BRASÍLIA – O julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pode tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível entrou na “vala comum” do cronograma de sessões da Corte. Foi assim que o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, rebateu críticas de bolsonaristas, para quem o tribunal tem atuado de forma política.
“O TSE tem de julgar de acordo com a lei e a Constituição. Nós limpamos todos os processos liberados para a pauta. Não seria esse caso, por envolver um ex-presidente, que eu tiraria (dizendo): ‘Ah, vou esperar o momento propício’. Não. Entrou na vala comum”, disse Moraes ao participar nesta terça-feira, 13, de debate promovido pela revista piauí, com patrocínio do YouTube. Intitulado “Encontros piauí - A Natureza da Máquina – Como funciona o Estado brasileiro”, o evento foi fechado para convidados.
Moraes afirmou que pautou o julgamento de Bolsonaro para o próximo dia 22 porque o ministro Benedito Gonçalves, relator do caso, liberou a ação. “Não há escolha de processo”, insistiu ele. Nas plataformas digitais, apoiadores de Bolsonaro disseram que Moraes escolheu a data a dedo porque “22″ é o número do PL, partido do ex-presidente. No diagnóstico do magistrado, porém, as redes sociais se tornaram “terra sem lei” e a extrema-direita tem sido “muito competente” na estratégia de manter em funcionamento uma “máquina de fake news”.
O ministro sempre se orgulha de agir com celeridade, tanto que chegou a calcular em seis meses o prazo para concluir o julgamento dos processos de vândalos que atacaram as sedes do Palácio do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), em 8 de janeiro. Relator do inquérito que investiga os atos golpistas, Moraes amenizou logo depois a previsão. “É que fiquei animado”, afirmou.
Das 1.300 denúncias recebidas, o magistrado disse que até o fim do ano julgará as mais graves, cerca de 250, e destacou haver mais de 40 financiadores do quebra-quebra na prisão. Desconversou, porém, quando perguntado se havia gente graúda por trás dos ataques. “A Polícia está investigando”, declarou Moraes, que também integra o Supremo.
No julgamento do qual é alvo, Bolsonaro responde à acusação de abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação por ter convocado uma reunião com embaixadores, no Palácio da Alvorada, em julho do ano passado. No encontro, o então presidente atacou as urnas eletrônicas e lançou dúvidas sobre a lisura do sistema de votação no Brasil.
‘Voto é obrigatório, pero no mucho’
Ao ser perguntado se o julgamento do próximo dia 22 põe um ponto final sobre tais questionamentos, Moraes disse que essas discussões terminaram com as eleições.
“Se você acha que o seu voto vai ser fraudado, por que você vai sair da sua casa, vai até a seção eleitoral e vai votar?”, indagou o presidente do TSE. Ele mesmo respondeu, arrancando risos da plateia. “Nós sabemos que o voto é obrigatório no Brasil, pero no mucho, né? Basta você justificar. Você pega o celular e justifica”, argumentou, ao constatar que, mesmo se isso não for feito, a multa é irrisória.
Chamado de “Xandão” desde que o ex-deputado Roberto Jefferson – preso por incitação a atos golpistas – assim o ‘batizou’, Moraes contou que esse é o apelido de um de seus filhos. “Ele até brincou comigo: ‘Ué, roubou o meu apelido?’ Nunca ninguém me chamou de Xandão e amigos íntimos também não. Mas ficou para o bem e para o mal”, resignou-se.
Descontraído, Moraes afirmou, ainda, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não feriu qualquer princípio ao indicar o advogado Cristiano Zanin, seu defensor na Lava Jato, para ocupar uma cadeira de ministro do Supremo. A sabatina de Zanin na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado está marcada para o próximo dia 21.
“Obviamente, o presidente não vai escolher alguém que pense diferente dele”, avaliou Moraes. Para encerrar, lembrou que esse modelo também é adotado na Suprema Corte dos Estados Unidos. “Um presidente de direita não vai colocar, em tese, um ministro de esquerda. E vice-versa”, disse o magistrado. O único presidente que, de acordo com ele, não deu “a mínima bola” para o STF foi João Baptista Figueiredo, ainda na ditadura militar.