A uma semana do próximo ato nacional que deve levar manifestantes às ruas das principais cidades brasileiras pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro, marcado para o dia 2 de outubro, lideranças políticas à esquerda e à direita ainda debatem se é possível coordenar os esforços de antigos rivais na campanha.
O Estadão questionou o comando de 14 legendas dos mais variados espectros políticos que declaram oposição ao atual governo, do PT ao Novo, sobre quais são os entraves que dificultam uma eventual união em torno da bandeira do “Fora Bolsonaro”. Os principais motivos informados pelos partidos vão de falta de consenso interno sobre a abertura de um processo contra o presidente a questões relativas a interesses que têm como norte a eleição presidencial de 2022.
Em comum, todos os partidos integram o fórum Direitos Já!, que se tornou um dos polos de oposição que tentam construir uma frente ampla para pressionar o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (Progressistas-AL) a abrir o processo de impeachment de Bolsonaro. Algumas dessas siglas, no entanto, não têm ainda posição sobre o assunto.
Parte das lideranças argumenta que o ambiente para a formação de uma ampla coalizão se construiu a partir das manifestações do último 7 de Setembro. Na ocasião, ao discursar em Brasília e em São Paulo, Bolsonaro ameaçou descumprir ordens judiciais do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) – o que em tese configura crime de responsabilidade –, e seus apoiadores pediram uma intervenção militar no País e o fechamento da Corte.
Outros líderes partidários ponderam que seriam necessários gestos no sentido de uma clara suspensão da pré-campanha de 2022 para que todos os partidos e seus pré-candidatos pudessem se concentrar na abertura do processo de deposição do presidente.
Para alguns partidos de centro, no entanto, entrar de vez no bloco do impeachment ainda é uma incerteza. Siglas como o PSD e MDB ensaiaram uma mudança de posição nos dias seguintes aos atos do Dia da Independência, mas, com o recuo na forma de uma carta à Nação divulgada por Bolsonaro nas redes em tom de desculpas a Moraes, os dirigentes partidários agora sinalizam uma acomodação. Uma grande mobilização popular nas ruas das principais cidades brasileiras em oposição a Bolsonaro é citada por todos como uma condição essencial para a mobilização conjunta, sem a qual o cenário não deve mudar.
Para o coordenador do Direitos Já, Fernando Guimarães, é preciso deixar de lado as diferenças e se unir em torno de um objetivo comum. “Quem tiver compromisso com a democracia vai colocá-la acima de tudo”, disse Guimarães, que tem se esforçado para juntar no mesmo palco representantes de correntes divergentes e até rivais políticos. “Este é um momento em que precisamos estar preocupados em mobilizar a sociedade, e somar na rua todos aqueles que tenham a clareza da sua responsabilidade histórica, para deixar de lado as questões eleitorais e os projetos políticos.” PSDB, PDT, Cidadania e PV devem estar no ato do dia 2 pelo impeachment de Bolsonaro com os partidos de esquerda na Avenida Paulista.
O QUE PENSAM OS DIRIGENTES
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Antonio Neto, integrante da executiva nacional do PDT
“Houve uma confusão por parte dos companheiros que decidiram não ir (ao ato no dia 12). Eu reputo isso um erro. A história do mundo mostra que nos momentos-chave, decisivos, você tem de tirar da discussão aquelas coisas que são menores. Falta desprendimento, em primeiro lugar, de não levar em consideração o inimigo principal. O que falta é terem essa visão do compromisso com o momento, que é muito grave. A prioridade é efetivamente garantir a democracia para que possamos ter eleições livres, soberanas e, acima de tudo, garantir a posse de quem seja eleito. Não podemos debater agora a eleição.”
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José Aníbal, integrante da executiva nacional do PSDB
“É difícil imaginar mais 16 meses com Bolsonaro, com esse padrão de desgoverno que ele tem. É preciso que seja feito um acordo nacional. Sou a favor do ‘Fora Bolsonaro’, mas a questão não pode se resumir ao impeachment. Eu falo em impeachment como sinalização. O País está à deriva. O ‘fora Bolsonaro’ cria muita convergência, mas cada um interpreta de um jeito. Essa conjuntura é muito dinâmica. Essas gavetas de esquerda, direita, centro-esquerda e centro-direita estão travando o debate. É um jogo de palavras. Fui em todas as manifestações contra Bolsonaro. Seria preferível que as manifestações se unissem.”
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Eduardo Ribeiro, presidente do Novo
“Falta definir se realmente querem o impeachment ou se a pauta será só retórica eleitoral. Não vejo o PT, por exemplo, se esforçando pelo impeachment. A saída de Bolsonaro despolariza e enfraquece o Lula nos eleições. O Novo está num espectro político diferente do restante da oposição, não temos articulação conjunta. Mantemos nossa posição institucional, mas o cenário depois do dia 7 de setembro, com o recuo constrangedor do Bolsonaro, assentou as forças políticas em Brasília de forma que, se nada muito grave acontecer, o impeachment se tornou muito improvável. O Centrão e o PT não querem.”
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José Guimarães, integrante da executiva nacional do PT
“Em primeiro lugar, esse ato do dia 2 é um momento que percebo que pode selar essa unidade. É preciso ter muita generosidade das forças políticas para agregarem outros atores, para dar musculatura à luta pelo impeachment. Por último, é preciso povo na rua. É o que falta. A pressão sobre o Congresso Nacional é um elemento central nessa campanha. Sem isso, não tem impeachment. Nossa prioridade é unir as forças de oposição em defesa da democracia e pelo impeachment já. Essa é a centralidade.”
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Juliano Medeiros, presidente do PSOL
“A oposição está unida em defesa do impeachment. Apresentamos um pedido unitário que reúne partidos, movimentos e parlamentares de diferentes espectros partidários meses atrás. Os protestos de rua caminham para uma unificação. Falar em ‘oposição fragmentada’ não faz mais sentido. Nossa prioridade é o fortalecimento da campanha pelo #ForaBolsonaro. O impeachment depende de um deslocamento de partidos e deputados que hoje dão sustentação ao governo Bolsonaro, que só pode ocorrer a partir da pressão popular nas ruas, num amplo movimento de rejeição ao governo Bolsonaro.”
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Junior Bozzella, vice-presidente do PSL
“Fui nas manifestações da esquerda e estive também na manifestação (contra Bolsonaro) da direita. Acho que nós, que defendemos a democracia, temos o dever de fazer um gesto nesse sentido: baixar as bandeiras agora e buscar unidade. A construção dessa frente ampla não pode ser conduzida por partido A ou B, e sim por uma entidade isenta. No PSL não temos uma deliberação sobre apoiar ou não o impeachment. Eu sou signatário do impeachment e tenho liberdade para me posicionar. Esse tema do fechamento de questão nunca foi debatido dentro da nossa Executiva Nacional.”
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Isnaldo Bulhões, integrante da executiva nacional do MDB
“Acho que a união da oposição na verdade já existe. Desconheço qualquer dissidência nesse sentido, eles defendem a pauta de admissibilidade do processo de impeachment. Quanto ao MDB: na minha opinião o impeachment é apagar fogo com gasolina. Um processo desses logicamente tem de ir ao encontro de várias vertentes. Acho pouco prudente colocar neste momento como prioridade a admissibilidade do processo de impeachment. O posicionamento do partido, tanto no Senado quanto na Câmara, é manter a independência que tem tido sempre. Discutimos o mérito pauta a pauta.”
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Alessandro Molon, integrante da executiva nacional do PSB
“É importante que o ato pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro não tenha um dono. Considero que a participação dos demais partidos é muito importante e estão havendo tratativas para a adesão, e não tenho a menor dúvida de que ela virá. Espero que a gente consiga já para o dia 2 de outubro mas, se por acaso isso não se viabilizar, tenho plena convicção que até 15 de novembro a gente consegue isso. Não são partidos políticos que estão sendo convidados por serem convidados. Estão sendo convocados para serem também autores da convocação – portanto, coorganizadores.”
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Gilberto Kassab, presidente do PSD
“O PSD acompanha e propõe soluções para as reais necessidades do País, como superação da crise econômica e da pandemia de covid. Participa do debate democrático e cobra que a Constituição Federal seja respeitada por todos os agentes públicos. O partido entende que, a partir da inobservância da Constituição, pode ser levada adiante a proposição de afastamento do presidente da República ou outras sanções.”
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Jefferson Coriteac, vice-presidente do Solidariedade
“O dia 7 de Setembro, com a ameaça à democracia e à nossa Constituição, foi o estopim para começar essa união. Acho que agora começa essa organização, a partir de hoje. O Solidariedade, junto com partidos de oposição, já fizeram um documento para o 'Fora Bolsonaro'. No fórum do Direitos Já!, há partidos que não são declaradamente de oposição ao governo, mas que estão unidos na defesa da democracia. Dentro em breve, acho que deve haver uma ação muito maior. Nossa prioridade é lutar pela defesa dos direitos dos trabalhadores, dos mais necessitados, não deixar que a democracia e a Constituição sejam afetadas. Estamos lutando para que as pessoas possam se alimentar e viver, porque hoje temos preços altíssimos e pessoas sem condições de se manter.”
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Soninha Francine, integrante da executiva nacional do Cidadania
“Unir a oposição fica mais fácil quando você já tem um ponto de partida, um bloco para demonstrar isso. Para demonstrar que é possível. Se estivesse todo mundo sozinho tentando chamar para si, ficaria mais difícil, lógico. Mas é muito bom que a gente já pode demonstrar. É por aí. Não precisa começar do zero, já temos uma construção. Nosso partido tem 90% de alinhamento com o tema. Pelo País, às vezes, e até na Câmara, há integrantes que destoam. Mas eles que destoam: é um posicionamento que é deles. O partido é historicamente a favor de alianças, Partido Comunista, depois o PPS herdando isso. Temos posição.”
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Heloísa Helena, porta-voz nacional da Rede Sustentabilidade
“Falta pensar menos no calendário eleitoral e mais nos escombros de lágrimas, lutos e sofrimentos pelos quais passa o Brasil. Muitas pessoas acham que devem deixar o Bolsonaro sangrar para, de alguma forma, facilitar a disputa eleitoral. Na verdade, ele não está sangrando. Quem está sangrando pelo desemprego, pelo desespero, por luto e lágrimas, é a grando maioria do povo. É só isso: não ficar refém do oportunismo eleitoral. Estamos articulando com todas as forças sociais para que, conjuntamente, possamos viabilizar a abertura de processo por crime de responsabilidade. Ao mesmo tempo, nós estamos atualizando os 18 eixos estratégicos para um Brasil sustentável, porque a democracia sem justiça social não existe. Estamos atualizando nosso projeto para o País, fazendo todos os debates necessários para, até dezembro, ter um projeto para o Brasil na mão. A vida que possibilita mudanças estruturais profundas não está presente apenas nas cúpulas partidárias, é muito importante temos compreensão para não achar que os partidos são os ungidos com as únicas possibilidades de fazer transformação social.”
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Luciana Santos, presidente do PCdoB
“Falta a percepção de que é preciso deixar essa disputa de 2022 para o momento certo. Na prática, muitas forças acabam colocando essa agenda da eleição na frente. Por mais que não seja algo deliberado, na base social e política há muita incompreensão de como conviver com os contrários, com quem já foi Bolsonaro e agora é a favor do impeachment. A confusão é natural de momentos de crise, mas com paciência vamos conseguir ir fazendo o convencimento político dessa necessidade. Do ponto de vista tático, nossa prioridade é desmascarar, isolar e derrotar Bolsonaro. Programaticamente, é a bandeira da democracia. Na agenda econômica, nós temos muitas diferenças e também na agenda social.”
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José Luiz Penna, presidente do PV
“A reunião (do domingo, dia 12) não foi um fracasso. Bolsonaro pôs tudo (na organização dos atos no dia 7). Temos de ter visão de que essas coisas são cumulativas. Se não foi possível juntar no dia 12 todos os partidos, acho que no dia 2 nós vamos conseguir juntar todos os partidos e movimentos. Tudo isso (a divergência entre partidos) fica pequeno diante da possibilidade de nem termos eleição. Talvez o que se jogue fora é a última oportunidade do Brasil. Estamos falando sem parar. Agora, os processos eleitorais do Brasil são muito excludentes. Mas estamos enfrentando.”