Os resultados do primeiro turno do pleito de 2022 demonstraram, assim como em 2018, a dificuldade de as pesquisas eleitorais captarem o voto do eleitor de direita, em especial dos bolsonaristas. Em boa parte dos Estados e para os diferentes cargos, somam-se exemplos nos quais os levantamentos não conseguiram prever a vitória ou a liderança de políticos desse campo.
A primeira surpresa foi o próprio desempenho do presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL), que, nos últimos levantamentos dos principais institutos de pesquisa (Datafolha e Ipec), aparecia com 36% ou 37% dos votos válidos e acabou o primeiro turno com mais de 43% da preferência do eleitorado, ultrapassando, portanto, a margem de erro de dois pontos porcentuais.
A diferença entre os números da pesquisa e o resultado do primeiro turno não foi tão ampla no caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que registrava 50% a 51% das intenções de voto nas pesquisas mais recentes e acabou com 48% no primeiro turno - dentro ou próximo da margem de erro, portanto.
O cenário de erro na projeção do desempenho de candidatos da direita se repetiu nos maiores colégios eleitorais do País. Na disputa pelo governo de São Paulo, as pesquisas falharam ao apresentar Fernando Haddad (PT) como líder, com 39% a 41% das intenções de voto, e Tarcísio de Freitas (Republicanos) em segundo lugar, com sete a dez pontos porcentuais a menos. Ao final do primeiro turno, o candidato bolsonarista ficou com cerca de 42% dos votos válidos, contra 35% do petista.
Ainda em São Paulo, as pesquisas erraram ao não prever o sucesso do astronauta e ex-ministro de Bolsonaro Marcos Pontes (PL) na disputa pelo Senado. Os levantamentos projetavam vitória de Márcio França (PSB), mas Pontes levou a melhor na disputa, com quase 50% dos votos válidos contra cerca de 36% de França.
Vitória não prevista
No Rio de Janeiro, os levantamentos apontavam um segundo turno entre Cláudio Castro (PL) e Marcelo Freixo (PSB) na disputa pelo governo do Estado. A última pesquisa Datafolha, por exemplo, mostrou o primeiro pontuando 44% dos votos válidos contra 35% do segundo colocado. Ao final da apuração ontem, a diferença entre ambos ficou superior a 30 pontos porcentuais (58% contra 27%) e Castro acabou eleito em primeiro turno.
No Rio Grande do Sul, o atual governador Eduardo Leite (PSDB) liderava a maioria das pesquisas, mas, ao final da apuração, ficou com 10 pontos a menos do que o oponente Onyx Lorenzoni (PL), ex-ministro e aliado de Bolsonaro. Na disputa pela vaga gaúcha ao Senado, outra surpresa: o vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos) acabou eleito com 44% dos votos válidos, embora nas pesquisas aparecesse apenas em terceiro lugar ou empatado em segundo com Ana Amélia Lemos (PSD), ambos atrás de Olívio Dutra (PT). Ao final, Dutra acabou na segunda colocação, com 37% dos votos válidos, e Ana Amélia pontuou 16%.
Para especialistas, a resistência de eleitores de direita aos institutos de pesquisa e o chamado “voto envergonhado” ajudam a explicar os erros dos institutos de pesquisa no pleito deste ano. “Quem acompanha isso nas redes já tinha notado que alguns bolsonaristas se recusavam a responder a pesquisa, dizendo que são enviesadas. Outra coisa é o que a gente chama de ‘espiral do silêncio’, ou seja, pessoas que têm vergonha de dizer que votam no Bolsonaro só que, na frente da urna eletrônica, escolhem quem quiserem”, afirmou a cientista política Tathiana Chicarino, professora de pós-graduação da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. No final de setembro, um eleitor bolsonarista chegou a agredir um pesquisador do Datafolha no interior de São Paulo.
O ministro da Casa Civil de Bolsonaro, Ciro Nogueira (PP), criticou neste domingo, 2, os institutos de pesquisa e convocou os eleitores bolsonaristas a não responderem levantamentos sobre a intenção de voto para o segundo turno. Bolsonaro, por sua vez, disse que os erros nas projeções “desmoralizaram de vez” os institutos de pesquisa. “Acho que não vão continuar fazendo”, declarou. Segundo o presidente, os institutos afetam o resultado da votação. “Tem gente que vota em quem está na frente. Então, a pesquisa influencia, sim.”
Para o advogado, geógrafo e CEO da Geocracia, Luiz Ugeda, as pesquisas foram as “grandes perdedoras” da eleição. “Elas não captaram um conjunto de eventos que, quando vemos de forma estruturada, chamam a atenção. Essas instituições devem fazer uma autocrítica para que os brasileiros tenham informações confiáveis e fidedignas”, declarou.
Questionado sobre as pesquisas, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, disse que são os institutos que “devem explicar as discrepâncias”. /COLABORARAM ANA LUIZA ANTUNES, JULIA AFFONSO E LETÍCIA PILLE