BRASÍLIA – A letargia do governo federal para conter a invasão do Palácio do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) por parte de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, neste domingo, 8, fez com que crescessem nas fileiras do PT as críticas à atuação do ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. Dirigentes do PT pressionam Lula para trocar o ministro, mas até agora não obtiveram sucesso nesse movimento.
A crise de graves proporções na Praça dos Três Poderes expôs o titular da Defesa, que enfrenta resistência de petistas desde que foi sondado para ocupar o cargo, e agora ficou enfraquecido. O argumento de conselheiros de Lula é o de que Múcio não tem ascendência sobre as Forças Armadas e, além de tudo, tenta agradar a militares que protegem golpistas. Declarações dadas pelo titular da Defesa, seis dias antes dos atos de vandalismo, em Brasília, serviram como combustível para uma ala do PT aumentar a pressão contra ele. Na ocasião, Múcio disse que manifestações em frente aos quartéis faziam parte da democracia e deveriam se “esvair” aos poucos, sem repressão.
Em conversas reservadas, parlamentares do PT e de outros partidos aliados afirmam que Lula deveria substituir Múcio por Nelson Jobim ou mesmo por Jaques Wagner, hoje líder do governo no Senado. Os dois foram ministros da Defesa em gestões passadas do PT. Múcio, por sua vez, foi titular da Secretaria de Relações Institucionais de 2007 a 2009, no segundo governo Lula, e presidente do Tribunal de Contas da União (TCU).
O presidente não planeja troca na Defesa, ao menos por enquanto, embora admita ter havido graves problemas na operação de segurança federal. Na tentativa de obter explicações sobre a inação, Lula se reuniu nesta segunda-feira, 9, com Múcio e com os comandantes do Exército, general Júlio César de Arruda; da Marinha, almirante Marcos Sampaio Olsen, e da Aeronáutica, tenente-brigadeiro do ar Marcelo Kanitz Damasceno, no Palácio do Planalto. O gabinete de Lula foi um dos poucos não atingidos pela depredação, que destruiu até mesmo obras de arte, como o mural “As Mulatas”, de Di Cavalcanti. Documentos da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) também foram furtados durante a invasão.
Decreto
Múcio e o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Gonçalves Dias, chegaram a sugerir ao presidente, no domingo, que lançasse mão do decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para conter os ataques na Praça dos Três Poderes. Lula resistiu e decretou intervenção na segurança do Distrito Federal, mais branda que a GLO.
Nos bastidores, dirigentes do PT mostram inconformismo com o que chamam de “ingenuidade” de Múcio e do ministro da Justiça, Flávio Dino, que confiaram no governador Ibaneis Rocha. O governador garantiu aos ministros que tudo estava sob controle. À noite, após o caos instalado na capital da República, gravou um vídeo pedindo desculpas a Lula. Ibaneis acabou afastado do cargo por 90 dias, por determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
Dino admitiu divergências com Múcio sobre a permanência de bolsonaristas em acampamentos diante dos quartéis. Disse, porém, não concordar com a ofensiva política para transformar Múcio em “vilão” da história. “Tenho solidariedade ao ministro Múcio, o que não significa concordância integral”, afirmou Dino, que, ao contrário do colega, defendia a rápida retirada dos aliados de Bolsonaro da frente do QG do Exército. “Não concordo com a martirização de Múcio como sendo o vilão desse processo”, emendou ele.
A ausência do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP) durante os atos de vandalismo no Planalto também causou estranheza no governo. Durante os governos Dilma Rousseff e Michel Temer a tropa foi convocada em mais de uma ocasião para proteger o patrimônio público de ameaças de invasões. O BGP tem entre suas principais funções guardar as instalações do Planalto e do Comando do Exército. Neste domingo, porém, só entrou em cena depois que as depredações já haviam ocorrido. E, mesmo assim, com contingente reduzido.
Ao Estadão, Múcio disse estar ciente dos problemas e das pressões para retirá-lo do cargo. “Meu lugar pertence ao presidente da República”, resumiu o ministro da Defesa. “Eu estar aqui, ou não, não interfere na nossa relação de amizade, bem querer e admiração.”