O senador Sérgio Moro (União Brasil-PR) afirmou que o presidente Lula divulgou uma “desinformação grave” sobre o plano do Primeiro Comando da Capital (PCC) de sequestrar o parlamentar. Na semana passada, o petista disse acreditar em uma “armação do Moro” ao comentar o caso. O ex-juiz participou neste sábado, 1º, na 9ª edição do Brazil Conference, de um painel sobre regulação de fake news.
Para o senador, o presidente deu um mau exemplo em matéria de desinformação ao falar de uma “armação”. Moro disse ver com preocupação a proposta da atual gestão de criar uma entidade autônoma para supervisionar se as plataformas estão cumprindo normas de regulação. O governo encaminhou sugestões ao projeto de lei das Fake News, de relatoria do deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP). O ex-juiz afirmou ver risco de censura nas proposições.
“Não há nenhuma delimitação de como seria esse órgão”, disse. “É um grande risco colocar nas mãos do Executivo um poder de supervisão que eventualmente possa resultar numa espécie de censura. Podemos lembrar episódios recentes em esse atual governo incorreu em desinformação e em ataques. Colocar uma espécie de mandato em branco é muito arriscado. Esse projeto deve ser debatido e muito melhorado”.
O ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinícius de Carvalho, outro painelista da mesa, rebateu o ex-juiz. “Tenho a certeza que não é nem um pouco a intenção do governo Lula censurar o que as pessoas dizem ou não dizem nas redes sociais. O governo Lula não é o governo Bolsonaro”, disse, e foi recebido por muitos aplausos da plateia.
Carvalho defendeu que a regulação do tema não equivale a censura, e sim a criar uma arquitetura bem delimitada em que o cuidado com os usuários seja priorizado. Ele argumentou que o governo Bolsonaro criou um “ecossistema de desinformação”.
“A gente não pode desprezar o que aconteceu nesse período, em matéria de desinformação, de negação da ciência, de destruição de instituições”, disse. “Não estamos falando de equívocos pontuais. Estamos falando de uma estratégia concertada, institucionalizada, para acabar com a integridade das instituições”.
O ministro da CGU defendeu ainda que a desinformação deve ser combatida com transparência das informações públicas. “A desinformação como estratégia é o outro lado da moeda de um estado opaco. Em um modelo em que a desinformação impera, também impera a falta de informação. Foram 64 mil negativas de acesso à informação no governo Bolsonaro, usando argumentos os mais esdrúxulos possíveis”, pontuou.
Depois da fala do ministro, Moro voltou a criticar as propostas do governo Lula para o PL das Fake News. “Não existe governo bom ou governo ruim, todo governo oferece riscos de abuso”, disse. “Se fosse no governo anterior, eu seria igualmente contra. Aliás, deixei o governo Bolsonaro por conta de graves divergências com o presidente da República. Esse projeto de lei é ruim. Temos que aprofundar esse debate, não tratar de maneira simplificada”, concluiu, sob aplausos.
Moderação de conteúdo
Ao mediar a mesa, o cientista político Hussein Kalout, destacou que o debate sobre a regulação das plataformas digitais é um desafio coletivo, no qual envolve o Congresso Nacional, o Poder Executivo e Judiciário, empresas privadas e sociedade civil.
Nina da Hora, cientista e pesquisadora, pontuou a preocupação em relação à moderação de conteúdo e a falta de transparência nos critérios das plataformas para estabelecer quais conteúdos devem ser moderados em detrimento de outros. “A regulação das plataformas é a busca por mais transparência de como esses modelos são associados aos modelos de negócio das plataformas sociais, e isso envolve: como é coletado, armazenado, utilizado e acessado por terceiros”, reitera.
Durante a sabatina, a cientista Nina da Hora relembrou o caso que aconteceu na última segunda-feira, 27, no qual um adolescente matou a professora ao entrar com um faca na escola Thomazia Montoro. Antes do episódio, o aluno realizou diversas postagens nas redes sociais anunciando que faria o ataque e dando detalhes sobre o episódio.
De acordo com a pesquisadora, antes de prever os conteúdos é preciso entender. “Antes de tomar essa decisão, precisa entender como esses posts chegam nos celulares. Essa é a busca de boa parte da sociedade civil e pesquisadores envolvidos nesse debate: entender como isso funciona e se é possível entender”, pontuou.
Na última terça-feira, 28, o Supremo Tribunal Federal (STF) realizou uma audiência pública sobre as regras do Marco Civil da Internet no qual contou com a presença dos advogados do Google e do Facebook. Na ocasião, os representantes alertaram sobre a responsabilização das plataformas e disseram que equiparar a responsabilidade das plataformas à dos autores das postagens pode levar a um aumento da remoção de conteúdos ‘subjetivos’.
Organizada pela comunidade brasileira de estudantes em Boston (EUA), a conferência tem parceria do Estadão, que faz a cobertura. Os debates, de forma presencial, ocorrem na Universidade Harvard e no Massachusetts Institute of Technology (MIT), apoiadores do evento. Os painéis também são transmitidos pelo canal do Youtube da Brazil Conference.