BRASÍLIA – Em um pronunciamento de cerca de 40 minutos, o presidente Jair Bolsonaro rebateu o ex-ministro Sérgio Moro que, ao pedir demissão, o acusou de tentar interferir na Polícia Federal. Na fala, no entanto, Bolsonaro reconheceu que quer um contato mais direto com o diretor-geral da instituição e evidenciou ter interesse pessoal em investigações da PF, como o caso da facada que sofreu em 2018. Bolsonaro disse que, se Moro queria independência para fazer nomeações, deveria ter disputado a eleição à presidência.
Cercado de ministros, o presidente ainda afirmou que o ex-juiz federal condicionou à exoneração do atual diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, a uma indicação para o Supremo Tribunal Federal (STF) em novembro. Moro nega ter utilizado Valeixo como moeda de troca.
“Já que ele falou em algumas particularidades mais de uma vez, o senhor Sérgio Moro disse para mim: você pode trocar o Valeixo, sim, mas em novembro, depois que o senhor me indicar para o Supremo Tribunal Federal. Me desculpe, mas não é por aí. Reconheço as suas qualidades em chegando lá, se um dia chegar, pode fazer um bom trabalho mas eu não troco. E outra coisa, é desmoralizante para um presidente ouvir isso, mais ainda externar.”
No pronunciamento, Bolsonaro destacou que não considera a possibilidade de manter no cargo alguém que discorda de suas ideias, apresentadas durante a campanha eleitoral, e enumerou outras divergências que teve com Moro, inclusive sobre a posição do ministro em relação ao novo coronavírus. O presidente queria uma postura mais enfática do então ministro da Justiça contra os governadores que optaram por regras mais rígidas de isolamento social.
O presidente também defendeu, nesta sexta, o seu anseio por trocar o diretor-geral da PF e confirmou que disse a Moro ontem, pela manhã, que havia chegado a hora de colocar um “ponto final” no assunto. O então ministro da Justiça, por sua vez, que queria um nome de sua preferência. “Não tenho que pedir autorização para ninguém para trocar o diretor ou qualquer outro”, afirmou o Bolsonaro durante o pronunciamento desta sexta-feira, dia 24.
Bolsonaro também admitiu que gostaria de falar diretamente o diretor-geral da Polícia Federal, assim como afirma fazer com outras autoridades e servidores. "É comum que eu possa interagir com ele (diretor-geral), assim como interajo com a inteligência das Forças Armadas e com a Agência Brasileira de Inteligência (Abin)”, justificou. “Não posso abrir mão disso”, admitiu.
Rodeado por outros ministros, inclusive o novo titular da Saúde, Nelson Teich, o presidente se queixou da condução da Polícia Federal em torno das investigações do caso do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. “A PF de Moro se preocupou muito mais com Marielle do que aconteceu com seu chefe supremo”, disse. Bolsonaro exonerou o diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, do cargo, levando Moro a pedir a demissão.
Ele negou, no entanto, que tenha pedido informações sobre processos em investigação da Polícia Federal. “Nunca pedi para ele o andamento de qualquer processo até porque a inteligência com ele perdeu espaço na Justiça”, declarou Bolsonaro.
Ao ler uma carta direcionada ao ex-juiz da Lava Jato no discurso, Bolsonaro disse estar “decepcionado e surpreso”, com o comportamento de Moro. O chefe do Planalto classificou as declarações do ministro como infundadas. “Não são verdades as insinuações que eu desejaria saber sobre investigações em andamento”, disse. “Desculpa, senhor ministro, o senhor não vai me chamar de mentiroso”, declarou Jair Bolsonaro ao contestar Moro.