O relatório final da Polícia Federal sobre o inquérito referente à venda ilegal de joias desviadas da Presidência da República revelou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) estava ciente de que os presentes seriam vendidos em leilões. No dia 4 de fevereiro, o tenente-coronel Mauro Cid enviou o link do leilão do kit rosé para Bolsonaro. O evento estava marcado para quatro dias depois. Em resposta, o ex-presidente escreveu “Selva!”, um jargão militar usado como forma de cumprimento.
A saudação “Selva!” é tradicionalmente usada por militares do Exército Brasileiro, especialmente por aqueles que servem em unidades de operações na Amazônia. A origem do termo está ligada ao Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), localizado em Manaus (AM), fundado em 1964. Esse centro treina militares para operações na floresta amazônica, ensinando técnicas de sobrevivência e combate específicas para esse ambiente.
O próprio Exército Brasileiro explicou a origem do termo em seu perfil no Facebook. No início do funcionamento do CIGS, o centro não tinha fichas de viaturas, fazendo com que o militar responsável pelo portão das armas perguntasse o destino das viaturas que saíam do quartel. Quase sempre, recebia uma resposta apressada e lacônica: “Selva!” – era seu destino. “A resposta curta, tão repetida, fez-se saudação espontânea e vibrante, alastrou-se, expandiu o seu significado”, explicou.
Atualmente, o brado “Selva!” é amplamente difundido no meio militar como uma maneira de expressar determinação e compromisso com a missão e os companheiros de farda. Os apoiadores de Bolsonaro também utilizam a expressão com frequência. Durante os ataques à Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro, a expressão “Festa da Selma”, uma alusão à “Selva”, foi utilizada como código para coordenar os ataques na capital federal.
Bolsonaro acessou site de empresa de leilão
A Polícia Federal confirmou, por meio da perícia no celular do ex-presidente, que Bolsonaro acessou o site da empresa Fortuna Auction, responsável pelo leilão. Em 8 de fevereiro, dia do leilão, Cid avisou a Bolsonaro que “daqui a pouco é o kit” e enviou um link no Facebook, provavelmente com a transmissão ao vivo do evento. A joia, contudo, não foi arrematada. O tenente-coronel decidiu, no dia 13 de fevereiro, realizar mais uma tentativa de leilão. Em março, contudo, Cid informou à Fortuna Auction que não tinha mais interesse.
“Esta sequência apresentada: primeiro, o envio de link do leilão por Mauro Cid, segundo, o registro de acesso à página por meio de histórico e cookies por Jair Bolsonaro, em seu aparelho telefônico, e terceiro, a utilização da expressão ‘Selva’ reforçam a utilização deste jargão para confirmar a ciência, do ex-presidente, de que o kit ouro rosé fora exposto a leilão”, afirmou a PF.
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Bolsonaro foi indiciado na última semana por crimes de associação criminosa, peculato e lavagem de dinheiro. Segundo a PF, a associação criminosa tentou desviar joias avaliadas em R$ 6,8 milhões. Os bens incluem relógios de luxo das marcas Rolex e Chopard, além de canetas, colar e brincos. Os valores obtidos das vendas dos presentes eram convertidos em dinheiro em espécie e ingressavam no patrimônio pessoal do ex-presidente, por meio de pessoas interpostas.
A defesa de Bolsonaro nega irregularidades e diz que os presentes recebidos pelo ex-presidente seguiram um protocolo rigoroso de tratamento e catalogação pelo Gabinete Adjunto de Documentação Histórica (GADH), sem influência do chefe do Executivo. No X (antigo Twitter), Bolsonaro disse aguardar que a PF faça as “correções” no inquérito. “A última será aquela dizendo que todas as joias ‘desviadas’ estão na CEF [Caixa Econômica Federal], acervo ou PF, inclusive as armas de fogo”, escreveu.