O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), falou abertamente em reeleição e alfinetou o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), seu principal adversário no pleito de 2024, durante a entrega de 109 moradias populares nesta quarta-feira, 20, na Vila Olímpia. O político tenta fazer um contraponto ao líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que tem o apoio do governo federal na disputa.
“É muito fácil as pessoas dizerem que defendem a habitação, que defendem não sei o quê, e a entrega, zero. O importante é isso aqui, concretizar o sonho”, declarou Nunes, depois de entregar as chaves aos primeiros beneficiados, de um total de 272 moradias; o restante ficou para março. Ao prometer 100 mil unidades habitacionais (entre concluídas, em obras ou adquiridas) até o final do seu mandato, o prefeito disse ainda que “o segundo (mandato) começa em janeiro de 2025″.
A agenda do prefeito ocorre cinco dias depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aparecer ao lado de Boulos em um evento do Minha Casa, Minha Vida na capital paulista. O petista assinou contrato para o início das obras do Copa do Povo, empreendimento que atende pedido de 2,6 mil moradores de uma ocupação do MTST em Itaquera, na Zona Leste — e que está diretamente associado às origens e com o eleitorado de seu apadrinhado político.
Aliados de Nunes mencionaram o episódio nesta quarta, 20. “O Copa do Povo só existe porque o Ricardo (Nunes) colocou R$ 53 milhões naquela obra”, alegou João Farias, ex-secretário municipal de Habitação. Farias, da cota do Republicanos, pediu demissão em maio deste ano após desentendimentos com membros da administração ligados ao prefeito e ao MDB.
O atual titular da pasta foi na mesma linha. “O prefeito não está incentivando as pessoas a ocuparem moradia, ele está dando moradia”, disse o secretário Milton Vieira. Jorge Wilson Filho (Republicanos), vereador da base aliada de Nunes e filho do líder do governo Tarcísio de Freitas, soltou a frase: “invasor aqui não vai passar”.
Moradora reclama do valor das parcelas no evento
Nem toda a cerimônia saiu como planejado. Durante o discurso, uma moradora convidada a representar a comunidade subiu ao palco para reclamar do pagamento do Termo de Permissão de Uso (TPU). “Não é justo essa comunidade voltar e ter que pagar pelo apartamento”, declarou Rosângela, de 53 anos. Ela diz que sobra pouco mais de R$ 500 para alimentar quatro pessoas dentro de casa e pediu ajuda.
Segundo funcionários da prefeitura, o valor fica entre R$ 200 e R$ 400 por família de acordo com a faixa de renda familiar e há prazo de quitação. O prefeito argumentou que o valor era importante para abastecer o Fundo Municipal de Habitação e manter a política nos próximos anos.
Em outro momento, Nunes sugeriu “deixar mais bonita” uma parede lateral do empreendimento que está pintada há anos com grafites de um dos moradores da antiga favela Funchal. Parte da plateia apoiou a ideia, enquanto outros protestaram. “Eu sei que foi alguém da comunidade, está até bonito, mas está desgastado. Vamos fazer um negócio aí bonito, novo?”, sugeriu o prefeito, prometendo submeter a proposta a voto.
Conjunto fica em bairro nobre e atrasou dois anos
A prefeitura de São Paulo entregou 109 apartamentos de um total de 272 do conjunto habitacional Coliseu, localizado na Vila Olímpia, próximo ao shopping JK Iguatemi. O terreno abrigou a favela Funchal a partir da década de 1950, removida em janeiro de 2020 para a construção do empreendimento.
Segundo a prefeitura, o investimento foi de R$ 44 milhões, mas houve atrasos. A estimativa da Secretaria Municipal de Habitação (Sehab) ao acordar a saída das famílias era concluir a obra em dois anos. O prazo ficou para dezembro de 2022 e, posteriormente, setembro de 2023. Agora, a previsão é março de 2024, com parte das famílias já alocadas.
A construção também foi alvo de apurações do Tribunal de Contas do Município (TCM). O orçamento inicial era de R$ 34,6 milhões. A prefeitura justificou o atraso e o acréscimo nas despesas em razão da pandemia, que teria gerado escassez de material, aumento no custo e velocidade reduzida dos trabalhos. Nunes também criticou a Enel em seu discurso, alegando que a empresa teria demorado 120 dias para fazer a ligação de energia nos apartamentos.