O que as Forças Armadas pensam sobre a demissão do único ministro militar de Lula?


Generais notaram ausência de G. Dias, então chefe do GSI, na cerimônia do Dia do Exército ao lado do presidente; leia bastidor

Por Felipe Frazão
Atualização:

BRASÍLIA – A demissão do general da reserva Marco Edson Gonçalves Dias, o G. Dias, agora ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), não deve afetar a relação do Exército com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Oficiais da ativa e da reserva ouvidos pelo Estadão sob a condição de anonimato afirmam que G. Dias não era visto como um representante da cúpula das Forças Armadas no primeiro escalão do governo.

Um general de quatro estrelas lembrou que G. Dias não foi um ministro indicado, sugerido ou endossado pelo Exército ao presidente, apesar do vínculo direto com o Alto Comando. Um assessor do atual comandante disse que G. Dias estava na reserva há anos, era antigo colaborador da segurança presidencial do petista e, por isso, uma escolha pessoal de Lula. Além disso, o general de três estrelas não demonstrava ambições políticas e atuava com pouco apego ao cargo, de forma discreta, cumprindo uma missão a pedido do presidente.

Militares da ativa e da reserva afirmam que demissão do único general no ministério de Lula não afeta relações com Forças Armadas FOTO: WILTON JUNIOR / ESTADÃO Foto: WILTON JUNIOR
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Um ex-comandante do Batalhão da Guarda Presidencial, conhecedor das rotinas do Palácio e do GSI, avalia que Lula o manteve até agora no cargo por consideração ao antigo colaborador, mesmo com todas as queixas e desconfianças sobre os militares que manifestou. Para o oficial, “no fundo, Lula não queria um milico lá, ainda mais o chefe”. E a escolha por um militar passou a fazer menos sentido ainda porque a Polícia Federal assumiu a segurança pessoal do presidente - as instituições PF e Forças Armadas têm culturas e métodos distintos.

G. Dias foi diretor do Departamento de Segurança e assessor-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Em março de 2006, assumiu como secretário de Segurança da Presidência da República. Sempre circulou muito próximo do presidente, espécie de “sombra”. Assumiu a Coordenadoria de Segurança Institucional e trabalhou com a ex-presidente Dilma Rousseff após passar à reserva em 2013.

Nesta quarta-feira, dia 19, Lula voltou a falar sobre seus dissabores com a caserna. Mas participou de uma cerimônia, em tentativa de recobrar as relações. “Hoje foi o Dia do Exército Brasileiro e todo mundo sabe o quanto eu andava magoado com os militares desse País por conta de tudo o que aconteceu. Fiquei a noite inteira pensando ‘vou ou não vou?’. Tomei a decisão de ir e acho que Deus me ajudou a decidir”, disse o presidente. “Fui para mostrar ‘eu não guardo rancor’. Esse Exército não é mais o Exército de Bolsonaro, é o Exército de Caxias, é o Exército com compromisso constitucional.”

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A ausência de G. Dias ao lado de Lula, na solenidade no Quartel-General do Exército, foi notada e comentada no generalato. Os mais antigos se perguntaram: “Cadê o G. Dias?”. Achavam que ele deveria estar na cerimônia por chefiar, até então, uma pasta com perfil militar na Presidência da República. Naquela altura, já circulava entre os generais a informação de que ele fora flagrado em uma situação complicada, embora as imagens não tivessem sido veiculadas pela CNN Brasil.

Ausência de G. Dias ao lado de Lula, na solenidade no Quartel-General do Exército, foi notada e comentada entre os oficiais. Foto: RICARDO STUCKERT/PR

A ordem no Comando do Exército é não tratar publicamente do assunto. A cúpula da Força Terrestre acompanha agora quem vai ficar com o comando GSI, que possui em sua maioria cargos e atribuições militares. Embora a pasta tenha sofrido grande desidratação, com perda de atribuições, oficiais acham pouco provável que Lula avance a ponto de extingui-la por completo. Mas deve eliminar um problema, a cobrança por desmilitarizar a pasta.

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O desfecho mais provável, segundo oficiais militares e ministros de Lula, é a escolha de um civil para chefiar a pasta. Lula entregou o comando, de forma interina, a Ricardo Capelli, jornalista e braço-direito do ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino. Ele havia atuado como secretário-executivo de Dino e como interventor da União na segurança do Distrito Federal, após os ataques antidemocráticos.

Perda de prestígio

Sem nenhuma base política, G. Dias havia perdido poder e prestígio e viu sua pasta ser esvaziada no governo depois do atos golpistas de 8 de janeiro. G. Dias havia entrado numa disputa de versão com o próprio Exército, sobre a dispensa de um reforço de segurança às vésperas do ataque ao Palácio do Planalto, e não encontrava apoio amplo nem na caserna para permanecer no governo.

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A situação se tornou irreversível após a CNN Brasil divulgar imagens que mostram o então ministro indicando uma saída pela escada a invasores que estavam na porta do gabinete de Lula. As gravações do próprio Palácio do Planalto mostram a equipe do GSI, de forma passiva, sem deter os invasores. Um deles cumprimentou um dos extremistas e fez um gesto de positivo a outro grupo. Um terceiro agente do GSI serviu água.

Blindado externamente, ele sofria forte questionamento de colegas ministros. Em vez de demitir um homem de sua confiança, Lula reduziu as atribuições históricas do GSI, desprestigiando o general. G. Dias já havia deixado de ser o responsável pela segurança pessoal imediata de Lula, o círculo de homens armados que fazem as vezes de guarda-costas. A tarefa passou a ser desempenhada por policiais federais, ligados a uma secretaria nova instalada no gabinete pessoal de Lula.

O presidente determinou que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) saísse do organograma do GSI. A Abin passou a ser vinculada à Casa Civil, chefiada por Rui Costa, que conduzia reuniões sobre o assunto sem a presença do próprio G. Dias. O general nunca conseguiu emplacar um nome vinculado a si para chefiar a agência.

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Imagens de câmeras de segurança do Palácio do Planalto mostram o ministro-chefe do GSI, Gonçalves Dias, orientando bolsonaristas durante os atos golpistas de 8 de janeiro. Foto: Reprodução/CNN

Dois dias após o fracasso na proteção da Presidência, G. Dias dizia ter preparo para se defender de “fogo amigo ou fogo inimigo”, por causa de seus 44 anos de Exército. Em duro recado, Lula chegou a dizer a G. Dias que ele precisava “assumir o controle” e “tomar conta” da pasta o quanto antes, segundo ministros, e ordenara um pente-fino em toda a equipe herdada do general bolsonarista Augusto Heleno.

G. Dias fez circular a versão de que as dificuldades de reação no 8 de janeiro estavam vinculadas ao fato de que não havia ainda trocado todos os integrantes do GSI - apenas os que eram diretamente ligados ao ex-ministro Heleno. Até para não haver uma quebra de comunicação e de comando, dada a necessidade de reforço na segurança para a posse de Lula, alguns militares em postos-chave foram mantidos, mas não adiantou. Outros erros de preparo ficaram patentes, como efetivo insuficiente. A situação de G. Dias foi comparada ao desgaste do coronel Paulo Jorge Fernandes da Hora, ex-comandante do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP).

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O coronel Fernandes sofreu intenso desgaste na tropa e teve de responder a interrogatórios em investigações perante o Supremo Tribunal Federal para explicar sua conduta e de seus subordinados na repressão ao ataque golpista. Num vídeo gravado por um policial, ele bateu boca com a PM, uma disputa de comando durante a operação, e parecia querer evitar a prisão e somente evacuar o Planalto. As imagens da CNN sugeriram algo semelhante por parte do ministro. Ele afirma que conduzia todos para um andar abaixo, onde prisões foram efetuadas. Mas um oficial experiente lembrou que não foi apenas o comandante do BGP que não deu voz de prisão aos invasores.

BRASÍLIA – A demissão do general da reserva Marco Edson Gonçalves Dias, o G. Dias, agora ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), não deve afetar a relação do Exército com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Oficiais da ativa e da reserva ouvidos pelo Estadão sob a condição de anonimato afirmam que G. Dias não era visto como um representante da cúpula das Forças Armadas no primeiro escalão do governo.

Um general de quatro estrelas lembrou que G. Dias não foi um ministro indicado, sugerido ou endossado pelo Exército ao presidente, apesar do vínculo direto com o Alto Comando. Um assessor do atual comandante disse que G. Dias estava na reserva há anos, era antigo colaborador da segurança presidencial do petista e, por isso, uma escolha pessoal de Lula. Além disso, o general de três estrelas não demonstrava ambições políticas e atuava com pouco apego ao cargo, de forma discreta, cumprindo uma missão a pedido do presidente.

Militares da ativa e da reserva afirmam que demissão do único general no ministério de Lula não afeta relações com Forças Armadas FOTO: WILTON JUNIOR / ESTADÃO Foto: WILTON JUNIOR

Um ex-comandante do Batalhão da Guarda Presidencial, conhecedor das rotinas do Palácio e do GSI, avalia que Lula o manteve até agora no cargo por consideração ao antigo colaborador, mesmo com todas as queixas e desconfianças sobre os militares que manifestou. Para o oficial, “no fundo, Lula não queria um milico lá, ainda mais o chefe”. E a escolha por um militar passou a fazer menos sentido ainda porque a Polícia Federal assumiu a segurança pessoal do presidente - as instituições PF e Forças Armadas têm culturas e métodos distintos.

G. Dias foi diretor do Departamento de Segurança e assessor-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Em março de 2006, assumiu como secretário de Segurança da Presidência da República. Sempre circulou muito próximo do presidente, espécie de “sombra”. Assumiu a Coordenadoria de Segurança Institucional e trabalhou com a ex-presidente Dilma Rousseff após passar à reserva em 2013.

Nesta quarta-feira, dia 19, Lula voltou a falar sobre seus dissabores com a caserna. Mas participou de uma cerimônia, em tentativa de recobrar as relações. “Hoje foi o Dia do Exército Brasileiro e todo mundo sabe o quanto eu andava magoado com os militares desse País por conta de tudo o que aconteceu. Fiquei a noite inteira pensando ‘vou ou não vou?’. Tomei a decisão de ir e acho que Deus me ajudou a decidir”, disse o presidente. “Fui para mostrar ‘eu não guardo rancor’. Esse Exército não é mais o Exército de Bolsonaro, é o Exército de Caxias, é o Exército com compromisso constitucional.”

A ausência de G. Dias ao lado de Lula, na solenidade no Quartel-General do Exército, foi notada e comentada no generalato. Os mais antigos se perguntaram: “Cadê o G. Dias?”. Achavam que ele deveria estar na cerimônia por chefiar, até então, uma pasta com perfil militar na Presidência da República. Naquela altura, já circulava entre os generais a informação de que ele fora flagrado em uma situação complicada, embora as imagens não tivessem sido veiculadas pela CNN Brasil.

Ausência de G. Dias ao lado de Lula, na solenidade no Quartel-General do Exército, foi notada e comentada entre os oficiais. Foto: RICARDO STUCKERT/PR

A ordem no Comando do Exército é não tratar publicamente do assunto. A cúpula da Força Terrestre acompanha agora quem vai ficar com o comando GSI, que possui em sua maioria cargos e atribuições militares. Embora a pasta tenha sofrido grande desidratação, com perda de atribuições, oficiais acham pouco provável que Lula avance a ponto de extingui-la por completo. Mas deve eliminar um problema, a cobrança por desmilitarizar a pasta.

O desfecho mais provável, segundo oficiais militares e ministros de Lula, é a escolha de um civil para chefiar a pasta. Lula entregou o comando, de forma interina, a Ricardo Capelli, jornalista e braço-direito do ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino. Ele havia atuado como secretário-executivo de Dino e como interventor da União na segurança do Distrito Federal, após os ataques antidemocráticos.

Perda de prestígio

Sem nenhuma base política, G. Dias havia perdido poder e prestígio e viu sua pasta ser esvaziada no governo depois do atos golpistas de 8 de janeiro. G. Dias havia entrado numa disputa de versão com o próprio Exército, sobre a dispensa de um reforço de segurança às vésperas do ataque ao Palácio do Planalto, e não encontrava apoio amplo nem na caserna para permanecer no governo.

A situação se tornou irreversível após a CNN Brasil divulgar imagens que mostram o então ministro indicando uma saída pela escada a invasores que estavam na porta do gabinete de Lula. As gravações do próprio Palácio do Planalto mostram a equipe do GSI, de forma passiva, sem deter os invasores. Um deles cumprimentou um dos extremistas e fez um gesto de positivo a outro grupo. Um terceiro agente do GSI serviu água.

Blindado externamente, ele sofria forte questionamento de colegas ministros. Em vez de demitir um homem de sua confiança, Lula reduziu as atribuições históricas do GSI, desprestigiando o general. G. Dias já havia deixado de ser o responsável pela segurança pessoal imediata de Lula, o círculo de homens armados que fazem as vezes de guarda-costas. A tarefa passou a ser desempenhada por policiais federais, ligados a uma secretaria nova instalada no gabinete pessoal de Lula.

O presidente determinou que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) saísse do organograma do GSI. A Abin passou a ser vinculada à Casa Civil, chefiada por Rui Costa, que conduzia reuniões sobre o assunto sem a presença do próprio G. Dias. O general nunca conseguiu emplacar um nome vinculado a si para chefiar a agência.

Imagens de câmeras de segurança do Palácio do Planalto mostram o ministro-chefe do GSI, Gonçalves Dias, orientando bolsonaristas durante os atos golpistas de 8 de janeiro. Foto: Reprodução/CNN

Dois dias após o fracasso na proteção da Presidência, G. Dias dizia ter preparo para se defender de “fogo amigo ou fogo inimigo”, por causa de seus 44 anos de Exército. Em duro recado, Lula chegou a dizer a G. Dias que ele precisava “assumir o controle” e “tomar conta” da pasta o quanto antes, segundo ministros, e ordenara um pente-fino em toda a equipe herdada do general bolsonarista Augusto Heleno.

G. Dias fez circular a versão de que as dificuldades de reação no 8 de janeiro estavam vinculadas ao fato de que não havia ainda trocado todos os integrantes do GSI - apenas os que eram diretamente ligados ao ex-ministro Heleno. Até para não haver uma quebra de comunicação e de comando, dada a necessidade de reforço na segurança para a posse de Lula, alguns militares em postos-chave foram mantidos, mas não adiantou. Outros erros de preparo ficaram patentes, como efetivo insuficiente. A situação de G. Dias foi comparada ao desgaste do coronel Paulo Jorge Fernandes da Hora, ex-comandante do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP).

O coronel Fernandes sofreu intenso desgaste na tropa e teve de responder a interrogatórios em investigações perante o Supremo Tribunal Federal para explicar sua conduta e de seus subordinados na repressão ao ataque golpista. Num vídeo gravado por um policial, ele bateu boca com a PM, uma disputa de comando durante a operação, e parecia querer evitar a prisão e somente evacuar o Planalto. As imagens da CNN sugeriram algo semelhante por parte do ministro. Ele afirma que conduzia todos para um andar abaixo, onde prisões foram efetuadas. Mas um oficial experiente lembrou que não foi apenas o comandante do BGP que não deu voz de prisão aos invasores.

BRASÍLIA – A demissão do general da reserva Marco Edson Gonçalves Dias, o G. Dias, agora ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), não deve afetar a relação do Exército com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Oficiais da ativa e da reserva ouvidos pelo Estadão sob a condição de anonimato afirmam que G. Dias não era visto como um representante da cúpula das Forças Armadas no primeiro escalão do governo.

Um general de quatro estrelas lembrou que G. Dias não foi um ministro indicado, sugerido ou endossado pelo Exército ao presidente, apesar do vínculo direto com o Alto Comando. Um assessor do atual comandante disse que G. Dias estava na reserva há anos, era antigo colaborador da segurança presidencial do petista e, por isso, uma escolha pessoal de Lula. Além disso, o general de três estrelas não demonstrava ambições políticas e atuava com pouco apego ao cargo, de forma discreta, cumprindo uma missão a pedido do presidente.

Militares da ativa e da reserva afirmam que demissão do único general no ministério de Lula não afeta relações com Forças Armadas FOTO: WILTON JUNIOR / ESTADÃO Foto: WILTON JUNIOR

Um ex-comandante do Batalhão da Guarda Presidencial, conhecedor das rotinas do Palácio e do GSI, avalia que Lula o manteve até agora no cargo por consideração ao antigo colaborador, mesmo com todas as queixas e desconfianças sobre os militares que manifestou. Para o oficial, “no fundo, Lula não queria um milico lá, ainda mais o chefe”. E a escolha por um militar passou a fazer menos sentido ainda porque a Polícia Federal assumiu a segurança pessoal do presidente - as instituições PF e Forças Armadas têm culturas e métodos distintos.

G. Dias foi diretor do Departamento de Segurança e assessor-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Em março de 2006, assumiu como secretário de Segurança da Presidência da República. Sempre circulou muito próximo do presidente, espécie de “sombra”. Assumiu a Coordenadoria de Segurança Institucional e trabalhou com a ex-presidente Dilma Rousseff após passar à reserva em 2013.

Nesta quarta-feira, dia 19, Lula voltou a falar sobre seus dissabores com a caserna. Mas participou de uma cerimônia, em tentativa de recobrar as relações. “Hoje foi o Dia do Exército Brasileiro e todo mundo sabe o quanto eu andava magoado com os militares desse País por conta de tudo o que aconteceu. Fiquei a noite inteira pensando ‘vou ou não vou?’. Tomei a decisão de ir e acho que Deus me ajudou a decidir”, disse o presidente. “Fui para mostrar ‘eu não guardo rancor’. Esse Exército não é mais o Exército de Bolsonaro, é o Exército de Caxias, é o Exército com compromisso constitucional.”

A ausência de G. Dias ao lado de Lula, na solenidade no Quartel-General do Exército, foi notada e comentada no generalato. Os mais antigos se perguntaram: “Cadê o G. Dias?”. Achavam que ele deveria estar na cerimônia por chefiar, até então, uma pasta com perfil militar na Presidência da República. Naquela altura, já circulava entre os generais a informação de que ele fora flagrado em uma situação complicada, embora as imagens não tivessem sido veiculadas pela CNN Brasil.

Ausência de G. Dias ao lado de Lula, na solenidade no Quartel-General do Exército, foi notada e comentada entre os oficiais. Foto: RICARDO STUCKERT/PR

A ordem no Comando do Exército é não tratar publicamente do assunto. A cúpula da Força Terrestre acompanha agora quem vai ficar com o comando GSI, que possui em sua maioria cargos e atribuições militares. Embora a pasta tenha sofrido grande desidratação, com perda de atribuições, oficiais acham pouco provável que Lula avance a ponto de extingui-la por completo. Mas deve eliminar um problema, a cobrança por desmilitarizar a pasta.

O desfecho mais provável, segundo oficiais militares e ministros de Lula, é a escolha de um civil para chefiar a pasta. Lula entregou o comando, de forma interina, a Ricardo Capelli, jornalista e braço-direito do ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino. Ele havia atuado como secretário-executivo de Dino e como interventor da União na segurança do Distrito Federal, após os ataques antidemocráticos.

Perda de prestígio

Sem nenhuma base política, G. Dias havia perdido poder e prestígio e viu sua pasta ser esvaziada no governo depois do atos golpistas de 8 de janeiro. G. Dias havia entrado numa disputa de versão com o próprio Exército, sobre a dispensa de um reforço de segurança às vésperas do ataque ao Palácio do Planalto, e não encontrava apoio amplo nem na caserna para permanecer no governo.

A situação se tornou irreversível após a CNN Brasil divulgar imagens que mostram o então ministro indicando uma saída pela escada a invasores que estavam na porta do gabinete de Lula. As gravações do próprio Palácio do Planalto mostram a equipe do GSI, de forma passiva, sem deter os invasores. Um deles cumprimentou um dos extremistas e fez um gesto de positivo a outro grupo. Um terceiro agente do GSI serviu água.

Blindado externamente, ele sofria forte questionamento de colegas ministros. Em vez de demitir um homem de sua confiança, Lula reduziu as atribuições históricas do GSI, desprestigiando o general. G. Dias já havia deixado de ser o responsável pela segurança pessoal imediata de Lula, o círculo de homens armados que fazem as vezes de guarda-costas. A tarefa passou a ser desempenhada por policiais federais, ligados a uma secretaria nova instalada no gabinete pessoal de Lula.

O presidente determinou que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) saísse do organograma do GSI. A Abin passou a ser vinculada à Casa Civil, chefiada por Rui Costa, que conduzia reuniões sobre o assunto sem a presença do próprio G. Dias. O general nunca conseguiu emplacar um nome vinculado a si para chefiar a agência.

Imagens de câmeras de segurança do Palácio do Planalto mostram o ministro-chefe do GSI, Gonçalves Dias, orientando bolsonaristas durante os atos golpistas de 8 de janeiro. Foto: Reprodução/CNN

Dois dias após o fracasso na proteção da Presidência, G. Dias dizia ter preparo para se defender de “fogo amigo ou fogo inimigo”, por causa de seus 44 anos de Exército. Em duro recado, Lula chegou a dizer a G. Dias que ele precisava “assumir o controle” e “tomar conta” da pasta o quanto antes, segundo ministros, e ordenara um pente-fino em toda a equipe herdada do general bolsonarista Augusto Heleno.

G. Dias fez circular a versão de que as dificuldades de reação no 8 de janeiro estavam vinculadas ao fato de que não havia ainda trocado todos os integrantes do GSI - apenas os que eram diretamente ligados ao ex-ministro Heleno. Até para não haver uma quebra de comunicação e de comando, dada a necessidade de reforço na segurança para a posse de Lula, alguns militares em postos-chave foram mantidos, mas não adiantou. Outros erros de preparo ficaram patentes, como efetivo insuficiente. A situação de G. Dias foi comparada ao desgaste do coronel Paulo Jorge Fernandes da Hora, ex-comandante do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP).

O coronel Fernandes sofreu intenso desgaste na tropa e teve de responder a interrogatórios em investigações perante o Supremo Tribunal Federal para explicar sua conduta e de seus subordinados na repressão ao ataque golpista. Num vídeo gravado por um policial, ele bateu boca com a PM, uma disputa de comando durante a operação, e parecia querer evitar a prisão e somente evacuar o Planalto. As imagens da CNN sugeriram algo semelhante por parte do ministro. Ele afirma que conduzia todos para um andar abaixo, onde prisões foram efetuadas. Mas um oficial experiente lembrou que não foi apenas o comandante do BGP que não deu voz de prisão aos invasores.

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