Na escolinha com o professor Gilmar Mendes


Em aula acompanhada pelo 'Estado', o ministro quase não faz as caras e bocas que são uma de suas marcas registradas no plenário do Supremo

Por Rafael Moraes Moura

BRASÍLIA - Se no Supremo Tribunal Federal (STF) ele provoca reações viscerais - um colega já sugeriu um “duelo” de arma de fogo, outro o definiu como “a mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia” -, na sala de aula Gilmar Mendes se transforma e tem fama de professor afável, que já deu aula para ministro de Estado, deputado e até um mensaleiro. A última ameaça ao magistrado veio do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, que afirmou ao Estado ter planejado assassinar o ministro a tiros dentro do próprio STF.

Ao entrar na sala de aula do IDP, Gilmar fala manso, pausado, e quase não faz as caras e bocas que são uma de suas marcas registradas no plenário do Supremo Foto: Rafael Moraes Moura / Estadão

No Supremo, Gilmar dá votos contundentes, eleva o tom da voz, ataca procuradores da “República de Curitiba”, se irrita com "gângster no comando" de investigações na Receita, chama o ex-juiz Sérgio Moro de “coaching da acusação” e volta e meia se mete em discussão com algum colega de plenário. Isso é um Gilmar Mendes, mas há um outro, o “lado B”, quando tira a toga e vira professor.

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Ao entrar na sala de aula do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), do qual é sócio, Gilmar fala manso, pausado, e quase não faz as caras e bocas que são uma de suas marcas registradas no plenário do Supremo. Na “escolinha do professor Gilmar” não há votos, não há polêmicas, nem divergências, muito menos embates como aqueles protagonizados com Luís Roberto Barroso em sessões transmitidas ao vivo pela TV Justiça.

“Bom dia”, diz Gilmar, ao iniciar a aula, acompanhada pelo Estado, da disciplina “jurisdição constitucional” às 8h06 de uma manhã de quarta-feira. Horas depois, o Supremo retomaria a polêmica análise sobre réus delatados terem o direito à última palavra nas alegações finais, em um julgamento que abre brecha para anular condenações da Lava Jato. Na sala de aula, a pauta é mais light - “controle de constitucionalidade”.

A segurança no IDP já havia sido reforçada com a instalação de catracas eletrônicas antes mesmo do caso Janot vir à tona. O ministro considera sua rotina “muito contida” - vai a eventos, como lançamentos de livros, mas evita multidões em estádios, apesar da paixão pelo Santos, emoldurada em camisas autografadas que foram colocadas em destaque na sala do IDP e no gabinete do Supremo.

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Na noite anterior à aula, o próprio Gilmar havia determinado a completa paralisação das investigações envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) no caso Queiroz. Na classe, ninguém ousa indagá-lo sobre o tema controverso - mais relevante discutir as referências do direito alemão, pelo menos naquele momento.

Eliane Cantanhêde avalia entrevista de Gilmar como um recado de ‘quem ri por último, ri melhor’; ouça podcast abaixo.

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Talentos

Os 28 alunos presentes acompanham a fala do professor-ministro sobre o papel da Suprema Corte em invalidar leis ou preencher o vácuo deixado pela inércia do Executivo e Legislativo. A jornada dupla faz parte da rotina de Gilmar, que deu aulas para mais de 2 mil estudantes desde a criação do instituto, em 1998.

Os 28 alunos presentes acompanham a fala do professor-ministro sobre o papel da Suprema Corte em invalidar leis ou preencher o vácuo deixado pela inércia do Executivo e Legislativo Foto: Rafael Moraes Moura / Estadão
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Um deles foi o ex-deputado João Paulo Cunha, condenado pelo STF no processo do mensalão por corrupção passiva e peculato, inclusive com o voto de Gilmar. Procurado, Cunha não se manifestou.

Os atuais deputados federais Domingos Neto (PSD-CE) e Marcos Pereira (Republicanos-SP) e o ex-ministro da Indústria Marcos Jorge (do governo Temer) também já passaram pela sala de aula do ministro no IDP. Na classe de mestrado de Domingos, a turma reunia gestores públicos, servidores do Tribunal de Contas da União (TCU) e até membros do Ministério Público, instituição frequentemente criticada pelo Gilmar ministro. “Era uma classe bem eclética, mas nada de questões políticas, dessas brigas, chegaram ao ambiente de sala de aula. Ele é um excelente professor, com uma profundidade de conhecimento totalmente fora da curva", recorda Domingos.

Na avaliação de Marcos Pereira, o ambiente formal da sala de aula faz com que os alunos se concentrem na discussão teórica, evitando as polêmicas do noticiário - inclusive do STF. “Ele é mais tranquilo em sala de aula, que requer um pouco mais de maleabilidade, afinal de contas é a troca de aprendizado entre professor e aluno.”

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Gilmar ainda costuma aproveitar o contato com os estudantes para fazer uma espécie de programa informal de "recrutamento de talentos”. Muitos dos seus assessores no STF, inclusive o atual chefe de gabinete, já foram seus alunos no IDP ou na Universidade de Brasília (UnB), onde parou de lecionar devido à dificuldade para conciliar tanta coisa ao mesmo tempo.

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Ministro afirma são necessárias medidas integradas em outras áreas no Estado, além da segurança pública

Na última quarta-feira, as interrupções dos alunos para a formulação de perguntas na aula foram meramente pontuais. “O Gilmar professor traz os aspectos históricos para a gente entender a jurisdição constitucional, enquanto o Gilmar ministro tenta entender a realidade atual e aplicar o direito em cima daquilo, mesmo que as decisões às vezes sejam controversas ou contra a opinião pública”, avalia o aluno João Marcos Pedra. “Ter aula com ele me mostrou quanta bagagem histórica ele tem, me abriu os olhos para um outro Gilmar que eu não conhecia.”

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Os alunos anotam o recado em cadernos e tablets. Alguns saem da aula, tomam um cafezinho para despertar, outros vão ao banheiro. Todos voltam. “O nosso sonho de consumo seria se o texto tivesse um único significado, infelizmente as coisas não ocorrem assim. Um mesmo texto pode ter múltiplos significados”, ensina Gilmar na aula matinal, ao destacar as nuances quando se interpreta a redação de normas legais.

Gilmar costuma aproveitar o contato com os estudantes para fazer uma espécie de programa informal de "recrutamento de talentos” Foto: Rafael Moraes Moura / Estadão

Autocrítica

Os dois lados - magistrado e professor - se fundem quando um assunto vem à tona: os precatórios, alvo preferencial de um dos julgamentos mais contestados pela versão Gilmar ministro, ressurgem na aula do IDP, por iniciativa do Gilmar professor. “Nas fundamentações (apresentadas no julgamento) apareciam as coisas mais esdrúxulas, que o que faltava para os Estados para pagar era 'vontade política’. Desconfiem sempre que vocês ouvirem essa expressão. Alguém tá querendo enganar alguém”, alerta o professor aos estudantes.

“Já vieram duas emendas constitucionais parcelando os precatórios. Para nós (ministros do STF) que dissemos que eram imparceláveis fica uma situação bastante curiosa. Um grave erro que cometemos”, acrescenta Gilmar, já com a versão ministro incorporada. Pensando bem, o lado A e o lado B do ministro não são tão indissociáveis assim.

BRASÍLIA - Se no Supremo Tribunal Federal (STF) ele provoca reações viscerais - um colega já sugeriu um “duelo” de arma de fogo, outro o definiu como “a mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia” -, na sala de aula Gilmar Mendes se transforma e tem fama de professor afável, que já deu aula para ministro de Estado, deputado e até um mensaleiro. A última ameaça ao magistrado veio do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, que afirmou ao Estado ter planejado assassinar o ministro a tiros dentro do próprio STF.

Ao entrar na sala de aula do IDP, Gilmar fala manso, pausado, e quase não faz as caras e bocas que são uma de suas marcas registradas no plenário do Supremo Foto: Rafael Moraes Moura / Estadão

No Supremo, Gilmar dá votos contundentes, eleva o tom da voz, ataca procuradores da “República de Curitiba”, se irrita com "gângster no comando" de investigações na Receita, chama o ex-juiz Sérgio Moro de “coaching da acusação” e volta e meia se mete em discussão com algum colega de plenário. Isso é um Gilmar Mendes, mas há um outro, o “lado B”, quando tira a toga e vira professor.

Ao entrar na sala de aula do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), do qual é sócio, Gilmar fala manso, pausado, e quase não faz as caras e bocas que são uma de suas marcas registradas no plenário do Supremo. Na “escolinha do professor Gilmar” não há votos, não há polêmicas, nem divergências, muito menos embates como aqueles protagonizados com Luís Roberto Barroso em sessões transmitidas ao vivo pela TV Justiça.

“Bom dia”, diz Gilmar, ao iniciar a aula, acompanhada pelo Estado, da disciplina “jurisdição constitucional” às 8h06 de uma manhã de quarta-feira. Horas depois, o Supremo retomaria a polêmica análise sobre réus delatados terem o direito à última palavra nas alegações finais, em um julgamento que abre brecha para anular condenações da Lava Jato. Na sala de aula, a pauta é mais light - “controle de constitucionalidade”.

A segurança no IDP já havia sido reforçada com a instalação de catracas eletrônicas antes mesmo do caso Janot vir à tona. O ministro considera sua rotina “muito contida” - vai a eventos, como lançamentos de livros, mas evita multidões em estádios, apesar da paixão pelo Santos, emoldurada em camisas autografadas que foram colocadas em destaque na sala do IDP e no gabinete do Supremo.

Na noite anterior à aula, o próprio Gilmar havia determinado a completa paralisação das investigações envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) no caso Queiroz. Na classe, ninguém ousa indagá-lo sobre o tema controverso - mais relevante discutir as referências do direito alemão, pelo menos naquele momento.

Eliane Cantanhêde avalia entrevista de Gilmar como um recado de ‘quem ri por último, ri melhor’; ouça podcast abaixo.

Talentos

Os 28 alunos presentes acompanham a fala do professor-ministro sobre o papel da Suprema Corte em invalidar leis ou preencher o vácuo deixado pela inércia do Executivo e Legislativo. A jornada dupla faz parte da rotina de Gilmar, que deu aulas para mais de 2 mil estudantes desde a criação do instituto, em 1998.

Os 28 alunos presentes acompanham a fala do professor-ministro sobre o papel da Suprema Corte em invalidar leis ou preencher o vácuo deixado pela inércia do Executivo e Legislativo Foto: Rafael Moraes Moura / Estadão

Um deles foi o ex-deputado João Paulo Cunha, condenado pelo STF no processo do mensalão por corrupção passiva e peculato, inclusive com o voto de Gilmar. Procurado, Cunha não se manifestou.

Os atuais deputados federais Domingos Neto (PSD-CE) e Marcos Pereira (Republicanos-SP) e o ex-ministro da Indústria Marcos Jorge (do governo Temer) também já passaram pela sala de aula do ministro no IDP. Na classe de mestrado de Domingos, a turma reunia gestores públicos, servidores do Tribunal de Contas da União (TCU) e até membros do Ministério Público, instituição frequentemente criticada pelo Gilmar ministro. “Era uma classe bem eclética, mas nada de questões políticas, dessas brigas, chegaram ao ambiente de sala de aula. Ele é um excelente professor, com uma profundidade de conhecimento totalmente fora da curva", recorda Domingos.

Na avaliação de Marcos Pereira, o ambiente formal da sala de aula faz com que os alunos se concentrem na discussão teórica, evitando as polêmicas do noticiário - inclusive do STF. “Ele é mais tranquilo em sala de aula, que requer um pouco mais de maleabilidade, afinal de contas é a troca de aprendizado entre professor e aluno.”

Gilmar ainda costuma aproveitar o contato com os estudantes para fazer uma espécie de programa informal de "recrutamento de talentos”. Muitos dos seus assessores no STF, inclusive o atual chefe de gabinete, já foram seus alunos no IDP ou na Universidade de Brasília (UnB), onde parou de lecionar devido à dificuldade para conciliar tanta coisa ao mesmo tempo.

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Ministro afirma são necessárias medidas integradas em outras áreas no Estado, além da segurança pública

Na última quarta-feira, as interrupções dos alunos para a formulação de perguntas na aula foram meramente pontuais. “O Gilmar professor traz os aspectos históricos para a gente entender a jurisdição constitucional, enquanto o Gilmar ministro tenta entender a realidade atual e aplicar o direito em cima daquilo, mesmo que as decisões às vezes sejam controversas ou contra a opinião pública”, avalia o aluno João Marcos Pedra. “Ter aula com ele me mostrou quanta bagagem histórica ele tem, me abriu os olhos para um outro Gilmar que eu não conhecia.”

Os alunos anotam o recado em cadernos e tablets. Alguns saem da aula, tomam um cafezinho para despertar, outros vão ao banheiro. Todos voltam. “O nosso sonho de consumo seria se o texto tivesse um único significado, infelizmente as coisas não ocorrem assim. Um mesmo texto pode ter múltiplos significados”, ensina Gilmar na aula matinal, ao destacar as nuances quando se interpreta a redação de normas legais.

Gilmar costuma aproveitar o contato com os estudantes para fazer uma espécie de programa informal de "recrutamento de talentos” Foto: Rafael Moraes Moura / Estadão

Autocrítica

Os dois lados - magistrado e professor - se fundem quando um assunto vem à tona: os precatórios, alvo preferencial de um dos julgamentos mais contestados pela versão Gilmar ministro, ressurgem na aula do IDP, por iniciativa do Gilmar professor. “Nas fundamentações (apresentadas no julgamento) apareciam as coisas mais esdrúxulas, que o que faltava para os Estados para pagar era 'vontade política’. Desconfiem sempre que vocês ouvirem essa expressão. Alguém tá querendo enganar alguém”, alerta o professor aos estudantes.

“Já vieram duas emendas constitucionais parcelando os precatórios. Para nós (ministros do STF) que dissemos que eram imparceláveis fica uma situação bastante curiosa. Um grave erro que cometemos”, acrescenta Gilmar, já com a versão ministro incorporada. Pensando bem, o lado A e o lado B do ministro não são tão indissociáveis assim.

BRASÍLIA - Se no Supremo Tribunal Federal (STF) ele provoca reações viscerais - um colega já sugeriu um “duelo” de arma de fogo, outro o definiu como “a mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia” -, na sala de aula Gilmar Mendes se transforma e tem fama de professor afável, que já deu aula para ministro de Estado, deputado e até um mensaleiro. A última ameaça ao magistrado veio do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, que afirmou ao Estado ter planejado assassinar o ministro a tiros dentro do próprio STF.

Ao entrar na sala de aula do IDP, Gilmar fala manso, pausado, e quase não faz as caras e bocas que são uma de suas marcas registradas no plenário do Supremo Foto: Rafael Moraes Moura / Estadão

No Supremo, Gilmar dá votos contundentes, eleva o tom da voz, ataca procuradores da “República de Curitiba”, se irrita com "gângster no comando" de investigações na Receita, chama o ex-juiz Sérgio Moro de “coaching da acusação” e volta e meia se mete em discussão com algum colega de plenário. Isso é um Gilmar Mendes, mas há um outro, o “lado B”, quando tira a toga e vira professor.

Ao entrar na sala de aula do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), do qual é sócio, Gilmar fala manso, pausado, e quase não faz as caras e bocas que são uma de suas marcas registradas no plenário do Supremo. Na “escolinha do professor Gilmar” não há votos, não há polêmicas, nem divergências, muito menos embates como aqueles protagonizados com Luís Roberto Barroso em sessões transmitidas ao vivo pela TV Justiça.

“Bom dia”, diz Gilmar, ao iniciar a aula, acompanhada pelo Estado, da disciplina “jurisdição constitucional” às 8h06 de uma manhã de quarta-feira. Horas depois, o Supremo retomaria a polêmica análise sobre réus delatados terem o direito à última palavra nas alegações finais, em um julgamento que abre brecha para anular condenações da Lava Jato. Na sala de aula, a pauta é mais light - “controle de constitucionalidade”.

A segurança no IDP já havia sido reforçada com a instalação de catracas eletrônicas antes mesmo do caso Janot vir à tona. O ministro considera sua rotina “muito contida” - vai a eventos, como lançamentos de livros, mas evita multidões em estádios, apesar da paixão pelo Santos, emoldurada em camisas autografadas que foram colocadas em destaque na sala do IDP e no gabinete do Supremo.

Na noite anterior à aula, o próprio Gilmar havia determinado a completa paralisação das investigações envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) no caso Queiroz. Na classe, ninguém ousa indagá-lo sobre o tema controverso - mais relevante discutir as referências do direito alemão, pelo menos naquele momento.

Eliane Cantanhêde avalia entrevista de Gilmar como um recado de ‘quem ri por último, ri melhor’; ouça podcast abaixo.

Talentos

Os 28 alunos presentes acompanham a fala do professor-ministro sobre o papel da Suprema Corte em invalidar leis ou preencher o vácuo deixado pela inércia do Executivo e Legislativo. A jornada dupla faz parte da rotina de Gilmar, que deu aulas para mais de 2 mil estudantes desde a criação do instituto, em 1998.

Os 28 alunos presentes acompanham a fala do professor-ministro sobre o papel da Suprema Corte em invalidar leis ou preencher o vácuo deixado pela inércia do Executivo e Legislativo Foto: Rafael Moraes Moura / Estadão

Um deles foi o ex-deputado João Paulo Cunha, condenado pelo STF no processo do mensalão por corrupção passiva e peculato, inclusive com o voto de Gilmar. Procurado, Cunha não se manifestou.

Os atuais deputados federais Domingos Neto (PSD-CE) e Marcos Pereira (Republicanos-SP) e o ex-ministro da Indústria Marcos Jorge (do governo Temer) também já passaram pela sala de aula do ministro no IDP. Na classe de mestrado de Domingos, a turma reunia gestores públicos, servidores do Tribunal de Contas da União (TCU) e até membros do Ministério Público, instituição frequentemente criticada pelo Gilmar ministro. “Era uma classe bem eclética, mas nada de questões políticas, dessas brigas, chegaram ao ambiente de sala de aula. Ele é um excelente professor, com uma profundidade de conhecimento totalmente fora da curva", recorda Domingos.

Na avaliação de Marcos Pereira, o ambiente formal da sala de aula faz com que os alunos se concentrem na discussão teórica, evitando as polêmicas do noticiário - inclusive do STF. “Ele é mais tranquilo em sala de aula, que requer um pouco mais de maleabilidade, afinal de contas é a troca de aprendizado entre professor e aluno.”

Gilmar ainda costuma aproveitar o contato com os estudantes para fazer uma espécie de programa informal de "recrutamento de talentos”. Muitos dos seus assessores no STF, inclusive o atual chefe de gabinete, já foram seus alunos no IDP ou na Universidade de Brasília (UnB), onde parou de lecionar devido à dificuldade para conciliar tanta coisa ao mesmo tempo.

Seu navegador não suporta esse video.

Ministro afirma são necessárias medidas integradas em outras áreas no Estado, além da segurança pública

Na última quarta-feira, as interrupções dos alunos para a formulação de perguntas na aula foram meramente pontuais. “O Gilmar professor traz os aspectos históricos para a gente entender a jurisdição constitucional, enquanto o Gilmar ministro tenta entender a realidade atual e aplicar o direito em cima daquilo, mesmo que as decisões às vezes sejam controversas ou contra a opinião pública”, avalia o aluno João Marcos Pedra. “Ter aula com ele me mostrou quanta bagagem histórica ele tem, me abriu os olhos para um outro Gilmar que eu não conhecia.”

Os alunos anotam o recado em cadernos e tablets. Alguns saem da aula, tomam um cafezinho para despertar, outros vão ao banheiro. Todos voltam. “O nosso sonho de consumo seria se o texto tivesse um único significado, infelizmente as coisas não ocorrem assim. Um mesmo texto pode ter múltiplos significados”, ensina Gilmar na aula matinal, ao destacar as nuances quando se interpreta a redação de normas legais.

Gilmar costuma aproveitar o contato com os estudantes para fazer uma espécie de programa informal de "recrutamento de talentos” Foto: Rafael Moraes Moura / Estadão

Autocrítica

Os dois lados - magistrado e professor - se fundem quando um assunto vem à tona: os precatórios, alvo preferencial de um dos julgamentos mais contestados pela versão Gilmar ministro, ressurgem na aula do IDP, por iniciativa do Gilmar professor. “Nas fundamentações (apresentadas no julgamento) apareciam as coisas mais esdrúxulas, que o que faltava para os Estados para pagar era 'vontade política’. Desconfiem sempre que vocês ouvirem essa expressão. Alguém tá querendo enganar alguém”, alerta o professor aos estudantes.

“Já vieram duas emendas constitucionais parcelando os precatórios. Para nós (ministros do STF) que dissemos que eram imparceláveis fica uma situação bastante curiosa. Um grave erro que cometemos”, acrescenta Gilmar, já com a versão ministro incorporada. Pensando bem, o lado A e o lado B do ministro não são tão indissociáveis assim.

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