo Pimenta, possível candidato ao governo do Rio Grande do Sul, jogou mais lenha nessa fogueira. O governador do Rio Grande do Sul (PSDB), Eduardo Leite, também montou a secretaria dele, mas acabou escorregando nas palavras numa entrevista: “Estudos alertaram, mas governo também vive outras agendas”.

Autoridades dos três níveis participam de sobrevoo sobre áreas afetadas no Rio Grande do Sul Foto: Foto: Ricardo Stuckert / PR

À época da criação do ministério, o governo federal considerou que era necessário ter um representante direto para capitalizar as ações e diretrizes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O problema é que Pimenta, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB) e Leite estão em partidos diferentes e cada um quer puxar a brasa para seu assado, quando se trata, por exemplo, de anunciar medidas como a suspensão da dívida do Estado por três anos. Mas são absolutamente evasivos no momento em que é preciso buscar responsabilidades.

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O prefeito Melo, que figurava como favorito para a reeleição – com mais de 40% de votos segundo a última pesquisa RealTime Big Data –, está afundando, segundo analistas de cenários eleitorais. Desde que a água começou a inundar Porto Alegre não se conhecem ações dele. Pelo contrário, sabe-se pela imprensa local que a Prefeitura irá agora investigar por qual motivo o Departamento de Águas e Esgoto (DMAE) não prestou atenção aos alertas feitos pelos seus próprios engenheiros de que as casas de bomba não estavam funcionando corretamente e havia riscos de alagamentos. A mesmas observações foram feitas por especialistas de fora. Mas Melo parece que até agora não tinha tomado conhecimento dos fatos.

A situação de Leite (PSDB), que tem mais um ano e sete meses de um novo mandato, é um pouco semelhante. Em entrevista ao jornal ‘O Globo’, reconheceu que o sistema antienchente de Porto Alegre não funcionou. Não sabe se foi porque muita água caiu dos céus ou por que os equipamentos não foram projetados para tanto ou por que os avisos para a população chegaram tarde. O fato é que seu Estado está debaixo d’água e que não tão cedo ele terá condições de circular pelo País, pensando em uma possível candidatura no campo da centro-direita em 2026.

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Entretanto, o ponto de alto dessa disputa por ações, poder etc, ou “dessa briga de foice no escuro”, como dizem os próprios gaúchos, ainda está por chegar. Leite tem ventilado a proposta a ser levada ao TSE de adiar as eleições municipais. Melo e os demais candidatos não querem sequer ouvir essa ideia. Fossem poucas as vidas perdidas, os bens materiais que foram destruídos, os gaúchos ainda vão enfrentar o triste dissabor de ver autoridades se engalfinhando em vez de buscando soluções para que a vida possa voltar ao normal. Dourado, o canarinho resgatado por dois cidadãos comuns numa canoa, teve mais sorte.

A família de Dourado, o pequeno canarinho, teve, como todas as demais que vivem em mais da metade do Rio Grande do Sul, que sair às pressas do prédio onde morava. Dourado ficou. Recebeu uma cota extra de alimentos. Afinal, aquela torrente de águas que desabava do céu, imaginava-se, duraria dois ou três dias. Mas, não foi isso que aconteceu. A família de Dourado começou a ficar preocupada.

Os dias passavam e Dourado continuava sozinho. Até que Adriana, a dona, convenceu o filho de que deveriam buscá-lo. Era isso ou ele morreria. Num dia de manhã, debaixo de chuva, saíram para resgatar Dourado. Quando chegaram ao prédio havia quase um metro e meio de água na entrada. Eles não teriam como entrar. Foi quando apareceu um pequeno barco com dois rapazes. Adriana e o filho Nicolás lhes pediram ajuda.

Autoridades públicas demonstram incapacidade de lidar com a tragédia, enquanto voluntariado trabalha Foto: WILTON JUNIOR/ ESTADÃO

Os dois cidadãos rapidamente concordaram e foi montada uma pequena operação de salvamento para Dourado. Quando saiu de casa, estava em um canto da jaulinha, todo acinzentado. Em nada lembrava o passarinho amarelo que fora. Mas estava vivo, junto com sua família, e iria para a casa de Alfredo, onde Adriana estava abrigada. No dia seguinte, ressuscitou. Estava novamente amarelinho, pulando, provavelmente grato pela vida que lhe haviam devolvido.

O Brasil inteiro deu um exemplo de comovente solidariedade para com os gaúchos. Quantas vidas não foram salvas graças a essa empatia? Não fosse todo esse esforço humanitário da sociedade, provável que a catástrofe tivesse sido pior, se é que isso é possível. E por quê? Simples. Pois oculta pela água pútrida, se trava uma briga política fratricida entre quem mais pode perder ou ganhar alguma coisa nesse profundo cenário de adversidade e desolação. Uma energia que poderia ser gasta em ajudar desabrigados, desalojados e desamparados.

E aí começam as baixarias ou as frases completamente non sense. Bem disposto e exibindo saúde na campanha, o ex-vice-presidente e senador general Hamilton Mourão parece ter envelhecido muito nesse ano e sete meses de mandato. Ao ser perguntado por que não havia comparecido para ajudar seu Estado, respondeu: “quantos homens de 70 anos estão aí no meio d”água?”.

A criação do Ministério Extraordinário de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, entregue ao ministro da Comunicação Social, Paulo Pimenta, possível candidato ao governo do Rio Grande do Sul, jogou mais lenha nessa fogueira. O governador do Rio Grande do Sul (PSDB), Eduardo Leite, também montou a secretaria dele, mas acabou escorregando nas palavras numa entrevista: “Estudos alertaram, mas governo também vive outras agendas”.

Autoridades dos três níveis participam de sobrevoo sobre áreas afetadas no Rio Grande do Sul Foto: Foto: Ricardo Stuckert / PR

À época da criação do ministério, o governo federal considerou que era necessário ter um representante direto para capitalizar as ações e diretrizes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O problema é que Pimenta, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB) e Leite estão em partidos diferentes e cada um quer puxar a brasa para seu assado, quando se trata, por exemplo, de anunciar medidas como a suspensão da dívida do Estado por três anos. Mas são absolutamente evasivos no momento em que é preciso buscar responsabilidades.

O prefeito Melo, que figurava como favorito para a reeleição – com mais de 40% de votos segundo a última pesquisa RealTime Big Data –, está afundando, segundo analistas de cenários eleitorais. Desde que a água começou a inundar Porto Alegre não se conhecem ações dele. Pelo contrário, sabe-se pela imprensa local que a Prefeitura irá agora investigar por qual motivo o Departamento de Águas e Esgoto (DMAE) não prestou atenção aos alertas feitos pelos seus próprios engenheiros de que as casas de bomba não estavam funcionando corretamente e havia riscos de alagamentos. A mesmas observações foram feitas por especialistas de fora. Mas Melo parece que até agora não tinha tomado conhecimento dos fatos.

A situação de Leite (PSDB), que tem mais um ano e sete meses de um novo mandato, é um pouco semelhante. Em entrevista ao jornal ‘O Globo’, reconheceu que o sistema antienchente de Porto Alegre não funcionou. Não sabe se foi porque muita água caiu dos céus ou por que os equipamentos não foram projetados para tanto ou por que os avisos para a população chegaram tarde. O fato é que seu Estado está debaixo d’água e que não tão cedo ele terá condições de circular pelo País, pensando em uma possível candidatura no campo da centro-direita em 2026.

Entretanto, o ponto de alto dessa disputa por ações, poder etc, ou “dessa briga de foice no escuro”, como dizem os próprios gaúchos, ainda está por chegar. Leite tem ventilado a proposta a ser levada ao TSE de adiar as eleições municipais. Melo e os demais candidatos não querem sequer ouvir essa ideia. Fossem poucas as vidas perdidas, os bens materiais que foram destruídos, os gaúchos ainda vão enfrentar o triste dissabor de ver autoridades se engalfinhando em vez de buscando soluções para que a vida possa voltar ao normal. Dourado, o canarinho resgatado por dois cidadãos comuns numa canoa, teve mais sorte.

A família de Dourado, o pequeno canarinho, teve, como todas as demais que vivem em mais da metade do Rio Grande do Sul, que sair às pressas do prédio onde morava. Dourado ficou. Recebeu uma cota extra de alimentos. Afinal, aquela torrente de águas que desabava do céu, imaginava-se, duraria dois ou três dias. Mas, não foi isso que aconteceu. A família de Dourado começou a ficar preocupada.

Os dias passavam e Dourado continuava sozinho. Até que Adriana, a dona, convenceu o filho de que deveriam buscá-lo. Era isso ou ele morreria. Num dia de manhã, debaixo de chuva, saíram para resgatar Dourado. Quando chegaram ao prédio havia quase um metro e meio de água na entrada. Eles não teriam como entrar. Foi quando apareceu um pequeno barco com dois rapazes. Adriana e o filho Nicolás lhes pediram ajuda.

Autoridades públicas demonstram incapacidade de lidar com a tragédia, enquanto voluntariado trabalha Foto: WILTON JUNIOR/ ESTADÃO

Os dois cidadãos rapidamente concordaram e foi montada uma pequena operação de salvamento para Dourado. Quando saiu de casa, estava em um canto da jaulinha, todo acinzentado. Em nada lembrava o passarinho amarelo que fora. Mas estava vivo, junto com sua família, e iria para a casa de Alfredo, onde Adriana estava abrigada. No dia seguinte, ressuscitou. Estava novamente amarelinho, pulando, provavelmente grato pela vida que lhe haviam devolvido.

O Brasil inteiro deu um exemplo de comovente solidariedade para com os gaúchos. Quantas vidas não foram salvas graças a essa empatia? Não fosse todo esse esforço humanitário da sociedade, provável que a catástrofe tivesse sido pior, se é que isso é possível. E por quê? Simples. Pois oculta pela água pútrida, se trava uma briga política fratricida entre quem mais pode perder ou ganhar alguma coisa nesse profundo cenário de adversidade e desolação. Uma energia que poderia ser gasta em ajudar desabrigados, desalojados e desamparados.

E aí começam as baixarias ou as frases completamente non sense. Bem disposto e exibindo saúde na campanha, o ex-vice-presidente e senador general Hamilton Mourão parece ter envelhecido muito nesse ano e sete meses de mandato. Ao ser perguntado por que não havia comparecido para ajudar seu Estado, respondeu: “quantos homens de 70 anos estão aí no meio d”água?”.

A criação do Ministério Extraordinário de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, entregue ao ministro da Comunicação Social, Paulo Pimenta, possível candidato ao governo do Rio Grande do Sul, jogou mais lenha nessa fogueira. O governador do Rio Grande do Sul (PSDB), Eduardo Leite, também montou a secretaria dele, mas acabou escorregando nas palavras numa entrevista: “Estudos alertaram, mas governo também vive outras agendas”.

Autoridades dos três níveis participam de sobrevoo sobre áreas afetadas no Rio Grande do Sul Foto: Foto: Ricardo Stuckert / PR

À época da criação do ministério, o governo federal considerou que era necessário ter um representante direto para capitalizar as ações e diretrizes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O problema é que Pimenta, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB) e Leite estão em partidos diferentes e cada um quer puxar a brasa para seu assado, quando se trata, por exemplo, de anunciar medidas como a suspensão da dívida do Estado por três anos. Mas são absolutamente evasivos no momento em que é preciso buscar responsabilidades.

O prefeito Melo, que figurava como favorito para a reeleição – com mais de 40% de votos segundo a última pesquisa RealTime Big Data –, está afundando, segundo analistas de cenários eleitorais. Desde que a água começou a inundar Porto Alegre não se conhecem ações dele. Pelo contrário, sabe-se pela imprensa local que a Prefeitura irá agora investigar por qual motivo o Departamento de Águas e Esgoto (DMAE) não prestou atenção aos alertas feitos pelos seus próprios engenheiros de que as casas de bomba não estavam funcionando corretamente e havia riscos de alagamentos. A mesmas observações foram feitas por especialistas de fora. Mas Melo parece que até agora não tinha tomado conhecimento dos fatos.

A situação de Leite (PSDB), que tem mais um ano e sete meses de um novo mandato, é um pouco semelhante. Em entrevista ao jornal ‘O Globo’, reconheceu que o sistema antienchente de Porto Alegre não funcionou. Não sabe se foi porque muita água caiu dos céus ou por que os equipamentos não foram projetados para tanto ou por que os avisos para a população chegaram tarde. O fato é que seu Estado está debaixo d’água e que não tão cedo ele terá condições de circular pelo País, pensando em uma possível candidatura no campo da centro-direita em 2026.

Entretanto, o ponto de alto dessa disputa por ações, poder etc, ou “dessa briga de foice no escuro”, como dizem os próprios gaúchos, ainda está por chegar. Leite tem ventilado a proposta a ser levada ao TSE de adiar as eleições municipais. Melo e os demais candidatos não querem sequer ouvir essa ideia. Fossem poucas as vidas perdidas, os bens materiais que foram destruídos, os gaúchos ainda vão enfrentar o triste dissabor de ver autoridades se engalfinhando em vez de buscando soluções para que a vida possa voltar ao normal. Dourado, o canarinho resgatado por dois cidadãos comuns numa canoa, teve mais sorte.

A família de Dourado, o pequeno canarinho, teve, como todas as demais que vivem em mais da metade do Rio Grande do Sul, que sair às pressas do prédio onde morava. Dourado ficou. Recebeu uma cota extra de alimentos. Afinal, aquela torrente de águas que desabava do céu, imaginava-se, duraria dois ou três dias. Mas, não foi isso que aconteceu. A família de Dourado começou a ficar preocupada.

Os dias passavam e Dourado continuava sozinho. Até que Adriana, a dona, convenceu o filho de que deveriam buscá-lo. Era isso ou ele morreria. Num dia de manhã, debaixo de chuva, saíram para resgatar Dourado. Quando chegaram ao prédio havia quase um metro e meio de água na entrada. Eles não teriam como entrar. Foi quando apareceu um pequeno barco com dois rapazes. Adriana e o filho Nicolás lhes pediram ajuda.

Autoridades públicas demonstram incapacidade de lidar com a tragédia, enquanto voluntariado trabalha Foto: WILTON JUNIOR/ ESTADÃO

Os dois cidadãos rapidamente concordaram e foi montada uma pequena operação de salvamento para Dourado. Quando saiu de casa, estava em um canto da jaulinha, todo acinzentado. Em nada lembrava o passarinho amarelo que fora. Mas estava vivo, junto com sua família, e iria para a casa de Alfredo, onde Adriana estava abrigada. No dia seguinte, ressuscitou. Estava novamente amarelinho, pulando, provavelmente grato pela vida que lhe haviam devolvido.

O Brasil inteiro deu um exemplo de comovente solidariedade para com os gaúchos. Quantas vidas não foram salvas graças a essa empatia? Não fosse todo esse esforço humanitário da sociedade, provável que a catástrofe tivesse sido pior, se é que isso é possível. E por quê? Simples. Pois oculta pela água pútrida, se trava uma briga política fratricida entre quem mais pode perder ou ganhar alguma coisa nesse profundo cenário de adversidade e desolação. Uma energia que poderia ser gasta em ajudar desabrigados, desalojados e desamparados.

E aí começam as baixarias ou as frases completamente non sense. Bem disposto e exibindo saúde na campanha, o ex-vice-presidente e senador general Hamilton Mourão parece ter envelhecido muito nesse ano e sete meses de mandato. Ao ser perguntado por que não havia comparecido para ajudar seu Estado, respondeu: “quantos homens de 70 anos estão aí no meio d”água?”.

A criação do Ministério Extraordinário de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, entregue ao ministro da Comunicação Social, Paulo Pimenta, possível candidato ao governo do Rio Grande do Sul, jogou mais lenha nessa fogueira. O governador do Rio Grande do Sul (PSDB), Eduardo Leite, também montou a secretaria dele, mas acabou escorregando nas palavras numa entrevista: “Estudos alertaram, mas governo também vive outras agendas”.

Autoridades dos três níveis participam de sobrevoo sobre áreas afetadas no Rio Grande do Sul Foto: Foto: Ricardo Stuckert / PR

À época da criação do ministério, o governo federal considerou que era necessário ter um representante direto para capitalizar as ações e diretrizes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O problema é que Pimenta, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB) e Leite estão em partidos diferentes e cada um quer puxar a brasa para seu assado, quando se trata, por exemplo, de anunciar medidas como a suspensão da dívida do Estado por três anos. Mas são absolutamente evasivos no momento em que é preciso buscar responsabilidades.

O prefeito Melo, que figurava como favorito para a reeleição – com mais de 40% de votos segundo a última pesquisa RealTime Big Data –, está afundando, segundo analistas de cenários eleitorais. Desde que a água começou a inundar Porto Alegre não se conhecem ações dele. Pelo contrário, sabe-se pela imprensa local que a Prefeitura irá agora investigar por qual motivo o Departamento de Águas e Esgoto (DMAE) não prestou atenção aos alertas feitos pelos seus próprios engenheiros de que as casas de bomba não estavam funcionando corretamente e havia riscos de alagamentos. A mesmas observações foram feitas por especialistas de fora. Mas Melo parece que até agora não tinha tomado conhecimento dos fatos.

A situação de Leite (PSDB), que tem mais um ano e sete meses de um novo mandato, é um pouco semelhante. Em entrevista ao jornal ‘O Globo’, reconheceu que o sistema antienchente de Porto Alegre não funcionou. Não sabe se foi porque muita água caiu dos céus ou por que os equipamentos não foram projetados para tanto ou por que os avisos para a população chegaram tarde. O fato é que seu Estado está debaixo d’água e que não tão cedo ele terá condições de circular pelo País, pensando em uma possível candidatura no campo da centro-direita em 2026.

Entretanto, o ponto de alto dessa disputa por ações, poder etc, ou “dessa briga de foice no escuro”, como dizem os próprios gaúchos, ainda está por chegar. Leite tem ventilado a proposta a ser levada ao TSE de adiar as eleições municipais. Melo e os demais candidatos não querem sequer ouvir essa ideia. Fossem poucas as vidas perdidas, os bens materiais que foram destruídos, os gaúchos ainda vão enfrentar o triste dissabor de ver autoridades se engalfinhando em vez de buscando soluções para que a vida possa voltar ao normal. Dourado, o canarinho resgatado por dois cidadãos comuns numa canoa, teve mais sorte.

A família de Dourado, o pequeno canarinho, teve, como todas as demais que vivem em mais da metade do Rio Grande do Sul, que sair às pressas do prédio onde morava. Dourado ficou. Recebeu uma cota extra de alimentos. Afinal, aquela torrente de águas que desabava do céu, imaginava-se, duraria dois ou três dias. Mas, não foi isso que aconteceu. A família de Dourado começou a ficar preocupada.

Os dias passavam e Dourado continuava sozinho. Até que Adriana, a dona, convenceu o filho de que deveriam buscá-lo. Era isso ou ele morreria. Num dia de manhã, debaixo de chuva, saíram para resgatar Dourado. Quando chegaram ao prédio havia quase um metro e meio de água na entrada. Eles não teriam como entrar. Foi quando apareceu um pequeno barco com dois rapazes. Adriana e o filho Nicolás lhes pediram ajuda.

Autoridades públicas demonstram incapacidade de lidar com a tragédia, enquanto voluntariado trabalha Foto: WILTON JUNIOR/ ESTADÃO

Os dois cidadãos rapidamente concordaram e foi montada uma pequena operação de salvamento para Dourado. Quando saiu de casa, estava em um canto da jaulinha, todo acinzentado. Em nada lembrava o passarinho amarelo que fora. Mas estava vivo, junto com sua família, e iria para a casa de Alfredo, onde Adriana estava abrigada. No dia seguinte, ressuscitou. Estava novamente amarelinho, pulando, provavelmente grato pela vida que lhe haviam devolvido.

O Brasil inteiro deu um exemplo de comovente solidariedade para com os gaúchos. Quantas vidas não foram salvas graças a essa empatia? Não fosse todo esse esforço humanitário da sociedade, provável que a catástrofe tivesse sido pior, se é que isso é possível. E por quê? Simples. Pois oculta pela água pútrida, se trava uma briga política fratricida entre quem mais pode perder ou ganhar alguma coisa nesse profundo cenário de adversidade e desolação. Uma energia que poderia ser gasta em ajudar desabrigados, desalojados e desamparados.

E aí começam as baixarias ou as frases completamente non sense. Bem disposto e exibindo saúde na campanha, o ex-vice-presidente e senador general Hamilton Mourão parece ter envelhecido muito nesse ano e sete meses de mandato. Ao ser perguntado por que não havia comparecido para ajudar seu Estado, respondeu: “quantos homens de 70 anos estão aí no meio d”água?”.

A criação do Ministério Extraordinário de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, entregue ao ministro da Comunicação Social, Paulo Pimenta, possível candidato ao governo do Rio Grande do Sul, jogou mais lenha nessa fogueira. O governador do Rio Grande do Sul (PSDB), Eduardo Leite, também montou a secretaria dele, mas acabou escorregando nas palavras numa entrevista: “Estudos alertaram, mas governo também vive outras agendas”.

Autoridades dos três níveis participam de sobrevoo sobre áreas afetadas no Rio Grande do Sul Foto: Foto: Ricardo Stuckert / PR

À época da criação do ministério, o governo federal considerou que era necessário ter um representante direto para capitalizar as ações e diretrizes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O problema é que Pimenta, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB) e Leite estão em partidos diferentes e cada um quer puxar a brasa para seu assado, quando se trata, por exemplo, de anunciar medidas como a suspensão da dívida do Estado por três anos. Mas são absolutamente evasivos no momento em que é preciso buscar responsabilidades.

O prefeito Melo, que figurava como favorito para a reeleição – com mais de 40% de votos segundo a última pesquisa RealTime Big Data –, está afundando, segundo analistas de cenários eleitorais. Desde que a água começou a inundar Porto Alegre não se conhecem ações dele. Pelo contrário, sabe-se pela imprensa local que a Prefeitura irá agora investigar por qual motivo o Departamento de Águas e Esgoto (DMAE) não prestou atenção aos alertas feitos pelos seus próprios engenheiros de que as casas de bomba não estavam funcionando corretamente e havia riscos de alagamentos. A mesmas observações foram feitas por especialistas de fora. Mas Melo parece que até agora não tinha tomado conhecimento dos fatos.

A situação de Leite (PSDB), que tem mais um ano e sete meses de um novo mandato, é um pouco semelhante. Em entrevista ao jornal ‘O Globo’, reconheceu que o sistema antienchente de Porto Alegre não funcionou. Não sabe se foi porque muita água caiu dos céus ou por que os equipamentos não foram projetados para tanto ou por que os avisos para a população chegaram tarde. O fato é que seu Estado está debaixo d’água e que não tão cedo ele terá condições de circular pelo País, pensando em uma possível candidatura no campo da centro-direita em 2026.

Entretanto, o ponto de alto dessa disputa por ações, poder etc, ou “dessa briga de foice no escuro”, como dizem os próprios gaúchos, ainda está por chegar. Leite tem ventilado a proposta a ser levada ao TSE de adiar as eleições municipais. Melo e os demais candidatos não querem sequer ouvir essa ideia. Fossem poucas as vidas perdidas, os bens materiais que foram destruídos, os gaúchos ainda vão enfrentar o triste dissabor de ver autoridades se engalfinhando em vez de buscando soluções para que a vida possa voltar ao normal. Dourado, o canarinho resgatado por dois cidadãos comuns numa canoa, teve mais sorte.

Opinião por Monica Gugliano

É repórter de Política do Estadão. Escreve às terças-feiras

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